Destaques de peso na nova geração do samba, Mariene de Castro une a voz baiana com o traquejo esperto da eterna Clara Nunes. O resultado dessa mistura vem sendo apresentado em seu mais novo trabalho ‘Ser de luz’, uma linda homenagem a uma das artistas mais emblemáticas do Brasil.
Em entrevista ao nosso site, a cantora, que começou a carreira atuando como backing vocal de artistas consagrados como Carlinhos Brown, grupo Timbalada e Marcia Freire, falou sobre aqueles que gostaria de homenagear enquanto vivos, sobre a visibilidade dos cantores que trabalham como covers e, ainda, aos que fazem tributos em homenagem a seus ídolos, confessando não se incomodar com as comparações de seu estilo com o de Clara. Ela destaca também a importância da nova geração da música e, contrária à Fafá de Belém, que em entrevista exclusiva para o site, se revelou contra downloads de música, Mariene se mostra a favor da prática sem nenhum problema.
Durante o papo, a moça ainda falou também sobre a recente carreira no cinema: depois de emplacar trilhas sonoras em ‘Ó pai ó‘ e ‘Mujeres del mundo’, ela foi convidada para atuar ‘Folhas sagradas’, de Pola Ribeiro, e protagonizou ‘Quase samba’, de Ricardo Targino, lançado no Festival do Rio. Confira o bate-papo!
HT: Qual é a importância da obra de Clara Nunes na sua vida? A que outros artistas gostaria de prestar homenagem um dia?
MC: A Clara (Nunes) chegou na minha vida recentemente, com o projeto ‘Ser de Luz’, mas de uma maneira bem grandiosa. Principalmente, porque precisei estudar sobre a vida e obra completa dela, mergulhar de vez em sua linda na figura. Foi incrível conhecer um pouco mais desse raro talento. Clara, enquanto cantora, influenciou muito a nossa cultura e trouxe para o Brasil a cultura negra africana, o que foi muito importante naquele momento. Sem contar o quanto ela trazia de referências baianas em seu estilo. Tenho vontade ainda – e farei! – de homenagear Beth Carvalho e Zeca Pagodinho. São duas pessoas de suma importância na minha vida. Me acolheram aqui no Rio e me receberam como padrinhos. Beth me apresentou para a música carioca, as rodas de samba. Já com meu padrinho Zeca, tenho uma relação não só na carreira, mas em tudo que faço, pois ele é muito participante. Ele é muito presente na minha vida. Além disso, os dois são porta vozes do samba, carregam essa bandeira com muita responsabilidade e respeito. Como diria o sambista Nelson Cavaquinho, o importante é homenagear quem está vivo. E é isso que eu quero fazer no meu próximo projeto.
HT: Seu show é um tributo à Clara Nunes. Você tem medo que, em um trabalho autoral, as pessoas continuem presas a sua imagem como intérprete da Clara, por mais que você imprima seu estilo pessoal?
MC: Para ser bem sincera, isso não é algo que me preocupa. Antes deste projeto, as pessoas já faziam comparações do meu estilo de cantar com o da Clara. Quando topei fazer esse tributo, foi para, além de prestar homenagem, estabelecer nossas diferenças. Ela sempre engrandeceu a música da minha terra, fez referência a nossa cultura e religiosidade em suas músicas, então, só tenho a admirar e agradecer as semelhanças. Além disso, é uma forma do meu público passar a conhecer a obra de Clara Nunes e também dos fãs dela conhecerem meu trabalho. Tudo na vida é via de mão dupla.
HT: Como você vê a aceitação do trabalho cover no mercado da música brasileira? As pessoas têm algum tipo de preconceito?
MC: Graças à Deus fui (e sou) muito bem aceita e bem falada na mídia até hoje. Nunca sofri nenhum preconceito em relação a isso, pelo contrário, recebi todo apoio e incentivo de grandes músicos como, Diogo Nogueira, que conviveu muito com a Clara por conta do pai (João Nogueira), parceiro e fundador do Clube do Samba, do qual Clara também fazia parte. Todos me elogiaram e me apoiaram bastante, acho que pelo fato do trabalho ter sido criado com tanta verdade, tanto amor e sem grandes pretensões. O resultado foi bonito e não sofri rejeições.
HT: Você começou a carreira como vocal de apoio de grandes artistas baianos como, Carlinhos Brown e Timbalada. Como foi trabalhar com feras da música logo de início?
MC: Aprendi muito com eles! Conheci a música feita para a grande massa, em cima de um trio elétrico. Me fez ter experiências enriquecedoras. Hoje, vejo isso como uma fase que fez parte do meu crescimento.
HT: Sabemos que você concilia a carreira de cantora e a de atriz. O que te dá mais prazer? Em cena, você prefere os estúdios de televisão ou palco teatral?
São duas emoções diferentes. Me apaixonei pelo cinema recentemente. Foi algo que me encantou muito, mas a música é a minha vida, meu dia a dia, meu sustento e a minha cura. É tudo que eu desejo e tudo que eu acredito. Tudo que eu faço na minha vida está ligado a música, é o meu templo religioso. Mas não nego que quero cada vez mais mergulhar no cinema.
HT: Hoje em dia, os cantores independentes possuem muita força na internet e, disponibilizar o CD ou EP para download, acabou se tornando uma estratégia de divulgação, a fim de que as pessoas compartilhem e expandam cada vez mais o trabalho. O que você pensa sobre essa tendência da nova geração?
MC: Sem dúvidas, sou a favor! Fui artistas independente durante muitos anos. Conheço todos os prós e contras, sei como a luta é grande. Hoje, sou comprometida com uma gravadora e sei a diferença que isso faz. Não vejo nenhum problema nessa prática alternativa. A música é pra ser vista, o que não é visto não é desejado! A internet está aí para isso, por mais que ainda não seja algo acessível por todos, como as rádios, por exemplo.
HT: Além do seu show que homenageia uma grande artista brasileira, outros cantores da nova MPB também possuem projetos paralelos, cantando músicas de seus ídolos como, a banda Seu Chico, do Tibério Azul para o Chico Buarque e o ‘Caetanagem’, do Bicicletas de Atalaia. Você acompanha o trabalho dessa rapaziada novata? Daria destaque para algum?
MC: Infelizmente ainda não conheço essas duas bandas, mas com certeza vou procurar saber. Mas acho maravilhoso que isso seja feito. O repertório vasto que temos no Brasil é uma riqueza, precisamos mesmo rememorar, arranjar, cantar com uma nova voz. Acho super válido todo o trabalho cover. A minha responsabilidade enquanto artista é também reviver os músicos que passaram. Eu sempre regravo músicas antigas que sou apaixonada! Não se pode deixar nenhuma grande obra esquecida. Recentemente, teve o musical em homenagem aos 50 anos de carreira do Milton Nascimento. Só ele, assisti 5 vezes! Também vi que rolou um belo tributo ao Cazuza, Vanessa da Mata também fez alguns shows relembrando os sucessos do Tom Jobim, e Maria Rita reviveu a carreira da mãe (Elis Regina) nos palcos. Apesar de preferir a homenagem em vida, acho que é uma forma de comemorar e reviver os tempos. É deixar viva a música, movimentar o repertório, tirar das bolachas e resgatar nos palcos.
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