Cantora Nanda Cid e drag Melina Bley tiram amarras dos padrões da beleza impostos desde Maria Antonieta


Lançando simultaneamente single ‘Melhor versão’ e clipe, a cantora desafia os padrões de beleza em produção inspirada na figura polêmica Maria Antonieta, com participação da drag queen Melina Bley: ““Existe uma revolução em curso e eu quero deixar a minha contribuição ”Maria Antonieta era uma mulher à frente de seu tempo, que ditava a moda. Estabelecia padrões, mas também se tornava refém deles. É uma boa metáfora de como a gente às vezes se sente nos dias de hoje. Acho que o importante é se manter consciente, sempre questionando e buscando melhorar a própria relação com o mundo. Afinal, quem se aliena pode acabar perdendo a cabeça!”, frisa Nanda Cid

Cantora Nanda Cid e drag Melina Bley tiram amarras dos padrões da beleza impostos desde Maria Antonieta
Nanda Cid encarna Maria Antonieta em clipe de 'Melhor Versão' em um libelo contra os padrões de beleza impostos às mulheres

Nanda Cid encarna Maria Antonieta em clipe de ‘Melhor Versão’ em um libelo contra os padrões de beleza impostos às mulheres

*Por Brunna Condini

“Hoje eu acordei com coragem de ser quem eu sou/Só isso, mais nada/Vejo no espelho, cada curva é uma confissão/Me sinto/Sem medo, fora do padrão/Minha melhor versão”. São com esses versos da música “Melhor Versão“, transbordando atitude e embalados por uma melodia certeira que a cantora Nanda Cid faz um libelo contra as amarras, os padrões de beleza estabelecidos para as mulheres desde à época de Maria Antonieta (1755-1793), na França, que enfrentou a corte francesa ao tentar abolir o espartilho, usar roupas mais fluidas, cabelos verdadeiras esculturas, mas que acabou influenciando um séquito de mulheres que davam a vida para ser ‘Maria Antonieta’. “Não vou ficar refém da balança, das capas de revista, nem de ninguém”, dispara Nanda, que convocou a drag queen Melina Bley para embarcar nessa metáfora e contracenarem um um clipe. Ideia incrível.

Nanda como Maria Antonieta: “As pessoas estão resistindo às pressões sociais relativas a um padrão de beleza que é totalmente ultrapassado. Aos poucos, nosso olhar está evoluindo no sentido de enxergar a beleza na autenticidade das pessoas” (Divulgação)

“Maria Antonieta era uma mulher à frente de seu tempo, que ditava a moda. Estabelecia padrões, mas também se tornava refém deles. É uma boa metáfora de como a gente às vezes se sente nos dias de hoje. Acho que o importante é se manter consciente, sempre questionando e buscando melhorar a própria relação com o mundo. Afinal, quem se aliena, pode acabar perdendo a cabeça!”, explica Nanda.

Melina e Nanda: “Quero contribuir pra essa busca individual que cada pessoa precisa fazer pra descobrir sua melhor versão”, diz a cantora (Divulgação)

“A música fala das dores e dos prazeres de se olhar no espelho e se assumir para o mundo. O trecho ‘lá onde o sol nasce pra todas nós’, com o arranjo de cordas, é quase um portal para um mundo ideal, onde todas as pessoas são valorizadas pelo que as torna únicas. Um respiro de esperança para a nossa luta diária”, detalha a cantora sobre a música que tem produção de Filipe Soares, que já concorreu quatro vezes ao Grammy Latino por trabalhos com Anitta, Diogo Nogueira e Martinho da Vila.

E por falar em esperança, Nanda pensa no artista como porta-voz de temas importantes que, para muita gente, são custosos de se ouvir e refletir. “Tenho a tendência de me posicionar, mas também gosto da liberdade de voltar atrás, me corrigir, mudar de ideia. O perigo da visibilidade é que as pessoas tendem a querer engessar as suas opiniões. O artista nem sempre tem tudo claro na mente. Às vezes é melhor se abster do que falar besteira. Eu tenho esse cuidado. Mas quando alguma coisa é clarividente pra mim, eu tendo a me pronunciar. É o caso do que está acontecendo no Afeganistão. A comunidade internacional precisa se mobilizar diante de tantas violações de direitos humanos. É urgente”.

"O perigo da visibilidade é que as pessoas tendem a querer engessar as suas opiniões. O artista nem sempre tem tudo claro na mente. Às vezes é melhor se abster do que falar besteira. Eu tenho esse cuidado" (Divulgação)

“O perigo da visibilidade é que as pessoas tendem a querer engessar as suas opiniões. O artista nem sempre tem tudo claro na mente. Às vezes é melhor se abster do que falar besteira. Eu tenho esse cuidado” (Divulgação)

Aos 28 anos e no sexto lançamento da carreira, ela ‘nasceu’ profissionalmente há exatos nove meses. Mas o interesse pela música é antigo. “Desde pequena faço aulas de piano, canto, bateria. Com 21 anos, ganhei uma bolsa de estudos para um conservatório de teatro musical em Nova York e passei um ano por lá estudando. Foi meu período de maior aprendizado e quando descobri minha aptidão para compor. Quando voltei pro Brasil, fiz alguns testes para musicais e sempre acabava eliminada na etapa de dança. Então, parti para a advocacia, que é minha formação paralela, mas depois de alguns anos, a vontade de fazer minhas próprias produções musicais falou mais alto”, conta.

Nanda como Maria Antonieta: “As pessoas estão resistindo às pressões sociais relativas a um padrão de beleza que é totalmente ultrapassado. Aos poucos, nosso olhar está evoluindo no sentido de enxergar a beleza na autenticidade das pessoas” (Divulgação)

Com a nova canção, composta por Nanda em parceria com Bárbara Dias, a cantora celebra a liberdade de ser exatamente quem se é. E o videoclipe – que segue ao fim desta matéria – é um show à parte, trazendo a imagem controversa de Maria Antonieta – a austríaca que foi rainha da França, ícone de uma época, que morreu guilhotina no fim do século 18. De um lado, era tida como símbolo da arrogância e da insensatez da monarquia francesa. De outro, admirada como uma mártir, sacrificada por ser exatamente quem era.

A cantora conta que conheceu a drag queen Melina Bley durante um show. “O propósito de ter uma drag queen em cena no clipe é trazer um contraponto à minha realidade e às minhas batalhas enquanto mulher hétero-cis. Por muito tempo vendeu-se um padrão de beleza inatingível para a maioria das pessoas, como forma de perpetuar o consumo de produtos e serviços, que teoricamente nos ajudariam a alcançá-lo. Hoje a gente já reconhece que as pessoas são diferentes e podem ter desejos diversos. Posso achar libertador romper com a imposição de estar sempre maquiada, com as unhas feitas e a depilação em dia. Isso precisa ser respeitado. Por outro lado, alguém como a Melina, pode achar libertador fazer uma super maquiagem, colocar suas unhas postiças e um salto super alto, porque isso expressa um lado importante da sua personalidade. Isso também precisa ser respeitado”.

No clipe Nanda vai se ‘desmontando’, enquanto Melina, vai se ‘montando’. A artista diz que existe “uma revolução em curso” e que deseja deixar sua contribuição: “As pessoas estão resistindo às pressões sociais relativas a um padrão de beleza que é totalmente ultrapassado. Aos poucos, nosso olhar está evoluindo no sentido de enxergar a beleza na autenticidade das pessoas. Quero contribuir pra essa busca individual que cada pessoa precisa fazer pra descobrir sua melhor versão. Não quero que ninguém imite meu cabelo ou minha forma de vestir. Quero ser referência em ser eu mesma. Quero inspirar as pessoas a terem essa coragem”.

Maria Antonieta morreu guilhotinada. Que cabeças deveriam ‘rolar’ por aqui, metaforicamente dizendo? “Não sou a favor de ‘cancelar’ as pessoas, mesmo que elas tenham opiniões retrógradas e completamente politicamente incorretas. Eu acho que a gente precisa resistir no caminho certo até que elas cedam, por falta de apoio”.

“Maria Antonieta era uma mulher à frente de seu tempo, que ditava a moda. Estabelecia padrões, mas também se tornava refém deles. É uma boa metáfora de como a gente às vezes se sente nos dias de hoje" (Divulgação)

“Maria Antonieta era uma mulher à frente de seu tempo, que ditava a moda. Estabelecia padrões, mas também se tornava refém deles. É uma boa metáfora de como a gente às vezes se sente nos dias de hoje” (Divulgação)

Nanda promete um EP para 2022 e conclui: “Acho que aceitar outras pessoas como são é uma questão de tempo. Muitos preconceitos vêm enraizados nas pessoas. A evolução é lenta, não é linear, mas ela está acontecendo. Eu não sei qual é seria o antídoto para a intolerância- quem me dera, porque sairia pulverizando ele por aí!. Mas acredito que a juventude exerce uma função muito importante nesse contexto. Os mais velhos nos ensinam a viver, e os mais novos nos ensinam como continuar vivendo. Se atualizar é preciso. Constantemente”.

"Acho que aceitar outras pessoas como são é uma questão de tempo. Muitas coisas vêm enraizadas nas pessoas. A evolução é lenta, não é linear, mas ela está acontecendo" (Divulgação)

“Acho que aceitar outras pessoas como são é uma questão de tempo. Muitas coisas vêm enraizadas nas pessoas. A evolução é lenta, não é linear, mas ela está acontecendo” (Divulgação)