Minas Trend: Alexandre Bojar aponta como a essência de uma marca deve estar alinhada com a padronização da modelagem


“Se a marca não tem coerência na própria tabela de medidas ela está correndo grandes riscos. É muito mais difícil aumentar a percepção de valor do seu produto se a marca não consegue gerir sua própria tabela de medidas. É preciso um trabalho de conscientização sobre os benefícios de se estabelecer uma tabela de medidas, um corpo modelo de prova e a gestão da qualidade dessas medidas”, pontua Alexandre Bojar, consultor técnico do SENAI CETIQT. Ele esteve à frente da palestra “Alinhando a Essência da Marca: Padronização como Ferramenta de Identidade”, na Escola de Design, em Belo Horizonte, como parte integrante da 30ª edição do Minas Trend – Maior Salão de Negócios da América Latina -, promovida pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG)

Minas Trend: o Maior Salão de Negócios da América Latina, realizado no Minascentro

A padronização de modelagens, tecidos e aviamentos pode fortalecer a identidade de uma marca. Esta foi a tônica da palestra do consultor técnico do SENAI CETIQT Alexandre Bojar, na Escola de Design (UEMG), no Centro histórico de Belo Horizonte, em sinergia com a 30ª edição do Minas Trend – Maior Salão de Negócios da América Latina, promovida pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), norteada pelo tema “As Novas Conexões da Moda”. Perguntei a Bojar, como a modelagem impacta e pode fidelizar o cliente a uma marca? “A modelagem é responsável pelo que o corpo vê e sente quando o assunto é roupa. Ela influencia diretamente a sensação tátil e ergonômica do tecido no corpo e cria a estética da roupa, responsável também por materializar os aspectos subjetivos da moda e da identidade. A pessoa que usa a roupa não precisa entender dos aspectos técnicos da modelagem para saber se uma peça lhe cai bem ou não. Ela irá perceber, mesmo que de forma inconsciente, quando uma marca não é coerente na entrega da identidade de produto, quando ela não conta a mesma história nas diferentes coleções, ou quando os tamanhos estão sempre mudando. Isso pode ser fatal para a reputação da marca”, frisa.

Alexandre atuou em Consultorias Tecnológicas e Capacitações em Modelagem, nos setores de Desenvolvimento e Normalização de Uniformes Profissionais e de Alta Performance, Consultorias em Confecção Industrial, Engenharia e Desenvolvimento de Produtos e Gestão de Projetos em Moda, Confecção e no desenvolvimento estratégico de Polos Industriais, e é Graduado em Tecnologia na Produção de Vestuário pelo SENAI CETIQT. Apresentou seu trabalho de Conclusão de Curso (TCC) no 14° Colóquio de Moda, formou-se Master em Marketing e Comunicação de Moda pelo Istituto Europeo di Design (IED). Elaborou políticas públicas para a cadeia produtiva da moda como Articulador em Economia Criativa pela Secretaria Municipal de Cultura da Cidade do Rio de Janeiro, prestou consultoria de modelagem para empresas e alunos, e possui marca homônima de moda sem gênero.

Alexandre Bojar destaca o Top10 de dicas para se alinhar a essência de uma marca com a padronização da modelagem:

  1. Consuma os conteúdos dos canais do SENAI CETIQT para estar sempre atualizado com as melhores práticas da indústria da moda; 
  2. A proposta de valor – que é como a marca entrega o seu propósito – estabelecido por ela para o cliente tem que estar muito clara e ser consistente no tempo; 
  3. É importante que essa proposta de valor se destaque do concorrente; 
  4. Conhecer o fluxo de desenvolvimento e estabelecer melhoria contínua; 
  5. A marca deve ter uma tabela de medidas sólida e verificada junto ao corpo da modelo de prova. A modelo de prova e a tabela de medidas deve ser sempre a mesma;  
  6. O mix de produtos deve ser estratégico e inteligente, com análise criteriosa da performance de venda, do faturamento por produto, da linha de produtos que destaca a marca alinhada a uma proposta de valor, e tendo cuidado com os modelos canibais; 
  7. Estabelecer um grupo de bases de modelagem estratégico que reflita a identidade da marca; 
  8. Estabelecer um padrão para variações das bases de modelagem: alturas de decotes, mangas ou cinturas, por exemplo; 
  9. Pesquisar os recursos humanos e tecnológicos da empresa e estabelecer os processos mais eficientes para desenvolvimento e produção dos produtos; 
  10. Padronizar os processos e características dos acabamentos; 

Dialogando com o tema anterior, o SENAI CETIQT desenvolveu um dos projetos mais importantes em prol da cadeia produtiva têxtil e de confecção e, consequentemente, do varejo de moda: o mapeamento da diversidade dos corpos da população brasileira através da Pesquisa de Caracterização Antropométrica Brasileira (SIZEBR). Desde o resultado da pesquisa, Alexandre disse-nos que “ela é a nossa principal fonte de informação sempre que o assunto é tabela de medidas, e está sendo fundamental para o estabelecimento das novas diretrizes da ABNT. Percebo que o interesse das marcas por entender o formato do corpo de seu público e consequentemente estudar sua própria tabela de medidas está crescendo, e quando elas sabem que a pesquisa Size BR estabeleceu um recorte regional querem entender melhor para que possam estudar estratégias de distribuição em cima das diferenças apresentadas nesse recorte”.

Alexandre Bojar: A modelagem é fundamental para fidelizar o cliente (Foto: Divulgação)

De acordo com o estudo do Size BR, no caso das mulheres, os biotipos são retângulo, ampulheta, colher, triângulo e triângulo invertido. Apontou que 76% são do tipo retângulo, 8% são triângulo, 6% são ampulheta, 5% são colher e 5% são triângulo invertido. A partir daí pode-se tomar padrões de medidas para busto, cintura, quadril e quadril alto. “Percebo que a informação de que o biótipo retangular é o mais comum, no geral, é recebido com grande surpresa. Mas quando nos aprofundamos na metodologia da construção desses biótipos percebemos que ele contempla as pessoas que possuem medidas de busto, cintura, quadril alto e quadril em equivalência, mas que tem configurações diferentes. Não é incomum pessoas com a região da cintura costas pequena e a maior medida estar projetada para a barriga, isso cria uma sensação visual de corpo acinturado, mas o biótipo é retangular. Então essa pesquisa está contribuindo para uma discussão muito rica sobre o formato do corpo brasileiro”, analisa.Contemporaneamente ainda há marcas que vendem roupas tamanho M, mas que, na realidade, é um P. Um G que é M. Seguimos para qual caminho? Se o empresário não conseguir padronizar – em sintonia com o fornecedor – as marcas vão obrigar o cliente a comprar uma roupa de tamanho diferente a cada hora para conseguir se vestir. Há algum avanço nessa conscientização? “Essa é uma questão interessante e complexa. De fato, se a marca não tem coerência na própria tabela de medidas, ela está correndo grandes riscos. É muito mais difícil aumentar a percepção de valor do seu produto se a marca não consegue gerir sua própria tabela de medidas. E isso não é tão obvio para os empresários. É preciso um trabalho de conscientização sobre os benefícios de se estabelecer uma tabela de medidas, um corpo modelo de prova e a gestão da qualidade dessas medidas. Então a motivação em nos procurar é essa conscientização. Mas mesmo nesse papel de consultor vejo que é preciso ainda um trabalho de convencimento para que a empresa empregue esforços nesse sentido. Porque não é apenas estabelecer a tabela de medidas, é preciso investimento para que ela seja cumprida”.

O consultor relata-nos sobre como tem sido o seu trabalho de campo. Segundo ele “a realidade da maioria das empresas que eu atendo não é igual a que estão submetidas a grandes grupos, quase sempre são empresas familiares que começaram o negócio a partir de um conhecimento empírico e de uma necessidade financeira, possuem acúmulo de papéis e estão sempre apagando incêndios. Algumas grandes estruturas do passado que ruíram com a pandemia estão buscando se reestruturar, buscando também o caminho do online, os novatos que conseguiram surfar na onda da venda digital a partir de 2020 estão encarando a necessidade de se organizar para conseguir produzir suas demandas. Mesmo nesse cenário não é comum encontrar empresas que veem valor no desenvolvimento estratégico do produto, ou que tomam o investimento, já que seus benefícios não são a curto prazo e o ganho monetário não é simples de perceber”.

Para evidenciar esta transformação, ele nos cita cinco exemplos de marcas que já estão se adequando e como fizeram isso:

  • A Aviator está fazendo um trabalho muito interessante em relação a sua tabela de medidas para camisaria. A marca sabe que uma de suas principais entregas de valor está em sua tabela de medidas.
  • A Objetiva está fazendo um trabalho muito bom em padronização e gestão do desenvolvimento. O SENAI CETIQT entrou padronizando bases, acabamentos e procedimentos do desenvolvimento e o Audaces com treinamento para o ISA na gestão do desenvolvimento.
  • O grupo da Alto Giro, que já tem muito rigor com acabamento, matéria-prima e design elaborado, tem investido no desenvolvimento para estabelecer um calendário de atacado afiado que contemple suas marcas com grandes mix de produtos.
  • A iniciante marca Bruna Bruno, de acessórios para vinhos, que nasce com um propósito e proposta de valor bem definidos e muito cuidado no lançamento de novos produtos, fez uma pesquisa muito interessante alinhando estética sofisticada ao utilitarismo.
  • Outra iniciante, a Triply de bolsas retornáveis, fez uma intensa pesquisa unindo design e sustentabilidade para oferecer ao mercado uma eco bag premium.

Em uma realidade em que há plataformas online e lojas físicas, perguntamos ao consultor como devem estar alinhadas. “Alinhar jornada do consumidor com os diferentes canais de conteúdo da marca digitais e físicos pode trazer benefícios que transformam o consumidor em um verdadeiro fã defensor da marca”.

“Se a marca não tem coerência na própria tabela de medidas ela está correndo grandes riscos” (Foto: Divulgação)

Sobre o cenário da moda nacional, ele diz que “algumas cidades e estados enxergam a moda como diversificação de sua economia e estão investindo em formação ou estruturação de polos de moda, como Maricá, no Rio de Janeiro, e Aracaju, no Sergipe, com o Cinturão de Confecções de Itabaianinha e Tobias Barrero, que são exemplos. Também temos algumas conversas iniciadas com a Paraíba e com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente do RJ. Percebo também uma tendência dos fornecedores de produtos investindo em marca própria para não ficar na mão de grandes marcas e conseguir aumentar o valor percebido do seu produto. Eles agora estão descobrindo que montar uma marca requer uma outra estratégia de negócio”.

Quanto ao sonho que o move, Alexandre diz:  “Ao ver tanta matéria-prima comprada sem sequer ser transformada, ou produtos produzidos nunca vendidos, isso criou em mim uma vontade ou um senso de propósito em contribuir para que tenhamos uma indústria mais estratégica e inteligente nesse sentido. Percebo que o sistema de desenvolvimento e produção de moda tolera muitos erros e desperdícios. Uma peça de roupa feita de forma errada não mata seu usuário como pode acontecer com um carro ou avião mal produzido, por exemplo, mas eu acredito que podemos nos espelhar no desenvolvimento desses produtos para para fazê-lo de forma mais estratégica e enxuto. Que a indústria continue contribuindo para a formação da identidade brasileira e continue sendo um importante motor da economia, mas com mais responsabilidade ambiental”.

Acrescenta ainda: “Também é um grande objetivo conseguir acompanhar um trabalho completo de alinhamento de branding com desenvolvimento estratégico de produto, passando pela padronização de produtos e processos, do início até a finalização do projeto, digitalizando toda a informação e automatizando o processo de desenvolvimento. É preciso muito tempo para que o trabalho completo se realize e poucas empresas estão dispostas a investir. Mas é um desejo participar de todas as etapas, não apenas compartilhar a metodologia, testar os primeiros desenvolvimentos e depois acompanhar à distância, como acontece hoje em dia. Meu maior sonho é desenvolver a minha marca autoral de forma que com ela eu consiga colocar em prática esse conhecimento, formatando um olhar particular”.