A diversidade de propostas marcou o 5º e último dia (7/11) da 38ª edição da São Paulo Fashion Week, realizada no Parque Ecológico Cândido Portinari durante esta semana. Coube a 2nd Floor, segunda marca da Ellus e egressa do Fashion Rio, começar a jornada entrando numa gelada. Literalmente. É que a inspiração para seu inverno 2015 é a Islândia, país encravado no Atlântico Norte, bem pertinho da Groelândia e famoso pelos fiordes, piscinas naturais de água quente e geisers, com povo de olhos puxadinhos, meio com cara de esquimó. Mas quem pensa que a levada era étnica, se enganou em gênero, número e grau. Das estampas de vulcão e geleiras às referências esportivas, como números aplicados nas roupas e barras de vestidos e meiões listrados, a marca aposta em moda jovem pronta para ser assimilada assim que chegar às lojas. Dessa vez, ela desfilou somente o feminino, à exceção dos looks usados por Fiuk, que compôs a dupla de celebridades na passarela junto com Laura Neiva. Como outras grifes na temporada, a brand se concentra agora em cartela de cores enxuta, com preto, branco, cinza, vermelho e azul royal, conseguindo passar a atmosfera glacial pretendida. E, como estamos falando do DNA Ellus, óbvio que o jeans pontua a coleção, com lavagem que colabora na leitura desse frio de doer os ossos.
Em seguida, a Acquastudio, grife que se alimenta sempre do minimalismo, pesquisa o barroco mineiro para apresentar looks… minimalistas! O resultado, aliás, ficou lindo, e HT arrisca dizer que esta talvez seja uma das melhores coleções da marca nos últimos tempos. A estilista Esther Bauman prova que é possível partir de um tema over para captar aquilo que interessa, alcançando a elevação absoluta da limpeza de formas, mas enriquecendo o conjunto com a textura dos jacquards e bordados delicados, como as flores metálicas de alguns vestidos. Praticamente a própria essência do espírito barroco: a simplicidade exterior das formas aliada à riqueza das aplicações e o uso do dourado, equivalente aqui ao que seria o interior das igrejas.
Egressa de Minas, Apartamento 03 – que pertence ao Nohda, o grupo criado por Patrícia Bonaldi que também inclui sua grife de mesmo nome, a PatBo e Lucas Magalhães – é outra estreante na SPFW que faz bonito. Luiz Claudio, o diretor criativo, é mais um designer que parte nesta temporada de um filme de cinema para criar uma coleção, no caso, “Dersu Uzala”, (idem, Atelier 41 e outros, 1975), clássico do mestre Akira Kurosawa e, portanto, o japonismo está presente nas formas amplas, na economia de cores, nas estampas geométricas ou de galhos, no apreço pelas texturas, na predileção por longos e longuetes. Bonito de se ver, é mais uma marca que a gente torce para vender bem.
A estética clean de Helmut Newton é inspiração para o inverno de Wagner Kallieno, um designer que anda mostrando que entende do riscado. Com peças de ótimo corte em cartela de preto, branco e marrom, ele é mais um que joga com o trio monocromia versus grafismo versus minimalismo, tentando traduzir assim o trabalho do fotógrafo e buscando o equilíbrio, através de simetrias e assimetrias. Correto.
As irmãs Laura e Lorena Tavares, da Llas, estão aos poucos conquistando espaço na moda. Mineiras (mas com um pé em São Paulo), estudaram em Paris, participaram (e venceram) a primeira edição do concurso Ready To Go – iniciativa do Workshop MIT – e ganharam o direito de desfilar no Minas Trend. Agora, elas são as vencedoras do Prêmio Hot Spot, que fomenta novos designers e, de quebra, foram contempladas com uma apresentação na SPFW, além de ter coleção produzida e vendida pela Riachuelo, ainda em novembro.
Quem conhece o trabalho delas desde o início, sabe que elas costumam ser adeptas daquela roupa limpa e cool, que tem como exemplos máximos a paulista Clo Orozco e a carioca Andrea Saletto. Pelas peças apresentadas nesta sexta-feira, é possível perceber que as meninas agora enveredam por outro caminho, talvez uma evolução de sua percepção de estilo. As formas estão mais descomplicadas ainda, fáceis, tudo é muito simples. Em compensação, bem mais decoradas, com peças inteiras de renda sobrepostas ou muitas aplicações, seguindo a tradição mineira do bordado, ainda que de um jeitinho descontraído. Tipo assim: em cima, uma camiseta sem muitas delongas, mas com um bordado na manga de um dos lados, bem colorido; embaixo, uma saia toda em renda guipure. E finalizando o look, um legging por baixo e um All Star customizado.
Lorena conta para HT depois do desfile, no camarim: “Dessa vez fomos para outro lado, nunca investimos tanto em decoração na coleção. É uma fase, tudo pode acontecer e pode ser que daqui para frente façamos completamente diferente”, revela, completando que, agora, parte da coleção é produzida em uma nova unidade em São Paulo, a outra em Minas. E, diante da nova pegada moderninha, uma quantidade de descolados na plateia, prontos para conferir seu trabalho. Entre ele, Marcelo Sommer e Dudu Betholini, dois talentos de primeira grandeza que se viram obrigados a enfrentar as mazelas de um mercado difícil. A gente torce para que as garotas da Llas tenham sorte.
Em tempo: na trilha sonora, o impagável Zé Pedro, que já tinha o ar de sua graça na véspera no desfile da Têca. Mas, ao seu lado, Alice Caymmi, neta de Dorival, filha de Danilo, sobrinha de Nana. Nem é preciso dizer que esse talento familiar continua dando fruto nos genes da geração mais nova da família. Ela conta: “O Paulo Martinez (que fez o styling no desfile) chamou o Zé para fazer a trilha, que me chamou. Aí escolhi cantar “Homem”, de Caetano Veloso, que está neste meu segundo álbum, “Rainha dos Raios”, lançado pela Joia Moderna. “Mas e “I feel love”, da Donna Summer, que você também cantou, poderosa, no desfile?”, pergunta HT. Ela nem titubeia: “Ah, não está no álbum, mas eu gosto e canto no show, assim como ABBA. Zé Pedro completa: “O povo da moda precisava conhecer o trabalho de Alice. Agora até o Paulo (Borges) já é fã”.
Amapô
Encerrando a temporada de lançamentos, a TNG comemora 30 anos de estrada. Tito Bessa, o homem à frente da marca, conta: “Para essa data tão especial, abri mão do tradicional casal da novela das nove na passarela, substituindo por três tops que fizeram história na marca, tanto nos desfiles como em campanhas: Mariana Weickert, Paulo Zulu e Michelle Alves“. Bom, se Gisele causou rebuliço na terça-feira, então cabe a outras tops do babado, Mari e Michelle, encerrar com pompa esta edição do evento. E Zulu, claro, nem se fala, envelhece como vinho, é magnético. Na trilha, hits dos Beatles, também sob a batuta de Zé Pedro. Entre eles, “Get Back” faz o público mexer pezinho. Eterno mesmo.
E a moda? Bom, veio na medida certa, perfeitinha para encerrar a maratona de desfiles. Tendo como inspiração a própria história do denim – base da identidade da marca –, desde seu surgimento no final do Século XVIII, a label de Tito Bessa pega carona no fato de o jeans ter se tornado a roupa dos mineradores na corrida do ouro, no Velho Oeste americano, para fazer releitura dessa roupa. Assim, utilitários como jaquetas, calças e saias cheias de bolsos, macacões e jardineiras ressurgem em novas lavagens – como a que mistura resina com barro para lembrar o uso nas minas de ouro, São itens com acabamento que remete ao desgaste das peças no garimpo e se encontram em sintonia com a releitura do look destroy noventista, de novo sob os holofotes das tendências. E, como a grife também tem um pé na alfaiataria, modelagens militaristas de 1800 são revisitadas, com paletós, trench coats e casacos em lã completando o sortimento. Coleção amarradinha, com boas soluções usáveis tanto para elas, quanto para eles.
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