“Trabalho com costura vermelha para remeter ao sangue. Ele tem mesma cor na raça humana”, diz Airon Martin da Misci


Em conversa com o site HT, o designer de roupas e mobiliário com traços inspirados nas linhas modernistas falou sobre o prazer de criar para agregar e que, com todas as nossas diferenças, somos irmãos com ideiais de vida em sociedade

Já ouviu falar de uma marca multidisciplinar que una vestuário e mobiliário a conceitos de diversidade, pluralidade, respeito às diferenças e faça uma ode ao ser humano sem qualquer tipo de distinção? Essa é a Misci, criada a partir de um neologismo inspirado na palavra miscigenação e que, como a própria origem já diz, busca abraçar as variedades presentes no brasileiro. Somos todos irmãos. Em conversa com o site HT, o idealizador e dono da marca, Airon Martin, contou mais sobre o caminho que está trilhando com a Misci. Vem conferir!

VARAL
Modelos: Marina Gonzalez e Lucas Rozin
(Foto: Ton Gomes)

Quem vê as peças criadas por Airon pode imaginar uma vida inteira mergulhada no design, mas a realidade do jovem foi outra. Nascido e criado no interior do Mato Grosso, o único contato que ele tinha com algo relacionado à estética era a partir da avó, quando ao lado dela arrumava o jardim e outras partes da casa. Pertencente a uma família muito tradicional e conservadora, Airon não teve liberdade na escolha inicial de sua profissão futura. “Minha família é muito tradicional e sonhava em ter um filho advogado. Então, eu iniciei o curso de Direito, mas vi que não era o que eu queria. Uma nova conversa me incentivou a optar pela Medicina. Lá fui eu para Buenos Aires onde ingressei no curso. E sabe que foi na capital Argentina que eu tive o meu primeiro contato com o design?”, comentou Airon, que permaneceu no curso por apenas um ano, antes de arriscar tudo e se dedicar ao que realmente amava.

Voltou ao Brasil para se dedica à arte e à estética. Estudou no Istituto Europeo di Design, trabalhou no Estúdio Paulo Alves e Marcenaria Trancoso e abriu um escritório. De onde mais tarde, nasceu a Misci. “Tudo começou com um escritório de design, no qual eu cuidava de projetos de interiores e branding para clientes específicos. Quando eu vi, já estava lançando uma marca de produtos para a venda. Foi tudo muito rápido”, revelou.

Menos de um ano separam o início do seu escritório de design do lançamento da primeira coleção da Misci, que abrange tanto o vestuário quanto o mobiliário. Batizada Human Race foi apresentada ao público em agosto de 2018, refletindo os ideais do idealizador e da marca, e como o próprio nome já diz, tem como foco a raça humana. “Sempre fui apaixonado por moda e mobiliário. Por que não transformar a minha marca em algo que pudesse contar histórias? Eu queria fazer algo que tivesse ligação com a identidade brasileira, mas sem ser aquilo de tucano e vegetação”, comentou bem-humorado. E prosseguiu explicando mais sobre o processo de pesquisa anterior à coleção: “Estudei bastante a história do design aqui e conheci mais do modernismo, que foi muito forte no Brasil. Infelizmente, esses projetos modernistas acabaram se perdendo porque agregaram um luxo irreal. Por isso, sinto a inspiração no modernismo, mas com um olhar inovador”, relatou. Um exemplo dessa utilização diferenciada do conceito de modernismo é a Cadeira UNI, presente na coleção Human Race, que é inspirada no movimento e caracterizada pelo minimalismo, mas ao mesmo tempo vira uma namoradeira para duas pessoas e oferece conforto e segurança ao público plus size.

VARAL
Modelo: Lucas Rozin
(Foto: Ton Gomes)

Outro ponto que chama atenção para a primeira coleção da Misci é seguir o estereótipo de gêneros definidos. Airon volta à história da família para nos contar: “Eu fui criado pela minha mãe e pela minha avó. Então é impossível não ter a referência feminina nas minhas criações também voltadas para homens. Apesar de compartilhar como sem gênero, o que eu faço é colocar referências femininas nas roupas masculinas e quebrar um pouco esse território tão demarcado”. Além disso e da modelagem oversize, permitindo que uma maior variedade de corpos vista e use a coleção, as cores escolhidas também guardam muitos significados. “Independentemente da cor, do corpo, eu quero mostrar que a raça humana é uma só. Por isso, trabalhamos muito com a costura vermelha para remeter ao sangue, que é vermelho em todos nós”, revelou.

Ainda que tenha menos de um ano de estrada com a marca, o sucesso das criações de Airon é inegável e ele, muito satisfeito com o seu trabalho, se sente orgulhoso dos passos que vem dando e a satisfação de ver pessoas vestindo as suas roupas. “É incrível. Ainda mais quando eu admiro essa pessoa ou ela captou bem o espírito do meu trabalho. O cantor Silva, por exemplo… Foi uma enorme satisfação vê-lo com uma camisa da minha marca, que é muito brasileira. Ainda mais ele sendo um cara que valoriza essa brasilidade”. Com esse pensamento de compartilhar as suas ideias para cada vez mais pessoas, Airon comentou sobre novas criações para o design de móveis.

Criado por sua mãe e avó, Airon tenta colocar referências femininas em suas criações (Foto: Reprodução Pessoal)

Assim, com o olhar para frente, Airon vem estabilizando a Misci e mostrando que a marca veio para o futuro. “O primeiro ano foi o momento de estruturar a marca e mostrar para o que ela tem como diferencial. Acabamos de fazer um paralelo entre as linhas modernistas com a identidade única de um varal. Algo que está presente em todas as casas sem distinção de classe social”, concluiu.