Um dos mais importantes nomes da nova geração do samba, Teresa Cristina é uma mistura de força, tradição e empoderamento. Em entrevista ao HT, a cantora, que também é compositora – informação que nem sempre é divulgada –, falou sobre os novos projetos, as mudanças necessárias a serem feitas no gênero musical, a situação do país e a parceria com Caetano Veloso. Inclusive, é por aí que vamos começar. Em turnê pelo Brasil, Teresa Cristina divide o palco com Caetano Veloso. Mais que isso. A sambista canta Cartola ao lado de um de seus ídolos. Ao HT, Teresa contou que a parceria começou por uma vontade própria de Caetano Veloso. “Ele foi a um show, se emocionou, gostou do repertório e veio falar comigo. É maravilhoso saber que eu só estou do lado dele porque ele quis. Imagina, quem sou eu para pedir algo ao Caetano? Essa atitude dele significa muito para mim e para a minha carreira como cantora e compositora”, disse.
No começo, Teresa subia ao palco sozinha para interpretar os clássicos de Cartola. Mas, após o convite de Caetano, a sambista disse que não poderia nem pensar em recusar. E a gente entende as razões. Hoje, depois de mais de dez shows ao lado de um dos grandes nomes da música brasileira, ela disse que segue aprendendo com o ídolo. “Poder ver a obra dele de perto e como ele trabalha é uma experiência incrível. Os conselhos que ele me dá sobre a minha presença de palco, por exemplo, estão sendo muito importantes para mim. É um casamento na música”, contou.
Depois do fim desta parceria, Teresa tem novos projetos para a carreira. Na verdade, a sambista irá resgatar um desejo antigo. Para 2017, a cantora e compositora deverá lançar o seu primeiro álbum de inéditas autorais. E, como adiantou, o disco já está bem adiantado. “Eu comecei a gravar no ano passado. Primeiro eu fiz todas as bases e agora só falta por a voz. Só que acabei sendo atropelada por esse projeto do Cartola que, graças a Deus, fez muito sucesso e acabou dando frutos. Agora, eu vou esperar concluir tudo o que eu tenho agendado para poder me dedicar ao álbum”, explicou.
Para o primeiro álbum autoral, Teresa contou que irá mesclar composições próprias e letras feitas em parceria com outros artistas, como César Mendes, Adriana Calcanhoto, Mosquito, Marisa Monte e Moacyr Luz. “Eu sempre fiz discos de intérprete, mesmo sendo compositora. E agora, pela primeira vez, vou lançar um álbum todo autoral”, comemorou Teresa Cristina que completou que o projeto deverá sair no ano que vem “se ainda existir Brasil”. Como compositora, a artista disse que gosta de escrever sobre o que lhe agrada ou incomoda. Mas, hoje em dia, se sente em uma nova missão. “Ultimamente eu tenho tentado, confesso que ainda não consegui, compor sambas no gênero feminino. Não adianta a gente ficar reclamando o tempo todo que as músicas são machistas e que as mulheres são sempre esculhambadas nas letras se não fazer nada para mudar. E esse recado é para mim mesma”, ressaltou.
No ano em que o samba completa 100 anos de história, a cantora e compositora destacou as transformações que ocorreram com o passar das décadas. Segundo ela, foi graças a essa reciclagem que o gênero se mantem vivo até hoje. “O samba atravessou um século inteiro e se mantém até hoje pela qualidade humana de pessoas que são símbolos e são nossos orixás, como Dona Ivone Lara, Monarco e Nelson Sargento. Eu acho que as mudanças têm de ser encaradas da mesma forma como passamos pela vida. A gente começa neném com a pele bonitinha e vai envelhecendo e ganhando rugas, conhecimento e inteligência. Eu acho que todas as mudanças que aconteceram no samba foram pontuais. Por isso que hoje ele faz 100 anos e consegue agradar a todos os estilos e gostos. Hoje em dia, você ouve o samba que você quer”, disse.
Por isso, Teresa Cristina acredita que a posição da mulher nas letras de samba também pode ser atualizada. Em tempos que o feminismo é pauta em diversos debates, a cantora e compositora disse que o assunto nunca esteve tão presente em sua vida. “Eu acho que nunca me incomodou tanto esse lugar que as pessoas definiram como o da mulher. Eu me irrito muito ao ver uma sociedade decidindo sobre que devemos ou não fazer. Essas atitudes têm que ser pautadas pelos desejos de quem vai ou não executar, ou seja, da própria mulher. Hoje, nós temos um homem que define quanto nós ganhamos o que fazemos com o nosso corpo, como temos que nos comportar etc. Tudo isso é dito pela voz masculina. Mas eu acredito que o homem não tenha que dar opinião em nenhuma dessas situações porque quem sabe o valor da mulher e quem manda no próprio corpo é ela. Talvez, essa condição em que nós estamos possa mudar. Inclusive, eu acho que já estamos em processo de transformação só pelas pessoas estarem falando mais disso”, analisou.
Outro assunto que segue sendo discutido, principalmente neste ano de mudanças constantes, é o cenário político do Brasil. Em uma mistura de descrença e decepção, Teresa Cristina disse que os últimos acontecimentos são conseqüência do processo de impeachment sofrido por Dilma Rousseff no primeiro semestre deste ano. “Eu acho que quando se dá um golpe é isso o que acontece. Estamos sendo atropelados por um bonde sem freio e sem lei. Nós estamos sem norte, como se fosse um faroeste. Mas, depois do golpe, eu não poderia imaginar uma situação diferente dessa”, disse a artista que revelou não acreditar na forma como o processo ocorreu. “Eu fiquei espantada com a facilidade que as pessoas engoliram o golpe e agora estão se abismando com tudo o que está acontecendo. Não vejo novidade nenhuma em o Renan cair e depois dizer que não vai sair, por exemplo. Já era de se esperar”, concluiu Teresa Cristina.
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