* Por Carlos Lima Costa
Longe dos palcos há cerca de dois anos e oito meses, a cantora Marcella Fogaça conta as horas para retomar a carreira. Em 8 de outubro, faz pocket show no evento Gastronomia Sem Fronteiras, no Shopping Fashion Mall, Rio. Em seguida, ela foca as energias no quarto álbum de carreira, um projeto autoral retratando o momento mais bonito e difícil de sua vida: a gravidez e o nascimento das filhas gêmeas Pietra e Sophia, do casamento com o ator Joaquim Lopes. As meninas vieram ao mundo com 32 semanas de uma gestação de risco (mono mono, com uma placenta e uma bolsa amniótica) e permaneceram 27 dias na UTI do hospital até poderem ir para casa. Essas experiências maternas também vão ser retratadas no e-book batizado ‘Sanidade no Caos’.
“Não tivemos a experiência tradicional de ter filhos e ir para casa. Não tem como explicar a profundidade dessa transformação. Nesse período, tive a certeza de que realmente a única coisa que podemos controlar de fato são os nossos pensamentos e sentimentos. Para isso, temos que trabalhar o autoconhecimento. Agora, quando me vi diante de uma situação na qual não tinha nenhum controle, não tive outra opção a não ser olhar pra dentro para encontrar em mim essa confiança na falta de controle, na fluidez do universo de Deus, caso contrário, eu ia surtar. Era uma situação super rara. Durante a gravidez, não encontrei ninguém que tivesse passado por isso. Aí veio o parto. Não pude vê-las lá na hora. Só fui amamentar 15 dias depois. Foi um processo de muita resiliência. Isso me fortaleceu, amadureci muito em pouco tempo. Emocionalmente, eu evolui a galope mesmo para sobreviver por elas e por mim”, enfatiza Marcella.
A cantora relembra o período da permanência das meninas no hospital: “Hoje, temos a certeza de que nada mais sério aconteceu, mas enquanto estávamos vivendo aquele momento, por mais que fosse só para ganhar peso, ficávamos naquela tensão, porque eram bebês na UTI, cercadas por casos mais graves. Só mãe de UTI sabe como é isso”, pontua.
Apesar de todas as circunstâncias, Marcella conseguiu amamentar as filhas até os seis meses. “Como ficaram muito tempo na UTI e tinha que entrar mamadeira, aí teve confusão de fluxo, que chama, confusão de bico. Fomos até seis meses maravilhosamente, aí elas mesmas não quiseram mais. Ficaram ótimas, eu é que sofria, porque não existe nada igual a você estar ali sendo o suficiente para a sobrevivência das suas filhas em um momento de conexão em que você se entrega. E quando elas olham dentro do seu olho, nossa, você não precisa de mais nada no mundo. Naquele momento, entendi para que eu nasci”, acrescenta.
A presença do marido, Joaquim, foi fundamental nesse período. “Ele viveu tudo comigo desde o primeiro dia, compartilhando os meus sentimentos positivos e apreensivos, me apoiando incondicionalmente, cuidando de mim na gravidez como nunca vi na vida. Quando elas nasceram, na UTI, a única coisa que eu fazia diferente dele era amamentar. Somos muito parceiros. Não teria conseguido passar por tudo isso sem ele. Essa situação nos fortaleceu ainda mais, porque foi uma experiência desafiadora. Então, apesar de todo medo que nos cercava não só por conta da pandemia, mas por causa da gravidez de risco, conseguimos comemorar muito o momento da gestação. Se sobrevivemos a tudo, nada mais nos abala”, observa. E, com bom humor, completa: “Passei esse tempo com ele me alimentando maravilhosamente bem com tudo que eu queria comer. Nossa senhora, eu abusei mesmo, pus esse homem pra trabalhar.” Joaquim é formado em Gastronomia.
TROCA DE EXPERIÊNCIAS MATERNAS NAS REDES SOCIAIS
Naquele período e até hoje, nas mídias sociais, Marcella troca informações com outras mães sobre a maternidade real. “Óbvio que é mágico. É o maior amor do mundo, mas não podemos romantizar também. A gente dá as mãos, porque realmente é difícil e desafiador. A gente morre para nascer outra pessoa”, assegura ela, que planeja lançar no final do ano um e-book com essas vivências. “São textos e contos baseados na minha experiência de maternidade. Alguns, eu até já publiquei no Instagram sob o título Sanidade no Caos, que vai ser o nome do livro. A gente tem que encontrar a sanidade no caos. Já está bem adiantado, mas não estou colocando pressão de data, porque quem manda na minha agenda é a Sophia e a Pietra. Mas pretendo soltar até o final desse ano. Quero compartilhar com as mães que sempre curtem e comentam. Quando compartilho um desses textos, as mães pedem para eu escrever um livro. Isso me motivou a fazer uma seleção desses textos, acrescentando outros”, conta.
Marcella quer compartilhar o trabalho musical com todas as mães para elas não se sentirem sozinhas. “Assim como eu não me sinto quando tenho essas trocas na internet. Durante a pandemia, principalmente, a internet foi uma rede de apoio muito importante, porque minha família e amigas estavam longe. Estávamos eu e Joaquim sozinhos vivendo todos aqueles novos sentimentos e emoções. Então, esse novo trabalho musical vai estreitar essa conexão. Tem músicas para as mães cantarem para os filhos que são as que eu fiz e canto para as meninas até hoje para elas dormirem. Vou colocar áudios delas, que já tenho gravados, na primeira que vou lançar próximo do Natal. O álbum vai ser uma espécie de cronologia da gestação até o parto e o primeiro ano bem impactante na vida da mulher. Tem música de quando descobri a gestação, quando vem ansiedade, medo, alegria e aí os primeiros meses que você acha que está doente (risos), de tanto que passa mal e a minha gravidez foi muito peculiar, eram gêmeas e uma gravidez de risco. Então, as canções narram essa experiência que me transformou de uma forma que eu jamais imaginei. A maternidade realmente me trouxe para mais perto de mim, de quem eu realmente sou”, analisa.
Neste álbum totalmente dedicado às meninas, ela não imagina mais do que nove músicas no total, até por conta dos nove meses da gestação, apesar de sua gravidez não ter chegado a tanto. A primeira canção virá acompanhada de um clipe. “Tenho que me virar em cinco mil pra dar conta de tudo, por neném pra dormir, organizar a banda, não é mole não. Estou trabalhando muito no improviso, porque o meu tempo é todo delas. Hoje, por exemplo, consegui emendar uma foto no meio do dia para a divulgação do show. O clipe vai representar bem o que foi a minha vida esse ano, com toda emoção e momentos maravilhosos, que elas vão poder ver no futuro. Primeiro, vou gravar essas músicas em estúdio para depois montar o show. É um projeto que eu estou fazendo com muito carinho sem pressa. Um projeto realmente autoral inspirado nessa experiência transformadora e mais importante da minha vida”, reforça.
RETORNO AOS PALCOS
A apresentação do próximo dia 8 é consequência dos muitos convites que vem recebendo para voltar a fazer shows. Esse primeiro vai integrar um evento solidário. A entrada vai ser um quilo de alimento não perecível. Marcella montou uma banda nova, selecionou canções eternizadas na voz de cantoras que marcaram sua vida. “São músicas que eu cresci ouvindo através de grandes mulheres, como Rita Lee, Marisa Monte, Marina Lima e Cássia Eller (1962-2001). Minha influência veio muito disso, mas Minas Gerais (ela nasceu em Belo Horizonte, capital mineira) é a terra do Clube da Esquina e também do pop rock, temos Skank, Jota Quest, que estavam muito em alta na minha adolescência”, lembra ela, que, em 2018, esteve na trilha sonora da novela O Tempo Não Pára, com a canção Baby, Eu Queria, um dueto com Nando Reis. Atualmente, Marcella não se apresenta desde o Carnaval de 2020, quando cantou em um camarote na Marquês de Sapucaí. Na sequência, veio a pandemia e a gravidez.
Joaquim viveu tudo comigo desde o primeiro dia, compartilhando os meus sentimentos positivos e apreensivos, me apoiando incondicionalmente, cuidando de mim na gravidez como nunca vi na vida – Marcella Fogaça
Marcella começou no pop rock. “Mas a espinha dorsal sempre foi MPB. Eu falo que é uma MPB com um pezinho no pop rock por causa das minhas influências . Mas esse novo trabalho especificamente vai mais para MPB até pela roupagem que eu quero dar de harmonia, arranjo. É um trabalho mais tocante e profundo, que vou fazer pra mim e por mim, compartilhando com as pessoas. São canções de amor”, explica ela, cujo primeiro CD, Te Vira do Avesso, foi lançado em 2013. Depois, gravou Cella, um EP com cinco músicas, e ainda Sem Medo, em 2019.
Para prosseguir em sua caminhada, nos momentos difíceis, ela busca forças em uma filosofia de vida que segue desde os 13 anos. Um seguimento da Yoga. “É nisso que eu me baseio, nessa fé, que é a fé em Deus. Então, pratico meditação, mantras, estudo realmente escrituras que falam de autoconhecimento. E minha família também é o meu pilar sempre que eu preciso de orientação, apoio”, conta Marcella, que se vê muito nas filhas através do bom humor das meninas. “Elas estão sempre rindo, são divertidas. Só choram quando estão com fome e sono. Até nisso a gente parece (risos) e fisicamente elas são uma misturinha perfeita, na personalidade também. Tirando essa questão do bom humor, elas são muito diferentes entre si”, conta Marcella que reflete sobre a sociedade machista que elas vão encontrar quando crescerem.
A maternidade foi um processo de muita resiliência. Isso me fortaleceu, amadureci muito em pouco tempo. Emocionalmente, eu evolui a galope mesmo para sobreviver por minhas filhas e por mim – Marcella Fogaça
Marcella frisa que informação é tudo. “Venho de uma época onde a gente não tinha muito acesso à informação, nem em casa. Era tudo muito velado, reprimido. Então, eu e Joaquim vamos explicar muito sobre como o mundo é. Claro que de acordo com a idade, com a evolução delas, conversando sobre o que podem fazer para o mundo se transformar e ser um lugar melhor para elas e para todos. As meninas vão ser criadas para serem fortes, para saberem desenvolver habilidades, saberem que elas tem segurança em casa, que podem confiar e contar com a gente para qualquer coisa. Nós, mães e pais de meninas nos preocupamos com isso a vida inteira desde que o mundo é mundo e vamos continuar nos preocupando”, afirma.
Outras questões também preocupam Marcella, como o meio ambiente. Quando lançou a música Gira Roda, ela destinou a renda da venda da canção nas plataformas para instituições engajadas com o meio ambiente. “Em casa, nos preocupamos realmente com a reciclagem. Já começamos a mostrar para as meninas o lixo que é de plástico, a nossa hortinha, a nossa composteira, como podemos economizar água, reciclar o lixo. Essa questão do meio ambiente me toca muito e quero muito passar para elas, porque é para elas que a gente vai deixar esse mundão. Fora isso, questões sociais de solidariedade. Às vezes, tem casos na internet que simplesmente bato o olho e tocam o meu coração, como uma mãe que precisa de ajuda. Temos que fazer o nosso máximo, porque o nosso máximo pode ser tudo para alguém. E tudo passa pela educação, o exemplo arrasta, então, temos que começar a dar exemplos em casa mesmo, nas pequenas coisas. As meninas são muito novinhas, mas assim que tiverem mais consciência, vamos dar mais exemplos, tipo, ganhou um brinquedo, vamos doar outro. Ganhou uma roupinha, vamos dar outra. Precisa ter essa consciência do desapego, de ajudar ao próximo. Isso é necessário”, aponta.
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