“A perseguição às religiões de matrizes africanas é ainda o preconceito a nós, negros”, diz Mariene de Castro


A cantora baiana acaba de lançar o single ‘Caxixi’ (Bonitinha), aquecendo corações como uma fogueira das festas juninas. E diz que segue lutando contra o racismo no nosso país. “Sempre dizendo não a esse castigo, que ninguém merece ter. Minha gente luta contra tudo e qualquer forma de preconceito, toda e qualquer quebra de direitos humanos e eu estou aqui para defender tudo o que me representa e o que eu acredito”, frisa

*Por Rafael Moura

“Você é tão bonitinha
Feito um caxixi
Tão cheia de mimo parece boneca de barro
De Mestre Vitalino
Perder o sossego por você
É bem mais fácil do que cortar cana queimada
Saudade de você é saudade dobrada”, os primeiros versos de ‘Caxixi’ (Bonitinha), o novo single de Mariene de Castro aquecem o coração, como uma fogueira de São João. A canção, um forró, chegou até ela como um presente de Roque Ferreira, um de seus compositores prediletos e parte fundamental da sua discografia – há canções dele em todos os seus álbuns. “Essa música chegou às minhas mãos pela alma de Roque Ferreira, que é um grande compositor, um artista da música brasileira, um dos maiores representante da cultura popular, um gênio, ainda vivo. Caxixi chegou em um CD que ele me apresentou com várias músicas inéditas e eu me apaixonei. Gravei na primeira oportunidade. Não só porque é uma música linda, mas fez parte do meu casamento e foi uma surpresa na voz do meu marido, Rafael. E a música fala de um amor de um jeito tão lindo, genuíno, sincero e puro. Eu já tinha cantando em um show que fiz em homenagem ao compositor, que se chamou ‘Meu compadre Ferreira‘, em 2010, em seguida nós gravamos e chegou a hora de entregar para o povo ouvir e desfrutar dessa arte tão bonita”, explica a cantora.

“É um hino ao amor, um amor nordestino, com cheiro de mato e de barro, do jeitinho que eu desejo a todos que ouvirem essa canção”, frisa Mariene. A intérprete é uma das mais importantes vozes da música popular brasileira. A cantora sempre foi considerada uma ‘força da natureza’ por quem a viu cantar. E os que a viram crescer nesses anos todos podem notar em detalhes a lapidação de seu canto potente, afinado e caloroso. “Eu sou uma típica nordestina, autêntica, apaixonada pelo Nordeste, apaixonada por Luiz Gonzaga. Sou neta de um caminhoneiro e de uma avó que tocava acordeão. Eu cresci ouvindo o Rei do Baião, cozinhando milho, amendoim, fazendo paçoca, canjica, mugunzá, fogueira, soltando fogo, me vestindo de caipira. Eu tive muita sorte de nascer nordestina e de viver tão intensamente, de desfrutar esse universo tão mágico de três santos – São Pedro, Santo Antônio e São João”, agradece.

A artista plástica Con Silva, especialista em arte naif, mergulhou no universo do ceramista Mestre Vitalino (1909-1963) e da arte naïf, muito presente nas festas juninas para ilustrar a capa do single já disponível em todas as plataformas digitais. “A Con trouxe uma arte cheia de amor e sensibilidade, deu vida em cores à canção e, agora, eu e Rafael, meu marido, estamos lá ‘bonitinhos’”, brinca. A musa baiana é uma grande devota de Santo Antônio e ela conta ao site HT que nunca fez pedido ao ‘casamenteiro’. “Eu só agradeço! Tenho um filho Pedro Antônio em homenagem ao santo. No sincretismo, ele é Ogum, um pai que me protege, que me guarda. Sou devota dele. Sou muito grata, porque ele é realmente muito presente na minha vida. Minha fé move montanhas. Eu tenho muita certeza disso. Eu sou a prova viva de muitos milagres e os meus milagres são a prova da minha fé”, enfatiza.

A capa do single ‘Caxixi’ (Bonitinha) de Mariene de Castro que faz uma homenagem aos Santos Juninos

A fé de Mariene permeia toda a sua carreira, afinal esse amor está presente em todos os seus shows, entrevistas, postagens… Mas vemos cada vez mais uma perseguição em torno das religiões de matrizes africanas. “Essa questão relacionada à intolerância nada mais é do que a permanência desse racismo, dessa perseguição aos povos africanos, mais especificamente ao candomblé, à umbanda e tudo a que diz respeito a nós, negros. Seguimos lutando e dizendo não a esse castigo, que ninguém merece ter. Minha gente luta contra tudo e qualquer forma de preconceito, toda e qualquer quebra de direitos humanos e eu estou aqui para defender tudo o que me representa e o que eu acredito”, conta. Lembrando que o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa é 21 de janeiro por meio da Lei nº 11.635, de 27 de dezembro de 2007.

Por conta da pandemia mundial causada pela Covid-19 estamos presenciando muitas atitudes de solidariedade, sororidade, ajuda ao próximo pela classe artística, por conta das vaquinhas coletivas. Perguntamos à estrela se ela acredita que essas manifestações deveriam se estender pós-pandemia: “A gente não sabe até quando essa pandemia vai perdurar, não sabemos quanto tempo esse país levará para se reerguer novamente. Acredito que irá demorar um pouco, por isso devemos ser solidários, a gente precisa dar as mãos e apoiar um ao outro. Eu espero muito que essas iniciativas possam se estender pós pandemia, assim como muito atos de solidariedade e compaixão. Eu tenho fé que a humanidade melhore e que possamos ter um mundo melhor, e que a natureza nos mostre esse caminho de mudanças. Essa transformação/ transmutação já está mostrando suas consequências e a natureza está respondendo, falando, renascendo e espero que possamos aproveitar essa nova vida da melhor forma possível”, conta.

Para encerrar essa nossa conversa a cantora diz que está passando essa quarentena em casa, com seu marido e filhos. “Estamos nos cuidando, nos resguardando e respeitando esse momento de silêncio. Aguardando para em breve podermos retomar nossas atividades diárias e podermos estar perto das pessoas que amamos”. A cantora está fazendo a ‘Resenha da Maricota‘, uma série de lives em seu perfil no Instagram, falando sobre música e fé.