Após uma semana de polêmica, se dividindo entre o backstage-performance montado no Museu de Arte Brasileira e o segredo de estado quanto ao local de seu desfile, Fause Haten divulgou nesta manhã que o desfile de sua FH seria em plena Avenida Paulista. E, claro, todos os convidados correram para o local, em uma espécie de corrida maluca. Chegando lá, os convidados puderam degustar um misto de desfile de moda com apresentação de balé, com as modelos dividindo a cena com bailarinos coreografados por Kátia Barros e Thiago Amoral, que também assinou a concepção geral.
Fotos: Agência Fotosite e Fernanda Calfat
Em seguida, foi a vez da Ellus de se apresentar no Theatro Municipal de São Paulo. E, em uma época onde sobreviver no mundo da moda chega a ser uma façanha e tanto, ter como tema da coleção a sobrevivência – desde as condições extremas no topo das montanhas até o ritmo frenético nas grandes cidades – prova que a grife, com muitos anos de estrada e, por isso mesmo, um verdadeiro baluarte no mercado nacional, está em sintonia fina com o momento atual. O estilista Rodolfo Souza alega que os elementos utilitários dos esportes montanhescos, quando migram para o jeanswear de luxo, tornam-se algo imprescindível à marca. E esporte de luxo, afinal, é o que há na próxima estação. Na cartela de cores, sobressaem os tons escuros que remetem à pouca luz e à profundidade glacial das florestas e tundras, mas as peças em caramelo merecem menção. Os bordados florais negros (uma das padronagens mais importantes do próximo inverno, junto com os xadrezes e prints de gatinhos) comparecem nas rendas e organzas, imprimindo atmosfera soturna ao conjunto desfilado, enquanto os tweeds e o jacquard snow cumprem a função de evocar a neve em peças como as jaquetas com pele ecológica de ovelha. E, como nesta temporada ainda temos a influência do Oriente, o jeans bruto – uma das apostas principais da grife – volta à cena aludindo ao Japão. Nós, do site, ficamos loucos com as salopettes e jaquetas com detalhes matelassados, assim como o macacão usado por Carol Trentini. No mais, destaque para os acessórios pontuais, as botas e os looks em verde militar ou caramelo, que são mais uma aposta da grife na releitura noventista.
Fotos: Agência Fotosite
Como uma espécie de Dr Calighari do estilo, João Pimenta resolveu fazer experimentos com a alfaiataria e a silhueta masculina. Em seu laboratório secreto vale tudo, desde confrontar opostos como shapes slim e oversize, até apostar em uma construção tubular, onde não há espaço para costuras laterais, frontais ou posteriores. E mais: em seus experimentos de cientista louco da moda, existe até mesmo a possibilidade de subverter o estereótipo tropical do homem brasileiro, apostando em uma criatura que sente frio. Para João, o clima subtropical do Sul do país funciona como uma espécie de celeiro da moda, incubadora tanto de modelos quanto de confecções. Assim, ele prefere tirar do armário (em ambos os sentidos figurados) o imigrante italiano machão, que evoluiu nesse ambiente geográfico e que é fruto de tradições como o apreço familiar, a vinicultura e a religiosidade. No frigir dos ovos, surge na passarela uma figura masculina, latino-européia, envergando cores claras que remetem, ao mesmo tempo, ao frio das geadas e às gamas que traduzem essa mesma latinidade máscula. Muito branco, bege, creme e off white, portanto, contracenam com mate, vinho, charuto e preto em um resultado que, em alguns momentos, chega a lembrar um outro personagem latino, aquele pimp chicano que transita pelo submundo bafônico de cidades como Nova Iorque e Chicago. Os sobretudos com lapelas destacadas, os chapéus de aba larga, os paletós jaquetão, as camisas abertas e calças longilíneas contribuem para essa associação, deixando de fora do arquétipo somente a pluma de faisão da lateral das cabeças. Um quê de Snoopy Dogg e 50 Cent, portanto. E, por fim, super valem os calçados, em carmim ou telha, desenhados por Pimenta e produzidos pela West Coast.
Fotos: Vinícius Pereira
A Forum deu prosseguimento ao trabalho de prints gestuais que tem feito há quatro temporadas, desde a primavera-verão 12/13, quando desenvolveu com o ilustrador Felipe Jardim estampas corridas com motivos de caipirinhas e acerolas. Dessa vez, Marta Ciribelli, estilista da grife, optou pelos elementos urbanos da capital paulista como postes, postes, ruas,carros, a noite e até os emaranhados de fios. E, se levarmos em conta que o currículo de Marta traz anos à frente no estilo da finada Yes Brazil – uma grife onde o forte eram as estampas corridas -, podemos imaginar que ela deve mesmo fazer a maior festa na fase atual da Forum. A belíssima estamparia da artista Carla Caffé revisita construções como o sinuoso Edifício Copan e até aqueles galpões industriais do bairro da Moóca. Não ficaram de fora nem mesmo as várias camadas de papéis rasgados sobrepostos nos outdoors e, completando o aspecto lírico dessas ilustrações, a grife ainda brincou com layers feitos com paetês 3D ou furta-cor sobre lã negra, remetendo às janelas acesas dos prédios no skyline urbano. Em relação à silhueta, a marca apresentou aquelas peças que têm composto o seu DNA recente: formas secas combinadas com outras amplas em alfaiataria bem cortada, onde os vestidos curtos ou midi ganham força total quando usados com sobretudos e pullovers da vez. Mas, no geral, foi o talho das calças, pantacourts e bermudas que deixou o povo da primeira fila ouriçado. No mais, vale mencionar a bela top gringa Candice Swanepoel majestosamente abrindo e fechando o desfile. Luxo perde!
Fotos Agência Fotosite
A Triton de Karen Fuke e Igor de Barros, ela no feminino e ele à frente do masculino, é jovem e visceral. Desta vez, eles usaram referências como manuscritos, caligrafias, rosas, pergaminhos e espelhos para criar uma coleção que transita, entre o estilo rocker e o personagem do motoqueiro, aquele mesmo da Califórnia e da Rota 66, inspiração que é forte para o inverno 2014. Sem dúvida, uma figura icônica, com suas jaquetas perfecto, couros e botas beatnik repletas de tachas e aplicações metálicas. Tanto que é possível enxergar essa figura, mesmo quando ela nem é mencionada no release, dada sua presença recorrente no mundo da moda. Para as mulheres da marca, a grife trouxe surpresas como a desconstrução da perfecto, modernizada, mais comprida na frente e curta atrás. Bom exercício de modelagem. Os vestidos diáfanos conferem frescor à coleção, mesmo quando em looks onde a bota está presente. Predominou uma cartela de cores sóbrias, como preto, vinho, rosa, nude, cinza e azul claro, que colaborou para pontuar a camisaria sob suéteres e os jeans detonadões, rasgados, sujos de tinta. Para os meninos, Igor definou o parka fundido aos abrigos com cangurus como fio condutor da história, em resultado urbano intensificado pelo mix de estampas e pelas sobreposições. Os capuzes dos hoodies em couro preto foram uma ótima sacada e vale mencionar as pochetes, mochilas e bonés com aplicações em madeira e os sapatos e sandálias com solados em cortiça, soluções espertas desenvolvidos em parceria com o ateliê Casco, que usa materiais sustentáveis. Na passarela, duas surpresas: a top Flávia Lucini de cabelos curtos (ficou linda!) e a atriz Fiorella Mattheis voltando aos tempos de modelo, surgindo como quem não quer nada. Enquanto isso, na primeira fila, famosos como Ellen Jabour, Marina San Vicente e o estilista Eduardo Pombal ficaram eclipsados pela presença arrasadora de Tatá Werneck, a Waldirene da novela das nove.
Fotos: Vinícius Pereira
Depois da Uma e de Fause Haten, foi a vez da Cavalera entrar na dança. Explica-se: em uma edição em que as coreografias têm sido forte aliado performático para conduzir as coleções, a grife de Alberto Hiar surpreendeu todos com um show muçulmano no anfiteatro do Parque Villa-Lobos, com direito a abertura com solo de guitarra pelo músico Luiz Carlini, dançarinos beduínos, música árabe e encerramento com número de belly dance a cargo de Sonia Atthieh. A gente até esquece que o dia foi pesado, com muitos desfiles para cobrir e que a Cavalera atrasou bastante o início do seu. Mas, apesar do atraso, a grife não poupou esforços para agradar e fez uma apresentação memorável, com boa coleção, também genial, desenhada com competência pela equipe de Francis Petrucci, styling inspiradíssimo de David Pollack e boa direção de Van Vieira. Vale todo o empenho, assim como o resultado. E, se na plateia os olhares iam para Letícia Spiller, convidada da grife (que até arriscou uns passinhos na farra final), o público acompanhava atento na passarela (ou melhor, no palco) a sucessão de looks que imprimiram um olhar contemporâneo sobre a cultura muçulmana. Mas errou quem pensa que a marca desfilou figurinos ao invés de peças usáveis. Por trás de toda aquela roupagem étnica – com direito até a badulaques que lembram os ornatos dos dromedários – havia peças de verdade que poderão ser usadas no dia a dia, mesmo que nem passe pela cabeça do consumidor dar uma passadinha pelo Instituto do Mundo Árabe na próxima visita a Paris. Looks em preto total, paletós cropped, bermudas em alfaiataria com comprimento midi, blusas que evocam tapeçarias, suéteres, calças estilo moletom e tricôs bacanas ganharam texturas que parecem o artesanato local, enriquecidos por estampas localizadas de camelos e lâmpadas das mil e uma noites, provando que a mão de Fátima – outro elemento icônico da cultura árabe presente nas peças – deve ter abençoado esse time. E, no final, segue a lista de três desejos dignos de serem pedidos a algum gênio da lâmpada fashionista: o sobretudo usado pela modelo Renata Scheffer, as calças masculinas com amarrações logo abaixo do joelho, a mochila com trabalho artesanal e as sandálias de couro. Ih, já são quatro pedidos. Será que o gênio não deixa passar esse número de desejos?
Fotos: Vinícius Pereira
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