* Por João Ker
Demorou, mas aconteceu: há sete meses sem lançar um videoclipe novo sequer, Lady Gaga liberou o curta-metragem de sete minutos da música “G.U.Y.” nesta noite deste sábado (22/03). O vídeo, dirigido por ela mesma – tipo Woody Allen e Barbra Streissand, que fazem de tudo e até assobiam -, conta com participações das Housewives de Beverly Hills e do apresentador Andy Cohen, além de conter outras duas músicas do álbum: “Artpop” e “Venus”. Mas por que uma das maiores artistas pop da última década levou quase um ano para lançar o segundo videoclipe do seu quarto disco?
Tudo começou com o primeiro single, “Applause”. Lançado com apenas algumas horas de diferença de “Roar”, de Katy Perry, o carro-chefe de divulgação do conceitual “ARTPOP” amargou a segunda posição nos charts da semana. A partir daí, todos os blogs e sites de música começaram a falar que o fim de Lady Gaga estava próximo e ela não conseguiria mais atingir o mesmo sucesso que teve com seu primeiro disco, nem que assumisse uma melancia glitter no pescoço assinada por Thierry Mugler. Isso foi o suficiente para que sua gravadora começasse a se preocupar. E preocupação, no caso, significa pausa para estratégia de guerra.
“Venus” seria o segundo single de “ARTPOP”, mas os executivos da Interscope decidiram que a música não era comercial o suficiente e resolveram lançar “Do What U Want” no seu lugar. Gaga então gravou um videoclipe, com direção do polêmico Terry Richardson – o homem do full frontal –, para a parceria com o rapper R. Kelly. Mas, algumas semanas antes de o vídeo ser lançado, Kelly e Richardson ocuparam a mídia ao serem acusados de abuso sexual contra mulheres. Scandal, mas não exatamente do jeito quer Gaga curte. A partir daí, o vídeo ficou fadado a nunca ver a luz do dia, permanecendo em alguma caverna, trancado a sete chaves e pronto para ser assistido somente por sobreviventes de um inverno nuclear. Daí, nem uma performance e um remix oficial com Christina Aguilera conseguiram salvar a música. Como se não bastasse, “ARTPOP” também não foi bem recebido pela crítica e não vendeu tanto assim nas primeiras semanas. Para a mídia, Gaga estava em um espiral descontrolada rumo ao fracasso. Teria ela se torando veneno de bilheteria de shows? E é nesse contexto, depois de muito dinheiro do próprio bolso e de afirmar que não se importava com o #1 (aham, Claudia!), que chega o vídeo de G.U.Y.
Agora, através de sua criatividade esquizofrênica, Gaga consegue dizer para todos o que aconteceu de errado com ela e quais são suas intenções daqui para frente. O novo vídeo começa ao som da faixa “Artpop” e mostra Gaga como um anjo que foi “abusado” e machucado por um bando de executivos sedentos por dinheiro. Pobrezinha da moça. Enquanto a música diz “meu coração bate com cordas e tijolos/venha para mim com todas as suas entrelinhas e fantasias”, a cantora se arrasta até o Hearst Castle. Entra “Venus”: o corpo de Gaga é afundado na piscina como uma oferenda para a Deusa do Amor e ela ressuscita com saudações a Eros, enquanto “G.U.Y.” começa a tocar.
Ao longo do vídeo, Lady Gaga personifica sua melhor versão de Donatella Versace – com muito menos botox, claro, mas nem por isso menos over -, enquanto seduz marmanjos, não se importando de ser a garota embaixo deles. Hum. Agora ela tem uma missão: espalhar amor pelo mundo, como se fosse uma sacerdotisa do kama sutra expert em sexo tântrico. Tipo mesmo guru do amor. Para isso, é criado um exército de G.U.Y.’s feitos a partir do DNA de Jesus Cristo, Gandhi e Michael Jackson -pessoas que morreram pelas traição dos seus, assim como a cantora já declarou que se enxerga na indústria da música. Então, Gaga e seu batalhão de clones – mais numeroso que os de Mila Jovovich na série “Resident Evil” – saem do castelo, dominam um complexo empresarial e depois vão em direção ao resto do mundo. Jihad musical?
O vídeo mostra a atual postura de Lady Gaga na indústria da música: continuar a entreter o público, mas com uma mensagem de aceitação e amor por trás de algo que, se visto superficialmente, pode ser encarado apenas como jogo publicitário e apelo comercial. “G.U.Y.” foi dirigido pela própria e, se comparado à experiência anterior de “Marry The Night”, é possível observar o desenvolvimento artístico pelo qual a cantora passou nos últimos anos, mesmo que não seja exatamente uma Sophia Coppola na hora de pegar o megafone e comandar o set, sentada em uma cadeirinha de cineasta.
Com este vídeo, a arte de Gaga ganha mais um gás rumo à uma possível nova consolidação pós-exaustão: em meio a estrelas de reality show, referências a deuses gregos e a perfeita fusão entre moda, música e tecnologia – ela personifica até um Lego durante o vídeo -, a artista demonstra ter aprendido direitinho as lições sobre reprodutibilidade e reapropriação do banal na fugaz escola de Andy Warhol. Se der, certo, que sabe ela não dura mais algum tempo?
Confira o clipe!
(Reprodução)
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