SENAI CETIQT: Celeiro de talentos da moda e design, Projeto Pipa Social gera transformação social e ganha o mundo


O projeto foi idealizado por Helena Rocha com o objetivo de proporcionar visibilidade a talentosas artesãs que moram em áreas de vulnerabilidade social, no Rio de Janeiro, para que elas possam viver da própria arte. Ao longo de quase 11 anos, o Pipa Social desenvolve o trabalho em 55 comunidades investindo em um Banco de Talentos de empreendedores sociais que trabalham com arte, artesanato e moda, para promover a qualificação profissional com geração de trabalho e renda, acesso à informação com consultorias exclusivas, e formalização nos negócios, cujos produtos começam a ser exportados

O projeto Pipa Social tem atuação importantíssima como polo de criação coletiva, de produção e de informação voltado para moradores de comunidades de baixa renda, com foco na busca por posicionamento profissional e consequente inclusão social. “Queremos ser referência como projeto de inclusão que ousou dar um passo a mais na transformação social de pessoas que vivem em comunidades de baixa renda para diminuir o abismo entre morro e asfalto”. A frase é da fundadora e presidente do projeto, Helena Rocha, que trabalha no terceiro setor há 23 anos. Pois foi ela a palestrante da live “Moda Circular — De Vento em Pipa“, promovida pelo Projeto Moda Circular: O Início de Um Novo Ciclo para a Indústria da Moda, fruto de uma parceria entre o SENAI CETIQT e a Laudes Foundation, que promove ações para apoiar a transição da moda brasileira para um modelo mais circular de produção e consumo. Conduzida pela consultora do Instituto SENAI de Tecnologia Têxtil e de Confecção Michele Souza, a conversa nos proporcionou um mergulho no projeto Pipa Social, que está alçando voos altos ao levar para o mundo as criações das mulheres artesãs em forma de moda e design.

Diferentemente de muitos outros projetos que treinam, capacitam, dão um outro norte para aquelas pessoas, mas sem um acompanhamento posterior para que consigam viver da própria arte, o Pipa Social traz, em si, uma ligação com a longevidade, com o apoio à futura empreendedora. Afinal, é preciso sustentar o negócio até chegar à formalização. Pensando em como essas pessoas poderiam ter seu sonho realizado, Helena Rocha criou uma metodologia social baseada em geração de trabalho e renda, no acesso à informação de qualidade e a formalização dos negócios. “Nosso objetivo é dar visibilidade a essas profissionais e ajudá-las a fazer negócio”, explica, acrescentando: “O mais importante nesse trabalho é que essas mulheres têm uma resposta ágil, rápida e comprometida com o ir para a frente. É muito bom saber que estamos transformando vidas e que as nossas próprias vidas também estão sendo transformadas”.

A alta potência das mulheres em ação no projeto Pipa Social (Foto: Reprodução/Instagram)

Durante a pandemia, Helena percebeu a oportunidade de dois grandes movimentos: ampliar o número de pessoas beneficiadas pela metodologia social da Pipa e exportar os produtos: “Nós criamos dois projetos: o Pipa no Ar, uma plataforma digital de ensino à distância para podermos aumentar o número de pessoas beneficiadas, e o Pipa Exportação, que tem o apoio da Apex Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) e já nos levou para a Expo Dubai, Paris, Londres e Bogotá. Ou seja, estamos ampliando a nossa exportação de produtos feitos com a energia das brasileiras e com o comprometimento da utilização de materiais nacionais, como resíduos das indústrias que seriam descartados, tais como tecidos, couro, ferragens”. Conclusão: o mundo está conhecendo a moda, a arte e as joias produzidas pelas mulheres das comunidades do Rio de Janeiro.

Este slideshow necessita de JavaScript.

Ao longo de quase 11 anos, o Pipa Social desenvolve o trabalho em 55 comunidades do Rio de Janeiro. Trinta e oito por cento dos beneficiados criaram marca própria com a ajuda de voluntários da Pipa, empresas e pessoas físicas. Com isso observou-se um aumento de 35% na renda familiar e 45% dos participantes do projeto se formalizaram. Ao todo 120 mil peças já foram confeccionadas por 980 pessoas trabalhando diretamente e 4.700, indiretamente.

Helena considera os números robustos, mas enfatiza que os sonhos vão muito além: “Por isso, nós criamos o projeto Pipa no Ar com o objetivo de beneficiar mais gente, porque talento, criatividade e garra não faltam dentro das comunidades. Observamos uma efervescência incrível na criatividade. E acompanhar, participar de alguma forma, é muito interessante e prazeroso”.

E acrescenta: “Somos muito ousadas e muito exibidas, também (risos). E temos que ser mesmo, porque o trabalho que essas mulheres, as nossas pipetes, fazem é espetacular. A criatividade, a aceitação na hora em que se fala de arte, elas entendem que têm que ter uma desconstrução das amarras, dos conceitos, das técnicas para voar livre, soltar pipa”. Para vocês terem uma ideia da potência do projeto, entre os clientes do projeto estão grandes marcas como Lenny Niemeyer, Papel Craft, Galeria Hathi, Guto Carvalhoneto, Master Card, Heineken/Devassa, Farm, Vivo, Rede Globo Recicla, Hotel Fasano, Fábula (FARM), Iara Figueiredo, Bossa Brasil, Mariah Rovery, East Eagle.

Helena Rocha conta que tudo começou com a ideia de fazer um projeto-piloto com moradores do Morro Santa Marta, em Botafogo, mas a expansão da área de atuação foi meteórica, “porque vinha uma artesã e dizia que tinha uma prima no Complexo do Alemão que era excelente crocheteira ou que conhecia alguém que fazia macramê e bijuteria na Cidade de Deus. E assim, vários talentos foram aderindo ao projeto que expandiu seu território”, comenta.

A Pipa já começou ousada. Era para fazer um projeto-piloto para ver como seria, acertar os rumos. Mas, os rumos foram vindo e a gente foi se acertando. Já começamos crescendo rápido. Eu pedi uma pesquisa para saber se estávamos indo na direção certa. Foi feito um trabalho com as artesãs durante um ano, aplicando questionários de dois em dois meses para saber o quanto tinha gerado de renda, o que havia mudado em suas vidas etc. Cem por cento das mulheres construíram ateliês em casa e começaram a gerar mais renda. É disso que precisam, pois são autônomas. Fazemos a interface delas com o mercado através de apoios e parcerias. Conseguimos desenvolver esses talentos e colocar no mercado. Isso é fantástico – Helena Rocha

A Pipa Social foi fundada para ser um instituto socioambiental. Há 11 anos, a instituição está voltada para a sustentabilidade e para diminuir as desigualdades sociais, a partir da educação e colaboração para se criar produtos sustentáveis. A missão é investir em um Banco de Talentos de empreendedores sociais que trabalham com arte, artesanato e moda, para promover a qualificação profissional com geração de trabalho e renda, acesso à informação com consultorias exclusivas, e formalização nos negócios.

Em relação ao Pipa Exportação, o trabalho manual é feito, também, sob uma reflexão. “Cada artesã vai encontrar as linhas, as cores que vão harmonizar esse trabalho. Depois, elas vão fazer todo esse alinhavar dos fios, juntar com uma estrutura que seja compatível para que ela possa aderir e que seja um trabalho de reflexão e de intuição, de harmonia e de arte. Em tempo: as mulheres integrantes do Pipa fizeram, recentemente, peças de arte com um olhar voltado para a obra de Tarsila do Amaral, a partir de um projeto incentivado por Tarsilinha do Amaral, sobrinha-neta e curadora da obra da pintora modernista.

Foto: Reprodução/Instagram/Pipa Social

“Eu falo muito em artes manuais, mas estamos vivendo a Quarta Revolução Industrial, em que temos a nanotecnologia, a Inteligência Artificial, os robôs, a internet das coisas; enfim, estamos trabalhando muito no sentido, também, de buscar materiais sustentáveis até que venham da própria tecnologia que está transformando esses lixos, esses resíduos em novas matérias-primas. A gente está com um foco muito grande em cima não só do que recebemos como insumo, mas na busca também de novas matérias-primas, de fibras naturais”, pontua Helena Rocha.

Sobre a inciativa educativa para estender as práticas sustentáveis para o cotidiano das pessoas que são impactadas pela Pipa, Helena diz que é fundamental e que só no conceito não funciona. A ideia é saber que temos recursos e trabalhar, na prática, como utilizar todos os nossos recursos. E começa pela separação do lixo, é bem o bê-á-bá mesmo. “Todos os nossos cursos, as nossas oficinas, as nossas aulas, as nossas palestras são em função da economia circular e de a gente aprender a trabalhar com os recursos que temos na mão e que não são lixo. Tudo é reaproveitável, tudo pode ser transformado, desde o lixo orgânico, do qual se pode fazer a compostagem, até a garrafa PET, as placas de raio-X, que são transformadas, por exemplo em brincos”.

Este slideshow necessita de JavaScript.

O Pipa no Ar vai trabalhar tanto no município do Rio como também da Região Metropolitana. E educação financeira é fundamental. “Juntamos quatro temas: educação ambiental; inteligência emocional; História da arte, da moda e do design, que é do que precisamos para desabrochar esses talentos com conhecimentos sobre arte da moda, da indumentária, do design, saber o que está acontecendo desde outros séculos até agora, como foi desenvolvido todo esse conceito de moda até chegarmos na economia circular, que isso não é mais futuro e que a educação está na preservação do nosso planeta e que sem isso a gente sucumbe. Até chegar aqui, todo o sistema de moda é muito poluente e como estamos indo por um caminho de sustentabilidade”, diz Helena.

O quarto tema é entender o que representa o Rio de Janeiro. “Estamos trabalhando no sentido de entender a nossa própria identidade, as tradições, histórias, o que queremos, o que gostamos e, a partir daí, idealizar produtos criativos e contemporâneos para exportação. Estamos incrementando a sustentabilidade, a criatividade. Vamos ter o Rio de Janeiro como um tema muito importante para a criação desses produtos. Daí vêm as oficinas em que vamos trabalhar com os recursos, criar uma peça coletiva a cada aula. Acho que, com isso, a gente consegue formar novas designers no desabrochar dos talentos e de todos esses temas que são fundamentais para a formação profissional, porque elas serão sempre autônomas. É formar empreendedores”, explica Helena.

Acrescenta ainda que o empreendedorismo está dentro do tema de educação financeira, o marketing, branding, está dentro disso também. “Como é que eu vou vender a minha marca? Isso tudo está dentro do projeto Pipa no Ar. São cinco meses de curso. Mas temos certeza de que com esse curso vamos formar muita gente boa, que já tem talento, que já é criativa, é só saber como dar linha para essa pipa”.

Existe um grande número de empreendedores talentosos e criativos nas comunidades cariocas. A Pipa Social reúne e conecta esses talentos para a confecção de produtos criativos. Nosso trabalho começa onde todos os outros terminam. Não queremos somente que eles sejam inseridos no mercado. Queremos que eles CRIEM mercado. Com eles, criamos produtos personalizados e valorizamos as técnicas manuais – Helena Rocha

E qual é a dica de ouro para quem quer trabalhar com o terceiro setor? “Eu bato numa tecla que é a criatividade que vem das periferias. É tanta gente boa, criativa e talentosa que só precisa de uma oportunidade. Quem vem já está praticamente pronto, é aquela coisa de se dar as mãos mesmo, de trabalhar gerando e criando oportunidade para essas pessoas. É disso que precisa para diminuir esse abismo, para a gente poder trabalhar junto, poder olhar para o futuro de uma forma sustentável, para a gente conseguir aprender e trocar ideias. Essa oportunidade que falta para que a gente diminua esse abismo da desigualdade em relação à educação. Acho que a gente precisa muito mais, do lado de cá, trazer pessoas que possam nos ajudar a gerar conhecimento e dar oportunidades de trabalho. A gente já tem o ouro na mão, só precisa abrir portas”, frisa a presidente do Pipa Social.

PILARES DO PIPA SOCIAL

  • Geração de trabalho e renda. Oferecer oportunidade de criação conjunta de coleção de moda e design com profissionais, desenvolvimento de produtos e confecção de peças que serão comercializadas no mercado formal.
  • Estimular o direito à informação sobre design, moda, cultura, arte e artesanato através de palestras, intercâmbios, encontros, oficinas e seminários, onde profissionais renomados dão consultorias e oportunidades de trabalho.
  • Estimular e fortalecer a organização econômica e social de cooperativas e associações de comunidades de baixa renda visando à formalização nos negócios e consequente resgate da cidadania.