Com um disco na praça, uma série e com projeto de voltar para o teatro, Laila Garin acredita que uma greve cultural assustaria a crise de hoje: “Não somos passatempo”


Em julho, a atriz e cantora lança “Laila Garin e a Roda”, seu novo disco fruto da parceria com a banda Rabisco. No repertório, o álbum traz releituras de canções de Chico Buarque, Caetano Veloso e Alceu Valença e outras faixas inéditas. “Há dois anos eu tenho um projeto musical no Beco das Garrafas onde experimentávamos vários repertórios com o público”

Com um sangue que tem a mistura da classe francesa com a energia da Bahia, Laila Garin é sempre uma boa conversa. Atriz, cantora e engajada, ela nunca tem uma novidade só. Desta vez não foi diferente. Com disco novo a caminho, série na Globo e projeto para o teatro, Laila nos mostrou como resistir e manter a chama da arte acesa mesmo em tempos de crise. Aliás, esta também é uma questão que a atriz não foge. Engajada em diversos movimentos que lutam para a sobrevivência da arte no panorama atual, ela destacou a importância da união da classe artística. Inclusive, para Laila Garin, um susto nesta situação seria uma paralisação total da cultura nacional. “Eu acharia lindo uma greve geral de artistas. Imagina um dia acordar e não ter música, novela, cinema, nada. Aí a população entenderia que não somos passatempo”, idealizou.

Mas, por enquanto, ela não está nada parada. Pelo contrário, com múltiplos trabalhos para contar, Laila Garin está na televisão, no teatro e na música. Na telinha, a atriz participou de um episódio da série “Sob Pressão”. A produção, de Jorge Furtado e Andrucha Waddington, conta histórias humanas a partir do caos de um hospital público como plano de fundo. Na série, Laila será Beth. “Ela é mãe de um menino que sofreu acidente de moto e, como não estava usando capacete, teve morte cerebral. É um tema forte, mas é uma discussão importante para as pessoas entenderem sobre essa questão e uma oportunidade de falarmos de doação de órgãos e fé”, adiantou a atriz que esteve no terceiro episódio da temporada.

Laila Garin será Beth na série “Sob Pressão” (Foto: Reprodução)

No entanto, este não será o único tema forte de “Sob Pressão”. No enredo, a série aborda questões como drogas, corrupção, traição e, claro, o abandono da saúde pública nos hospitais brasileiros. Porém, em momento algum, como destacou Laila Garin, a série tem objetivo de ensinar as pessoas. “A gente tem um produto que aborda muitas questões sérias e importantes, mas tudo é escrito por uma dramaturgia maravilhosa. Assim, não fica uma discussão didática. Nesse trabalho, eu me senti feliz como artista e cidadã de estar podendo dar voz a essas temáticas de uma maneira tão luxuosa. Como o texto é muito bem escrito, a gente não se sente ‘aprendendo’ sobre alguma questão. Quando percebemos, já estamos embalados por aquela história”, disse Laila que acredita que o lado humano da série, que mostra a versão homem, marido e cidadão dos médicos, por exemplo, dê um fôlego diferente à narrativa. “Eu nunca imaginei a impotência de um médico diante, por exemplo, da falta de recursos para exercer seu ofício. É um absurdo a gente ver casos de falta de luz no meio de uma cirurgia. Como se salva uma vida assim?”, destacou.

 

“Na maioria das vezes, quando somos nós as vítimas e estamos nervosos querendo atenção, achamos que o médico é Deus e que vai nos salvar” (Foto: Reprodução)

E não é só a televisão que tem exigido bastante do profissionalismo e entrega de Laila Garin. Além da série, ela também tem se dedicado bastante à música. A artista lança “Laila Garin e a Roda”, seu novo álbum, que está disponível em todas as plataformas digitais. Sobre a construção do repertório que tem releituras de clássicos de Chico Buarque, Caetano Veloso e Alceu Valença, além de inéditas, Laila Garin contou que tudo já foi testado e aprovado em outro trabalho anterior. “Há dois anos eu tenho um projeto musical com a banda Rabisco e nós ficávamos no Beco das Garrafas experimentando vários repertórios com o público. Então, lá a gente via qual música funcionava, os arranjos que precisávamos mudar e fomos construindo o álbum a partir desta experiência”, contou.

Laila Garin e A Roda (Foto: Joana Mendonça)

Após lançar o novo disco nas plataformas de streaming, Laila Garin e A Roda se apresentam no Rio de Janeiro e em São Paulo em um show dirigido por Ney Matogrosso. Enquanto isso, o primeiro single deste novo trabalho de Laila já está disponível na rede. O pioneiro a ser lançado foi “Baioque”, de Chico Buarque, que ganhou novas formas na voz da cantora.

Mas a gente sabe que ela é mais. Fora a televisão e a música, Laila Garin não deixa morrer seu caso sério com o teatro. Mesmo em tempos de crise. Recentemente, a atriz substitui Zélia Duncan no espetáculo “Alegria, Alegria”, que homenageia os 50 anos da Tropicália em nossa cena cultural. “Depois de ‘Gota D’água’, que tem uma carga bem puxada, fazer ‘Alegria, Alegria’, que é super leve, foi uma delícia. Era um show de música e poesia. Foi ótimo fazer, só curtição. Mas, já passou. Talvez, se tiverem outras datas, eu volto”, adiantou.

Laila Garin em “Alegria, alegria” (Foto: Robert Schwenck)

Quem também está querendo voltar é o premiadíssimo “Gota D’água [a seco]”, brilhante espetáculo da carreira de Laila Garin. Depois de temporadas de sucesso pelo Brasil e reconhecimentos de diferentes áreas, a atriz contou que agora que está correndo atrás de recursos para fazer uma temporada popular da peça no Rio de Janeiro e em São Paulo. “Está muito difícil. Nós fizemos uma temporada sem patrocínio e, por isso, estamos precisando parar para correr atrás disso agora”, contou. E a dificuldade de manter a chama do teatro acesa não é novidade para os seguidores das artes brasileiras. “Eu me considero uma privilegiada por viver entre Rio e São Paulo e, por estar nessa posição, eu não posso me alienar. Se nessas duas grandes cidades, que são a origem de tudo, eu fico imaginando nas outras regiões do país. Então, eu fico muito preocupada com a condição da arte hoje. Por isso, participo de movimentos como o ‘Teatro Sim’ para ver o que podemos fazer. É muito triste ver que, além de tudo, o governo ainda faz uma campanha para que a população fique contra os artistas. Parece que criaram um repúdio e uma criminalização da nossa classe. Mas isso é muito antigo para 2017. Na época da minha bisavó, acreditava-se que toda cantora era prostituta”, lembrou.

Com este atual panorama, Laila Garin destacou que está sendo necessário relembrar a importância da arte para o comportamento e as relações sociais. “Se é preciso dizer o óbvio, tudo bem. Vamos lá e começar do zero. Temos que explicar que a cultura não é só para divertir e para passar o tempo. Nossa função é sensibilizar. O ser humano não é só carne e osso, nós precisamos de poesia. Senão, seremos todos loucos que saímos matando os outros sem pensar neste ato”, analisou a atriz que acredita que uma greve geral de artistas poderia ser um choque neste momento. “A gente tem como se comunicar bem hoje em dia com a internet. Se nós pararmos de nos confrontar pensando em lados políticos e entendermos que, no momento que um teatro fecha, não tem essa divisão. A classe artística não pode ter partido político diante do fechamento de um teatro. Nós precisamos concordar que este é um lugar de salvar vidas que está acabando”, lamentou.

Se por um lado Laila se posiciona claramente e defende suas ideias com propriedade, por outro, a atriz reconhece quando não domina um assunto. Este foi o caso de analisar as razões pelas quais chegamos a este panorama de hoje. “Eu não sei. Teria que estudar mais para entender. Eu acho que tem uma luta do ser humano que, ao mesmo tempo que é coletivo e amoroso, também é individualista e egoísta. Fora que os políticos se esqueceram que eles estão no poder para representar o povo. Hoje em dia, eles só querem saber de defender suas carreiras. Mas talvez, essa crise toda só esteja acontecendo para que a gente acorde e tente mudar. Tem que ser otimista, né?”, concluiu a atriz e cantora Laila Garin.