Como princesa da Idade Média com discurso contemporâneo, Camila Rodrigues estreia em “Belaventura” e levanta bandeira da igualdade: “É um absurdo uma pessoa ser julgada pela sua cor ou gênero”


A atriz será Carmona que, embora na sinopse a personagem seja a vilã da trama, Camila defende que a princesa apenas luta pelo melhor de seu reino. “Acima de tudo, a Carmona quer defender seu reino e sua família e aí acaba ficando cega pelo poder”

Para quem acha que em um conto de fadas a princesa do reino é aquela moça submissa e graciosa, Carmona, de “Belaventura”, chega para acabar com qualquer estereótipo. A nova personagem de Camila Rodrigues na televisão estreou nessa terça-feira, 25, na trama da Record que será ambientada na Idade Média. Na novela, Carmona será uma nobre extremamente preocupada com o seu reino e que, por isso, assume a posição de vilã por querer assumir o trono a qualquer custo. Na verdade, não para Camila, que saiu em defesa de sua personagem. “Quando eu recebi a sinopse, estava escrito que ela seria a vilã da trama. Mas eu não a vejo desta forma. Ela se acha a pessoa mais preparada para governar o reino, e de fato é, e por isso quer assumir o trono de qualquer maneira. Acima de tudo, a Carmona quer defender seu reino e sua família e aí acaba ficando cega pelo poder”, explicou.

Nessa obsessão, Camila Rodrigues adiantou que sua personagem em “Belaventura” não medirá esforços para alcançar seus objetivos. Sendo assim, a atriz contou que podemos esperar de tudo um pouco da vilã disfarçada de princesa. “Se precisar, ela vai matar, sim”, afirmou. Aliás, a caracterização representa a contradição da personagem. Enquanto Camila interpreta uma personalidade forte e cega pelo poder, como definiu, Carmona se apresenta bela, com vestido rosa e detalhes de uma princesa de conto de fadas. Sobre a caracterização da personagem, a atriz destacou a importância do figurino e da maquiagem para ambientar o clima de Idade Média no qual se passa a novela. “Tudo o que é externo é muito grandioso na preparação do ator. A gente entra naquele ambiente de ficção e passa a de fato brincar de ser princesa. Então, quando eu me vejo como Carmona, tudo fica mais encantador”, contou.

Mais do que transpor Camila Rodrigues para o reino de Belaventura, a parte cenográfica da novela da Record ainda resultou em uma nova proposta na interpretação da atriz. De acordo com ela, os trejeitos de Carmona serão mais secos para contrapor ao imaginário delicado de uma princesa. “Como ela é muito reta e direta no que ela quer, nós escolhemos fazer uma interpretação menos graciosa. Então, a gente mostra que não é pelo fato de ela ser uma princesa e estar de rosa que ela é fofa em suas atitudes”, disse. Outro ponto que diverge Carmona de uma clássica personagem de conto de fadas é a relação com o príncipe encantado. No primeiro momento, Camila contou que a personagem não terá qualquer envolvimento com o amor e que todas as suas preocupações serão exclusivas ao reino de Belaventura. “Mas, com o passar dos capítulos, a gente vai vendo a aparição de um sentimento que modifica tudo. Ela fica mais humana e passa a ouvir e enxergar a vida de maneira diferente”, contou a atriz que definiu o “príncipe encantado de Carmona” como um homem tão preocupado com o reino quanto ela.

Camila Rodrigues será a princesa Carmona em “Belaventura”, a nova novela da Record (Foto: Studio Faya)

Sendo assim, Camila Rodrigues terá o desafio de mergulhar em um conto de fadas fictício que, apesar do universo de fantasia, tem raízes muito bem estabelecidas, como destacou a atriz. “Na história, a gente traz um pouco de Joana D’Arc e de Os Três Mosqueteiros. Mas também lidamos com uma proposta muito livre em que tudo pode ser feito neste contexto imaginário. Isso amplia as possibilidades dos personagens e permite a nos atores criar muito”, destacou.

Em relação a sua criação, mais do que dosar a doçura de uma princesa com o temperamento ambicioso da personagem, Camila Rodrigues também terá a missão de trazer ao discurso contemporâneo a questão da mulher na hierarquia da nobreza. Mesmo sendo a pessoa mais preparada para o trono de Belaventura, Carmona não poderá assumir o poder pelo simples fato de ser mulher. “Na novela, a gente mostra que nós já estamos lutando pelo nosso espaço desde a Idade Média, época em que se passa a trama. Mesmo ela sendo mais inteligente e preparada para tal função, ela não poderá governar porque não nasceu homem”, disse Camila que apontou que, apesar disso, em “Belaventura” as personagens mulheres terão mais força que os homens. “É muito interessante acompanhar esse contraponto. Fora que toda essa questão que envolve a Carmona traz um discurso de que ela não está lutando pelas mulheres ou contra os homens. Ela defende a ideia de que, acima do gênero, quem deve governar é aquele mais preparado”, explicou.

E é nesta posição de igualdade que Camila Rodrigues também encaixa o seu discurso. Para a atriz, o seu feminismo é baseado em um conceito de oportunidades iguais para eles e para elas. “Eu acho que nós temos que ser tratados pela qualidade que nós temos, independentemente da forma que nascemos. Na minha opinião, essa forma sexista de pensar é tão antiga que eu não consigo entender como continua tão latente em nossa sociedade”, argumentou a atriz que ainda trouxe a questão de raça para o discurso. “Eu acho que essa falta de espaço ocorre tanto para as mulheres quanto para os negros também. É um absurdo uma pessoa ser julgada pela sua cor, gênero ou qualquer outro fator que não modifique seu caráter ou suas habilidades. Por isso, igualdade para todos”, defendeu.

A atriz destacou a importância do discurso de igualdade nos dias de hoje (Foto: Studio Faya)

Se no panorama contemporâneo Camila Rodrigues se mostrou antenada aos discursos, quando o assunto é passado a atriz também mostra que conhece bem o cenário. Antes de mergulhar na idade Média para a nova novela, Camila voltou para a época bíblica quando integrou o elenco de “Os Dez Mandamentos”. Na trama, que foi sucesso unanime da emissora, a atriz interpretou Nefertari. Em relação às experiências no túnel do tempo, Camila Rodrigues acredita que trabalhos como esses são enriquecedores para a carreira de atriz e para a vida pessoal. “É muito bom a gente poder conhecer tão bem épocas que existiram no passado e que muitas vezes ficam esquecidas. Porém, enquanto em ‘Os Dez Mandamentos’ a gente trabalhou em cima de um cenário real, que está todo contado na Bíblia, em ‘Belaventura’ nós temos uma super liberdade criativa dentro de um contexto de Idade Média”, destacou.

Aliás, contar tramas ambientadas em tempos passados tem sido uma estratégia da Record nos últimos anos. Além de ter histórias contemporâneas em sua grade, a emissora vem se dedicando a ocupar uma lacuna da dramaturgia cronológica. E o resultado tem sido positivo. “A Record tem se dedicado e feito muito bem uma teledramaturgia num nicho que havia sido esquecido. É um tipo de novela que não existe e que tem um público muito fiel e curioso. Eu acho que a emissora foi muito inteligente nesta sacada e tem agradado bastante o público”, argumentou Camila que ainda destacou a leveza da narrativa. “Com o nosso dia-a-dia, às vezes só queremos sentar e assistir a algo lúdico. Em novelas que mostram a nossa realidade, temos as mesmas tragédias que vemos nos jornais em um ambiente que seria do entretenimento”, disse.

Por falar nas tragédias diárias, Camila Rodrigues comemorou não ter sido afetada pela crise cultural brasileira. De acordo com ela, sua trajetória recente na televisão lhe garantiu uma certa estabilidade em meio ao caos. “Eu venho emendando um trabalho no outro e não tenho sofrido muito. O maior problema está sendo com os teatros, que estão se fechando e perdendo recurso. Agora, que estou começando a pensar em um projeto para o palco, estou sentindo essa dificuldade”, contou a atriz que destacou que, mesmo garantida na televisão, tem passado por outra consequência negativa da crise. “Agora, as emissoras não estão mais fechando contratos muito longos. Pelo contrário. Nós estamos garantidos apenas durante a obra atual. Depois, fica o mistério até conseguirmos outro trabalho. Porém, não vejo isso apenas como problema. Desta forma, nós atores temos mais liberdade para trabalhar em outras emissoras e em novas oportunidades como Netflix”, disse.

E nesse jogo de sobrevivência dos brasileiros, Camila Rodrigues contou que tem planos de voltar ao teatro – mesmo neste momento instável. Longe dos palcos desde 2015, a atriz disse que está com um projeto de comédia ao lado de Eri Johnson, que também é seu parceiro em “Belaventura”. “É uma ideia ainda muito no começo de um espetáculo de humor com cinco atores em cena. Eu fiz a leitura na casa do Eri, que na novela faz o meu bobo da corte, e achei um texto super gostoso, ainda mais para esse momento”, adiantou a atriz Camila Rodrigues que tem planos de estrear em outubro.