Trama Afetiva lança roupa feita com guarda-chuvas recuperados de aterro sanitário para falar de regeneração da vida


Consultor criativo e de tendências, Jackson Araujo é idealizador do coletivo ‘Trama Afetiva’ para a construção de soluções inovadoras com foco em sustentabilidade e em uma perspectiva de mercado que potencializa a importância do ganho coletivo, ao invés do individual. No Brasil Eco Fashion Week, a Trama lançou a coleção batizada ‘Flores Astrais’ em parceria com a plataforma Revoada, que desde 2013 já retirou mais de 20 mil guarda-chuvas do aterro sanitário, impactando financeiramente a vida de 500 famílias. As roupas criadas “gritam pela urgência e diversidade de corpos e corpas LGBTQ”

*Por Jackson Araujo

O começo de tudo para a criação da coleção e do fashionvideo Flores Astrais, da Trama Afetiva, surgiu quando eu estava revendo uma entrevista que fiz ao vivo com Ney Matogrosso dentro do MAM-SP, em 2016, como parte do “Seminário Design e Conspiração: Ziguezagues entre Arte e Filosofia”. Naquele momento, estava exposto no museu o figurino utilizado pelo cantor no clipe da canção “Flores Astrais“, quando fazia parte dos Secos & Molhados.

Fui rever o clipe e imediatamente fiz um link entre o nosso projeto anterior, Água, em que questionávamos toda a fuga pro espaço e a busca de água na lua. No clipe dos Secos & Molhados, a banda está no espaço, assim como as pessoas do clipe da coleção Água, de vestíveis feitos a partir de guarda-chuvas recuperados de aterro sanitário.

E Ney canta: “Um grito de estrelas vem do infinito

E um bando de luz repete o grito

Todas as cores e outras mais

Procriam flores astrais…”

Daí veio a ideia de convidar um bando de pessoas LGBTQ para serem nossas estrelas e flores astrais, num grito de cores em prol da regeneração da vida por meio de afeto, diversidade e muita diversão. Gostamos de pensar no fashionvideo e na coleção como um antídoto para esses tempos tão cinzas, violentos e feios.

Foto: Beni Blazquez | Arte: Zeca Gerace

O primeiro passo foi convidar Max Blum para compor uma trilha sonora inédita e exclusiva que embalasse essa ideia de um novo possível terceiro Verão do Amor, já que o segundo e derradeiro aconteceu na Londres de 1989. Trinta e três anos depois, nos questionamos: quando será o próximo Verão do Amor nesse tsunami pandêmico?

Trilha feita e absolutamente em sintonia com o que buscávamos, partimos para convidar as estrelas do casting a fazerem parte dessa nossa rede de pessoas que se conectam para fazer da moda uma ferramenta de transformação socio ambiental.

Foto: Beni Blazquez | Arte: Zeca Gerace

Nossas estrelas são: Ana Giselle (@atransalien), DJ, modela e performer ativista do movimento T; criadora e diretora do festival multimídia Marsha; Pietro Dal Monte (@pietro.dalmonte), ator, cantor e dançarino do teatro musical, atualmente em cartaz com “Bullying, O Musical”; Puri Yaguarete (@puriyaguarete), transmuleke, ator/performer, circense, dançarino de Vogue; Arara Xestal (@araraxestal), artista, performer, aprendiz da @escoladeteatro e tarólogo criador do perfil @otarotsabe, ativista queer do corpo gordo; Zeca Gerace (@geracezeca), artista visual e diretor de arte de experiências imersivas; Michelle Maus (@transvegana), travesti, mestra em Têxtil e Moda pela EACH-USP e tecnóloga em Design de Moda e fundadora do projeto Botão de Flor, que visa inserção social de mulheres transexuais e travestis em situação de vulnerabilidade social; Sioduhi (@sioduhi), estilista, costureiro e ativista pelos direitos e visibilidade dos indígenas LGBTQ, diretor criativo da marca Sioduhi Studio (@sioduhistudio); Jorge Feitosa (@jfjorgefeitosa), costureiro da marca que leva seu nome e designer-tutor da Trama Afetiva; Nana Wharton (@nanawharton), designer da marca NotoriusBr, de hip hop style; Luana Pontes (@luapontes), designer e CEO da agência Cherry Plus, especializada em moda e beleza, e Dani Nakamura (@exexwhy), modelo, female impersonator, beauty- artist e estilista.

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Pessoas muito especiais que reavivaram a nossa ideia da Trama Afetiva como um espaço de acolhimento, empatia e ativismo. Respeito total!

Sobre a coleção, foi cocriada por Thais Losso, Jorge Feitosa e Itiana Pasetti, trio de designers-tutores que se empenham em encontrar soluções que garantam à matéria-prima uma vida útil fora do aterro sanitário por meio de peças modeladas com resíduo zero e sem utilização de insumos extras que não seja o próprio náilon utilizado para a construção das roupas.

Foto: Beni Blazquez | Arte: Zeca Gerace

As peças entram em venda por lote, ou seja, só serão confeccionadas sob encomendada em nosso catálogo – via Instagram da Trama Afetiva (@trama_afetiva), com pagamento prévio por Pix ou Pag Seguro. Assim, poderemos pagar os serviços da cooperativa de costureiras Mãos Amigas e de catadores e catadoras da Unidade de Triagem do Campo da Tuca, ambas em Porto Alegre, onde está baseada a plataforma Revoada, de Itiana Pasetti e Adriana Tubino, que desde 2013 já retirou mais de 20 mil guarda-chuvas do aterro sanitário, impactando financeiramente a vida de 500 famílias. A Revoada é parceira da Trama Afetiva nesses estudos regenerativos.

“Sabemos que todo lixo é um erro de design, portanto, estamos evitando uso de elásticos e zíperes, por exemplo, para garantir às peças uma característica lixo zero e que no final da vida útil ela seja facilmente desmanchada e possa ser inserida novamente na cadeia produtiva. Tendo assim roupas circulares, evitando que a peça se torne um lixo novamente”, diz Itiana Pasetti.

Foto: Beni Blazquez | Arte: Zeca Gerace

Para Jorge Feitosa, o principal desafio é a modelagem que não gera resíduos. “É sempre um exercício de muita inteligência e técnica pensar em peças de modelagem que aproveitem totalmente os guarda- chuvas, visto que originalmente eles têm formato circular, em gomos enviesados”.

“Conseguimos retirar 103 guarda-chuvas do aterro sanitário em apenas uma só peça, um maxipullover”, celebra Thais Losso, a designer que traz para o grupo um desafio que já começa a se estabelecer como meta: o crochê e o tricô a partir da transformação de guarda-chuvas em tiras a serem utilizadas nas técnicas de manualidades, acrescentando ao processo regenerativo o lado humano do fazer artesanal brasileiro.

Foto: Beni Blazquez | Arte: Zeca Gerace

“Mais que resistir e apenas sobreviver às violências, queremos propagar o direito LGBTQ+ de existir também pela potência da alegria, do direito de cantar, brincar e dançar, na vida e no audiovisual. É uma celebração da nossa existência”, conceitua o diretor Beni Blazquez.

A direção de movimento dos corpos e corpas de nossas flores astrais é de Clarice Lima (@claricelimao) e Isis Vergilio (@isisvergilio). Quem assina a beleza é Carlos Carrasco (@ccarrasco01) e a criação da identidade visual do projeto é de Luccas Morais (@ladyletal).

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