Day Mesquita: ‘Talento para trabalho como ator e sucesso de uma obra não devem estar ligados a número em rede social’


A atriz encerra seu contrato com a Record após viver sua segunda protagonista em ‘Amor Sem igual’, e fala dos novos desafios na carreira. Day também opina sobre o fato do número de seguidores nas redes sociais passarem a ser termômetro para escalação de algumas produções com pessoas que nem estudaram arte. Além disso, ela também comenta sobre o machismo que ajudou a colocar em evidência com seus últimos papeis: “Vivemos em uma sociedade patriarcal e por isso, nos deparamos com situações que foram naturalizadas, reproduzidas, mas que não deveriam ser. Não sou exceção à essa que parecia ser, até bem pouco tempo atrás, uma infeliz regra. Temos uma ‘herança’, até inconsciente, que faz nossas ações seguirem hábitos que precisam ser repensados e mudados. Como, por exemplo, quando rimos em situações desconfortáveis, porque achamos que se não fizermos isso seríamos indelicadas, quando na verdade, indelicado é quem nos coloca em situações constrangedoras. É o machismo incorporado!”

Day Mesquita (Foto: Adri Lima)

*Por Brunna Condini

Com o advento do ator-celebridade, muitas escolhas em produções audiovisuais parecem vir ‘casadas’ entre o perfil para o personagem e o número de seguidores nas redes sociais dos atores ou atrizes. Muitos artistas já se pronunciaram criticando o ‘requisito’, como Maria Zilda e Natallia Rodrigues. Mais recentemente, Armando Babaioff também declarou sua insatisfação com um teste de elenco que recebeu via WhastApp. No Twitter, o ator mostrou o print de uma seleção que exige atores que tenham, no mínimo, 10 mil seguidores no Instagram. A crítica do ator não é a quem é seguido, e sim, ao que vem se resumindo o ofício do ator, para quem o escala. A atriz Day Mesquita com 16 anos de trajetória profissional também não aprova o ‘critério’.

“Nunca fui eliminada de algum processo baseado em número de seguidores… Não que eu saiba, eu espero que não!. Acho isso quando colocado como requisito para um papel totalmente equivocado. Afinal, o talento para um trabalho como ator, e até o possível sucesso de uma obra, não está ligado aos números nas redes sociais. São bem distintos, têm muita gente talentosa com milhões de seguidores e igualmente também têm as que são muito talentosas que nem mesmo rede social tem. Uma coisa não tem nada a ver  (ou não deveria ter) com a outra”.

"Nunca fui eliminada de algum processo baseado em número de seguidores... não que eu saiba, eu espero que não! (risos). Acho isso quando colocado como requisito para um papel, totalmente equivocado" (Foto: Adri Lima)

“Nunca fui eliminada de algum processo baseado em número de seguidores… não que eu saiba, eu espero que não! (risos). Acho isso quando colocado como requisito para um papel, totalmente equivocado” (Foto: Adri Lima)

Atualmente, ela pode ser vista nas novelas ‘Além do Horizonte’ e ‘Cheias de Charme’ no cardápio da Globoplay e na série ‘O Negócio’, disponível na HBO Max. E é na linha de pensamento que a trouxe até aqui, contando com seu talento e determinação que Day pretende ser escalada para novos trabalhos. A atriz vive um período de ‘entressafra’, depois de dar vida à sua segunda protagonista em ‘Amor sem Igual‘, despedindo-se da Record após dois anos: “Meu contrato na verdade chegou até a ser estendido por conta da novela, mas já era previsto que a vigência fosse até o fim de 2020. Era algo que fazia parte do nosso planejamento, tanto o meu, quanto o da emissora, desde quando assinamos, a não ser claro, que eu estivesse com alguma obra ainda no ar, que acabou sendo o caso”. A atriz já está envolvida em outro trabalho, mas o novo job ainda está cercado de mistério: “Fui convidada para fazer uma série, mas ainda não posso antecipar detalhes uma vez que não fechamos. Mesmo tendo saído do ar esse ano, já estou com muita saudade das gravações”.

"Fui convidada para fazer uma série, mas ainda não posso antecipar detalhes uma vez que não fechamos. Mesmo tendo saído do ar esse ano, já estou com muita saudade das gravações e também dos palcos" (Foto: Adri Lima)

“Fui convidada para fazer uma série, mas ainda não posso antecipar detalhes uma vez que não fechamos. Mesmo tendo saído do ar esse ano, já estou com muita saudade das gravações e também dos palcos” (Foto: Adri Lima)

Voz feminina

Aos 35 anos, Dayenne Proença Mesquita, a Day, vem trilhando seu caminho de forma assertiva, sempre ligada às suas escolhas e ao que elas representam. Feminista, vem usando sua voz na arte para levantar questões importantes. Na última novela viveu uma garota de programa que sofreu abuso sexual, e antes disso, deu vida à personagem histórica Maria Madalena da trama bíblica ‘Jesus’ (2019). Ambas mulheres subjugadas e julgadas, por exercerem sua liberdade. Sobre o tema, ela fala da própria experiência.

“Vivemos em uma sociedade patriarcal e, por isso, nos deparamos com situações que foram naturalizadas, reproduzidas, mas que não deveriam ser. Não sou exceção à essa que parecia ser, até bem pouco tempo atrás, uma infeliz regra. Temos uma ‘herança’, até inconsciente, que faz nossas ações seguirem hábitos que precisam ser repensados e mudados. Como, por exemplo, quando rimos em situações desconfortáveis, porque achamos que se não fizermos isso seríamos indelicadas, quando na verdade, indelicado é quem nos coloca em situações constrangedoras!”, observa Day. “Já vivi muito isso de fingir que achei graça de algo sem noção para não soar mal-educada. E não era gentileza da minha parte, só um pensamento machista já incorporado que faz com que a gente compre isso. Hoje já identifico essas situações com mais facilidade, e me imponho, por mim e por outras mulheres”.

"Fico feliz por ter interpretado personagens como essas que podem, através desses trabalhos, colocar uma lupa em situações de machismo que elas viveram, nos fazendo repensar nas atitudes que temos e que os outros têm com a gente" (Foto: Adri Lima)

“Fico feliz por ter interpretado personagens como essas que podem, através desses trabalhos, colocar uma lupa em situações de machismo que elas viveram, nos fazendo repensar nas atitudes que temos e que os outros têm com a gente” (Foto: Adri Lima)

E completa: “Mulheres ganham em média 30% a menos do que os homens desempenhando as mesmas funções e muitas vezes trabalhando mais. Precisamos cada vez mais falar e entender que certas situações não são aceitáveis e não podem ser normalizadas simplesmente porque foram assim até hoje. Temos que olhar tudo de uma forma mais humana e igualitária, sem um filtro pré-estabelecido pela sociedade e cultura na qual vivemos. E fico feliz por ter interpretado personagens como essas que podem, através desses trabalhos, colocar uma lupa em situações de machismo que elas viveram, nos fazendo repensar nas atitudes que temos e que os outros têm com a gente”.

Voz pela sustentabilidade e os animais

Day também usa sua visibilidade para levantar as bandeiras do vegetarianismo e veganismo. A artista é embaixadora da Sociedade Vegetariana Brasileira e da campanha Segunda sem carne. “Sou vegetariana. Só acho justo dizer que é vegano quem realmente come zero derivados. Eu já não como carne há quase 10 anos. Mantinha peixe às vezes, que parei também há 3 meses. Minha mãe é vegetariana há 20 anos e acho que o exemplo dela dentro de casa me fez pensar e buscar saber mais sobre o assunto. Quanto mais me informava sobre a indústria pecuarista e seus modos de produção, mais foi ‘virando uma chavinha’, até começar a enxergar um prato diretamente associado a como ele chegou à minha mesa. A minha decisão em parar o consumo de carne foi pensando na exploração, sofrimento e morte animal. E não fazia sentido para mim manter essa prática, já que o amor e cuidado aos animais sempre foi muito forte em mim”.

Amor que ela exerce através da militância e na vida pessoal. Day adotou a cachorrinha Ayla em dezembro passado e conta que o amor pelos bichos vem de longa data, bem como seu envolvimento nas causas animais. “A Ayla está prestes a completar um ano de vida. Já tive uma cachorrinha que ganhei aos 11 anos, que queria muito, ela já faleceu há alguns anos e eu a amava demais, mas a Ayla foi minha primeira adoção, o que a fez ter um lugar bem especial na minha vida”. E destaca: “Com certeza ter um animal ajuda não só a atravessar esse momento, mas durante a vida de qualquer um. Quem tem pet sabe que muda o astral da casa. Acho que ter um animal adotado muda ainda mais, parece que dá para sentir o amor e gratidão por ter podido fazer algo que mudasse a história de vida do animalzinho, que passou por um abandono e até por maus tratos. Desde que adotamos a Ayla adicionamos mais uma boa dose de amor às nossas rotinas”.

"A Ayla foi minha primeira adoção, o que a fez ter um lugar bem especial na minha vida" (Reprodução Instagram)

“A Ayla foi minha primeira adoção, o que a fez ter um lugar bem especial na minha vida” (Reprodução Instagram)

A atriz também ressalta que os movimentos em prol da defesa animal continuam precisando de mais atenção e adesão. “Infelizmente, vemos muitos abrigos e protetores fazendo o impossível para manter os cuidados com os animais recolhidos, mas ainda vemos esses lugares passando por situações difíceis por falta de apoio, então quanto mais atenção, doações, mais disseminação de informações, mais podemos criar uma rede de apoio que por consequência também ajude mais bichinhos. A situação dos abrigos para animais que já era muito complicada, infelizmente se potencializou ainda mais com a pandemia. Eu acho que nesse momento, mais do que nunca, a união, o olhar ao próximo e a empatia ajudam  muito e fazem diferença em questões como essa. Por isso estou sempre divulgando a adoção responsável, além de formas mais concretas e fáceis de ajudar abrigos e protetores. Às vezes as pessoas podem realmente não saber que a ajuda pode ser dada de diversas formas. E como aconteceu comigo ao ver a foto da Ayla, pode acontecer com outras pessoas, e divulgando, estaremos aumentando a chance deles encontrarem lares. Muitos atos simples podem fazer a diferença, basta só um pouquinho de informação e vontade de ajudar. Então, se eu puder ser uma voz ativa nessa rede de informações e por melhores condições para os animais, e fizer a diferença para pelo menos um deles, já me sinto realizada e feliz demais”.

"Se eu puder ser uma voz ativa nessa rede de informações e por melhores condições para os animais, e fizer a diferença para pelo menos um deles, já me sinto realizada e feliz demais" (Foto: Adri Lima)

“Se eu puder ser uma voz ativa nessa rede de informações e por melhores condições para os animais, e fizer a diferença para pelo menos um deles, já me sinto realizada e feliz demais” (Foto: Adri Lima)