Projeções à Flor da Pele: o feminino em comunhão com a natureza sob as lentes de Rê Duarte


A artista iniciou a série ‘Projeções à Flor da Pele’ após a flexibilização do isolamento social imposto pela pandemia. “O resultado de imagens da natureza é projetado sobre os corpos nus de mulheres com características múltiplas acolhendo e enaltecendo as modificações dos seus corpos – sem alimentar os padrões estéticos – através de uma vivência única que tem como grande propósito afetar positivamente na autoestima da pessoa retratada”, pontua

Rê Duarte usa a fotografia como forma de potencialização da autoestima e a quebra de padrões estéticos

A fotógrafa Rê Duarte vem lançando luz à sua arte como ferramenta de potencialização da autoestima, de ajudar pessoas a se perceberem com um olhar mais leve, positivo e generoso sobre si – sobretudo mulheres -, em sinergia com a quebra de padrões enraizados pela sociedade e o valorizar a essência do ser humano, independentemente de classe social, cor da pele, crenças ou experiências vividas. E assim nasceu o projeto “Projeções à Flor da Pele”, com objetivo de reverberar a beleza, força e potência natural da mulher através de uma harmônica composição fotográfica, projetando imagens da natureza sobre corpos femininos e suas características múltiplas a partir de registros captados pela fotógrafa no universo do seu jardim, evidenciando a essência, beleza e a diversidade do feminino. “É um convite a ressignificar o olhar sobre o processo de recolhimento e mutação da mulher, quando é natural e muitas vezes necessário estar “à flor da pele”, propondo o resgate da essência feminina, a conexão da mulher com a natureza, com os seus ciclos e consigo mesma”, observa a artista.

Olhando suas obras de arte elaboradas com um olhar plural, percebemos também uma alusão à preservação da natureza em um mundo cujo alerta foi acionado. Garantir que os recursos naturais do planeta não se esgotem em função do desenvolvimento tecnológico é o grande desafio proposto pelo século 21. “Pode ser visto, sim, como um alerta a este chamado, porque acredito que é a partir da conexão com a natureza que nos ligamos mais profundamente com nossa verdade e ancestralidade, enaltecendo nossa força e autoestima”, pontua, acrescentando: “Além das consequências óbvias relacionadas ao descaso com o meio ambiente, percebo que a falta de zelo é um sintoma da desconexão da humanidade com a natureza. Somos reflexo da natureza e zelar por ela é fazer o mesmo para nós sem dúvidas. Fazemos parte da mesma raiz”.

Esse processo criativo surgiu em meio ao isolamento social por conta da pandemia, em 2020, com a intenção de criar, produzir e ser solidária com o próximo. “Dessa inquietação criativa nasceram dois projetos em paralelo: ‘Projeto Fresta – Fotografia Remota‘ e a série ‘Recados do Meu Jardim‘. Dois processos de criação que, unidos, foram fundamentais para a existência do projeto ‘Projeções à Flor da Pele‘”, pontua.

O primeiro foi conduzido em parceria com o fotógrafo Santiago Harte, na captação de imagens remotas de pessoas de toda parte do mundo, a partir de conversas de vídeo, interagindo com luz e sombra em suas casas, imersas no processo de quarentena, retratando sua relação com o mundo externo que passou a ser vivido através da ‘fresta’ de suas portas, janelas e incansáveis aparelhos eletrônicos – imagens que já caracterizavam a ideia de projeção, a partir da luz do sol. “Através desta série de ensaios, eu fui percebendo uma grande procura de mulheres buscando trabalhar suas inseguranças relacionadas ao corpo, medos e coragem com relação à exposição da sua imagem, além do desejo de potencializar sua beleza e a força do feminino”, reflete.

Em paralelo a este processo, Rê Duarte dividia seu tempo durante o isolamento com a prática de registrar o que há de lúdico ao seu redor. Assim nasceu a série de fotos batizada ‘Recados do Meu Jardim’, na qual, na maioria das vezes, com lente macro fotografou vegetações e os seres que habitam o seu jardim. Em seguida, no segundo semestre de 2020, com muita responsabilidade, as portas do meu estúdio puderam reabrir parcialmente a pedido de uma gestante. Ao final deste ensaio, realizei uma nova experiência fotográfica, criando um cenário composto apenas por câmera, projetor e a modelo, ‘estampando em sua pele’ projeções das imagens das flores, folhas e seres que havia registrado em meu jardim. Todos os elementos e o processo criativo que vivenciei se integraram harmoniosamente numa surpreendente composição fotográfica”, comenta.

A artista reuniu inúmeras vivências nas fotos que compõem o projeto trabalhando naquele momento com o mais lindo leque da diversidade de belezas existentes. Esse grande ‘álbum de experiências’ tem reflexos sobre relacionamentos retomados ou fortalecidos, ou de pessoas que passaram a se perceber com um olhar menos crítico sobre si a partir do “ensaio – vivência”. Esse caleidoscópio de momentos únicos também fortaleceu a fotógrafa a seguir em frente com a sua arte. “O fortalecimento da autoestima e autovalorização, entre outras buscas que trabalham para o florescimento da mulher, naturalizando o nu e reconhecendo a comunhão entre o ser feminino e a natureza, fazendo uma analogia entre estas duas potências, são as características e o propósito maior deste projeto, que sobressai a beleza e o inusitado das imagens”, frisa a artista.

O primeiro momento do trabalho da Rê Duarte remete à arte digital, mas as imagens são fotografias de fotografias. “Estas imagens não são tratadas ou montadas. O resultado das imagens traz sempre esta dúvida, o que muito me anima. Porque sempre sou perguntada como cheguei nesta conclusão da imagem final. Eu fotografo os elementos da natureza, depois as imagens são projetadas sobre corpos femininos. Por fim, fotografo os corpos projetados. Então estamos falando puramente de um trabalho artístico fotográfico. Onde não trato as imagens da natureza, muito menos a natureza das mulheres, ambas têm a sua realidade respeitadas”, esclarece.

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Letícia Pantoja, artista visual, diz que “o ensaio fotográfico me ajudou a fortalecer o meu processo de ser EU. Libertar meu corpo, minhas curvas e cicatrizes das amarras criadas por mim e por um estereótipo inalcançável…”. Já Karol Schittini, atriz e musicista, afirma: “Ter participado do projeto ‘Projeções à Flor da Pele’ foi muito intenso e revelador pra mim. Renovou a minha autoestima ver o meu corpo tatuado de natureza e poesia”.

Rê Duarte nos conta sua história de vida: “Cresci vendo minha mãe atuando como arquiteta, arteterapeuta e artista plástica. Então, eu fui criada no convívio de uma diversidade de artistas plásticos do Recife, em ateliês em que exercitei com frequência na minha infância e adolescência trabalhos manuais de técnicas variadas. Estas experiências múltiplas ficaram marcadas em minha trajetória e muito me influenciam em tudo que realizo na minha arte”.

Rê Duarte, desde 1999, atua em diversas áreas da cultura e do entretenimento. Trabalhou para campanhas nas quais fotografou importantes artistas que apoiaram causas ambientais. Em 2003, realizou no Recife, sua primeira mostra fotográfica, ‘Olho o que Avisto, Enxergo o que Imagino’, onde representava a diversidade cultural do estado de Pernambuco. Radicada em terras cariocas desde 2004, vem ao longo dos anos participando de congressos, oficinas e cursos voltados para as áreas de fotografia e design, dentre eles a graduação em Desenho Industrial, na Faculdade da Cidade do Rio de Janeiro.