Sociedade Viva Cazuza completa 25 anos e comemora com leilão e show-tributo megaestrelado no MAM, provando que a obra do poeta ainda vive


Ao longo do jantar apresentado por Paula Lavigne, a ONG arrecadou mais de R$ 1,5 milhão com obras de Vik Muniz, Adriana Varejão, Osgemeos e mais, e terminou a noite com apresentações emocionantes de Baby do Brasil, Ney Matogrosso, Djavan, Adriana Calcanhotto e uma turma que fez Lucinha Araújo (e quem mais estava presente) se comover

De “Ideologia” e “O tempo não para” a “Codinome beija-flor” e “Preciso dizer que te amo”, é impossível calcular exatamente qual foi o tamanho do impacto que Cazuza teve na cultura e na sociedade brasileiras. E, se o poeta acabou nos deixando cedo demais, um dos seus maiores legados permanece: a luta contra o vírus do HIV, que hoje, 25 anos após sua morte, continua sendo enfrentada por sua mãe, Lucinha Araújo, por meio da Sociedade Viva Cazuza, que ajuda crianças e adolescentes soropositivos. Na noite dessa quinta-feira (10/9), a ONG fundada apenas alguns meses após o falecimento do artista foi motivo de celebração por seu aniversário, com direito a um leilão e um show mais do que especial, que lotaram o Museu de Arte Moderna com a nata das artes plásticas e da música.

O evento foi dividido em duas partes: primeiro, um jantar/leilão, no qual obras de nomes como Vik Muniz (responsável pela curadoria dos trabalhos), Adriana Varejão, Osgemeos, Luiz Zerbini, Marcos Chaves e Maria Klabin, dentre outros 13 grandes artistas nacionais, foram doadas integralmente como uma forma de ajudar a Sociedade Viva Cazuza; logo após, Paula Lavigne organizou uma de suas famosas cantorias, reunindo Alcione, Adriana Calcanhotto, Preta Gil, Rogério Flausino, Teresa Cristina, Sandra de Sá, Otto, Djavan e muitos outros, todos acompanhados pela banda do Pretinho da Serrinha, enquanto reinterpretavam clássicos de Cazuza.

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Apresentado por uma Paula Lavigne enérgica e brincalhona, o leilão, claro, se tornou um grande sucesso, arrecadando cerca de R$1,5 milhão para a fundação. Na abertura, ela explicou o seu envolvimento com o evento: “Se eu sei alguma coisa sobre trabalhar com música, é porque o João Araújo (pai de Cazuza) me ensinou. E, antes de morrer, ele me pediu para que ajudasse com os negócios da Sociedade, então esse é apenas o início de uma comemoração que ainda terá muita coisa pela frente”, disse. Responsável pelo discurso de abertura, que reforçou a importância da Sociedade na ajuda às vítimas do HIV, Glória Maria havia conversado com HT momentos antes sobre sua ligação com Cazuza e a causa defendida na noite: “As pessoas às vezes esquecem da luta contra a AIDS. Eu espero que esse evento traga isso à memória novamente, porque é algo que não dá para deixar para depois. E tomara que, hoje, as pessoas realmente comprem as obras, porque a Sociedade está precisando”, desabafou.

Vik Muniz, que fez o retrato “Quase um segundo (Cazuza)” do poeta com recortes de revistas, o qual foi vendido por R$ 120 mil, falou ao HT sobre como foi ser o curador do leilão: “Liguei para os meus amigos e procurei por pessoas que fossem da mesma geração que o Cazuza, porque eu, por exemplo, não convivi com ele pessoalmente, mas todos sabemos que ele imprimiu muitas mudanças no comportamento e até na política daquele tempo. Vivíamos um Brasil pós-ditadura, que não sabia muito bem como lidar com aquela liberdade e o Cazuza, com seu ponto de vista livre, cheio de sentimentos, foi a primeira pessoa de projeção que conseguiu ser transparente e fazer com que os outros encarassem essa realidade”, declarou.

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Luiz Zerbini, amigo pessoal de Cazuza, já tinha uma história com o músico: é ele quem assina a capa de “Exagerado”, lançado em 1985. No evento, sua obra “Andarilho”, slide e fita adesiva, foi adquirida por R$ 82 mil. “É engraçado, porque você não imagina como as coisas vão acontecer. Eu confesso que estou bastante emocionado, por poder contribuir com a Viva Cazuza depois de tantos anos. Eu sinto muitas saudades dele. Só depois de perder que você vê como as pessoas fazem falta “, comentou com o site, comovido. E quem também relembrou a importância das palavras do compositor foi Beatriz Milhazes. “Essa já é a terceira vez que participo do leilão. Estou cedendo uma serigrafia que tem um símbolo de paz e amor no centro que acho tudo a ver com o Cazuza. Ele foi um grande músico, que atravessou décadas e entrou para a história da MPB. É eterno”, declarou.

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Logo após o jantar, que ainda teve um violão de Gilberto Gil (vendido a R$ 50 mil), um ukulele de Marisa Monte (R$ 7 mil), um manuscrito + disco autografado de Chico Buarque (R$ 16 mil), além da obra mais cara da noite – o quadro de Adriana Varejão que, sozinho, foi responsável por arrecadar R$ 530 mil para a Viva Cazuza – foi a vez de a música tomar o lugar das artes plásticas. E Paula Lavigne reuniu todas as suas forças para a noite ser mais do que inesquecível.

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O start se deu com Alcione cantando “Faz parte do meu show”, seguida de Adriana Calcanhotto em uma performance eletrizante de “Seja feliz”, do seu próprio repertório, e “Mulher sem razão”, do poeta. Na sequência, um dos momentos mais comoventes da noite: Ney Matogrosso cantou, entre gritos de “Gostoso! Lindo!” e com os olhos marejados, “Poema”, composição assinada por Cazuza aos 17 anos e encontrada por Lucinha no início da década de 1990, que foi entregue ao cantor e, posteriormente, musicada por Frejat. Na segunda faixa no evento, Ney deu conta de trazer ao palco toda a sua sensualidade performática em “Por que a gente é assim?”, com direito a abaixar a gola e levantar a barra da camisa. Sentada à beira do palco, Lucinha Araújo entoava todas as sílabas das canções, enquanto aplaudia e fazia coro aos fãs no final de cada performance.

Ney Matogrosso canta “Porque a gente é assim”

Teresa Cristina, que ficou responsável por “O tempo não para”, contou momentos antes ao HT que, quando ficou sabendo da cantoria, pediu a Paula Lavigne para participar do show. “Eu estou quase histérica, porque Cazuza é o rei do meu chuveiro. Apesar de eu não conseguir incluí-lo no meu repertório, sou fã incondicional desde criança. Ele foi um gênio do pop e aumentou o nível das composições, colocando letras com significados verdadeiros nas rádios. ‘O tempo…’ poderia ter sido escrita ontem! Sinto que hoje o evento é mais do que o show ou o leilão, é para propagar o amor, esse mesmo amor que ele tinha na ponta da língua e não se intimidava em mostrar”, disse.

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Comadre de Cazuza, Sandra de Sá comentou com HT: “Eu estou feliz para caramba de estar aqui, não tenho nem como mensurar. O Caju era bicho-homem, encarava tudo com verdade, e o que ele tinha para falar serviu para ontem, serve para hoje e vai servir amanhã. Se ele ainda estivesse vivo, iria incomodar muitas pessoas, muito mais do que já incomodou. E a gente iria incomodar com ele”, riu, antes de subir ao palco para cantar “Brasil”. E, se o objetivo de Sandra era fazer um incômodo no conformismo político, por ali ela conseguiu: a artista desceu para cantar em meio ao público e deu um sentido ainda mais forte nos versos críticos do compadre.

Rogério Flausino, ao lado do irmão Wilson Sideral, cantou “Bete Balanço” e “Preciso dizer que te amo”, logo após bater um papo com o site. “Sou fã do Cazuza para c***. Acho importante prestarmos respeito aos nossos ídolos, e a garotada de hoje precisa conhecer mais a obra dele, dessa liberdade de expressão e de amor, independente do sexo. Sinto falta de alguém que represente isso hoje”, disse o músico que, enquanto soltava a voz, conseguiu colocar Glória Maria e Marina Ruy Barbosa para dançarem ao lado do palco, enquanto Fábio Porchat, Carolina Jabor, Rita Guedes e Paula Burlamaqui pulavam na plateia.


Rogério Flausino e Wilson Sideral apresentam “Preciso dizer que te amo”

A noite se seguiu assim: em um momento, Otto apresentava “Trem para as estrelas” com a voz embargada, falando que sem Cazuza ele talvez nem estaria ali; Preta Gil colocou todos para pularem com “Exagerado”; Chay Suede, observado por uma Laura Neiva toda romântica no canto do palco, cantando “Pose de star”; e, surpresa!, Baby do Brasil, que não estava na programação, de repente surge com o microfone na mão. E o que acontece quando o inconformismo da Tropicália se encontra com os versos de Cazuza? A menina dança, até ver o dia nascer feliz.

Chay Suede canta “Pose de star”

Em tese, a última apresentação seria de Djavan que, entre gritos de “Rei! Mestre!”, cantou “Avião”, “Flor de lis”, “Oceano” e “Sina”. Mas como a cantoria não mostrava sinal nenhum de parar, o microfone foi se revezando de forma improvisada e espontânea entre Rogério Flausino, Baby do Brasil – que depois ainda se apresentou com outra convidada-surpresa, Márcia Castro -, Teresa Cristina e por aí foi. Afinal, em uma noite onde reinou o amor, se deixar levar pelo clima faz parte do show. Veja abaixo mais vídeos das apresentações:


Baby do Brasil canta “Pro dia nascer feliz”


Djavan apresenta “Avião”


Ney Matogrosso emociona com performance de “Poema”