Responsável por manter o legado de Cazuza vivo, Lucinha Araújo, mãe do artista, conta sua missão após a morte do filho: “Essa é a minha sobrevivência”


Além de se dedicar à obra do filho, ela também é responsável pela Sociedade Viva Cazuza. A fundação, inaugurada há 25 anos, cuida de crianças e adolescentes infectados pelo vírus HIV. “Eu vou todos os dias na instituição em busca do sorriso do meu filho no rosto dessas crianças”

Ela e uma das mães mais queridas do Brasil. Depois de dar luz ao homem que encantou o país com sua arte e mensagens fortes e atuais, ela foi abraçada por um povo que viu a gravidade de uma nova e perigosa doença. Lucinha Araújo, mãe de Cazuza, é a maior responsável por manter vivo o nome e o legado de seu filho mesmo 26 anos após sua morte pelo vírus da AIDS em 1990. Esta semana, ela teve a honra e a emoção de acompanhar a obra de seu filho pelas vozes de grandes nomes da música brasileira. No palco da Arena Banco Original, evento que rola no Armazém 3 do Boulevard Olímpico, Lucinha Araújo viu de perto artistas como Ney Matogrosso, Baby do Brasil e Alcione entoarem as mensagens de Cazuza para uma plateia animada e emocionada.

Show “Viva Cazuza Sempre” na Arena Banco Original (Foto: Felipe Panfili)

Em entrevista ao HT, Lucinha contou que mais que honrada com a homenagem do show “Viva Cazuza Sempre”, ela se sente orgulhosa pela obra deixada por seu filho. Segundo ela, o poeta e cantor é um ícone da cultura nacional que permanecerá vivo mesmo depois de sua morte. “O Cazuza foi um grande poeta e o Brasil se orgulha muito dele. Eu vejo que meu filho é uma figura como Noel Rosa, que morreu antes de eu nascer, mas eu cresci ouvindo e se mantém vivo até hoje. Então, é isso que eu quero e acredito que vá acontecer: Cazuza estará para sempre entre a gente através de sua arte”, disse.

Por falar na arte do cantor, Cazuza já bradava nos anos 1980 ideias e sensações que estão vivas até hoje no cotidiano do brasileiro. Há mais de 25 anos, ele pedia uma ideologia para viver e que o nosso país mostrasse sua verdadeira cara. Hoje, em tempos de transformações e crises gerais na sociedade tupiniquim, Lucinha Araújo destacou a contemporaneidade do discurso de seu filho. “Ele era muito atual. Os anos se passam e ele continua mais à frente do tempo dele. E eu espero que continue assim depois que eu não estiver mais aqui. Porque, por enquanto, eu grito o nome dele para o Brasil inteiro ouvir”, afirmou Lucinha que imaginou como seria o poeta Cazuza em 2017, em meio a esse panorama no qual estamos vivendo. “Hoje em dia, por exemplo, os políticos não chegam mais ao poder por causa de uma ideologia. Eles só estão lá por causa do dinheiro. Então, é uma situação que eu vejo com muita tristeza. Por isso, eu acredito que se ele estivesse vivo hoje, estaria nos palcos reclamando, lutando e pedindo para o Brasil mostrar a sua cara. Afinal, esta foi uma letra que ele fez há 26 anos e que ainda não aconteceu de fato”, imaginou.

Lucinha Araújo no show “Viva Cazuza Sempre” na Arena Banco Original (Foto: Felipe Panfili)

O fato é que as ideias de Cazuza realmente não têm data de validade. Preocupada em manter vivas essas ideologias, Lucinha contou como são seus dias como mãe do Cazuza. Além de cuidar do legado artístico do filho, ela também é responsável pela Sociedade Viva Cazuza, que atende crianças e adolescentes infectados com o vírus do HIV. “Para mim, essa é a minha sobrevivência. Imagina se eu tivesse que ficar em casa chorando todos os dias querendo meu filho? Isso não ia trazê-lo de volta e não seria nada bom para mim. Então, pelo menos, eu pego o dinheiro que ganho com a arte dele e ajudo as crianças que precisam de mim e que têm a mesma doença que levou o Cazuza. Eu tenho muito prazer com esse meu trabalho, se é que essa doença possa dar alguma sensação boa. Por isso, eu vou todos os dias na instituição em busca do sorriso do meu filho no rosto dessas crianças”, contou emocionada ela que se disse apaixonada por sua maior função na vida: ser mãe. “O sentimento materno, seja biológico ou adotivo, é o mais puro que pode existir em um ser humano. Nem o pai é como a mãe. Apesar de terem muitos maravilhosos, somos nós quem carregamos por nove meses, damos bronca e carinho para os nossos filhos”, completou.

E por falar na doença que matou Cazuza, Lucinha Araújo disse que enxerga a AIDS por duas visões. Segundo ela, a parte boa está atrelada a uma crença de que a cura da doença esteja próxima. No entanto, Lucinha não escondeu a preocupação em ver que os números de novos infectados continuem aumentado. “Eu acho que a cura não está muito longe. Mas, ao mesmo tempo, também vejo com pessimismo porque os jovens esqueceram a importância de usar camisinha e voltaram a se contaminar. A cada dia, o número de adolescentes contaminados aumenta mais e isso me preocupa muito”, disse Lucinha que estima que a cura venha na próxima década. “Eu não sei se eu vou viver para ver. Mas, daqui a uns dez anos, eu acredito que nós já tenhamos um método para acabarmos com essa doença”, idealizou ela que no ano passado completou 80 anos.

Baby do Brasil e Lucinha Araújo no show “Viva Cazuza Sempre” na Arena Banco Original (Foto: Felipe Panfili)