Coronavírus: profissionais de diversas áreas dividem desafios de atender o público em tempos de pandemia


Em um incerto mundo novo, que se apresenta e se abre com a pandemia da Covid-19, profissionais renomados compartilham suas experiências, apreensões, e esperanças. Ouvimos com exclusividade, Malvino Salvador e a mulher Kyra Gracie, donos de academia Gracie Koe, a atriz Regiane Alves, proprietária de restaurantes. Além dos médicos Alessandro Martins (cirurgião plástico e intensivista), Leonardo Stambowsky (cirugião vascular), a dermatologista Andréa Duarte e o professor de inglês Paul Walsh. Vem saber! E torcer pelo melhor com a gente!

*Por Brunna Condini

A pandemia do novo Coronavírus e a recomendação do Ministério da Saúde e da Organização Mundial de Saúde (OMS) de isolamento social vem causando uma mudança de comportamento nas pessoas. E isso se estende aos profissionais de todas as áreas, principalmente, aqueles que dependem de um contato mais direto com outras pessoas para atuar. Os meses da população em recolhimento exigem que eles se reinventem na forma de atender seu público e clientes, até porque a tendência é que muitos dos novos hábitos adquiridos na quarentena sejam implementados ou permaneçam por muito tempo. Um mundo novo tende a se abrir pós-pandemia. E a resiliência na transformação deve ser um exercício.

Donos da academia Gracie Koe, na Barra da Tijuca, o ator Malvino Salvador, e sua mulher, a lutadora de Jiu-Jitsu Kyra Gracie, falam das alternativas experimentadas na fase, que não se sabe quanto vai durar. “Abrimos o nosso currículo e aulas online. O aluno pode ter acesso de qualquer lugar do mundo. Sendo empreendedora, tenho que colocar a cabeça para pensar em uma solução. Não é fácil, nem todo negócio tem essa oportunidade. Mas nós encontramos esse caminho”, conta Kyra. E Malvino acrescenta: “Levamos mais de dois anos criando a metodologia de ensino da Grace Kore. Nós sabemos exatamente os pontos que trabalhamos e o que nos fortalece. Quando se tem um negócio, você precisa saber os seus pontos fortes. O que fizemos, nesse momento, foi adaptá-los à nova realidade e colocá-los online para nossos alunos e possíveis novos integrantes”.

Malvino Salvador e Kyra Gracie: “Abrimos o nosso currículo e aulas online. O aluno pode ter acesso de qualquer lugar do mundo” (Reprodução Instagram)

O casal fala da rotina com as filhas, Ayra, 5 anos, e Kyara, 3, em casa. “Tem um lado que esse isolamento nos permite: é ver o crescimento das meninas a todo momento, sabe? Estamos sempre em movimento, trabalhando, cumprindo prazos. E, agora, a gente vai percebendo o amadurecimento das conversas, do vocabulário, das brincadeiras. Esse é o único lado positivo disso tudo. É vivenciar cada experiência. A gente sempre esteve ao lado delas, no entanto, agora mais ainda. Kyra e eu temos acompanhado muito o aprendizado das aulas online. E ensiná-las é muito prazeroso”, divide Malvino.

Kyra afirma que o fato de ter uma rotina de atleta também facilita em passar pelos desafios na atual fase. “Tem a parte da resiliência, superação e paciência, que são extremamente importantes para o momento que estamos vivendo. Dentro do tatame precisamos trabalhar esses valores para alcançar a vitória e até mesmo para aceitar as derrotas. São valores do tatame para vida, afinal todos nós temos nossas lutas diárias’, ensina.

Resiliência, superação e capacidade de adaptação também estão na rotina do cirurgião plástico Alessandro Martins. “Meu dia a dia mudou totalmente. Estou acompanhando pós-operatórios por atendimento online e as consultas de primeira vez tem sido destinadas a pacientes com câncer que não podem esperar a pandemia passar por se tratar de urgência (o médico, além da cirurgia plástica, estética e reparadora, tem ampla experiência em reconstrução das mamas pós-mastectomias por câncer e é formado em cirurgia plástica pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA), no Rio de Janeiro). Mas tenho mergulhado neste momento da pandemia no trabalho em unidades de tratamento intensivo. Sempre atuei como intensivista em paralelo ao trabalho na clínica. Com a pandemia, essa atividade tem permeado meus dias e noites. É gratificante esse canal de apoio a uma população que precisa de ajuda”, analisa Alessandro. Mas, ainda assim, ele e todos os médicos tem encarado um mundo relativamente novo no enfrentamento à Covid-19 estando na linha de frente do tratamento contra o vírus. “É uma doença nova. Até porque tem muitos protocolos sendo publicados e mudando com muita frequência. O paciente que testou positivo muitas vezes está em estado crítico e precisa de cuidados na UTI. Evolui com ciclos de melhora e de piora que são acompanhados com extrema atenção. E não há ainda uma medicação que a gente consiga definir como aquela que controle exatamente a doença. Tudo no tratamento é um desafio constante”, diz o médico que continua salvando vidas.

Dr. Alessandro Martins: “A rotina de quem está na linha de frente do tratamento de pacientes com coronavírus depende de ter amparo para o exercício da profissão com EPIs, disciplina para que não dissemine a doença e não se contamine” (Foto: Vinicius Mochizuki)

Alessandro já havia nos contado que as cirurgias eletivas ficaram mais restritas. E, no caso da cirurgia plástica, normas específicas estão sendo seguidas. No entanto, existem cirurgias que não dependem dessa restrição, como as de pacientes com câncer – que têm um prazo para serem submetidos a uma operação -, vítimas de acidentes e de queimaduras, entre outras. “Cito um exemplo do câncer de mama relacionado à quimioterapia ou radioterapia e que há um momento ideal para a operação proporcionando um bom controle da doença. Esses pacientes não podem perder o timing do tratamento”, pontua, acrescentando: as cirurgias estéticas e outras que não têm tanta premência estão sendo remarcadas. Dessa forma, vamos conseguir manter os hospitais livres para os casos graves em geral e médicos e pacientes estarão fazendo o bem para que retornemos o mais breve possível com as cirurgias que tanto proporcionam auto-estima e bem-estar”.

Ele aposta que as mudanças adotadas no mundo em quarentena devem continuar como hábitos no pós-pandemia. “Acredito que todos os cuidados adquiridos e maiores com a higiene devem permanecer como hábitos primordiais”, frisa.

Nada será como antes

A atriz Regiane Alves, também é empreendedora. Sócia dos restaurantes Puro, no Jardim Botânico, e também, do Ella Pizzaria, no mesmo bairro, e do Massa, no Leblon, ela diz que o momento é delicado e demanda todos os cuidados recomendados. “O Puro está fechado no momento. E o Ella e o Massa estão funcionando no sistema de delivery ou você pode ligar e busca no local. Está muito difícil, mas acho que a saúde de toda população está em primeiro lugar. Temos que seguir o que a OMS determina, e estamos pensando nos funcionários”, avalia.

A atriz acredita que o momento crítico, também pode ser a oportunidade de reinvenção e de busca de alternativas. “Acho que isso tudo vai ter um impacto muito grande. Não tem como, todo mundo já está sentindo. Mas as pessoas estão negociando tudo o que é possível: mensalidades das escolas dos filhos, os fornecedores do restaurante estão dividindo os valores para que a gente consiga acertar tudo. Muita gente vai ter problema. Temos que ser criativos, divulgar nas redes para as pessoas saberem que podem ir lá e pegar a comida. E tomamos decisões administrativas, como a concessão de férias para alguns funcionários. É um momento de reinvenção, mas de análise da realidade também”, reflete.

Regiane e os filhos João Gabriel e Antônio: “Acho que podemos nos voltar para a simplicidade e espiritualidade. Nunca estivemos tão isolados e, ao mesmo tempo, tão conectados” (Foto: Pino Gomes)

Regiane enxerga, mesmo no meio do caos e das incertezas, um momento na sociedade de criar melhores padrões de comportamento. “A reinvenção que vivemos é de tudo. De como a gente levava a vida, a casa, o tipo de consumo. Você percebe que consumia muito e que pode diminuir. Acho que podemos nos voltar para a simplicidade, acredito que espiritualmente é algo que veio para a gente se conectar. Nunca estivemos tão isolados, e ao mesmo tempo, tão conectados. É uma coisa dúbia e muito louca. Você está nas redes sociais, vendo o que está acontecendo, os amigos aparecem, amigos antigos querem saber como você está. Acho que temos que ter calma, seguir os conselhos, não estamos sozinhos, cada um atravessando questões sérias. Espero que essa quarentena consiga achatar a curva e temos que pensar no próximo. Espero que volte tudo ao normal logo”, torce Regiane, que tem cumprido o isolamento ao lado dos filhos, João Gabriel, 6 anos, e Antônio, de 2, do seu casamento com João Gomez, filho de Regina Duarte.

O cirurgião vascular Leonardo Stambowsky destaca que a pandemia acabou antecipando muitas tendências de atendimentos em todas as áreas. “Acredito que a telemedicina veio para somar e certamente vai ter seu papel para casos selecionados mesmo após a pandemia. Além disso, seguiremos no futuro uma tendência internacional se desospitalização. Os hospitais ficarão reservados para procedimentos de alta complexidade, o restante será feito em clínicas e consultórios especializados”, opina. E compartilha como tem se adaptado à nova realidade: “Aumentamos o tempo entre os atendimentos, limpeza de todos ambientes de contato entre as consultas, equipe treinada, uso de máscara cirúrgica e face shield. Além disso, realizamos uma triagem por telefone para saber os casos realmente necessários para atendimento presencial”, conta.

“Acredito que a telemedicina veio para somar e certamente vai ter seu papel para casos selecionados mesmo após a pandemia” (Foto: Felipe O’Neill)

Leonardo aproveita para chamar atenção, para alguns cuidados, dentro da sua especialidade para as pessoas em quarentena: “Sabemos que as pessoas permanecendo em casa têm uma maior tendência ao sedentarismo, o que pode piorar a insuficiência venosa e aumentar o risco de trombose. Portanto, como dicas, devemos evitar permanecer longos períodos sentados, elevar as pernas duas, três vezes por dia por cinco minutos, acima da linha do coração. Além, é claro, da prática de atividades físicas”.

Investindo em conhecimento e saúde

O professor de inglês Paul Walsh, londrino, radicado no Rio de Janeiro desde 2016, ensina a língua inglesa no Brasil desde então. “Comecei a dar aulas em uma ONG na Chácara do Céu, aqui na Zona Sul. E há dois anos venho me especializando em aulas de inglês para brasileiros”. Ele conta, que mesmo antes da quarentena por conta da Covid-19, já dava aulas online. “Era bem dividido antes, mas agora as aulas são 100% online e ganhei mais alunos. As pessoas estão mais abertas para conversar sobre sua situação, e mais sensíveis ao que acontece no mundo. As aulas estão mais voltadas para a conversação, porque as pessoas estão precisando mais dessa interação e apoio. Acredito que as aulas ficaram mais humanizadas”.

O professor Paul Walsh: ‘As aulas estão mais voltadas para a conversação porque as pessoas estão precisando mais dessa interação e apoio. Acredito que as aulas ficaram mais humanizadas” (Foto: Mariana Walsh)

Paul salienta, inclusive, que no isolamento, a procura pelas aulas aumentou. “São alunos entre 25 e 35 anos que estão pensando no futuro, em suas empresas ou até desejando uma mudança de país no futuro. Antes, os alunos queriam aprender inglês pensando na empresa onde atuavam ou almejando melhorar o currículo para um emprego. Agora, a procura por línguas vai além disso, sinto as pessoas repensando tudo. Inclusive, grandes mudanças de vida, e mais interessadas em explorar o mundo. Estão encarando o isolamento como uma chance de melhorarem em diversos aspectos. Também percebo os alunos mais à vontade em aulas online por estarem, geralmente, em suas casas”.

A dermatologista Andréa Duarte tem optado pela telemedicina no atendimento aos seus pacientes, e diz que tem atendido muitas pessoas com questões emocionais refletidas na saúde da pele no atual cenário. “A pele tem a mesma origem embriológica do Sistema Nervoso Central, logo é comum que situações de estresse tenham repercussões sobre a mesma: psoríase, urticárias e dermatites factíceas  tendem a aumentar nesse período”, afirma.

A dermatologista Andréa Duarte: “Antes do Coronavírus, a telemedicina já havia dado os seus primeiros passos. A pandemia acelerou todo esse processo” (Divulgação)

Acha que a telemedicina e os cuidados estabelecidos hoje vão ser a alternativa, o normal, neste mundo novo que se abre pós-Covid-19? “Antes do Coronavírus, a telemedicina já havia dado os seus primeiros passos. A pandemia acelerou todo esse processo e impôs mudanças importantes no padrão do atendimento médico pela necessidade do isolamento. Acho que nesse novo mundo pós-Covid-19, a telemedicina vai se tornar cada vez mais forte, embora o atendimento presencial ainda seja imperativo. A avaliação médica exige desde a observação da linguagem corporal, mas subjetiva, e nem por isso menos importante, até o exame clínico minucioso com ausculta e palpação. Sou dermatologista, preciso ter acesso tridimensional às lesões dos meus pacientes e nem sempre as fotos, por melhor que sejam, podem me proporcionar essa experiência. Ou seja, ainda existem limitações a uma boa prática da telemedicina”.

A médica também salienta sobre os aspectos que podem influenciar na saúde da pele. “Ela depende de um total estado de harmonia entre mente e corpo. Cuidados com a mente como prática de exercícios de respiração e meditação levam à liberação de hormônios e neurotransmissores que influenciam o metabolismo das nossas células. Nos cuidados com o corpo, a prática regular de atividade física tonificando músculos e pele são importantes no combate a flacidez. A alimentação diversificada com frutas, grãos, legumes e proteínas conferem aminoácidos e vitaminas essenciais à renovação celular. Por último, uma rotina básica, diária de limpeza, tonificação, hidratação e proteção garantem uma pele bonita e saudável”, orienta Andréa.