“As UPPs são uma moeda de troca do PMDB”, afirmou Rodrigo Pimentel


O filme Intervenção coloca uma lupa no regime falho das UPPs no Rio de Janeiro. Durante uma coletiva de imprensa na comunidade Tavares Bastos, a equipe soltou o verbo sobre as políticas destacadas de combate à violência do estado

Os brasileiros não aguentam mais. Quando abrimos o jornal recebemos uma enxurrada de notícias de calamidade pública: hospitais sem nenhuma infraestrutura, violência exacerbada, altos índices de desemprego, assassinatos e verbas públicas indo para bolsos de políticos. O filme ‘Intervenção’, que estreia nos cinemas no dia da Proclamação da República, está funcionando como um verdadeiro grito de socorro e, ao mesmo tempo, um grande desabafo de todos da equipe para a situação vergonhosa do país. O longa expõe sem impor ideologias ou posicionamentos políticos a verdade sob as óticas dos policiais com relação ao sistema falho e fadado à desgraça das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) no Rio de Janeiro. O site HT teve acesso com exclusividade às filmagens, que estão rolando na Comunidade Tavares Bastos, onde conseguimos conversar com grande parte do elenco sobre este projeto. Durante o papo, os atores como Dandara Mariana, Marcos Palmeiras e Bianca Comparato mostraram a sua indignação sobre os recentes acontecimentos o que, para eles, afirma a necessidade e urgência deste assunto ser levado às telonas cinematográficas. Vem ler este papo cabeça!

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Elenco de Intervenção na coletiva de imprensa (Foto: AGNEWS)

As maiores críticas, obviamente, ficaram reservadas ao sistema das UPPs, já que era o tema central da película. Para começar a escrever este filme, os roteiristas Rodrigo Pimentel e Gustavo de Almeida precisaram definir e analisar o projeto. Sendo assim, chegaram a um conceito inspirado no filme Dunkirk, do Christopher Nolan, que fala sobre ingleses que estão esperando para serem resgatados de uma ilha. A partir disso, se inicia um movimento civil de pescadores que tentam salvá-los. “A nossa ideia é que as UPPs são grandes Dunkirk, mas a diferença é que não existe um barco para trazê-los de volta. Os policiais estão esperando para serem tirados daquele posto”, explicou Gustavo de Almeida. Para suscitar esta opinião, ele completou: “O policial e o morador casaram bêbados em Las Vegas e, no dia seguinte, olharam um para o outro sem saber qual era a garantia desta união. Isto porque, realmente, não tem nada. Não tem governo, judiciário, estado, educação, saúde e emprego. Trabalhei como assessor de imprensa da Polícia Militar por cinco anos e, durante todo este tempo, nunca vi ninguém propor isenção de imposto para empresa que empregasse moradores de uma favela vizinha. Só vi isenção para outras coisas, mas é melhor nem comentar”.

Rodrigo Pimentel também é um jornalista com largo conhecimento sobre a política brasileira e autor do livro que originou Tropa de Elite 1 e 2.  Dessa vez, ele soltou o verbo sobre a falta de condições de trabalho destas unidades. “A UPP só serve hoje para tomar tiro. Os contêineres são nojentos, cheios de ratos. E, sinceramente, não há nada mais provisório do que isto. Não é um ambiente seguro, todos estão furados com balas e não há acesso ao banheiro. O policial não pode caminhar até um bar na frente da unidade, porque é assassinado. É evidente que este projeto falhou e quem o mantém funcionando é uma pessoa muito equivocada ou com rabo muito preso politicamente, afinal, vamos falar a verdade: este regime é uma moeda de troca do PMDB. O estado, a imprensa e a população estão insensíveis a isto”, analisou.

Enquanto, inicialmente, Rodrigo Pimentel confessou ter acreditado no sistema das UPPs, Bianca Comparato nunca achou que pudesse fazer alguma diferença. “É muito difícil entender como se pacifica com um fuzil nas mãos. Esta é uma das grandes complexidades desta iniciativa. Os PMs das UPPs tinham uma função ainda maior na sociedade. Esperava-se que a polícia fosse da comunidade, ajudasse as pessoas dando reforço de português, por exemplo. Ou seja, era para ser escola, hospital, academia, creche e exército. É impossível uma corporação resolver um problema tão complexo”, garantiu.

O site HT participou com exclusividade dos bastidores do filme (Foto: AGNEWS)

Intervenção, dessa forma, traz um olhar mais amplo e ao mesmo tempo específico sobre a realidade do policial. Uma das cenas que o site HT teve o privilégio de assistir em primeira mão exibia uma discussão acalorada com a imprensa fictícia sobre a falta de preocupação da mídia quanto ao bem estar dos soldados. “Acredito que a imprensa desumaniza um pouco. Quem não gosta da polícia diz que é fascista e quem é chapa branca diz que é perfeita. No entanto, a gente não percebe que são pessoas comuns que moram na baixada, pegam trem com a farda escondida no saco de supermercado”, afirmou Gustavo de Almeida.

Ao mostrar outro ponto de vista, o título do filme faz referência a uma esperança do roteirista Rodrigo Pimentel. Reavaliar o sistema das UPPs foi uma das primeiras atitudes que a Intervenção Militar teve quando chegou ao Rio de Janeiro. Ele esperava que este projeto funcionasse como estes barcos salva-vidas do Dunkirk, recentemente explicado por Gustavo de Almeida. Ao mesmo tempo em que Rodrigo aposta nesta ideia, ele exibe grandes dúvidas quanto ao sucesso da iniciativa. “A intervenção militar no Rio de Janeiro é, obviamente, política e acredito que o exército brasileiro é mais uma vítima deste equívoco. Mas, ao mesmo tempo, acho uma manobra necessária, porque a cidade está totalmente falida, as forças policiais estão sem combustível, sem farda, viatura ou colete. Alguém precisa tentar recuperar a segurança, mas não da forma como se está fazendo, afinal, o dinheiro disso até hoje não chegou. De qualquer forma, vejo isto como uma esperança da sociedade por dias melhores. Acho que não deva funcionar, mas…”, lamentou. Para o produtor italiano Cosimo Valerio, a verdadeira ‘intervenção’, na verdade, deve ser feita em outubro no momento em que os cidadãos forem votar nas urnas.

Caio Cobra e Marcos Palmeira posando para foto na comunidade Tavares Bastos (Foto: AGNEWS)

Não importa como será alterado este viés de violência exacerbada na qual o Rio de Janeiro está chafurdado, para Dandara Mariana a cidade é “muito violenta e está precisando de ajuda e soluções”. A prova disso é que, de acordo com o produtor italiano Cosimo Valerio, a Tavares Bastos era única favela que tornava este projeto viável. “Nós só conseguimos filmar aqui pelo fato do BOPE ter uma sede perto. Fazer esta produção em qualquer outro lugar seria muito difícil por conta da criminalidade. Se ele sair daqui, fica inviável gravar em comunidades no Rio de Janeiro”, avaliou.