Pelos pavilhões do ArtRio, artistas, curadores e expositores revelam como a arte pode contribuir para um Brasil melhor


Em período que une pré-eleições e um atípico movimento das artes plásticas na capital cultural, HT pergunta qual relação pode existir entre os dois acontecimentos

*Por João Ker

A Feira Internacional de Arte do Rio de Janeiro – ArtRio 2014 termina neste domingo (14/9), com mais de 110 galerias expondo o melhor de seus artistas em uma programação que começou na quinta, praticamente o tempo necessário para percorrer quatro pavilhões lotados com obras de artes (sem contar o armazém 5, onde está a IDA – Feira de Design do Rio, que também já soma uma atração à parte). Chão, paredes, teto, reflexos, portas e passagens se abarrotam com artistas no Píer Mauá, exibindo nomes que vão desde Cândido Portinari a Anita Malfatti, de Andy Warhol a Salvador Dalí, em uma curadoria tanto contemporânea quanto atemporal.

O evento – pareado com outros tantos acontecimentos artísticos que tomaram conta da capital neste fim de semana – é o respiro que o mercado de arte precisava para dar aquela movimentada nas vendas. Basta observar um senhor na casa dos seus 50 anos que, passeando com a esposa, decidiu parar em uma das galerias para comprar um quadro de Mario Testino (com um registro que o fotógrafo fez de Sienna Miller em 2007 e que, mais tarde, estaria eternizado na capa de setembro do mesmo ano, assim como no documentário The September Issue) e acabou levando “no impulso” outras duas obras que, no mínimo, lhe custaram uma centena de milhares de reais.

Na efervescência de pessoas, lançamentos e exposições, HT assume uma daquelas coceirinhas atrás da orelha e quer saber do público do ArtRio: em período pré-eleitoral, quando os candidatos à presidência estão quase se enforcando em rede nacional, como a arte pode contribuir para um país melhor? Como seu envolvimento com o público pode modificar a cabeça de um eleitor e até contribuir para um panorama sociocultural menos acéfalo do que o habitual?

Cristina Schleder, que lança seu livro “Os tapetes Voadores da Mata Atlântica” pelo evento, comenta: “O artista tem suas angústias e usa a arte como um meio de denúncia. Eu, por exemplo, mostro no meu livro não a destruição, mas o belo. No subconsciente de quem está vendo, surge um afeto diferente pela imagem representada, a pessoa passa a prestar mais atenção naquilo que está perdendo. E, claro, a arte como um todo faz as pessoas pensarem , se envolverem em um determinado contexto e observarem as coisas com outros olhos. A informação passada já gera uma cabeça pensante. Quem não entende de determinado assunto e tem contato com ele através da arte, começa a se interessar por aquilo, pesquisa e se informa”.

Cristina fotografou a Mata Atlântica no seu novo livro mas diz que "foi ela quem me escolheu": "O meu olhar é voltado para aquilo que a natureza me oferece", afirma a artista (Foto: Amanda Déa)

Cristina fotografou a Mata Atlântica no seu novo livro, mas diz que “foi ela quem me escolheu”: “O meu olhar é voltado para aquilo que a natureza me oferece”, afirma a artista (Foto: Amanda Déa)

Vinícius Almeida acha que o problema principal está na democratização da arte: “Quando ela atinge a massa de forma mais profunda e cria acesso a esse outro mundo, então ela tem o poder de transformar a visão de uma pessoa sobre determinado contexto”, filosofa com propriedade.

Vinícius tem 24 anos e estuda design na PUC (Foto: Amanda Déa)

Vinícius tem 24 anos e estuda design na PUC (Foto: Amanda Déa)

A osteopata Giliane Altomare já pensa que há uma certa pluralização do conceito de arte: “Toda obra consegue atingir um tipo de público e criar uma reflexão, desde que seja uma arte de alto nível e consiga transmitir tanto seriedade quanto pureza. Isso sim consegue atingir um cidadão e fazer com que ele desenvolva um olhar mais apurado”.

Giliane tem 50 anos e uma paixão não-declarada por obras de arte alegres (Foto: Amanda Déa)

Happy days: Giliane tem 50 anos e uma paixão não-declarada por obras de arte alegres (Foto: Amanda Déa)

Responsável pela galeria Espacio Mínimo, o expositor espanhol Roger Martinez Calvo, de 58 anos, acredita na veracidade com que a obra de arte pode transmitir um recorte da sociedade: “Ela é fundamental para mudar a vida de um indivíduo. Ela representa a imagem mais correta do nosso passado e do nosso presente, deixando uma visão mais ampla para o futuro”.

Roger acredita piamente que a arte é o retrato mais fiel da sociedade: "Até mais do que o jornalismo", afirma. E depois ri em seguida ao ver a cara que o repórter fez  (Foto: Amanda Déa)

Roger acredita piamente que a arte é o retrato mais fiel da sociedade: “Até mais do que o jornalismo”, afirma. E depois ri em seguida ao ver a cara que o repórter faz (Foto: Amanda Déa)

A expositora Luciana Antunes acredita que a arte é um modo de veicular um certo tipo de comentário crítico, mesmo que disfarçado sob outras camadas: “É uma maneira de brincar com os problemas políticos, mesmo que seja através da sátira. Quando a pessoa entende o significado por trás de uma obra, ela tende a se conscientizar sobre determinado assunto”.

Luciana tem 26 anos e  já estava ajudando o país a melhorar através da arte, mesmo que não se gabe do feito. Através da iniciativa ArtRio Social, ela ajudou a recolher verba de leilões e reencaminhar os valores para o Hospital Pró-Criança, que atende vítimas do câncer (Foto: Amanda Déa)

Luciana tem 26 anos e já estava ajudando a melhorar o Brasil através da arte, mesmo que não se gabe do feito: pela iniciativa ArtRio Social, ela ajuda a recolher verba de leilões e reencaminhar os valores para o Hospital Pró-Criança, que atende vítimas do câncer (Foto: Amanda Déa)

André Fábio, responsável pela divulgação da revistas Das Artes no evento, acredita que a cultura tem o poder de abrir a mente das pessoas: “As artes visuais também fazem parte de um sistema  cultural e retratam o cotidiano da sociedade. Essa cultura fomenta ainda mais o pensamento crítico”.

André faz parte do time que distribui cultura e pensamento crítico através da informação (Foto: Amanda Déa)

André faz parte do time que distribui cultura e pensamento crítico através da informação (Foto: Amanda Déa)

A artista Ana Stewart, que exibe seu trabalho pela ArtRio, também acha que a arte é uma maneira de expandir os horizontes culturais e ideológicos de um indivíduo. “Ela requer uma extrema abertura de cabeça, interesse e envolvimento da parte de quem observa. Isso contribui para a assimilação de uma verdade própria, que independe de um autor. É o conhecimento da verdade”.

Ana posa ao lado de seus retratos e afirma: "As associações feitas através da arte são formadas de forma individual e são essenciais para o desenvolvimento de um olhar apurado" (Foto: Amanda Déa)

Ana posa ao lado de um dos seus retratos e afirma: “As associações feitas através da arte são essenciais para o desenvolvimento de um olhar apurado” (Foto: Amanda Déa)

As amigas Cecília Abeid (20) e Rafaela Ribeiro (22) andam juntas, mas com cabeças separadas. A primeira não sabe se a arte funciona como um motor para o pensamento crítico: “Ela é pouco incentivada tanto no mundo acadêmico público quanto no privado. Não há uma oportunidade para as crianças conhecerem e terem acesso a esse tipo de cultura. Já Rafaela acredita que, mesmo sem se propagar “a arte toca na sensibilidade de cada um e, a partir daí, desenvolve uma maior preocupação com o entorno”.

Cecília e Rafaela estudam design juntas na PUC-Rio (Foto: Amanda Déa)

Cecília e Rafaela estudam design juntas na PUC-Rio, mas têm opiniões diversas, revelando que as diferenças podem contribuir para solidificar uma amizade (Foto: Amanda Déa)

Confira abaixo algumas imagens icônicas capturadas no evento por HT:

Este slideshow necessita de JavaScript.

Fotos: Amanda Déa