Certa vez, em um dos inúmeros shows que Elba Ramalho vem fazendo pelo país com o amigo Geraldo Azevedo, um fã questionou o compositor: “por que você canta tanta música da Elba?”. Aos risos, e para não estender muito a conversa, Geraldo explicou que ela era seu ídolo, e se despediu. Mas a situação não é bem essa: Elba que é a maior intérprete de canções do nordestino. E essa parceria se repetiu na noite desta sexta-feira (22) na Ilha de Vitória, com uma apresentação da dupla entoando sucessos como “Frevo Mulher”, “Chão de Giz”, “Táxi Lunar” e “Pretolina-Juazeiro”. HT estava lá, e depois de conferir essa viagem pela fronteira Agreste-Sertão, tratou de bater um papo rápido com Elba Ramalho – que já estava ficando sem voz após um show no Nordeste seguido de curto sono.
Nesses 40 anos de amizade, contabilizar o número de parcerias é trabalho árduo. Quase que achar agulha no palheiro. Nesse Geraldo escreve, Elba canta, já foram milhares de discos, prêmios e três gravações do “Grande Encontro”. “Tem músicas que o compositor faz especialmente para a intérprete. Mas outras não. Uma vez ele escreveu uma canção que queria gravar, eu queria cantar, ele não queria deixar, mas eu roubei”, conta entregando: em setembro vai acontecer uma gravação com Geraldo, para render um DVD. Paralelo a parceria, Elba já entregou nas lojas e plataformas digitais o “Do meu olhar pra fora”, novo CD. Nele, das 12 faixas, quatro carregam a assinatura de Dominguinhos, sem contar que ela interpreta “La noyée”, de um dos grandes nomes da música francesa, Serge Gaisnbourg.
Para chegar a mais um trabalho, tendo no encalço a marca de praticamente um disco por ano desde o começo da carreira, Elba garante que foi um misto de sorte com aproveitamento das oportunidades: “eu não planejei muito não. As coisas foram acontecendo, eu fui na maré. Onde o vento soprava, eu estava lá. Eu era atriz, eu cantava, estava ali na arte. Quando surgiu o mercado da música eu fui aprendendo e fui por ele. Hoje são 35 anos de carreira, 33 discos, e eu ainda estou aprendendo”. Aprendizado esse que, segundo ela, rendeu algumas pedras jogadas. “A gente vai fazendo no mercado até acertar, conseguir se estabelecer. Deus proporciona uma sorte boa para uns, mais ou menos para outros, e as pessoas, dentro das suas possibilidades e do que lhe é oferecido no mundo, se estabelecem no mundo. Eu, graças a Deus, não tenho do que reclamar. O que foi me jogado de pedra, eu construí castelos enormes. A minha vida é sempre soma, sempre aprendizado”, nos contou.
Mas, obviamente, não só de sorte se faz uma carreira consolidada – até internacionalmente -. Instigada, Elba considera que um dos fatores reais para tudo ter dado tão certo foi o mote “regionalidade” que levou para seu repertório. “Tem uma brasilidade. A arte, quanto mais regional, mais universal se torna. E deu certo também por eu ter essa coisa expressiva no palco, dançar e fazer espetáculo super produzidos”, explica ela, que não cogita fazer mais nenhuma carreira internacional. “Tudo que eu fiz lá fora foi positivo. Hoje eu opto trabalhar mais no Brasil porque eu cansei um pouco de viajar e fazer turnês longas por vários países”. Podemos concluir também que essa decisão foi tomada por quatro nomes: Luã Mattar, Maria Paula Ramalho, Maria Esperança Lopes e Maria Clara Lopes, seus filhos.
“Minha vida é assim, com saudade, sentimento de culpa. Mas elas já cresceram um pouco. A pequena, de oito anos, sente muita falta. Ela é muito ligada comigo. Mas quando estou no Rio de Janeiro [onde reside] abro mão de tudo, de cinema, de teatro. Eu tento compensar. Mas é minha sina. Eu digo para ela: ‘eu sou uma cantora, tenho que voar para trabalhar'”, disse. E se o amor com os filhos ocupa quase que todos os pensamentos de Elba, espaço para uma paixão, ela confessa, não há mais. “Eu tive [muitos amores], hoje eu não tenho mais. Estou muito tranquila há quatro anos, e é uma escolha. Eu estou muito feliz, serena. Já vivi todas as experiências de amor que eu quis viver. Nunca estive tão feliz em toda minha vida”, garante.
A essa altura da conversa, Elba já coloca a mão na garganta, sua voz vai sumindo, e o cansaço é aparente. A cantora ainda precisa tirar uma série de fotos com fãs, e necessita de um repouso – que não teve por completo horas antes. No caminho de retorno ao seu camarim, já com tietes ao entorno, ela titubeia em dois rápidos questionamentos de HT: “para quem você daria uma carona no Táxi-Lunar”? “No Táxi-Lunar? Essas perguntas de vocês… (ri). Ai, levaria meus filhos”. Bom, Elba, e um banho de cheiro? Quem merece? “Ai, não daria um banho de cheiro nos políticos não. Eles não merecem. Novamente, para meus filhotes”, termina se despedindo.
Créditos: Camilla Baptistin
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