Um ano de pandemia no Brasil: famosos contabilizam as dores e dificuldades do período


Artistas como atriz Mariana Xavier, Silvero Pereira, Ju Colombo, Beth Goulart, Leona Cavalli, Luís Lobianco, Claudia Netto e Dadá Coelho falam ao site HT sobre as perdas deste um ano de pandemia. Eles também compartilham como têm superado as adversidades e que transformações aconteceram em suas vidas. Vem saber, porque não está mesmo fácil para ninguém!

*Por Brunna Condini

Um ano após o registro do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, a população ainda convive com o vírus em sua rotina. As máscaras viraram item fundamental, as bolsas e bolsos carregam álcool 70% ou em gel (ou deveriam carregar), e nas relações familiares, de amizade e profissionais, os encontros online viraram uma realidade, e nos presenciais, que rarearam, abraços e beijos não são bem vistos, já que o coronavírus é facilmente transmitido desta forma.

Nada será como antes, muito se fala. Ora, nada é como antes quando o tempo passa. Mas o que é dito neste caso é que os efeitos do vírus no mundo todo já são muito sentidos neste um ano. São mudanças de comportamento, crises econômicas, políticas e sociais, ansiedade, desesperança com o futuro por aqui e tantos outros fatores que já engoliram nossas vidas com a chegada da Covid-19. Entre mortes (até ontem foram 265.500 óbitos) e curas, quem consegue levar a vida com um mínimo de perdas, pode sentir algum privilégio, mas não está ileso de ter seu emocional remexido por tantas dificuldades e incertezas ao redor. O site HT ouviu alguns artistas sobre o tema. Não está mesmo sendo fácil para ninguém.

"É muito frustrante ter acreditado, quando tudo começou, que sairíamos dessa experiência melhores como humanidade" (Reprodução Instagram)

“É muito frustrante ter acreditado, quando tudo começou, que sairíamos dessa experiência melhores como humanidade” (Reprodução Instagram)

A atriz Mariana Xavier confessa que vê com desânimo o cenário atual. “É muito revoltante que, um ano depois, com todos os exemplos que a gente teve pelo mundo de como enfrentar o problema, o Brasil esteja passando pelo pior momento dessa crise sanitária. Muito frustrante ter acreditado, quando tudo começou, que sairíamos dessa experiência melhores como humanidade. O que vemos é justamente o contrário. Demonstrações bizarras de egoísmo, irresponsabilidade e ignorância, começando por quem nos governa, que deveria ser o primeiro a dar o exemplo e buscar saídas eficientes para todo esse horror, mas, ao contrário, dá declarações e toma decisões cada vez mais desastrosas, parecendo que se apraz com a dor”, desabafa.

Mariana compartilha aqui como tem buscado algum bem-estar no período. “Tento me apegar à espiritualidade para aguentar o tranco e seguir em frente, mas a mesma perspectiva espiritual deixa muito clara para mim a diferença entre destino e livre-arbítrio. Acredito que a pandemia era uma prova necessária para todo o planeta, estava em nosso destino, mas a forma como cada país e cada pessoa está agindo perante o desafio é escolha, livre-arbítrio e a responsabilidade também será cobrada. Tenho absoluta noção do meu privilégio de poder continuar me protegendo, mas não consigo não me importar com quem não tem a mesma condição e está sendo obrigado a se lançar nessa roleta-russa É uma doença traiçoeira, não tem como saber como cada organismo vai reagir. Estamos vendo um aumento absurdo de casos graves entre pessoas jovens e sem comorbidade, as mesmas que se iludiram achando que tinham corpo fechado e que por isso podiam se expor sem medo. Eu não quero pagar para ver. A única escolha segura segue sendo não pegar. Sigo tendo meus trabalhos cancelados, adiados… essa semana mesmo estava de malas prontas para fazer um filme em São Paulo, iria na segunda, e na quarta me disseram que não vou mais. A sensação é de exaustão, de um enorme desperdício de energia, já que a gente tem que ponderar mais para tomar qualquer decisão. E quando consegue se organizar minimamente para realizar os projetos, tudo desmorona no segundo seguinte. Tenho dito em terapia que a sensação é de estar tentando montar um quebra-cabeça de gelatina. As peças escorregam da nossa mão, partem ao meio, derretem, desaparecem, não têm mais encaixe, começa do zero, uma loucura”, analisa a atriz que segue no ar como Biga, na reprise especial de ‘A Força do Querer’.

“Tive perdas, como a maioria das pessoas e profissionalmente também” (Foto: Reprodução/Instagram)

Silvero Pereira, que está na mesma produção no horário das 21h, sua primeira novela, lamenta sobre o panorama do seu estado de origem, o Ceará. “Ele está em situação extrema e a perda de vidas tem sido muito triste. Tive perdas, como a maioria das pessoas. Profissionalmente também com trabalhos que não puderam ser executados e propostas que não pude aceitar por estar negociando com outro projeto. Pessoalmente, houve uma perda afetiva, ou seja, muito tempo longe de familiares e amigos. Acho que aprendemos ao longo de um ano a nos proteger mais, sobre como podemos correr menos risco. Entretanto, ainda temos uma grande parcela negando a pandemia e provocando um caos maior”, avalia Silvero, que acabou de rodar dois longas, um em que vive um mafioso em “Quem Matou Antuérpia Fox?“, ao lado de Cleo e Fiuk, e também um abusador em “Bem-vinda a Quixeramobim“, novo filme de Halder Gomes, ao lado de Monique Alfradique.

"Perdi a esperança de que, no geral, sairíamos dessa crise melhores como sociedade. Não superei" (Foto: Luis Lobianco)

“Perdi a esperança de que, no geral, sairíamos dessa crise melhores como sociedade. Não superei” (Foto: Luis Lobianco)

Luís Lobianco, que teve a Covid-19, é muito próximo da sua família e diz que a falta de contato presencial frequente é um dos danos da pandemia que tem mais sentido. “Perdi o primeiro ano de vida da minha sobrinha-afilhada (Maitê, de 4 anos) e perdi a esperança de que, no geral, sairíamos dessa crise melhores como sociedade. Não superei. Ainda não posso estar com a minha família e só vejo o governo ganhar mais força com apoio de ideias negacionistas”.

Transformações internas

As perdas carregam dor e aprendizados. Como escreveu Elizabeth Bishop em seu poema ‘Uma Arte’… “A arte de perder não tarda aprender; tantas coisas parecem feitas com o molde da perda que o perdê-las não traz desastre”. Lidamos com as perdas ao longo da vida, mas talvez esse seja o período em que mais falamos delas diariamente. A atriz e apresentadora Ju Colombo, que estará no núcleo de Marieta Severo em ‘Um Lugar ao Sol’, próxima novela das 21h na Globo, conta que atravessar esse momento nebuloso tem provocado mudanças fundamentais em sua forma de ser. “De todo o cenário que aa pandemia trouxe para a minha vida, o fato de presenciar tantas mortes, sendo uma pessoa que preza muito as relações, me proporcionou profunda reflexão e a tomada de decisão de abrir mão da intolerância (muito presente em momentos decisivos), da ansiedade (desisti de querer acelerar o tempo do outro) e da falta de sabedoria ao agir de modo a antecipar as descobertas significativas em relação à vida das pessoas do meu convívio, apesar de enxergar a necessidade da pessoa olhar a própria conduta”, reflete.

“Essas transformações internas me proporcionaram as conquistas mais valiosas deste ciclo da minha vida: relação afetiva de qualidade, uma relação familiar maravilhosa, um ninho de amor e mútuo respeito e relações profissionais dignas, de qualidade e riqueza, inclusive financeira. Está valendo a pena aprender a ser um ser humano melhor”.

"Tem valido a pena aprender a ser um ser humano melhor" (Divulgação)

“Tem valido a pena aprender a ser um ser humano melhor” (Divulgação)

Apesar de muitos preferirem olhar para o lado bom da vida, apesar de tudo, algumas perdas são irreparáveis. Como a de Beth Goulart, que perdeu a mãe Nicette Bruno, há dois meses em decorrência do quadro de Covid-19. “A superação tem acontecido com muita fé. Orações, meditação sobre o que significa a vida, a compreensão da espiritualidade, do processo da vida como um aprendizado. Aqui em casa, nós acreditamos que a vida não começa no berço e não termina no túmulo. Então, precisamos todos trabalhar nosso espírito, nosso crescimento espiritual em cada uma de nossas encarnações. Esse processo de compreensão nos ajuda a superar uma perda como essa. Mas é muito difícil, você perde uma referência, a fonte de amor. Você perde sentido, muitas vezes. Mas a fé nos ajuda a recobrar o sentido maior da nossa existência”.

“A superação da morte da minha mãe tem acontecido com muita fé. Orações, meditação sobre o que significa a vida, a compreensão da espiritualidade, do processo da vida como um aprendizado” (Reprodução)

A fé também tem ajudado Leona Cavalli a superar as dificuldades. “Graças a Deus não perdi familiares; mas alguns amigos e colegas queridos, sim, como Eduardo Galvão e Nicette Bruno. Infelizmente, tive perdas no trabalho; estava fazendo um filme que teve de ser interrompido, e ensaiando uma peça de teatro que teve estreia adiada. Agora estou gravando uma série que também foi suspensa, com várias cenas já rodadas. Tenho procurado superar a tristeza da perda de amigos e as interrupções no trabalho com fé em Deus e a certeza de que quando tudo isso passar, estaremos mais fortalecidos”.

"Tenho procurado superar a tristeza da perda de amigos e as interrupções no trabalho com fé em Deus e a certeza de que quando tudo isso passar, estaremos mais fortalecidos" (Divulgação)

“Tenho procurado superar a tristeza da perda de amigos e as interrupções no trabalho com fé em Deus e a certeza de que quando tudo isso passar, estaremos mais fortalecidos” (Divulgação)

A atriz Claudia Netto contabilizou perdas e ganhos. “Perdi amigos e amigos de amigos Não há consolo para isso! Estou longe de minha família, tenho sobrinhos netos, trigêmeos, que moram em São Paulo e não vejo crescerem, darem seus primeiros passos! É ruim não poder encontrar as pessoas que amo, abraçar, confraternizar”, desabafa “Por outro lado, não fiquei paralisada com a pandemia. Como não saí de casa por quatro meses, estudei muito! Concluí meu TCC e me formei em Artes Cênicas após 40 anos de profissão. Também estudei filosofia e física quântica. Depois desses 4 meses, tive uma experiência única: saí de casa para fazer uma turnê da peça DPA, ‘Detetives do Prédio Azul’ em Drive-ins. Com todo protocolo e cuidados, sendo testados semanalmente, usando máscara e face shield em cena. Lotamos todos os lugares e o que me fez mais feliz foi oferecer diversão para as crianças confinadas em casa, dar oportunidade aos pais de levarem suas crianças de uma forma segura, dentro dos seus carros, para assistirem o DPA, o programa mais amado pelo público infantil no teatro. Hoje, só saio para ir para o estúdio gravar o ‘Detetives do Prédio Azul’. Bate e volta. Tive altos e baixos emocionalmente e alguns rompimentos em minha vida pessoal. Estou muito triste, arrasada com tantas mortes e o descaso desse governo com nossas vidas! Tenho medo de pegar Covid e de passar Covid para alguém. Precisamos ser responsáveis, obedecer a quarentena! E torço muito para ter vacina para todos nós o mais breve possível!”.

"Precisamos ser responsáveis, obedecer a quarentena! E torço muito para ter vacina para todos nós o mais breve possível!” (Divulgação)

“Precisamos ser responsáveis, obedecer a quarentena! E torço muito para ter vacina para todos nós o mais breve possível!” (Divulgação)

A humorista Dadá Coelho tem sofrido com a forma como a pandemia vem sendo conduzida no Brasil. “A vida virou um milagre e a morte segue no ar. As ações foram muito mal conduzidas por este governo genocida que está aí. As perdas dessas vidas são irreparáveis. O Brasil virou uma esculhambação macabra: gente aglomerando, gente sem usar máscaras. O que dizer de um país que inventou a ‘vacina de vento’? Isso foi das coisas que mais me assustou. Como alguém finge que deu uma vacina? É de uma psicopatia grande. Vivemos em um país muito desigual, eu passei a enxergar muito mais o outro. É um momento duro e difícil, vamos precisar de muita força e coragem para sair dessa. Tem uma desesperança no ar, mas acho que somos fortes e vamos passar por isso, superar, o Brasil é maior que tudo isso”.

É um momento duro e difícil, vamos precisar de muita força e coragem para sair dessa. Tem uma desesperança no ar, mas acho que somos fortes e vamos passar por isso, superar, o Brasil é maior que tudo isso" (Reprodução)

É um momento duro e difícil, vamos precisar de muita força e coragem para sair dessa. Tem uma desesperança no ar, mas acho que somos fortes e vamos passar por isso, superar, o Brasil é maior que tudo isso” (Reprodução)