Casa de Criadores: Da alfaiataria de Leandro Castro ao trabalho colaborativo da plataforma Vou Assim


Conferimos os desfiles de Ken-gá, Vivão, Vou Assim, Rafael Caetano, Berimbau, Filipe Freire, Leandro Castro, Vicenta Perrotta

O quarto dia de desfiles da Casa de Criadores contou com a participação das labels Ken-gá, Vivão, Vou Assim, Rafael Caetano, Berimbau, Filipe Freire, Leandro Castro e Vicenta Perrotta.

Vivão

Vivão Project nasceu em 2019 em Salvador, Bahia, por Alexandre Francisco Vivão, diretor criativo e artístico da marca. O foco é o streetwear e acreditar que o futuro é o reflexo do hoje e a melhor forma de construir um mundo novo é observando as necessidades do agora, projetando novos caminhos e possibilidades de entendimento individual e coletivo.

“A coleção “OBJECTIVUS” propõe uma imersão nas manifestações culturais contemporâneas que estão orientadas à vitalidade do porvir. O momento é da ampliação do imaginário. Não existem fronteiras para as ideias e podemos ser co-criadores da realidade nos mundos tangível e virtual. A materialização de espaços que irradiem respeito às subjetividades individuais e coletivas é iminente, o que impulsiona a criação de narrativas diversas, originais, por vezes insólitas. O que há de insólito dentro de ti?”, questiona Vivão.

Vivão – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

Vivão – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

O ato de expor ou mesmo apreciar as atípicas subjetividades é uma obra potente de coragem. Se atirar ao horizonte impulsiona não só quem se arrisca à própria legitimidade, mas todes que presenciam o salto. A coleção conta com as pinturas, característica forte da marca, com surrealismo futurista que acompanha a chegada do metaverso – a confluência utópica entre a esfera material e digital.

Vivão trabalha em colaboração com a marca carioca Atato, de design autoral. A marca busca produzir peças atemporais que signifiquem genuinamente para quem as veste, desafiando a lógica do consumo desenfreado e fomentando a moda consciente no Brasil.

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Vou Assim

A Vou Assim é uma plataforma de apoio ao fazer artístico de corpas dissidentes e pessoas trans idealizada pela artista transvestigenere nascida no Sertão da Bahia A Pimentel. Tem como embasamento o que se popularizou como upcycling ou reciclagem, que definimos como uma das propostas de semiótica para produção de novas imagens de moda. A pedagogia do lixo serve como base para a construção das peças, ressignificando os descartes gerados pela indústria da moda.

Para 50° Casa de Criadores foi idealizado o desfile TRANSFRICÇÃO em alusão a corpos trans e racializados alvos de violência diária e guerra permanente. Segundo os integrantes da Vou Assim, “em um contexto em que não somos nem mesmo humanizados, surge a necessidade de proteção e segurança desses corpos em vulnerabilidade: criação de armaduras. Nosso processo criativo parte daí, para cavar um espaço possível de existência e dignidade no mundo”.

O lixo é usado enquanto potência criativa, recriando vida com o que não é mais útil para a sociedade e atravessando diálogos entre corpo, retalhos, lixo e roupa. A criação artística é coletiva e imersiva, vindo da urgência de novas imagens e produções de moda em um contexto de emergência climática no planeta. As propostas são imagens de moda disformes, e apresentadas de duas formas: 5 estilistas e 35 perfomers foram convidades para compor o espetáculo.

Cada estilista criou uma coleção com 7 peças:

A Pimentel:

Estilista, produtora cultural e performer. É artista residente da Casa de Criadores, Ateliê Transmoras, Ateliê Vou Assim e Motim Bafro, e atua há sete anos produzindo projetos de arte e cidadania para a comunidade trans, dentre eles o espetáculo TRANSCÁRCERE, os desfiles TRAVESTI VIVA, TRANSCLANDESTINA 3020 e BRASIL PAÍS CAMPEÃO MUNDIAL DE TRAVESTIS. Coordena o Coletivo Cu (Círculo de união LGBTTTQIA+) e a Ateliê Criativa Vou Assim ambos com atuação na periferia da Zona Norte de São Paulo. Sua trajetória com a moda e produção cultural articula questões de gênero e de colonização das corpas!

Amangelo Prateado:

Diretor criativo e produtor cultural que atua no campo híbrido das artes visuais, moda e sustentabilidade. Utiliza da pedagogia do lixo enquanto potência criativa em suas produções, atravessando diálogos entre corpo, lixo e gênero.

Mira Visuais:

Mira, 25 anos, é artista visual em formação pela Universidade Federal da Bahia. Desenvolve pesquisa multimídia articulando maresias sobre saudade, família e travestilidade, transitando entre desenho, pintura, performance e costura. É artista residente na Ateliê Criativa Vou Assim, onde transmuta potências artísticas entre lixo e moda.

Luä Ayo Ayana:

Estudante de moda que faz experimentações têxteis e customizações. “Ao mesmo tempo que minha coleção visa sustentabilidade e acessibilidade, também é um laboratório de experiências, onde exploro minha criatividade, identidade e auto-conhecimento, me auto exploro. Vai muito além de apenas fazer peças e vender”.

Japhette Lant:

É uma beninense que imigrou para o Brasil em 2012. Ela se formou em design pela Unesp em 2017. Durante a sua trajetória, ela focou em estudar o design e a moda com um novo olhar, um olhar que ela chama de “africêntrico”; o que traz a nu suas referências e vivências no continente africano, e também no Brasil como uma africana da diáspora contemporânea.

Seus trabalhos transitam entre o design e a moda. Isso a levou a ter uma marca de moda alternativa inspirada na cultura africana. Ela sempre busca técnicas de estamparia e de criação ancestrais que estão se perdendo na própria África, devido a globalização. Japhette trabalha uma linha de resgate das artes e design africanos que irá trilhar o caminho para acessar produções afro-futuristas ainda no presente.

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Rafael Caetano

Para a volta presencial às passarelas, Rafael Caetano faz transição em sua próxima coleção de verão. Não é só da noite que vive a marca do jovem estilista paulistano. Depois de invadir as praias com as suas ultra sungas recortadas e super-desejadas nos últimos 2 anos, o designer aposta em uma nova oferta de prêt-à-porter cheia de simbologias e que tem a cara da marca.

Rafael Caetano – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

Rafael Caetano – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

Para esse novo momento, o estilista revisitou seu próprio guarda-roupa e escolheu bases de tecidos leves, todos da tecelagem Kalimo Next Door, deixando de lado características plásticas de outras coleções, e tornando a roupa mais possível no dia a dia de seus clientes.

Dentre as cores, se destacam: o Chiclete, Pink, Menta, Violeta, Coral, Musgo, Preto e 0ff. Destaque para o Moletom High Color da Kalimo, com novas propostas de brilho, utilizados em peças-ícones da coleção.

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Berimbau Brasil

Criada em meados de 2018 pelo maranhense Sandro Freitas, a Berimbau Brasil tem como propósito, desenvolver e proporcionar produtos que estabeleçam uma imagem contemporânea e urbana, com inspiração intercultural afro-indígena. Por meio da moda e das múltiplas formas de expressões artísticas é um agente de transformação e impacto social. Além das peças, a Berimbau também oferece oficinas de corte, costura e processos criativos, pelo Sesc SP.

A coleção desfilada na Casa de Criadores contempla a história e influência do reggae jamaicano no Maranhão, sua influência na cultura do estado e também no próprio país de origem. “O reggae foi um ritmo que sempre fez parte da minha infância. Cresci na frente de um clube chamado “Nova Geração”, vendo as aparelhagens chegando e sendo montadas, instaladas, ouvindo os Dj’s fazendo o teste de som, isso me fez  sentir que estava vivenciado algo único e muito rico culturalmente. Às 18h, lembro que as pessoas começavam a se reunir na frente do clube, com roupas muito confortáveis, alegres, com identidade e uma originalidade singular. Aquilo era meu ápice criativo. Hoje, eu acredito que tudo aquilo que vivi e senti deve ser expressado na Berimbau, no meu trabalho, com as minhas raízes culturais, isso faz parte da minha história, auxiliou na construção da minha identidade”.

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Filipe Freire

O estilista lançou na 50ª edição do Casa de Criadores a coleção batizada Delicate em forma de joia-roupa objeto de desejo. Cada um dos 15 looks foram feitos à mão pelo próprio designer. O resultado remetia a um crochê incrível tendo como material o metal. O casting contou com Thelma Assis abrindo o desfile.

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Leandro Castro

O designer trabalha com a ressignificação experimental das técnicas do universo da camisaria e da alfaiataria. Suas peças de roupa são realizadas em tiragens únicas e sob medida,  onstruídas a partir da restrição e síntese das formas, mesclando o apreço pelo acabamento artesanal de qualidade e o uso de matéria-prima de descarte e de menor impacto socioambiental, além da colaboração de outras pessoas periféricas nos processos de criação.

Marina Dias no desfile de Leandro Castro – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

“Como negociamos com nossas fragilidades ao nos vestimos?”, indaga Leandro acrescentando a sua análise: “Essa série investiga a roupa e as aparências como dispositivos de proteção e sobrevivência, retomando o sentido primordial e de memória atávica do vestir, sobretudo em momentos sombrios, como as noites que atravessamos. A partir da restrição de uma única cor e de materiais, foram acionadas imagens como de muros, paredes, armaduras e barreiras de proteção para a criação de vestíveis amplos e de grande estrutura. Vale dizer ainda que as peças são artesanalmente a partir do uso de material têxtil rejeitado pela indústria e da síntese formal como norteador do projeto das roupas”.

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Vicenta Perrotta

O desfile de Vicenta Perrotta na 50ª Casa de Criadores é a finalização do ATM LAB: Trans business, uma residência artística com 4 marcas de pessoas trans e travestis da rede do Ateliê. A proposta da residência foi selecionar as marcas mais maduras da Rede TRANSmoras, acelerando seu processo criativo e de negócio por meio da produção da coleção em conjunto de Vicenta, além de mentorias com nomes relevantes do cenário artístico, como Manauara Clandestina e Micaela Cyrino. Entre os temas das mentorias coletivas estiveram precificação de produtos, gestão do tempo, construção imagética e autoconhecimento.

As 4 marcas selecionadas são:

  • Dulce Mel Modas, de Mel Pinheiro, sediada na Freguesia do Ó em São Paulo;
  • Vista Vaskes, das irmãs Dil Vaskes e Katryna Serafim, levando axé para as passarelas;
  • Coletivo Cabeças, destruição do sistema e transenvenenamento social e;
  • Transcooper, cooperativa de produção têxtil da Casa sem Preconceitos em Campinas.

Vicenta Perrota e ATM Lab – Foto: Marcelo Soubhia/Agência Fotosite

Perrotta lidera a articulação política e artística do Ateliê TRANSmoras, que fundou há 9 anos em Barão Geraldo, em Campinas. Se destaca há anos na moda como estilista e no ativismo, tendo produzido projetos, oficinas e formações para diversas marcas e instituições na área de costura, ressignificação do consumo e pedagogia do lixo. Perrotta atrai uma rede enorme de artistas, e tem amplo trânsito em instituições como Sesc, Centro Cultural São Paulo, Art Sampa, Mercado Mundo Mix e Casa de Criadores.

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Ken-gá

A Ken-gá foi criada em 2016 por Lívia Barros e Janaina Azevedo. A proposta é autenticidade fazendo parte da luta pelo empoderamento feminino e LGBTQIA+, com muito bom humor e máximo respeito pela diversidade de corpos e desejos.

The queen by Ken-gá (Foto: Divulgação)

A coleção inpirada no Brás, em São Paulo, conclui a trilogia da moda popular brasileira que a Ken-gá apresenta desde de 2020, ganhando a passarela em clima de celebração após dois anos difíceis para a moda.

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