João Bosco comemora 43 anos de carreira com show solo e fala de política, economia e internet: “Ainda resisto a esse excesso de exposição”


O artista apresenta show com voz e violão hoje e amanhã no Miranda, e conversa com HT sobre a eterna paixão pela música, a nova geração de compositores, sua amizade com Criolo e mais

Não há dúvidas de que João Bosco é um dos maiores compositores do país. O artista mineiro surgiu em 1972, no lado B do “Disco de bolso do Pasquim”, dividindo sua música “Agnus sei” com “Águas de março”, de Tom Jobim, e desde então não parou mais. Com 43 anos de carreira, ele volta agora ao palco do Miranda, onde apresenta o show “João Bosco Solo”, hoje e amanhã.

Em entrevista exclusiva ao HT, João comenta que se apresentar apenas com voz e violão faz parte de sua própria história. “Este é o resultado de experiências mais recentes, mas é algo que diz muito sobre mim e a minha carreira. A minha vida é um ‘João Bosco solo'”, explicou o músico sobre o espetáculo em que revisita clássicos como “Quando o amor acontece” e “Papel machê”, além de outros sucesso que nunca gravou, como “Because”, dos Beatles, “Milagres”, de Dorival Caymmi e “Medo de amar”, de Vinícius de Moraes.

Quem já assistiu a um show de João Bosco sabe que o músico, no palco, entra em total sintonia com seu violão, em uma espécie de transe criativo que se traduz para as notas propagadas e inevitavelmente emocionam o público. é essa relação de amor à música que, segundo o próprio, influencia no seu distanciamento de redes sociais e aplicativo: “Faço minhas pesquisas e olho meu correio virtual, mas não passo disso. Preciso tocar meu violão”, explica.

Na entrevista que você lê abaixo, João fala sobre as manifestações dos panelaços, a crise econômica, intolerância nas redes, como se encantou pelo talento de Criolo e a inevitável paixão eterna pela música, que carrega até hoje. Vem com a gente:

João Bosco se apresenta hoje e amanhã no Miranda (Foto: Divulgação)

João Bosco se apresenta hoje e amanhã no Miranda (Foto: Divulgação)

HT: Como surgiu a ideia para o espetáculo “João Bosco solo”

JB: A minha vida é um João Bosco solo. Quando comecei em 1972, em um disco que o Antonio Carlos Jobim lançou “Águas de março”, minha música “Agnus Sei” era uma gravação de voz e violão. É algo que diz muito à minha carreira e à minha música: sinto que ela necessita muito do meu violão e dessa relação com o meu instrumento. Alguns discos como o “Acústico MTV” (1992), “Não vou pro céu, mas não vivo no chão” (2009) e “Obrigado gente!” (2006) são solo ou com pouquíssimos músicos. Esse show é um resultado de tudo isso e de uma apresentação recente em Inhotim, que chamei “Passagem de som”, na qual escolhi canções que eu normalmente não canto no show e não fazem parte do meu repertório. “My favorite things”, de “A noviça rebelde”; “Noite cheia de estrelas”, um clássico bem conhecido dos cancioneiros brasileiros, e por aí vai. É um repertório bem solto, que me deixa bem à vontade.


João Bosco – “Agnus Sei”

HT: Com mais de 40 anos de carreira, o que você pensa sobre a nova forma de consumir música via streaming, mp3 etc?

JB: É algo ao qual você não pode estar contra, um fluxo natural do mercado – ele vai crescendo e se colocando dentro das conquistas tecnológicas. Tivemos o 68, o vinil, o CD e, hoje, os meios onde a música é armazenada são diversos. Mas acho que um ponto muito positivo da internet é que ela oferece uma biblioteca musical incomparável! Isso é uma conquista sem volta. O importante é sempre exercer a vontade de apreciar o som.

HT: Entre os novos compositores brasileiros, há alguém que chame a sua atenção?

JB: Uma das pessoas que eu vi recentemente, há uns quatro anos em um evento em São Paulo, é esse músico que se chama Criolo. Ficamos até amigos posteriormente e ele participou da minha homenagem no Prêmio da Música Brasileira, em 2012, conversamos e  temos o desejo de fazer algo juntos. Eu vejo que ele reúne a história da música brasileira e, ao mesmo tempo, tem uma afinidade muito grande com o tempo dele, está muito ligado às transformações que a música sofreu recentemente. Ele consegue fazer um disco de rap, com as influências do hip hop, ao mesmo tempo em que produz um samba tradicional. Ele sabe juntar essas duas pontas. E o segredo é sempre esse: o que me chama atenção como o autor, é saber se doar para o universo brasileiro e juntar as influências com o que vê lá fora, diria até de forma antropofágica, criando um resultando completamente original.


Criolo fala sobre João Bosco
HT: E sobre essa nova geração de artistas, você consegue criar algum paralelo com aquela em que você começou, nos anos 1970?

JB: A única coisa que eu vejo é que a vida continua. Os modelos de algumas décadas atrás não são e nem poderiam ser repetidos hoje. Acho que, hoje em dia, o trabalho não existe em um ambiente com uma fala repressora a esse ou aquele estilo, como havia antigamente. Bastava uma crítica exacerbada para destruir um trabalho. Acho que, hoje, as pessoas estão muito mais aptas a fazer um projeto dar certo.

HT: Ao longo desse anos, mudou algo em você na forma como encara a música, os palcos e a profissão?

JB: O essencial para mim é a música. Nesse ponto, a gente vai aprendendo cada vez mais o seu ofício. Claro, meu violão amplia o universo dele, e as experiências como compositor também são ampliadas devido a outros músicos com quem interagi ao longo desse tempo. É necessário não perder o tesão em querer fazer a música, estar com ela, procurar por ela e estar preparado para recebê-la. O fundamental é isso – não deixar essa chama diminuir nunca; estar sempre produzindo e explorando a música. Comigo, há sempre esse ímpeto.

HT: Como você avalia essa onde protestos do panelaço com os escândalos de corrupção na política e acrise financeira pela qual o país está passando?

JB: As pessoas falam e elas têm todo esse direito. Somos uma população com mais de 200 milhões de brasileiros, há gente sã, biruta, radical, gente sociável… tem de tudo! Na internet você vê isso, principalmente no Facebook. Quando as pessoas têm a liberdade de estarem sozinhas e expressarem seus pensamentos, elas revelam um monte de aspectos do caráter que você não imaginava. E isso não havia antes, essa propagação de ideias. Hoje, tudo é possível. A ideia é conviver com isso e ver como resolver essas situações.

Mas o mundo todo está muito confuso. Os problemas não são apenas locais, são universais. Você vê na Europa, a calamidade absurda da Grécia. Em Portugal, na Espanha, há todo um mundo que está tendo problemas econômicos e financeiros. E isso é a base de tudo – na questão econômica, você vê como cuidam do social. Há uma tendência dentro dos assuntos econômicos, na qual sentimos que precisa haver um novo modelo para tentar diminuir o impacto do que o mundo está atravessando. É preciso que sempre tenha a democracia, porque se algo vai te levar a algum lugar é o diálogo, as ideias, mesmo com ideologias contraditórias. Precisamos entender que o mundo já foi um lugar mais prazeroso, mais equilibrado, mais fraterno. Já foi. Hoje, é mais complicado. Mas também tem muito mais gente do que 50 anos atrás, para o mesmo planeta.


João Bosco canta “O Bêbado e o Equilibrista” ao vivo

HT: Você falou muito sobre essa propagação de ideia via Facebook. Qual a sua relação com a internet? Usa redes sociais e aplicativos? 

JB: Eu gosto da internet para fazer minhas pesquisas. Uso como correio eletrônico, mas não passo disso. Não uso nenhum aplicativo. Eu tenho que tocar meu violão!

HT: Nem o Whatsapp para trocar mensagens de trabalho?

JB: Me recuso! Estou resistindo a esses modelos, porque ainda tenho um bom celular. Não quero estar no meio da rua e ter que trabalhar com internet. No aeroporto, eu quero olhar a paisagem, observar as pessoas. Eu preservo certas qualidades de vida. Ainda estou resistindo a esse excesso de exposição e informação. Gosto de algo mais discreto, calmo e de defender meu tempo.

Serviço:

João Bosco

Datas: 4 e 5 de setembro (sexta e sábado)

Horário: 21h30

Abertura da casa: 20h

Setor Um Tom Acima: R$ 90

Setor Notável: R$ 70

Setor Sustenido: R$ 50

 

INFORMAÇÕES MIRANDA

End: Espaço Lagoon – Avenida Borges de Medeiros, 1424 – Piso 2 – Lagoa – Rio de Janeiro (21) 2239-0305

Capacidade: 320 pessoas

Classificação: 16 anos

Formas de pagamento: dinheiro, cheque e todos os cartões de crédito e débito.

Ar-condicionado central

Mais informações em: www.mirandabrasil.com.br

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