Era madrugada de sábado, 19 de setembro de 2015, mas poderia facilmente ser janeiro de 1985, quando Roberto Medina abriu pela primeira vez o portão do Parque dos Atletas, na zona oeste do Rio de Janeiro e o Queen entrou para a história do Rock in Rio com Freddie Mercury e companhia entoando “Love of my life”, incensando toda uma multidão. Desta vez, 30 anos depois, Freddie, que nos deixou vítima de complicações do HIV em 1991, teve seu lugar preenchido por Adam Lambert, revelado no reality show “American Idol”.
Apesar do estranhamento inicial pela presença de Adam, ele, junto de Brian May e Roger Taylor conseguiram colocar o show e os presentes na Cidade do Rock no bolso. Obviamente que Adam, enquanto aposta em agudos potentes e falsetes longos, não consegue alcançar os mesmos graves de Freddie, mas nada que deixe a dever em sua presença de palco e no entoou de hits como “One vision” e “Stone cold crazy”. Com trocas mil de roupa, looks extravagantes e caras e bocas que dividiram a internet, Adam só foi criticado pela turma que insiste numa comparação infundada e não entendem que a vida segue, babies.
Verdade seja dita: esse é o mais próximo que, depois da virada do milênio, chegaremos perto do que o Queen representou um dia na música mundial. Adam, grato até o último fio de cabelo, não buscou em momento algum uma espécie de alusão musical ao que Freddie fazia (salvo, logicamente, a expressão corporal) e mais: reverenciava hora sim, outra também, seus colegas de palco Brian May e Roger Taylor. Na despedida, chegou a se retirar do centro do palco para a aclamação particular dos veteranos pela multidão. Postura que abriu espaço para “Ghost town”, sua música da carreira solo, conseguir uma brecha no setlist memorável do Queen.
Com a simulação de gestos obscenos com um pedestal, performance em um divã roxo e abano com leque dourado, Adam – um pouco exagerado, convenhamos – abriu espaço para May cantar, de forma solo, “Love of my life” ao violão. Uma Cidade do Rock inteira arrepiada, cantando em coro e emocionada. Ainda mais com um plus: uma gravação de Mercury era projetada num telão enquanto a canção, que ele dedicou a uma ex-namorada ainda em vida, era entoada. Aliás, o recurso foi utilizado por mais de uma vez durante as quase duas horas de apresentação e ajudou a marejar alguns olhos. Da guitarra feita de madeira de lenha queimada de May à bateria de Taylor, um dos bons momentos dessa turnê é o destaque reservado à performances individuais dos artistas com os instrumentos que os consagraram. Em dado momento, Rufus, filho de Taylor, participa de um desafio de bateria com seu pai; enquanto May, já na parte final do show, quase que petrifica os presentes com um longo, mas muito longo, solo de guitarra. “É maravilhoso estar aqui de novo no Brasil”, chegou a dizer o guitarrista antes de tirar uma selfie panorâmica com o público e exibi-la ao vivo. A febre do autorretrato, bom citar, também ganhou espaço quando ele chegou a acoplar um “pau de selfie” no próprio instrumento.
Deixando “We will rock you” e “We are the champions” para o final, após uns minutos ausentes do palco e com as luzes apagadas, o Queen + Adam Lambert encerraram a apresentação em alto estilo: o novato com uma coroa e com a bandeira nacional nas costas – à lá Mercury em 85 -, e May com uma camisa do Brasil, em tom de verde, com a urbe-maravilha estampada. Aplauso geral, todos os ingressos esgotados e o Rock in Rio matou a saudade, trinta anos depois, dos maiores sucessos do rock mundial e teve o grato prazer de conhecer Lambert. Moral da história? Um show que nasceu na desconfiança, ascendeu na nostalgia e terminou na festa. E que festa, senhores. Um ótimo gás para enfrentar os seis dias que temos pela frente.
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