Luciana Scapin e a Rede Muda Mundo contribuindo para uma sociedade mais justa, inclusiva, equitativa e regenerativa


Um dos maiores nomes do empreendedorismo social, Luciana fala sobre os inúmeros projetos no âmbito socioambiental sob o guarda-chuva do Instituto Rede Muda Mundo, um ecossistema colaborativo de negócios de impacto positivo social, ambiental e econômico e cuja frase-chave é perfeita: “A gente (es) colhe o que planta). “Tenho percebido com entusiasmo importantes coalizões setoriais em um exercício conjunto de geração de valor compartilhado. Em tempos em que as relações estão cada vez mais polarizadas, é um tremendo privilégio convidar diversos atores e segmentos para construir coletivamente soluções, afinal de contas seria utopia achar que alguém consegue resolver todas as problemáticas sozinho. Não é uma agenda somente do governo e líderes políticos. Toda a sociedade civil, ONG’s, empresas, academias, faculdades e profissionais precisam trabalhar juntos”

“Vivemos uma expansão de consciência a partir dos indivíduos que está reverberando nos negócios e, consequentemente, na sociedade e no planeta: o despertar para uma nova consciência coletiva. As pessoas podem mudar esse cenário: deixar de beneficiar alguns para beneficiar todos. Do individualismo à interdependência. Tem uma frase do Sistema B Brasil (que reúne empresas que ‘buscam ser melhor PARA o mundo e não apenas as melhores DO mundo’) que eu adoro: “A humanidade é interdependente: uns com os outros e com o planeta”. A análise é de Luciana Scapin, que tem uma linda história de vida no voluntariado, de se doar ao próximo. E você, leitor, vai poder mergulhar aqui nos mais diversos projetos nos quais ela está envolvida como CEO do Instituto Rede Muda Mundo, um ecossistema colaborativo de negócios de impacto positivo socioambiental, cuja frase-chave é perfeita: “A gente (es) colhe o que planta). É composto por iniciativas que promovem a transformação e criam oportunidades para acelerar a mudança que o mundo precisa, contribuindo para uma sociedade mais justa, inclusiva, equitativa e regenerativa.

Luciana Scapin e o inovar sempre com ações coletivas e colaborativas, e grandes parcerias intersetoriais voltadas para o melhor interesse coletivo

Com uma carreira consagrada no universo empresarial, Luciana Scapin, desde os oito anos de idade, pratica em ação a palavra solidariedade. As memórias afetivas da infância sempre permearam a sua atitude para com o próximo e por uma vida melhor. Está à frente de inúmeros projetos, entre eles, Transforma Brasil (engajamento cívico e voluntariado), Porto Social (Educacional, incubação e aceleração), Novo Jeito (mobilização), Purpose & Tals (consultoria e inovação social), sob o guarda-chuva da Rede Muda Mundo. É ainda multiplicadora do Sistema B, executiva com MBA em Gestão de Negócios pela FGV, com curso de extensão em ESG e pós-graduação em Marketing, e também mentora social, palestrante.

“Faço parte da energia de um povo brasileiro, no meio de crenças e oferendas, com muita gratidão expresso minha felicidade, mergulhando nas comunidades, no verde e na sustentabilidade, fazendo aquilo que cura a alma e acarinha meu coração”, pontua Luciana, que sente a força de uma rede, sinônimo de união, impulsionando milhares de pessoas, apoiada por empresas, associações, universidades, instituições religiosa, instituições públicas e toda a sociedade civil que trabalham para mudar o mundo.

A pandemia do coronavírus deixou ainda mais escancarada a importância e necessidade de construir soluções coletivamente, e a Rede Muda Mundo oferece soluções para governo, sociedade civil, academias, personalidades, faculdades, empresas e profissionais. “O fato é que todos precisam trabalhar juntos em prol de uma sociedade mais justa, inclusiva e regenerativa. São mudanças de valores e mentalidades importantes para pessoas e organizações agirem por seus próprios interesses, mas também gerar valor compartilhado para a sociedade e pensarem no futuro do nosso planeta. Não existe sucesso individual se não houver um planeta para habitarmos”, frisa.

O EXEMPLO DE VIDA DE QUEM ESTENDE A MÃO AO PRÓXIMO

Heloisa Tolipan – “A gente escolhe o que planta”. Nos conte sobre sua trajetória pessoal e qual foi a sua opção para plantar na vida?

Luciana Scapin – Existe um ditado que diz: “a palavra convence, mas o exemplo arrasta”. Uma menina, no auge dos 8 anos, observando atentamente as movimentações de alimentos naquela cozinha de casa (que depois tornou-se uma cozinha industrial). Era minha tia Nice cozinhando, embalando e entregando marmitas no inverno de São Paulo. Que felicidade era aquela no meio do caos de panelas e milhares de embalagens? Eu, sem nada de experiência, mas com uma curiosidade gigantesca, ficava vidrada na forma como ela preparava tudo com muito afeto. Foi ali o primeiro match perfeito: identificação com sua filosofia de vida.

HT – A partir daí, você conheceu a realidade das pessoas que moram nas ruas de São Paulo e passou a ajudar a distribuir refeições. O que a marcou para todo o sempre a partir do que seus olhos viram pela primeira vez?

LS – Os três primeiros anos dessa iniciativa foram frenéticos e tudo crescia tão rapidamente que eu me sentia feliz abraçando sempre mais desafios e novas atividades como voluntária nesta dinâmica de distribuição de marmitas para os moradores de rua. Guardo muitas imagens do rostinho de pessoas recebendo alimentos e cobertores. Gestos, palavras e olhares de gratidão. Mas as cenas que mais me emocionavam era ver as famílias unidas, o cuidado entre todos. Sempre juntinhos para se aquecer nos rigorosos invernos nas ruas de São Paulo. O amor é a arma mais valiosa para transformar pessoas, a sociedade e o planeta.

HT – Pode nos contar sobre a decisão de sua família em criar a ONG FOHRUM – Força Humanitária Nosso Lar?

LS – Após alguns anos de vivência nas problemáticas sociais, Tia Nice percebe que distribuir alimentos era importante, mas que estava aparando as folhas ao invés de cuidar da raiz do problema. Ela insistia que precisávamos nos dedicar para romper o ciclo da pobreza através das crianças. Explico alguns argumentos que me recordo ouvir: ‘uma criança que nasce e cresce morando na rua, entende naturalmente que seu limite de projeção de vida está preso àquele contexto vivido e experimentado por ela’. Quais suas aspirações? Em quem se inspiram? Por que não estudam? Quais seus sonhos? Suas principais habilidades? Como fortalecê-las para que tenham oportunidade de serem aquilo que desejam ser? Com essas inquietudes, nasce em 1992 oficialmente a FOHRUM: Força Humanitária Nosso Lar, uma ONG sediada em SP que oferece atividades para crianças e adolescentes da comunidade ao redor da sede.

SUCESSO COMO EMPRESÁRIA E QUEM A INSPIRA

HT – Quando a chamam de empreendedora social, como esta definição reverbera em seu coração?

LS – É engraçado como a gente às vezes entra no “piloto automático” da vida e se distancia das origens, dos valores, daquilo que faz nosso coração bater tão forte que chega a errar as batidas. Inicio minha trajetória profissional no mundo social aos 8 anos, contudo, aos 14 anos, acesso o mercado corporativo tradicional e por lá vivencio uma trajetória de 25 anos em constante ascensão, prêmios, reconhecimentos e posições estratégicas importantíssimas com exposição internacional. E “nas horas vagas” seguia em paralelo as ações sociais.

Até pouco tempo atrás o contexto vivido era de aeroportos, viagens internacionais, palestras, reuniões decisivas para o futuro de uma companhia, com um cargo bastante almejado por muitos executivos do país. Mas onde estava minha essência? O que havia acontecido comigo?

Esqueci essa louca e frenética vida para trás. Quer ousadia maior do que deixar o “estável” e “de sucesso” para ressignificar a atuação que de alguma forma esteja conectado com seus valores e sua origem? “The Paradise is here – OUR HEART”. Hoje sinto que faço parte da energia de um povo brasileiro, no meio de crenças e oferendas, com muita gratidão expresso minha felicidade, mergulhando nas comunidades, no verde e na sustentabilidade, fazendo aquilo que cura a alma e acarinha meu coração.

“Mergulho nas comunidades, no verde e na sustentabilidade, fazendo aquilo que cura a alma e acarinha meu coração”

PURPOSE & TALS EM PROL DO ENGAJAMENTO SOCIOAMBIENTAL

HT – Em 2019, você decidiu unir o social com a trajetória profissional, criando a Purpose & Tals, que oferece soluções para que as entidades realizem ações e iniciativas sustentáveis com impacto socioambiental relevante e mensurável. Qual foi o feedback nesse começo? Recebeu mais solidariedade de empresas com mulheres no comando?

LS – Mulheres empoderadas estimulam tantas outras não é mesmo? Se não fossem algumas mulheres espetaculares eu não estaria onde (e como) estou hoje. Minha Tia Nice já foi citada aqui como a primeira inspiração. Mas uma outra mulher empoderada mudou a minha vida em 2019. Dione Vasconcellos, fundadora da Lola Cosmetics, uma gaúcha que mora há anos no Rio de Janeiro, espalha sua energia e entusiasmo por onde passa misturando o “gauchês” com o “carioquês”. Dione é uma galáxia única, repleta de histórias poéticas, rodeada de constelações, e flutua por aí influenciando sonhos, distribuindo magia e arrecadando transformações de vida à partir de seus conselhos.

O anjo da guarda, Dione Vasconcellos, em ação: “Altruísmo, animação e verdade”, diz Luciana

Comigo não foi diferente. A Purpose & Tals só existe por causa dela e sua irmã Jaqueline Vasconcellos, que, após uma conversa sobre minha história, elas literalmente me empurraram em direção a fazer aquilo que amo, unindo expertise e know how do mundo corporativo, implementando metodologias e boas práticas de eficiência no âmbito socioambiental, para potencializar o impacto positivo. Mais do que apoiadora e incentivadora, foi inclusive a primeira cliente. Dione é minha fonte inesgotável de inspiração e o Brasil precisa conhecer a história de vida dela. Dione veio para este universo munida de altruísmo, animação e verdade. Desfila por aí seu positivismo que pode ser observado também através de cabelos e unhas coloridas e seus trajes característicos de uma paleta recheada de pantones vibrantes!

HT – Quais os 5 pontos que não podem deixar de ser abordados em qualquer de suas palestras no Brasil e no mundo?

LS – Vivemos em constante movimento e mudanças, e é questão de sobrevivência estarmos antenados à dinâmica! Temas como ESG – Environmental, Social and Governance (ESG – sigla em inglês) ou Ambiental, Social e Governança (ASG — em português) -, a Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, o Sistema B, Geração de Valor Compartilhado, Diversidade & Inclusão, entre outros, são cada vez mais presentes em agendas tanto corporativas quanto governamentais. Porém, em todas elas ainda há muito o que desbravar e estabelecer, de modo a gerar valor no curto, médio e longo prazos para todos os stakeholders e para a própria organização.

HT – Quais as delícias e as dores que ficaram em sua alma e sintetizam o momento que estamos vivendo?

LS – Os últimos anos foram marcados pela pandemia do coronavírus e, para aqueles que ainda não tinham percebido, ficou escancarada a importância de que somos uma única comunidade. Fica evidente a urgência em construir soluções coletivamente. Ficou nítido que o “meu comportamento” e “minha ação individual” tem um impacto direto na sociedade e no planeta. Arrisco dizer que, no Brasil, talvez nunca tivéssemos nos preocupado tanto com a solidariedade. Vi empresas, concorrentes e até setores diversos se juntando por algo maior e vibrei com cada ação, porque sabia que era uma ruptura de comportamentos e mentalidades.

De um lado a pandemia deixa estragos irreparáveis, como perdas de entes queridos e a saúde mental da população. As taxas de extrema pobreza, insegurança alimentar, fome e desemprego são assustadoras. Por outro lado tivemos a oportunidade de inovar, com ações coletivas e colaborativas, e grandes parcerias intersetoriais voltadas para o melhor interesse coletivo. Rompemos uma importante barreira e é um caminho sem volta. São mudanças de valores e mentalidades importantes para pessoas e organizações agirem por seus próprios interesses, mas também gerar valor compartilhado para a sociedade e pensarem no futuro do nosso planeta. Não existe sucesso individual se não houver um planeta para habitarmos.

Agenda 2030, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, o Sistema B, Diversidade & Inclusão são alguns dos temas abordados nas palestras de Luciana no Brasil e no mundo

 HT – Como ajudou e estendeu a mão ao próximo durante este período pandêmico?

LS – A Purpose & Tals faz parte da Rede Muda Mundo, um ecossistema colaborativo de negócios de impacto socioambiental. Cada uma das unidades de negócios do grupo se viu obrigada a recalcular a rota durante a pandemia e foram várias iniciativas em todas as empresas do grupo. A condução e liderança das ações de impacto social são de responsabilidade de Navila Teixeira, CEO das ONGs que compõem a Rede Muda Mundo. E ela faz um trabalho magnífico quando o assunto é gerar impacto positivo. Criamos campanhas emergenciais SOS Manaus e SOS Acre, que estiveram em situação de emergência devido ao agravamento da pandemia, surto de dengue, enchentes, além da crise migratória. Realizamos campanha de combate à fome chamada Tamo Junto na Luta, com o envolvimento e engajamento de artistas, personalidades, associações, empresas, setor público e instituições religiosas.

Com o início da vacinação e ansiedade dos brasileiros para a vacina, convidamos a população a ajudar os agentes de saúde com a campanha Tamo Junto da Vacina, no qual voluntários apoiavam nas campanhas de vacinação organizando filas, fazendo triagem e acolhendo os cidadãos nessa fase tão importante. Os profissionais de saúde também estavam cansados e puderam contar com o apoio de voluntários de todo o Brasil. Campanhas de parceiros também foram estruturadas e operacionalizadas pelas empresas do grupo e podem ser conhecidas através do Relatório de Atividades da organização.

REDE MUDA MUNDO – ‘A GENTE (ES) COLHE O QUE PLANTA’

HT – A Rede Muda Mundo é um grupo global, multicultural e multimarca, impulsionado por milhares de pessoas, apoiado por empresas, associações, universidades, instituições religiosa, instituições públicas e toda a sociedade civil que trabalham em prol do impacto positivo. Como se dá essa união? 

LS – Tenho percebido com entusiasmo importantes coalizões setoriais em um exercício conjunto de geração de valor compartilhado. Em tempos em que as relações estão cada vez mais polarizadas, é um tremendo privilégio convidar diversos atores e segmentos para construir coletivamente soluções, afinal de contas seria utopia achar que alguém consegue resolver todas as problemáticas sozinho. Não é uma agenda somente do governo e líderes políticos. Toda a sociedade civil, ONG’s, empresas, academias, faculdades e profissionais precisam trabalhar juntos.

O fator crítico de sucesso está em focar na causa social da iniciativa. A partir da identificação de alguma fragilidade, estrutura-se um projeto, convidamos, convocamos e engajamos os diversos atores para que a solução seja construída coletivamente, cada um contribuindo com seu expertise, atributos e know-how. E não há nada mais generoso do que dispor à sociedade aquilo que sabemos fazer de melhor!

HT – Viabilizar iniciativas que gerem impacto positivo socioambiental. Através de uma coalizão setorial, criando oportunidades para acelerar a mudança que o mundo precisa, contribuindo para uma sociedade mais justa, inclusiva, equitativa e regenerativa. Por favor, as suas considerações.

LS – Ao longo da história os sistemas econômicos foram construídos com foco absoluto no lucro individual, com ganhos a curto prazo e receita da instituição acima das pessoas e do planeta. Passamos a vivenciar de forma mais impactante a desigualdade social e degradação ambiental, entre outros fatores.

A pandemia do coronavírus deixou ainda mais escancarada a importância e necessidade de construir soluções coletivamente, e a Rede Muda Mundo oferece soluções para governo, sociedade civil, academias, personalidades, faculdades, empresas e profissionais. O fato é que todos precisam trabalhar juntos em prol de uma sociedade mais justa, inclusiva e regenerativa.

A causa social a ser trabalhada, assim como a solução oferecida, é construída de forma customizada considerando a atuação de cada parceiro, tendo como foco principal a problemática que estamos atuando.

Não são apenas as personalidades e influenciadores que caminham conosco nessa jornada. Empresas parceiras como Multiplan, Extrafarma e Lola Cosmetics já perceberam que os ganhos individuais a curto prazo só valem se gerar valor à sociedade e ao planeta à longo prazo, ressignificando os negócios e suas atuações. Em destaque temos a Neoenergia, maior grupo privado do setor elétrico brasileiro, como apoiador master oficial do projeto Transforma Brasil. Essa parceria consiste em promover o voluntariado e solidariedade. Há um grande esforço a ser feito para aumentar o engajamento cívico no país. O movimento de cuidar do próximo e realizar doações é fundamental para enfrentar não apenas os efeitos da pandemia, mas para diminuir o distanciamento social e acelerar a melhoria da qualidade de vida de quem mais precisa.

Instituições religiosas, entidades e associações também possuem um papel fundamental e relevante para gerar impacto positivo. A Newlife Church, igreja sediada em Boston EUA, atuou em parceria com o Transforma Brasil no projeto Educar Transforma, um projeto de empreendedorismo e geração de renda para combate ao desemprego e índice da pobreza no Brasil. O Educar Transforma conta com o apoio da DMCard, um grupo de produtos financeiros voltados para a concessão de crédito.

E já que falamos tanto em coalizão multisetorial, vale destacar a importante parceria público-privada entre o Transforma Brasil, Neoenergia e a Prefeitura de Caruaru. Nasce então o Transforma Caruaru, um exemplo brilhante de parceria público-privada com foco em gerar valor para a sociedade.

“A causa social a ser trabalhada, assim como a solução oferecida, é construída de forma customizada considerando a atuação de cada parceiro, tendo como foco principal a problemática que estamos atuando”

HT – De forma geral há um esforço em lançar um olhar mais atento à nova economia. O capitalismo ‘selvagem’ que levou o mundo à busca desenfreada dos lucros individuais, causando desigualdades abissais, miséria, destruição do meio ambiente, entre outras coisas, vem sendo repensado, questionado. As consciências individuais, diante do coletivo também se ampliaram? Acredita que a responsabilidade coletiva é o caminho que vai transformar a sociedade definitivamente?

LS – Empresas, instituições, entidades, associações, todas elas são formadas por pessoas. E somente com essa mudança de mentalidade individual é possível uma mudança na organização. E os números não mentem. Uma recente pesquisa da PWC revela que 76% dos consumidores comprariam de marcas que têm iniciativas ESG e 83% dos profissionais preferem trabalhar em empresas que valorizam o ESG. Outra pesquisa da FleishmanHillard (relatório Gen C) afirma que gera-se 306% a mais de valor vitalício em clientes com relacionamento emocional com uma marca. Isso sem contar a nova geração, os Millennials, que está mudando a forma de consumo.

Mas o que todos esses dados significam? Seja uma pressão interna (acionistas, colaboradores, integração à estratégia ou princípios e propósito da empresa), ou seja por estímulos externos (clientes, legislação, regulamentação vigente, etc), o fato é que vivemos uma expansão de consciência a partir dos indivíduos que está reverberando nos negócios e, consequentemente, na sociedade e no planeta; o despertar para uma nova consciência coletiva. As pessoas podem mudar esse cenário: deixar de beneficiar alguns para beneficiar todos. Do individualismo à interdependência. Tem uma frase do Sistema B Brasil que eu adoro: “A humanidade é interdependente: uns com os outros e com o planeta”.

TRANSFORMA BRASIL

HT – Ser voluntário e engajar-se em projetos sociais faz o indivíduo contribuir para a sociedade, aprender sobre responsabilidade social e desenvolver habilidades. O que é fundamental para tornar-se um voluntário?

LS – O Transforma Brasil é um dos negócios sociais da Rede Muda Mundo e tem como missão transformar o Brasil em uma nação de voluntários. Segundo pesquisa da World Giving Index, no Brasil nem 4% das população faz trabalho voluntário, enquanto que nos EUA esse índice alcança mais de 30% da população.

De fato as ONG’s e pessoas assistidas pelo projeto social são beneficiadas pelo trabalho voluntário. Mas engana-se quem acha serem apenas esses os beneficiados. O indivíduo que faz trabalho voluntário tem ganhos individuais como aprimorar a sensibilidade e empatia, oportunidade de trocas, experiências e aprendizagem com outros integrantes, possibilidade de obter experiências dentro de uma área de atuação, possibilidade de desenvolver ideias inovadoras, melhora no bem-estar sentindo-se satisfeito por fazer o bem e ajudar o próximo, afasta-se do tédio, amplia seu network, aumenta a chance de ser empregado, pois empresas valorizam quem se dedica ao voluntariado.

Não à toa grandes empresas investem em programas de voluntariado, pois, além de gerar valor para as comunidades do entorno, o programa de voluntariado corporativo oferece inúmeros benefícios tais como melhor envolvimento dos colaboradores, aprimora a visibilidade corporativa, recruta talentos, desenvolve habilidades do time e retém talentos, criando forte laço emocional com a marca.

Para fazer trabalho voluntário basta começar. As pessoas podem buscar por atuações em suas áreas específicas, como professores, médicos, enfermeiros. Mas o maior volume de vagas está na doação do tempo, tais como contador de histórias para crianças ou idosos, escrever cartinhas de acolhimento, entre outros.

Tenho outro exemplo bem pertinho para endossar a narrativa de que a força de vontade é o maior combustível para o trabalho voluntário. É a história da Lully, minha filha hoje com 12 anos. Se eu achava que comecei cedo no trabalho voluntário aos 8 anos, era porque ainda estava para nascer a Luisa. Ela inicia aos 5 anos, e por escolha própria. Em uma dessas corridas de rua em São Paulo, ela conheceu e se encantou com o Pernas de Aluguel, uma ONG que leva crianças cadeirantes de abrigos e orfanatos para corridas de rua. O voluntário nesse caso precisa gostar de esportes (corridas de 5k, 10k e 15k) e estar disposto a se divertir revezando na direção das cadeiras de rodas. Luisa rapidamente se aproximou da turma, conheceu o belíssimo trabalho liderado pelo Edu, fundador do Pernas de Aluguel.

Lully, na foto, com a mãe, Luciana, é um exemplo para as novas gerações. Desde os cinco anos, ela se apaixonou pelas ações de voluntariado

Após algum tempo demonstrando dedicação e compromisso, foi convidada para ser a mascote da ONG. Portanto, há 7 anos um dos trabalhos voluntários realizados aqui em casa são as corridas com a turma do Pernas de Aluguel. É uma delícia fazer trabalho voluntário e apoiar Luisa como mascote do Pernas de Aluguel. Costumamos dizer que é emoção em dobro na linha de chegada!

Lully é a mascote da ONG Pernas de Aluguel, que leva crianças cadeirantes de abrigos e orfanatos para corridas de rua

HT – O Pacto Global é uma iniciativa da ONU para engajar empresas e organizações na adoção do crescimento sustentável e da cidadania, por meio de lideranças corporativas comprometidas e inovadoras. A proposta é trabalhar com o segundo setor para implementar a agenda dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs) e é hoje a maior iniciativa de sustentabilidade corporativa do mundo. Você tem alguma ligação com a rede no Brasil?

LS – Junto com o nascimento do CNPJ da Purpose & Tals submetemos o manifesto para ser signatária do Pacto Global da ONU. Segundo o Climate Change and Sustainability Services, da Ernest Young, as informações ESG hoje são essenciais para a tomada de decisões dos investidores. E os critérios ESG estão totalmente relacionado aos ODS, realidade nas discussões no mercado de capitais.

A Rede Brasil do Pacto Global possui uma iniciativa chamada Liderança com ImPacto, que reconhece como porta-vozes dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável alguns líderes empresariais que atuam de forma diferenciada na integração da Agenda 2030 às estratégias do negócio.

Outra forma que tenho de levar a mensagem de que é possível evoluir com negócios mais sustentáveis é como Multiplicadora do Sistema B Brasil. O Sistema B é uma comunidade global de líderes que usam os seus negócios para a construção de um sistema econômico mais inclusivo, equitativo e regenerativo para as pessoas e para o planeta. O Sistema B Brasil existe porque líderes do agora e do futuro já sabem que para o mundo corporativo continuar crescendo positivamente, é preciso que a sociedade e o planeta estejam no mesmo ritmo.

HT – Uma das principais ações foi a criação da agenda dos ODSs em 2015 pela ONU, quando os países signatários se comprometem cumprir 17 grandes objetivos até 2030 para termos uma sociedade mais inclusiva e sustentável. O que tem visto na prática com a Rede Muda Mundo e seus braços de atuação?

LS – Todas as ações, iniciativas e campanhas que atuamos estão conectadas a um (ou mais) ODS’s e todas as ações que geram impacto positivo são lideradas por Navila Teixeira, CEO das ONG’s que compõem a Rede Muda Mundo, minha referência e inspiração em justiça social.

TRANSFORMA BRASIL

ODS 1 Erradicação da pobreza – pessoas em situação de rua: parceria com a ONG SP Invisível para arrecadação de kits de agasalho para moradores de cidades onde o inverno é rigoroso. Foram 5 mil kits distribuídos em São Paulo, Belo Horizonte e Curitiba.

ODS 3 Saúde e bem-estar – Pobreza Menstrual: parceria com o projeto Fluxo sem Tabu para arrecadação de absorventes femininos. Foram mais de 12 mil pacotes de absorventes distribuídos em todo o Brasil.

ODS 10 Redução das Desigualdades – Educar Transforma: projeto apoiado pela DMCard com objetivo de geração de renda e empreendedorismo. Em parceria com a igreja norte-americana Newlife, de Boston, apoiamos 2 projetos para formar e capacitar empreendedores: Sertão Presente no RN e Projeto Haja, no Jardim Gramacho / RJ. A empresária Claudia Cury, filha de Augusto Cury, também fez parte do Educar Transforma e apoiou 4 projetos para capacitação profissionais de pessoas e comunidades que precisam de oportunidades. Foram mais de 1200 pessoas beneficiadas.

ODS 16 Paz, Justiça e Instituições Fortes – Voluntariado, Ação Sorrisos: através de cartinhas, com palavras de força, carinho e esperança, voluntários proporcionaram sorrisos nos lares permanentes de idosos de 2 projetos da plataforma Transforma Brasil.

ODS 2 Fome Zero – Campanha Operação Kg: em parceria com a Cufa, arrecadação e distribuição de cestas básicas para comunidades mais vulneráveis. Foram mais de 26mil kilos de alimentos distribuídos em 5 estados do Brasil.

ODS 10 Redução das Desigualdades – Campanha do Agasalho: arrecadação de roupas, agasalhos e cobertores para doação nos meses mais frios do ano. Foram quase 6.000 peças de roupas doadas.

ODS 8 Emprego digno e crescimento econômico – Campanha São João e Boas Energias: distribuição de cestas básicas para as famílias de baixa renda impactadas pelo cancelamento do São João 2021. Foram mais de 10mil cestas básicas distribuídas em 6 estados do Brasil onde a festa de São João é uma importante alavanca econômica para micro-empreendedores.

PORTO SOCIAL:

Capacitamos iniciativas sociais e investimentos em rede. Conectamos o primeiro, segundo e terceiro setor criando soluções inovadoras que colocam o cidadão como parte ativa e importante para que as mudanças aconteçam. Escutamos as pessoas e trabalhamos todos juntos, porque entendemos que tudo começa com um propósito.

Trilhas educacionais: foram 9 turmas com 250 participantes e um total de 450 horas de conteúdo, beneficiando 3.860 pessoas diretamente e 15.440 pessoas indiretamente.

Imersão: uma imersão em conteúdos sobre histórias, projetos e pessoas reais que transformam desafios locais em soluções de negócios sociais. Foram 4 turmas com 60 participantes beneficiando 240 pessoas diretas e indiretas.

INCS: metodologia de incubação, um programa educacional com 6 eixos basilares: ecossistema, propósito, gestão, pessoas, sustentabilidade financeira e comunicação. O principal objetivo dessa trilha é capacitar e orientar os projetos de impacto social para que eles sejam estruturados e auto sustentáveis. Em 2021 foram 1.000 pessoas beneficiadas diretamente e 4.000 indiretamente.

PLIS: o programa de líderes de impacto social é uma trilha educacional voltada para que líderes, das mais diversas iniciativas sociais, possam se preparar para os desafios do mundo do empreendedorismo. O PLIS está focado no desenvolvimento e empoderamento de impulsionadores sociais – vozes que representam projetos ou causas de importante impacto social. É um programa que cuida de quem cuida de tantos. Em 2021 foram 700 pessoas beneficiadas diretamente e 2.800 pessoas beneficiadas indiretamente.

PS Comunidade: programa de conscientização do uso seguro e eficiente da energia elétrica nas comunidades. Por meio da parceria entre o Porto Social e o Grupo Neoenergia, foi elaborado um diagnóstico social da comunidade da Ilha de Deus, no centro de Recife. O levantamento realizado com ajuda de voluntários que apoiaram na coleta de dados e informações, ajudou no desenho de ações para promover um maior engajamento cívico na comunidade, além de criar relacionamentos e conexões em prol do bem estar social.

Parcerias com o poder público: O Porto Social também desenvolve parcerias com o poder público. Atualmente Teresina PI e Petrolina PE têm um programa de fortalecimento do terceiro setor e estímulo ao voluntariado no município. O objetivo é estimular a relação do poder municipal com a sociedade civil organizada.

Ações emergenciais: Campanha Brennand – foram distribuídos 36.000 kilos de alimentos para famílias do entorno do Instituto Brennand (Recife, Olinda e São Lourenço da Mata).

NOVO JEITO

ODS 3 Saúde e Bem-estar – Projeto Compartilhar que tem o objetivo de prestar atendimento, de forma voluntária, às pessoas que precisam de acolhimento psicológico emergencial especialmente pós-pandemia. Em 2021 foram 19 profissionais voluntários, 316 acolhimentos e 165 pessoas atendidas.

ODS 3 Saúde e Bem-estar – Ação Muda Junto, Doe Sangue, Doe Vida: campanha para estimular a doação de sangue nos hemocentros do país. Em 2021 foram mais de 1.800 pessoas beneficiadas.

PURPOSE & TALS

ODS 10 Redução das Desigualdades – Feminismos Plurais: uma iniciativa idealizada por Djamila Ribeiro, a Feminismos Plurais é o maior streaming antirracista, um espaço virtual de ensino de temas críticos e fundamentais para a compreensão da sociedade brasileira e tem o objetivo proporcionar letramento racial como um importante instrumento de reeducar, numa perspectiva antirracista e, com isso, fortalecer indivíduos, a sociedade em geral e o mercado corporativo na luta contra o racismo.

ODS 16 Paz, Justiça e Instituições Fortes – Exportação da Tecnologia e Inovação Social do Transforma Brasil: iniciamos em 2020 a expansão internacional levando expertise e know-how de engajamento cívico à países como Portugal, Angola, Chile e EUA.

ODS 3 Saúde e bem-estar – Produto Social: uma ação de Marketing Relacionado à Causa para reverter toda a renda de um produto social para uma campanha de crowdfunding para um bebê com leucemia rara que precisava de recursos para logística e tratamento nos EUA.

ODS 2 Fome Zero – Campanha 60 anos Extrafarma: uma ação de endomarketing no qual a cada R$ 1 doado pelos colaboradores a Extrafarma doaria a mesma quantia com o objetivo de arrecadar fundos para o combate à fome no Brasil.

ODS 15 Vida sobre a Terra – apoio à Lola Cosmetics na concepção e divulgação de comunicações de conscientização sobre produtos veganos, sem testes em animais e sem ingredientes com origem animal.

ODS 2 Fome Zero – Ciclofaixa São Paulo e Shopppings Multiplan: arrecadação de mantimentos e alimentos para o combate à fome no Brasil.

ODS 10 Redução das Desigualdades – podcast Ondas Negras: mais um projeto da Feminismos Plurais para levar conteúdo e informação antirracista.

ODS 2 Fome Zero – Campanha Carla Amorim: uma ação de Marketing Relacionado à Causa para reverter um percentual do lucro na semana do Dia das Mães para uma campanha de combate à fome no Brasil.

ODS 16 Paz, Justiça e Instituições Fortes – Dia Nacional do Voluntariado: levamos ao Cristo Redentor uma ação, mapping e representação do voluntariado no Brasil homenageando todos os brasileiros que dedicam parte do seu tempo para engajamento cívico e solidariedade.

ODS 12 Consumo e Produção Responsáveis – apoio à Lola Cosmetics na concepção e divulgação de comunicações de conscientização sobre o plástico, embalagens recicláveis e uso de ingredientes minimamente nocivos às pessoas e ao planeta.

ODS 10 – Redução das Desigualdades – Consciência Negra: em conjunto com a Feminismos Plurais, desenvolvemos uma série de cards e imagens e disponibilizamos para a audiência em geral para que pudessem usar em suas redes sociais a fim de multiplicar e disseminar um conteúdo de conscientização antirracista.

ODS 14 Vida debaixo d’água – lançamento de marca e produtos solares, protetores e bronzeadores, que não contém ingredientes que agridem os corais e a vida aquática, com parte do lucro revertido para projetos que protegem os mares e oceanos (nome e marca ainda não foram lançados e não pode ser divulgado).

CASA ZERO

O primeiro centro social de cultura e responsabilidade cívica do Brasil, com previsão de lançamento na 2ª quinzena de abril. A Casa Zero será o marco da transformação sociocultural, uma iniciativa que cria impacto em escala e pontos de contato com o voluntariado. É geração de negócios e de ação social em um único espaço.

A Casa Zero atuará como um espaço aberto à comunidade, com atividades voltadas para educação e para geração de renda. Um ambiente de capacitação e de oportunidades.

Um dos norteadores de atuação da Casa Zero é causar transformação e fazer diferença para a comunidade do entorno. A Comunidade do Pilar tem cerca de 800 moradores e está localizada em Recife, tendo o 2º pior IDH da cidade.

HT – O Transforma Brasil tem uma ação linda de distribuição gratuita de absorventes para quem não tem condição de comprá-los. Duas sugestões legislativas tramitam no Senado para garantir esse acesso a absorventes femininos, tampões íntimos e coletores menstruais a mulheres, meninas, homens trans e demais pessoas com útero. Na sua visão, por que até hoje o tema não teve a atenção necessária?

LS – No Brasil, 7,2 milhões de mulheres vivem em situação de extrema pobreza, de acordo com a pesquisa Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do IBGE. A pobreza menstrual é um dos reflexos da extrema pobreza, onde existe a escassez de produtos de higiene, assim como condições básicas para praticar a higiene menstrual. Não estamos falando apenas em absorventes, mas saneamento básico, água potável, condições dignas de moradia, acesso à informação e à educação em saúde menstrual.

O fato é que no Brasil e no mundo, tudo que era relacionado à mulher ficou desprezado ao âmbito privado. Por isso, mitos e tabus em torno da menstruação se fortaleceram, impedindo uma discussão objetiva e aberta sobre a saúde menstrual.

No entanto, segundo o Fundo de População da ONU, em seu relatório Pobreza Menstrual no Brasil (ma/21), ter recursos para vivenciar a menstruação com dignidade faz parte dos direitos humanos!

HT – Como acontece a ação da social tech Transforma Brasil junto da ONG Fluxo sem Tabu, que se uniram para distribuir 12 mil absorventes higiênicos em todas as regiões do país? Quantas pessoas devem ser impactadas?

LS – Faz parte da nossa missão capacitar, desenvolver e empoderar líderes sociais que atuam em justiça social e foi assim que nos inteiramos do trabalho desenvolvido pela jovem e inspiradora Luana Escamilla, que fundou o projeto aos 17 anos com o objetivo de ajudar as camadas mais vulneráveis da sociedade, quebrando o tabu da menstruação e colocando em debate a pobreza menstrual no Brasil e no Mundo.

Em uma conversa entusiasmante, Luana compartilha conosco que um de seus maiores sonhos era que a iniciativa crescesse e ajudasse cada vez mais pessoas que menstruam, e que atingisse e impactasse outras regiões do Brasil, já que sua atuação era apenas em São Paulo.

Pra nós foi um grande estímulo atuar em mais essa causa, e saber que através da nossa rede de 1 milhão de voluntários 4.500 projetos sociais poderíamos levar o benefício à todos os cantos do Brasil. No total foram 12.000 pessoas beneficiadas diretamente e esse impacto só foi possível graças à 120 projetos e iniciativas sociais espalhadas em todas as regiões do Brasil.

HT – Além de ser uma questão de higiene e saúde, a situação de pobreza menstrual pode comprometer períodos da vida escolar, atividades de trabalho, a vida social, e consequentemente afetar a autoestima e dignidade humana. Que considerações poderia fazer sobre esse cenário?

LS – A necessidade de enfrentamento da pobreza e redução das desigualdades incorpora urgência ao tratamento do problema da pobreza menstrual e seu impacto nas futuras gerações.

De acordo com o Relatório Pobreza Menstrual no Brasil do Fundo de População da ONU (ma/21), além dos efeitos intergeracionais de não garantir o direito à dignidade menstrual das meninas, há um impacto econômico imediato gerado pela falta de políticas públicas adequadas, que respondam à pobreza menstrual agora, enquanto as meninas, meninos trans e pessoas não binárias vivenciam sua adolescência, um momento decisivo para o seu desenvolvimento. A negligência de necessidades menstruais resulta em problemas que poderiam ser evitáveis, desde alergias/irritações, evasão escolar até aqueles que podem resultar em óbitos, como a síndrome do choque tóxico. O investimento adequado na saúde menstrual pode prevenir tais problemas. Além disso, a falta de acesso aos direitos menstruais pode resultar ainda em sofrimentos emocionais que dificultam o desenvolvimento do pleno potencial das pessoas que menstruam.

HT – Que tipo de inciativas podem se unir a esta ação? Como a sociedade ou empresas podem se juntar ao projeto?

LS – Através da parceria com o Fluxo sem Tabu, vimos que a partir de um sonho, de uma justiça social liderada por Luana, pudemos ampliar a atuação e levar não apenas os benefícios dos absorventes, mas também a mensagem e conscientização ao tema. Esse é o nosso papel: conectar, juntar, somar, para ampliar o impacto positivo.

Pessoas de uma forma geral podem contribuir levando absorventes no ponto de coleta físico na cidade de São Paulo localizado na faculdade FAAP ou acessando o site do Fluxo sem Tabu para fazer sua doação.

As empresas têm um poder maior de impacto através de ações estruturadas de conscientização e apoio à causa, e nós oferecemos todo o expertise e know how para construção de campanhas customizadas a fim de apoiar essa e outras causas que façam sentido com a estratégia e propósito da organização.

HT – Em uma época cuja velocidade da informação e tecnologia é de alta potência como alinhavar sonhos e torná-los realidade?

LS – Em tempos em que as conexões digitais roubam o contato físico, é um desafio diário transmitir a essência e sentimentos que uma causa social pode oferecer. Em contrapartida, os últimos tempos também mostraram que as pessoas não querem mais relações vazias e efêmeras. É preciso viver hoje, abraçar hoje, sentir-se bem hoje. Um abraço apertado, de um coração com outro coração, do querer o bem, pode iluminar e contagiar quem está ao redor.

Mesmo antes da pandemia, o Brasil já liderava alguns rankings de transtornos mentais. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) colocam o país na primeira posição em prevalência de ansiedade, com mais de 18 milhões de pessoas sofrendo do problema. Isso equivale a 9,3% da população brasileira.

Quem vive de doenças mentais tem uma luta diária insana. E a solidariedade pode ser um exercício importante no combate à depressão e ansiedade. Veja como exemplo o DJ Alok. Em 2021, ele fala abertamente sobre depressão e diz que se curou após se tornar mais solidário.

De outro lado estão aquelas pessoas que não foram diagnosticadas com doenças mentais, mas buscam por mais essência e propósito em suas vidas. É preciso resgatar nossos valores, aquilo que nos move. E depois conectar à esse motivo nossas principais habilidades, para colocar em prática nossa missão de vida.

De forma prática, costumo indicar um exercício pessoal de auto-ajuda e processo reflexivo de si próprio utilizando a Mandala Ikigai. Uma metodologia que ajuda a encontrar o trabalho ideal unindo vocação, propósito e impacto.

HT – Como o meio ambiente, a sustentabilidade, a economia criativa, o zero waste em prol de um mundo melhor têm sido objetivos em sua vida profissional?

LS – Os valores pessoais precisam estar alinhados com os objetivos profissionais, caso contrário, a conta não fecha. E comigo não é diferente. Meus primeiros salários (ainda aos 12 anos de idade no bazar da FOHRUM) eram destinados a um boleto mensal de apoio à SOS Mata Atlântica, minha 2ª instituição do coração escolhida ainda criança. Sou vegetariana desde essa época, e a cada leitura sobre o desmatamento na Floresta Amazônica me distancio ainda mais do vegetarianismo e me aproximo do veganismo (em um processo transitório). Em casa nosso estilo de vida é de uma família consciente, sem plásticos, sem desperdícios, com carro elétrico e reciclagem de lixo. Portanto os projetos e iniciativas que chegam até nós com vieses de meio ambiente e sustentabilidade nos reviram do avesso, nos encantam, e nos motivam a desempenhar um trabalho impecável não apenas por abraçar o desafio de um cliente parceiro, mas também por saber que estamos construindo um futuro mais sustentável, deixando um legado para gerações futuras. Digo “nós”, porque a Purpose & Tals é muito além da Luciana Scapin. Sou apenas a ponta do iceberg que representa um timaço cheio de valores e propósitos.

Temos uma equipe bastante plural, todos conectados pela justiça social. Cada um deles possui uma história de transformação de vida a partir do trabalho na Purpose & Tals. Um de nossos talentos por exemplo foi nascido e criado na Favela do Feijão, em São Gonçalo/RJ, e passava por necessidades básicas e condições de moradia muito precárias. Frequentava um projeto social em Niterói e lá o conheci. Ele tinha um talento nato para artes. Após investimentos e cursos em artes, Jhon desenvolveu suas habilidades. Hoje mora em São Paulo e encanta os clientes da Purpose & Tals através de toda sua arte criativa.

Cada integrante da equipe possui suas causas preferidas. No entanto, por vezes chegam até nós algumas problemáticas das quais não tínhamos tanta noção das dimensões. Isso aconteceu com a pobreza menstrual. Sabíamos que era uma questão importante, mas quando tivemos conhecimento sobre os indicadores e os estragos, vimos o quanto era essencial atuar nesse tema. A partir disso torna-se uma causa do coração. Por isso costumo dizer que a educação, o conhecimento, pode despertar em nós a consciência e por fim a ação de querer transformar realidades.

HT – Tenho frisado que se o movimento global aponta para tantas revoluções tecnológicas, inteligência artificial, mas também uma conscientização sobre “quem produziu o produto que escolhi?”, “de que forma foi produzido?” e “como foi o impacto dessa produção no meio ambiente”, nós estamos vivenciando um novo tempo no comportamento humano. Tempo de se fazer uma reflexão, adquirir o autoconhecimento e se unir com o próximo e mergulhar na sustentabilidade para um futuro melhor no agora. Como a sustentabilidade passou a ser ponto primordial na Rede como um todo?

LS – Há alguns anos percebemos o surgimento do novo consumidor: mais informado, mais exigente e mais consciente. De acordo com a 14º edição anual do Global Consumer Pulse Research, da Accenture Strategy, 83% dos consumidores brasileiros preferem adquirir produtos e serviços de empresas que se posicionam em relação a causas alinhadas a seus valores e crenças pessoais e dispensam as que preferem se manter neutras. Nesta mesma pesquisa, 77% dos consumidores brasileiros afirmam que suas decisões de compra são impulsionadas por valores éticos e autenticidade das empresas.

Isso significa dizer que as empresas precisam repensar e buscar por soluções e inclusive envolver toda a sua cadeia de suprimentos para uma atuação com sustentabilidade. Anos atrás presenciamos empresas criando suas áreas de Sustentabilidade (ou Responsabilidade Social Corporativa), tendo uma atuação periférica na estratégia das organizações. Agora faz-se necessário que a sustentabilidade esteja no cerne da estratégia, missão e propósito da companhia. Propósito e lucro devem caminhar juntos. Indicadores de impacto socioambiental devem ter a mesma prioridade nas organizações que os impactos de vendas e receitas possuem há anos.

Somos um ecossistema de negócios de impacto socioambiental. Todas as unidades de negócio já nasceram com a missão de causar impacto positivo. Mas não fomos inovadores nesse contexto. Existe um novo setor da economia denominado como setor 2.5. Não estamos falando do setor privado (segundo setor), que visa apenas o lucro sem cuidar das pessoas e do planeta. Também não estamos falando do terceiro setor, que causa impacto positivo mas que ainda depende muito de filantropia. Estamos falando de uma nova faixa da economia de empresas que geram suas próprias receitas (2º setor), porém seu produto final impreterivelmente precisa gerar impacto positivo (3º setor).

O tema ESG nas empresas ainda se constitui como diferencial, mas se tornará uma questão de sobrevivência para as empresas.

HT – Pesquisas recentes mostram que os consumidores darão preferência a marcas com proposta e que tenham uma pegada claramente social e de sustentabilidade.

LS – Isso já é uma realidade e os índices tendem a aumentar consideravelmente ano a ano. E não estamos falando em filantropia, e sim um capitalismo consciente. O CEO da BlackRock, Larry Fink, há quase uma década busca convencer seus clientes (empresas) a abraçar o novo capitalismo. Mas sua recente carta de 2022 trouxe um tom diferente. Ele já não se mostra preocupado em fazer os CEOs compreenderem a importância do ESG. Com a força da maior gestora do mundo, com 9,5 trilhões de dólares em ativo, Fink está cobrando planos e resultados.

Ele diz que nunca foi tão importante que os demonstrem ter uma estratégia consistente para suas empresas. E justifica com números. “Há dois anos escrevi que risco climático é risco de investimento. E, nesse curto período, vimos um deslocamento gigantesco de capital. Os investimentos sustentáveis atingiram USD 4trilhões”, aponta. “Isso é apenas o começo – o gigantesco deslocamento para os investimentos sustentáveis ainda está acelerando.”

Fink foi brilhante em afirmar que “o Capitalismo para Stakeholders não é sobre política. Não é uma agenda social ou ideológica. Não é um “acordado”. É capitalismo, impulsionado por relacionamentos mutuamente benéficos entre você e os colaboradores, clientes, fornecedores e comunidades em que sua empresa depende para prosperar. Este é o poder do capitalismo. (…) é por meio do Capitalismo para Stakeholders que o capital é alocado de forma eficiente, as empresas alcançam lucratividade durável e o valor é criado e sustentado no longo prazo.”