*Com Lucas Rezende
Prestes a subir ao palco do Espaço das Américas, em São Paulo, para o show de gravação do seu DVD que contará com quatro músicas inéditas e parcerias de peso como Anitta, Marcelo D2, Dado Villa Lobos e o produtor internacional Buckmouth Beatz, o rapper Projota está com todo gás e sabe que começou 2016 com o pé direito. No dia 13 de janeiro, mais de duas mil pessoas estarão em sua plateia e cada uma delas é especial. Explicamos: o show não teve venda de ingressos. Os fãs foram selecionados por meio de promoções nas redes sociais e nas principais rádios do país. O intuito, de acordo com Projota, é reunir pessoas que realmente gostam de seu trabalho. No material de divulgação do DVD, ele chegou a deixar claro que seu desejo é “mostrar o poder que existe na mão de um simples garoto crescido na periferia”.
Em entrevista exclusiva para HT, o rapper explicou melhor a frase e o conteúdo do novo projeto: “Falo sobre a possibilidade de virar a mesa, virar o jogo. Falo sobre dar a volta por cima em meio às tantas adversidades. Falo sobre ser um espelho para milhões de garotos e garotas, adolescentes oriundos das periferias do Brasil. Mostrar para essa molecada que é possível vencer na vida, e isso depende de esforço, dedicação e muita perseverança”, disse ele, que, em sua primeira entrevista para HT, já havia declarado que o preconceito nunca morre. “É assim: enquanto a pessoa não olha para você e não te chama de macaco não pode chamar de racismo. A gente sente que é tratado diferente”, disse, na época. E a opinião continua a mesma. “Em 2015, tivemos diversos casos de racismo e preconceito, foi importante isso ter acontecido. Seguimos no rumo de quebrar a máxima de que no Brasil não existe preconceito e, somente assim, poderemos um dia acabar com esse tremendo mal. Acho que ainda existe luz no fim do túnel, mas ela está longe, tão longe quanto nós negros, ou nós, vindos da classe menos favorecida, conseguimos enxergar desde sempre. As outras pessoas é que não sabiam disso”, defendeu.
Discurso de quem sabe o que diz. E Projota falou, sem papas na língua e com muita propriedade, sobre o caso dos cinco jovens negros assassinados por policiais militares no Rio de Janeiro. “Naturalmente recebo esse tipo de notícia com revolta, com tristeza e com uma certa falta de esperança na questão da segurança pública no Brasil. Olha, por tantas vezes eu e meus amigos achamos que seria nossa vez. Seria impossível eu calcular quantas vezes fui parado na rua, obrigado a por as mãos para o alto, abrir as pernas e ser revistado. Ser abordado e questionado se tenho passagem pela polícia, se uso drogas”, comparou ele, ressaltando a vergonha que sentia. “Meu primeiro enquadro ocorreu quando eu tinha apenas 12 anos. Pouca gente sabe o constrangimento e a vergonha que isso implica. Na frente de todos no seu próprio bairro, tido como suspeito de um crime que ainda nem foi cometido”, lamentou.
Mesmo com opinião tão forte acerca de assuntos polêmicos, suas músicas ainda são muito estereotipadas como “rap de playboy e patricinha”, mas (de novo) ele logo tem resposta na ponta da língua. “Na visão dessa pessoa o rap deve ser apenas para a periferia, e eu discordo disso”, lançou, fazendo questão de explicar que não divide seu público. “Eu apenas canto. Minha música é um filho e filho é para o mundo. Permito que ele chegue onde o vento levar e qualquer pessoa que tenha o coração aberto para receber minha mensagem, é muito bem-vinda e será eternamente agradecida por mim em minhas orações”, disse.
Ainda assim, na música “Elas gostam assim”, ele entoa versos como “agrego muito mais valor para ti do que seu rei do camarote” e “o pai dela diz que eu sou ruim, não presto, e não tenho o dim, sou vagabundo até o fim”. Perguntado sobre como o “playboy do asfalto” que o ouve recebe esse tipo de letra, Projota explicou que canta para quem quer ouví-lo e não se considera classista. “Essa música não tem a ver com o playboy, ela tem a ver com levantar a autoestima do moleque periférico. Aquele que precisa acreditar mais em si, que precisa saber que tudo na vida dele vai depender da capacidade de improvisar. Nossa vida é na base da gambiarra. E também não é nada além de um relato de um cara que nasceu nessa mesma situação, e que sempre foi capaz de tirar sua onda, de se dar bem com as mulheres, por respeitá-las e ter mais do que dinheiro para oferecer. É vivência de rua, experiência de vida que o acampamento de férias não proporciona”, disse ele, emendando que “tem amigos em todas as classes sociais”.
É com esse pensamento que, no dia 13, ele reunirá cantora pop, bailarina e ex-Legião no palco de uma das maiores casas de espetáculos da maior metrópole do país. A intenção da mistura, afinal, é romper com o estigma de maloqueiro, maconheiro e sem grandes produções e acabamentos que o rap carrega, Projota? “Não acho que o rap em si precise se desvincular de estigmas equivocados, acho errado decretar o caminho que toda uma cultura deve seguir. Apenas posso falar sobre o meu caminho e eu acredito que enquanto eu fizer a música que eu sinto vontade de fazer, que impulsiona minha alma a compor, estou no caminho certo. Se engana quem pensa que é fácil compor uma música e fazê-la tocar em todas rádios do país, como se isso fosse simplesmente mudar sua forma de fazer música”, analisou. O sucesso – ele é considerado um dos maiores rappers do país – é só consequência da sinceridade. “Eu me mantive sempre fazendo o que sinto vontade e, por acaso, minha linguagem é popular, agrada uma grande parte da população. Não fosse assim, eu não saberia encontrar uma fórmula para popularizar meu som. Se fosse tão simples, todos fariam”, decretou.
Artigos relacionados