Todos conhecem e querem um pouco da Pabllo Vittar. Sua voz está nas ruas, bares e pistas, e ninguém fica indiferente à presença singular da artista. O título do seu novo álbum “Não Para Não” descreve essa natureza inquieta e plural da Pabllo, que estourou em 2017, com o primeiro disco “Vai Passar Mal”. Em um ano, Pabllo mandou pastar os preconceituosos, alcançou o mundo com o single Sua Cara do grupo Major Lazer, e foi a primeira drag indicada a um Grammy. Em tempos do conservadorismo em estado latente no país, Pabllo Vittar é resistência e ecoa nas suas músicas, o que a gente mais precisa no momento: amor.
Com 10 canções inéditas de ritmos que são a cara do Brasil, Não Para Não é recheado de hits em potencial. O álbum tem referências ao pop, brega, forró e pagode, um reflexo da própria artista, que nasceu no Maranhão, e morou nos estados do Pará e Minas Gerais na adolescência, vivenciando diversas culturas e identidades musicais desde cedo. “No Pará, eu ouvia Calypso quando criança e muito tecnobrega, naqueles paredões enormes e pulsantes na cara da gente. Eu amava aquilo! Depois eu voltei para o Maranhão para estudar, e lá era só swingueira, aqueles axés e forrózões babados…Eu quis fazer nesse álbum a exaltação da música brasileira, porque é tão rica, às vezes a gente fica presa nas músicas lá de fora, que acabamos esquecendo que temos tantos ritmos incríveis que não exploramos devidamente”, conta.
Lançado na última quinta-feira (4), o álbum bateu recordes de streaming pelo Spotify em apenas um dia, com todas as músicas no Top 40 Brasil, e quatro delas no Top 10, algo que surpreendeu a própria Pabllo. “Eu não esperava! Quando o produtor me falou, eu gritei, me descabelei, mas depois fui até conferir se era verdade, com essa onda de fake news, né?”, brinca a artista, que só tem a agradecer aos fãs e a equipe pelo sucesso. Hoje em dia, muitos músicos lançam um single por vez, em detrimento do álbum completo ou físico. Uma ideia que Pabllo considera válida, mas que nem passou por sua cabeça. “Eu sempre quis lançar um novo álbum, até para ver uma nova estética, uma nova cara da Pabllo, algo refrescante mesmo. Porque quando a gente lança um trabalho, a gente se prepara, faz todo um conceito. Eu acho tão legal quando um artista cria um CD, porque ficamos ansiosos, nunca sabemos o que está por vir”, confessa.
E o conceito de Não Para Não é simples e direto: uma noite com a Pabllo Vittar, com momentos para dançar, curtir e até sofrer por aquele amor não correspondido. Lançado pela Sony Music Brasil, o processo de criação artística do álbum durou cerca de um ano. Enquanto as gravações do “Vai Passar Mal” foram realizadas em diferentes partes do país, como Minas, Rio de Janeiro e São Paulo, as vozes do segundo álbum foram todas gravadas em um estúdio de Los Angeles, durante uma semana intensa. “Los Angeles até ajudou nessa variedade de ritmos, porque lá é muito quente! Todo dia eu acordava naquele pique verão, já ia pro estúdio, ouvia as sonoridades, as composições, foi uma semana de muito trabalho que me diverti muito”, diz Pabllo, com a mesma sede de trabalhar que tem desde o início da carreira, três anos atrás.
A revelação do pagode Dilsinho, a funkeira Ludmilla e a multitalentosa Urias são as parcerias nacionais do álbum, escolhidas a dedo pela cantora, que se derrete ao dizer que não poderia ter feats melhores. “Eu amo muito minhas participações! O Dilsinho é um príncipe que admiro, eu bebi muito da fonte do pagode para trazer ao álbum. A Urias, eu não tenho nem o que falar, nossa amizade vem antes de tudo isso, a gente se viu crescer, tem coisa que ela sabe, que nem minha mãe sabe. Nossa música fala muito de amizade e dar nome para as pessoas que estão com você desde o começo”, frisa. Uma das junções mais esperada pelos fãs era com a cantora Ludmilla, que canta com ela a música “Vai Embora“. “A Lud, eu sou fã desde a MC Beyoncé. Eu me rasgava com seus funks! Já queria fazer música com ela há um tempão, mas estávamos esperando a hora certa e felizmente chegou!”, conta. O álbum ainda tem composição e produção do músico norte-americano Diplo, na música Seu Crime, que tem colaborações anteriores com a artista, como em Então Vai e Sua Cara.
Além de Diplo, a cantora está cheia de colaborações internacionais em sua trajetória. As mais recentes, com a argentina Lali Espósito, a inglesa Charli XCX e o duo nova-iorquino Sofi Tukker. Porém, ela ressalta que não coloca como objetivo uma carreira fora do país no momento. “Eu não estou correndo atrás de carreira internacional, acho que tudo acontece de uma forma natural. O próprio Não Para Não entrou em mais de 120 países nos charts, isso me deixa feliz. Ver onde nossa música e ritmo tem chegado, mas o foco mesmo é o Brasil, vamos se arregaçar e se rasgar por aqui! Mas se aparecer lá para fora, o que já tem aparecido, fico feliz. Estou me preparando para o mercado latino, fazendo aulas de espanhol, tanto que No Hablo Español, deste álbum, já é um olá para os fãs latinos, para eles se prepararem!”, adianta.
Depois do primeiro single “Problema Seu”, um eletropagode baiano, com ela descreve, Pabllo queria trazer uma segunda música de trabalho mais calma, uma balada romântica, mas que também desse para o público curtir na pista. A escolha foi certeira: “Disk Me”, que já tem clipe e tudo. “Um fã meu me disse esses dias ‘Eu estava ouvindo ‘Disk me’ chorando em casa, aí chamei minhas amigas para a balada e lá tocou Disk me, chorei de novo, mas estava dançando belíssima!’ A gente tinha vindo de Problema Seu, que é uma música que você se rasga inteira na swingueira, e que também fala de amor, mas você está por cima. Já em Disk Me os papéis inverteram, porque você que está sofrendo. O clipe é uma sofrência, mas eu estou sofrendo bonita!” conta, aos risos. E por falar em desilusões amorosas, Pabllo reflete que há beleza nisto, só que é preciso ter amor próprio sempre: “Como é bom sofrer de amor, né? Sofrer não é defeito, eu amo sofrer por boy, isso move a gente, o bom da vida é estar sempre se apaixonando, mas você tem que se amar, pode sofrer, mas se ama primeiro”
No cenário atual do país, com o perigo da eleição do candidato Jair Bolsonaro, que prega um discurso retrógrado e que atinge diretamente as minorias e a comunidade LGBTQ, Pabllo se mostra preocupada com a onda sombria que pode vir, mas deseja, acima de tudo, que ninguém abaixe a cabeça: “Nunca, como nos tempos de hoje, a gente precisou ter tanta força e jogar nossa positividade e alegria para cima. Estamos passando por um momento tão obscuro, o pavor está tomando conta. Eu tenho falado para a gente não ficar com medo, vamos botar nossas cadeiras mais alto, a gente sempre resistiu, já passamos por tanta coisa, não é isso que vai abalar a gente. Vamos passar por isso com a cabeça erguida, precisamos nos unir!”, decreta. O que a artista enxerga como uma luz no fim do túnel, é a união e resistência da população. “As pessoas estão parando para pensar, pelo menos uma parte delas, e ponderar o que é melhor para gente. Não só para a comunidade LGBTQ, quando falo em tempos sombrios é também para as mulheres, crianças, idosos, eu penso no conjunto todo”, reflete.
Para Pabllo, é essencial os artistas se posicionarem nessa situação alarmante, não é momento de se darem o luxo de ficarem isentos. Principalmente se o público majoritário deles é justamente os LGBTQ. “A gente precisa saber quem é por nós! Se você gosta de um artista, e consome o trabalho dele, o mínimo que você espera é que ele queira ver você bem, que não queira ver você morrendo ou apanhando na rua, sendo descriminada. Eu não desejo isso nem para quem me odeia, quem dirá para fã. A gente tem que trazer essa nossa voz, essa visibilidade que a gente tem, e usar ela de uma forma boa, conscientizando, pelo menos tentando dar um amor e afago para nossos fãs”, enfatiza. Por isso, o maior desejo da cantora no momento é continuar fazendo sua música, e levar alegria para as pessoas. “O que eu mais almejo é que a gente continue fazendo nosso trabalho, com amor e sem ter medo, e que as pessoas, que, assim como eu, carregam essa bandeira e tem uma voz ativa, caminhem juntas. Não quero ódio não, só quero continuar sendo feliz fazendo minha música, poder continuar fazendo meu trabalho em paz sem sentir o rancor no coração de ninguém”, frisa.
Com três anos de uma carreira consolidada, que começou pela internet e agora alcança novos horizontes a cada dia, é difícil escolher um momento mais especial. Entretanto, Pabllo lembra com carinho do festival Rock in Rio, realizado ano passado no Rio de Janeiro. “Eu nunca vou esquecer quando fui fazer um show no Rock in Rio, não digo nem de ter cantado com a Fergie, que foi incrível, claro, mas ter feito um showzinho antes. Eu estava só com um álbum, morrendo de medo, mas quando subi e vi aquela multidão me abraçando, com toda voz e o coração…Eu quero sentir isso para o resto da minha vida, sentir o carinho dos fãs é muito bom! Só quem está lá em cima dos palcos sabe. Esse dia me marcou muito, toda vez que eu lembro parece que ainda consigo ouvir as pessoas gritando”, relembra.
E na onda do seu novo álbum de sucesso, “Não Para Não”, e em homenagem a “Não Vou Deitar”, uma das músicas que já é queridinha dos fãs, Pabllo finaliza a entrevista falando para quem ela não deita jamais: “Eu não deito para o preconceito e para a intolerância no Brasil, jamais vou deitar para o ódio, para as pessoas que ainda insistem em querer ver as outras infelizes só porque são diferentes. Eu não vou deitar para isso nunca, mas nem que a vaca tussa!”. Tem como não amar Pabllo Vittar?
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