* Por Bruno Muratori
Quem é rei nunca perde a majestade. Não é a toa que Al Jarreau é considerado um dos mais inovadores performers do universo musical, único a vencer o Grammy em três categorias diferentes. Sua enorme bagagem artística ficou evidente nesta última passagem pelo Brasil, na 12º edição do Rio das Ostras Jazz & Blues Festival que terminou esta semana. No palco, Alwyn Lopez Jarreau, 74 anos, brincou a dar com o pau e pôs o público no bolso, encantando gente de todas as idades. Em muitos momentos via-se o quanto o veterano vislumbrava aquela multidão à sua frente, talvez num deja vu, já que esteve no país algumas vezes, inclusive no histórico primeiro Rock in Rio. Tanto naquela vez quanto nessa, a vibe foi tão boa! Realizado e sorridente (até emitiu o som dos batimentos do seu coração, dizendo “Muita felicidade, Tum, Tum), o astro recebeu o HT no camarim logo após o show, revelando sua admiração por nossa terra e lembrando outras passagens antológicas pela terra brasilis, como em 1997, quando cantou com Djavan no Heineken Concerts na terra da garoa. Confira.
O músico até virou figurinha relativamente fácil no país do samba. Sua paixão pelas sonoridades brazucas faz com que, sempre que pode, arrume espaço na agenda apertada para dar uma pinta por aqui: em 2013 mesmo se apresentou em outro festival, o Sesc Amplifica – Bossa e Jazz, no Rio. E, o fato de até andar dando muito cartaz ao país não quer dizer que se repita no repertório. Não, cada vez que vem, surpreende com alguma coisa e tudo sempre dá samba. Ele conta o porquê de todo esse amor: “Eu amo o Brasil com todas as letras e quem me conhece bem sabe disso. Tive grandes momentos da minha vida por aqui, mesmo antes mesmo de pisar nesta terra pra valer. Tudo começou com o contato com a maravilhosa música brasileira lá atrás, com as canções de Tom Jobim fazendo parte da minha formação. Portanto, vir ao lugar que é a fonte disso tudo é uma experiência incrível e nada mais que natural. A música brasileira é muito presente e já influenciou muitos artistas ao redor do globo, especialmente nos EUA.”
Ele fala cheio de si e com um sorriso na face, como se fosse uma criança marota e tentando criar intimidade através de brincadeiras, levando tudo como se estivéssemos em um papo no boteco. E procura ser gracinha, nada forçado: “É maravilhoso cantar nesse festival. Não é apenas música, mas energia, tudo aquilo que representa para esta comunidade local. Um exemplo a ser seguido, eu diria até um modelo. Movimenta a economia da cidade, faz com que todos ganhem e, assim as pessoas ficam felizes com essa bagunça boa. Vocês não podem deixar que isso acabe, hein! Vejo claramente que esse é um novo modelo a ser seguido no mundo inteiro. A luthieria(profissional especializado na construção e no reparo de instrumentos de corda),a tal orquestra de crianças, tudo isso é muito mais do que arte, é engajamento em várias frentes”.
Fotos: Vinícius Pereira
Ele comenta sobre a gratuidade do evento, que se estabelece sem a venda de ingressos e a importância de existirem, no mundo, outras iniciativas que se sustentem dessa forma: “Isso é muito raro no mundo, festivais desse nível gratuitos. Musicalmente, essa mistura de gerações na platéia faz com que pessoas de diferentes backgrounds tenham acesso a diferentes tipos de música, e isso ajuda a formar público. E, claro, todo artista precisa estar constantemente renovando o público, atingindo novas gerações pra se manter de pé e, em contrapartida, também permite que as novas gerações tenham acesso a outros caminhos diferentes daquilo que eles recebem maciçamente através dos sistemas midiáticos. Se não fosse dessa forma, talvez fosse muito difícil.”
“E qual o seu recado para esses brasileiros que te amam?”, pergunta HT. “Primeiro, meu muito obrigado. Eu também os amo, rs! Estar no lugar que deu origem à essas músicas maravilhosas. Digo e repito: Jobim é o máximo e só pode ser um privilégio estar aqui. Continuem sendo esse povo maravilhoso e acolhedor, que transmite essa alegria essa forma de ser, que contagia quem passa por aqui”.
HT quer mais papo, mas o tempo urge, a produção em torno do mestre quer levantar a barraca. Enfim, não dá para ter tudo nessa vida, que já é muito generosa, permitindo esse tête-à-tête com o mito. Nada de abusos. Mas não seria um bate-papo com Al Jarreau se ele não fizesse uma gracinha: finaliza o encontro arriscando umas batucadinhas e, de lambuja, ainda manda um “Samba do avião” – Não, assim você me mata! Deixando esse repórter totalmente desorientado, sentindo que a gente já é amigo. Vamos até trocar whatsapps, lógico! Coisas de brasileiro. E quem disse que ele não é quase brasileiro?
* Carioca da gema e produtor de eventos, Bruno Muratori é uma espécie de fênix pronta a se reinventar dia após dia. No meio da década passada, cansou da vida de ator e migrou para a Europa, onde foi estudar jornalismo. Tendo a França como ponto de partida, acabou parando na terra do fado, onde se deslumbrou com a incrível luz de Lisboa e com o paladar dos famosos toucinhos do céu, um vício. Agora, de volta ao Rio, faz a exata ponte entre o pastel de Belém e a manjubinha
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