Imagine dois shows completos, sem interrupção e com as duas bandas tocando juntas para finalizar a noite com chave de ouro? Pois bem, não precisa ficar só na imaginação, caros leitores. O projeto criado pela banda Vulgue Tostoi, de JR Tostoi e Marcello H, recebe nessa quarta-feira o grupo Posada e o Clã no Solar de Botafogo. O encontro entre as duas bandas de rock de diferentes gerações foi um dos assuntos de Tostoi com o HT. Sobre a apresentação dessa semana, o guitarrista contou que é a terceira edição do projeto que já recebeu a banda Ventre e a cantora Duda Brack. “Os convidados que tocam com a gente são, basicamente, músicos que a gente admira. No caso dessa quarta-feira, o Posada abre a noite e o Vulgue Tostoi vai entrando aos pouquinhos no palco. Os shows são mixados, não tem uma pausa. A gente toca duas músicas no show deles e depois começa a nossa apresentação com os convidados fazendo as nossas canções. Em sequência, o Posada e o Clã sai e volta no final, quando, juntos, nós tocamos músicas de artistas que a gente gosta”, explicou.
E, para esse momento das duas bandas cantando canções de outros músicos ao mesmo tempo, JR Tostoi nos adiantou que o paraense Jaloo será um dos homenageados. “Eu estava conversando com o pessoal do Posada uma vez e descobri que eles são muito fãs do Jalu, que é um cantor de música eletrônica do Pará. Ele tem um trabalho lindo, é autodidata. As melodias são incríveis e ele mistura brega com eletrônico e um toque de underground”, contou. Já nas edições passadas, ao lado da banda Ventre, o Vulgue Tostoi fez um tributo a David Bowie, que tinha morrido dias antes da apresentação. E, com a cantora Duda Brack, a partir de um brainstorming, o nome de Chico Science foi um dos escolhidos para o momento dobradinha no palco do Solar de Botafogo.
O show dessa quarta-feira também será a primeira oportunidade do Vulgue Tostoi lançar seu novo single, “Por Onde Corre a Hora”. Em relação a esse trabalho, que, após a apresentação estará disponível nas principais plataformas de streaming, Tostoi contou que é um reflexo e uma tradução do atual momento pelo qual os brasileiros estão passando. “É uma música que estava arquivada e resolvemos resgatar e tem tudo a ver com o momento de agora. A letra foi escrita há uns dez anos, mas nós mudamos algumas partes para que ela ficasse mais atual”, fez um pequeno mistério o guitarrista. O que será que vem por aí?
Bom, e já que o papo com o músico chegou no assunto política, o HT foi descobrir o que Tostoi acha desse panorama que estamos passando. Segundo ele, o atual momento é um turbilhão de informação que está deixando os cidadãos muito “ligados” com tudo o que está acontecendo. “Eu tenho 47 anos e nunca imaginei que fosse ver um cara com o sobrenome Odebrecht preso e nem que fosse acontecer essa vergonha toda com o partido que eu sempre votei. Eu acho que é tudo muito positivo. A nossa democracia é muito jovem e as leis têm brechas para fugir. Na minha opinião, ainda temos muita coisa para trabalhar. Mas não é só no Brasil, é no mundo inteiro. Eu acho que o mais importante nisso tudo é o uso inteligente da internet para ter todo mundo conectado. Eu adoro quando vejo os políticos sendo chamados de corruptos e ladrões no meio da rua. Esses casos fazem com que eles pensem duas vezes e aprendam a roubar melhor. Algum momento essa situação ia ter que mudar. Afinal, desde 1500 que as pessoas roubam e não são presas”, manifestou-se.
Mas vamos voltar a falar de música porque cultura ensina e relaxa, né? Pois bem. Nas artes que Tostoi atua, o músico também tem mais uma função além de comandar as guitarras da banda Vulgue Tostoi. A trajetória, o aprendizado e o conhecimento do meio musical foram alguns fatores que aproximaram JR Tostoi da produção de novos álbuns. E, com o olhar mais técnico de quem já está no mercado há mais de 18 anos, o músico destacou que a cena carioca está “maravilhosa” e mais solidária. “Na época que criamos o Vulgue, nós tínhamos amigos em outras bandas, mas era só isso. Não existia essa parceria como tem hoje. Agora, um toca a música do outro e ajuda o companheiro. Na minha época não era assim tão fluido e natural. Existia um ar de competição”, lembrou. Ah, e tem mais um motivo para o atual mercado carioca estar tão plural e rico, como afirmou Tostoi. Segundo o músico, a possibilidade de gravar novas faixas em casa amplifica a cena musical e profissionaliza os novos artistas. “Tem muita gente experimentando e fazendo som da maneira que pode. O limite, como a falta de instrumentos e um estúdio caseiro, ajuda artisticamente a gente a se expressar. Torna-se muito diferente o processo de criação”, disse.
Mas, engana-se quem pensa que tudo ficou mais fácil para os músicos. Apesar de reconhecer que a internet, por exemplo, é uma grande aliada dos artistas, os novos tempos não têm sido tão parceiros assim de quem quer viver dessa arte. “A música nunca foi tão desvalorizada. Nessa nova geração, por exemplo, ninguém escuta um disco inteiro de uma vez. A pessoa baixa uma música ou outra e é isso. No Brasil, ninguém compra música digital. CD eu não vou nem falar, né? E vinil é muito caro. Há pouco tempo, eu vi uma pesquisa que afirmava que apenas cerca de 30% das pessoas que compram vinil realmente adquirem com o objetivo de escutar música. Em relação à internet, eu acho que ajuda muito os artistas. O atrapalhar dela é financeiramente, já que a gente não ganha nada com Youtube ou as demais plataformas de streaming. Nós estamos nesse momento de não saber o que vai acontecer. A música não vai acabar, isso eu tenho certeza. Ela está cada vez mais rica e interessante, inclusive. Mas, ao mesmo tempo, ela nunca foi tão desvalorizada”, argumentou.
Sob seu olhar técnico e experiente, o guitarrista ressaltou o pequeno número de artistas que chegam ao mainstream. Isto é, às rádios, novelas, programas de tevê e tudo mais. Como nos contou, a pluralidade de novos e talentosos nomes da música brasileira não acompanha a renovação dos artistas superconhecidos. “Apesar do mercado brasileiro ser muito rico culturalmente, o mainstream é ridículo de pequeno. O nosso rock que vende, tirando um ou outro como O Rappa, é banda de pré-adolescente e infanto-juvenil. Nosso mercado tem muito a crescer e ser explorado artisticamente. Os profissionais da música são excelentes, tecnicamente falando. No entanto, o popular de massa, no mundo inteiro, é sempre muito ruim. E essa nossa produção não é diferente. Aparecer é uma coisa, ter uma carreira é outra”, declarou o produtor musical.
E, em relação a esses artistas que estão em evidência, JR Tostoi destacou mais uma diferença. No atual momento que estamos vivendo, em que temos diversos movimentos feministas, negros e gays aflorando na sociedade, “os músicos do mainstream” não usam da sua arte para se posicionar, ao contrário de artistas não tão conhecidos que fazem da sua letra um manifesto. “Nunca se falou tanto nesses movimentos. Eu acho que faz parte desse protesto a chamada de atenção nas letras. Esse tipo de manifestação está presente na cantora Larissa Luz e na banda Ventre, por exemplo. Mas, no mainstream, não há esse tipo de posicionamento. As pessoas ainda não falam muito sobre esses assuntos, elas preferem ficar em cima do muro”, opinou o guitarrista e produtor cultural JR Tostoi.
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