“Confio na beleza da ancestralidade e quero ver outras modelos com orgulho da pele e do cabelo”, diz Samile Bermannelli


A top baiana que já cruzou passarelas em Paris, Milão, Nova York e até Xanga celebra conquista internacional com cabelo afro na capa da edição de sétimo aniversário da revista Issue Magazine, que é um grande símbolo para a luta antirracista. “Eu venho tentando quebrar esse padrão dos cabelos das pretas e mostrar para os clientes que há inúmeras opções, como: tranças, penteados, miçangas e acessórios que eles podem usar”, afirma

*Por Rafael Moura

O ébano simboliza nobreza e, principalmente, resistência! Palavras essas que a top baiana Samile Bermannelli conhece bem de perto, afinal ela valoriza muitos suas raízes afro e em seu portifólio já tem desfiles para as grifes Valentino, Kenzo, Eli Saab, Zuhair Mourad, Marc Jacobs, Miu Miu, Balmain, Victoria’s Secret; campanhas para Dolce & Gabanna e Jacquemus, além de três Vogues Paris, Vogue América, Japão, Reino Unido e Brasil. A brasileira já cruzou as passarelas das principais semanas de moda mundiais: Milão, Nova Iorque, Paris e Londres. E segundo a Vogue Itália está na lista das 50 maiores modelos negras da atualidade.

Aos poucos, Samile tem modificado a indústria e empoderado outras mulheres negras a assumirem suas identidades afro. “Confio na beleza da minha ancestralidade e espero ver outras modelos com orgulho da sua pele e do seu cabelo. Não podemos viver inseguras, precisamos lutar pela nossa liberdade estética também”, ressalta. E completa. “Essa capa é muito importante para mim, é o resultado da minha resistência e insistência de que pode dar certo. Se eu olhasse pra trás e falasse para as minhas agências que eu iria colocar dreadlocks, eu provavelmente iria escutar um ‘não'”.

A modelo lembra que aos nove anos pediu a sua mãe que fizesse alisamento nos seus cabelos, afinal pela falta de representatividade, a pequena baiana de madeixas cacheadas queria andar com os cabelos soltos, mas o grande volume não permitia que o fizesse. “Minha mãe trabalhava muito e não sabia fazer muitos penteados, então sempre optava por aqueles que duravam uma semana inteira. Eu via as meninas na escola com cabelo solto e liso e queria me encaixar no padrão”, conta Samile, que ficou refém da química capilar por oito anos.

Até que aos 17, um ano e meio após começar a modelar, decidiu cortar os cabelos no estilo big chop e assumir seu afro — a partir de então a modelo viu sua carreira decolar. Orgulhosa de suas raízes afrodescendentes, decidiu usar sua visibilidade para mudar o mercado de moda. “Eu venho tentando quebrar esse padrão dos cabelos das pretas e mostrar para os clientes que há inúmeras opções, como: tranças, penteados, miçangas e acessórios que eles podem usar”, frisa.

A top baiana Samile Bermannelli  é uma das modelo da capa de aniversário da Issue Magazine

Seu cabelo sempre foi motivo de diversas reuniões em agências e com clientes, afinal, o mercado sempre teve grandes dificuldades de absorver a identidade afro das mulheres negras e impunha um padrão estético eurocêntrico dos fios lisos. “Já vi muitas meninas terem que trançar o próprio cabelo ou ouriçar seu black power nos backstages porque os cabeleireiros não sabem trabalhar com cabelo afro”, ressalta. A top acredita que o mercado vem se transformando e entendendo que não existe uma beleza única, por isso diferentes tipos de mulheres e homens vem sendo requisitados pela área para estrelar os castings de desfiles ou campanhas publicitárias. Para Samile, desde que frequentava o Projeto Top Model Fama, em Salvador, um iniciativa do coreógrafo baiano Silvado Tavares para catapultar meninas ao mundo da moda, até os dias de hoje, muitas transformações aconteceram, mas ainda precisamos avançar mais.