No Dia Internacional da Síndrome de Down, um manifesto sobre a falta de informação e representatividade na moda


Neste 21 de março, Mateus Gontijo, modelo, a convite da Trama Afetiva, idealizada por Jackson Araujo como plataforma de convergência e pesquisa de estudos em design social e regenerativo sobre inovação para resíduos da indústria de roupas, acessórios e objetos, protagoniza um editorial manifestando que Síndrome de Down não é doença e trazendo luz sobre a urgência da representatividade na cadeia de moda, que é menor que 0,1% em todo o mundo

*Por Jackson Araujo

Quantas pessoas com Síndrome de Down você conhece ou conheceu? Quantas pessoas com Síndrome de Down trabalham com você? E na moda? Quantas pessoas com Síndrome de Down você já viu em campanhas, revistas, redes sociais e passarelas? Neste 21 de março, Mateus Gontijo, modelo, a convite da Trama Afetiva, plataforma de convergência e pesquisa de estudos em design social e regenerativo sobre inovação para resíduos da indústria de roupas, acessórios e objetos, protagoniza um editorial manifestando que Síndrome de Down não é doença e trazendo luz sobre a urgência da representatividade na cadeia de moda, que é menor que 0,1% em todo o mundo. 

 “Eu sou comum, as pessoas têm medo de pessoas com Síndrome de Down” –  Mateus Gontijo, 18 anos, modelo e criador de conteúdos 

Matheus Gontijo / Fotos: Renan Cavicchioli / Styling: Jackson Araujo

TRISSOMIA 21 

A data, criada em 2006 pela organização Down Syndrome International, busca trazer visibilidade a pautas da pessoa com Síndrome de Down e fomentar ações inclusivas pelos 193 países-membros da ONU, uma vez que está presente no Calendário Oficial da organização. Este dia tem como objetivo combater o capacitismo e conscientizar as pessoas sobre a importância da luta pela autonomia, equidade de direitos e inclusão das pessoas com Síndrome de Down na sociedade. 

O dia 21 de março foi inteligentemente escolhido, porque a Síndrome de Down é uma alteração genética no cromossomo “21”, que deve ser formado por um par, mas no caso das pessoas com a síndrome aparece com “3” exemplares (trissomia) 

Entre as características físicas de quem tem síndrome de Down estão: olhos amendoados, maior propensão ao desenvolvimento de algumas doenças e hipotonia muscular. Em geral, as crianças com Síndrome de Down são menores em tamanho e seu desenvolvimento físico, mental e intelectual podem ser mais lentos do que o de outras crianças da sua idade. Mesmo assim, não há relação entre as características físicas e um maior ou menor comprometimento intelectual – o desenvolvimento dos indivíduos está intimamente relacionado aos estímulos e aos incentivos que recebem, sobretudo nos primeiros anos de vida, e a carga genética herdada de seus pais, como qualquer pessoa. 

Matheus Gontijo / Fotos: Renan Cavicchioli / Styling: Jackson Araujo

SÍNDROME DE DOWN NÃO É DOENÇA! 

Pessoas com Síndrome de Down têm muito mais em comum com o resto da população do que diferenças. Um ponto importante a ser ressaltado é que a Síndrome de Down não é uma doença, e sim uma mutação do material genético humano, representando uma condição inerente à pessoa. 

Estima-se que no Brasil, a cada 700 nascimentos ocorre 1 caso de trissomia 21, o que sinaliza em torno de 300 mil pessoas com síndrome de Down (ou mais). Aos pais, o mais importante é descobrir que seu filho pode alcançar um desenvolvimento de suas capacidades pessoais e avançar com crescentes níveis de realização e autonomia. Eles são capazes de sentir, amar, aprender, se divertir e trabalhar, ler e escrever, devem ir à escola como qualquer outra criança e levar uma vida autônoma. Em resumo, eles podem ocupar um lugar próprio e digno na sociedade.

Esta é apenas uma manifestação dele dizendo: olhem pra mim, não para a minha deficiência. É lindo e corajoso. Apresenta uma outra perspectiva que todas as pessoas ligadas à moda podem abraçar. Essas pessoas têm o direito de brilhar, como outras quaisquer. Muitas não se sentem representadas pela Síndrome de Down. 

Matheus Gontijo / Fotos: Renan Cavicchioli / Styling: Jackson Araujo

Desde a infância Mateus explorou sua linguagem corporal, através da dança, ioga, esportes e se inspirando no que via nas passarelas. Atualmente, com 18 anos, o criador de conteúdos digitais e modelo, busca através de seu trabalho inspirar outras pessoas a alcançar seus sonhos e também mostrar que inclusão e autonomia caminham juntos. Mateus foi identificado com a trissomia – 21 quando tinha 8 meses de vida, e é um dos poucos modelos masculinos com Síndrome de Down em nosso país a desfilar para eventos de moda e campanhas publicitárias. 

A Trama Afetiva desenvolve coletivamente um espaço, através de um editorial, que coloca as pessoas no centro dos processos, potencializando discursos e corpos que o design tem invisibilizado. As fotos foram feitas pelo diretor criativo Renan Cavicchioli no Edificio Virginia, onde o projeto ocupou uma das salas com seus vestíveis feitos com a lona resgatada de aterros sanitários por cooperativas de mulheres em situação vulnerável em parceria com o projeto Revoada, as instalações de arte foram feitas em colaboração com Victor Correa, na Design Weekend São Paulo. 

A moda não é mais sobre roupas. É sobre pessoas. Esse pensamento é o que nos move na Trama Afetiva. É o que me move em todas as construções que elaboro dentro e a partir da moda como micropolítica, em que perguntamos: com quem você faz? Para quem você faz? Convidar o Mateus Gontijo para estar conosco é sobre criar conexões aliadas. É sobre aprender com ele sobre representatividade. É sempre um convite para esquecermos a velha máxima da velha moda, o “faça-você-mesmo”. E potencializarmos o “faça-com-os-outros” e “faça-para-os-outros”. A vitória da coletividade passa obrigatoriamente pelo desafio diário de transformar privilégios em responsabilidades. Estar com Mateus exemplifica isso. Abrir espaço para um protagonismo que nunca lhe foi dado – Jackson Araujo, diretor criativo da Trama Afetiva 

Matheus Gontijo e Jackson Araujo, à frente da Trama Afetiva (Foto: Renan Cavicchioli)

Tirar o capacitismo e enxergar esses artistas com todo seu potencial é urgente e necessário.  Não precisamos falar de uma “moda inclusiva”, assim como na sociedade em geral a inclusão pode acontecer naturalmente. Ver as pessoas antes da deficiência pode ser um caminho onde todos se beneficiarão.  Moda é sobre ser, roupa é a ferramenta que nos auxilia a expressar o que queremos ser em cada momento ou fase da vida. Uma sociedade inclusiva é uma sociedade com menos medo, mais criatividade e mais humana. 

CRÉDITOS: 

Direção Criativa e Fotos: Renan Cavicchioli 

Styling: Jackson Araujo

Cenário: “Mostra: Eu e Você Somos Muitas …” Edificio Virginia, Victor Correa

Revisão: Giovanna Amorim