SENAI CETIQT: As fibras celulósicas sustentáveis para a indústria da moda e o case da gigante Lenzing


Dentro do ‘Projeto Moda Circular – O Início de Um Novo Ciclo para a Indústria da Moda’, uma parceria entre o SENAI CETIQT e a Laudes Foundation, a consultora do Instituto SENAI de Tecnologia Têxtil e de Confecção, Angélica Coelho, conversou com o gerente-técnico da Lenzing Fibers América do Sul, o engenheiro têxtil Gilberto Campanatti, sobre sustentabilidade, circularidade, rastreabilidade e transparência na área de fibras celulósicas desenvolvidas pela gigante austríaca Lenzing, líder mundial em produção de celulose e fibras (totalmente biodegradáveis) fornecida para a indústria de têxteis e nãotecidos

Todos os holofotes voltados para a indústria têxtil e como ela está mudando o mindset adotando a sustentabilidade no processo de produção para contribuir no enfrentamento das questões ambientais, como poluição e emissões de carbono. Maior centro latino-americano de produção de conhecimento aplicado à cadeia produtiva têxtil, de confecção e química, e referência em tecnologia, consultoria e formação de profissionais qualificados para a Quarta Revolução Industrial, o SENAI CETIQT e a Laudes Foundation criaram em parceria o Projeto Moda Circular – O Início de Um Novo Ciclo para a Indústria da Moda, que visa disseminar informações e práticas de produção menos agressivas ao meio ambiente. E vamos destacar para você, leitor, o bate-papo entre a consultora do Instituto SENAI de Tecnologia Têxtil e de Confecção, Angélica Coelho, com o gerente-técnico da Lenzing Fibers América do Sul, o engenheiro têxtil Gilberto Campanatti, sobre sustentabilidade, circularidade, rastreabilidade e transparência na área de fibras celulósicas desenvolvidas pela gigante austríaca Lenzing, líder mundial em produção de celulose e fibras (totalmente biodegradáveis) fornecida para a indústria de têxteis e nãotecidos.

Floresta de Faias (árvore conhecida como a “mãe da floresta) mantida pela Lenzing, gigante em produção de celulose e fibras (Lenzing AG Fotógrafo: Markus Renner / Electric Arts)

A Lenzing foi fundada na Áustria em 1938 e adotou o nome da pequena cidade onde aportou, à beira do Lago Attersee, de águas puríssimas. Atualmente, tem unidades nos principais mercados do mundo e uma receita de impressionantes 1,6 bilhão de euros. A Lenzing é uma empresa que está no início da cadeia de valor de produção de têxteis e nãotecidos e como produtora de celulose e fibras, trabalhando sempre em sinergia com clientes e parceiros para desenvolver soluções que agreguem mais valor para seus produtos.

“Temos cerca de seis mil funcionários na fábrica, enquanto a cidade tem cinco mil habitantes. Um belo dia, alguém inventou a palavra sustentabilidade, que nem se imaginava o que poderia ser há 83 anos, quando a Lenzing surgiu”, conta, Gilberto Campanatti. “Sustentabilidade foi definida como um tripé em que, para nos mantermos vivos, precisamos ter responsabilidade econômica, ambiental e social. Hoje, sem deixar de lado essas três diretrizes básicas, trabalhamos também com o tripé da sustentabilidade, baseado em confiança, transparência e rastreabilidade. São três pontos que toda empresa que preza pela sustentabilidade precisa trabalhar muito bem”.

Lenzing foi fundada na Áustria, em 1938, e adotou o nome da pequena cidade onde aportou, à beira do Lago Attersee, de águas puríssimas. Atualmente, tem unidades nos principais mercados do mundo (Lenzing AG Fotógrafo: Bavaria Luftbild Verlags GmbH)

Com a implementação de suas metas baseadas na ciência, o Grupo Lenzing contribui ativamente para enfrentar os problemas causados ​​pelas mudanças climáticas. Em 2019, a Lenzing assumiu o compromisso estratégico de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa por tonelada de produto em 50% até 2030. A meta é ser neutra para o clima até 2050. A implementação de dois projetos principais no Brasil e na Tailândia é um marco importante nesta jornada.

Celulose (Lenzing AG Fotógrafo: Franz Neumayr)

Campanatti conta que há 15 anos foi feito um estudo chamado ‘Celulose Gap’, que apontou, por exemplo, que a produção de algodão está próxima do limite. “Hoje produzem-se 24, 25 milhões de toneladas por ano no mundo, podendo chegar a 27, 28 milhões de toneladas, não muito mais que isso”, prevê o gerente-técnico e engenheiro têxtil da Lenzing. “O crescimento populacional vai demandar mais roupa e comida num cenário onde as terras agricultáveis estão em seu limite e a produção de algodão deve crescer pouco. Provavelmente, a falta de algodão será suprida por outras fibras. No caso, as celulósicas são o substituto mais natural. Vemos um futuro de cada vez mais crescimento no uso das nossas fibras”.

Produção de Liocel (Lenzing AG)

A transparência, cada vez mais exigida, não é apenas a que a empresa passa para o mercado, mas o que precisa ter para abrir suas fábricas e ganhar o respaldo de entidades que atestarão a veracidade à nível de sustentabilidade: “A frase famosa ‘La garantía soy yo’ não funciona mais dentro da cadeia têxtil. Tudo que comunicamos precisa ser comprovado. Dentro da cadeia de valor da Lenzing, começamos pela matéria-prima que utilizamos, madeira com as certificações FSC ou PFSC. No processo de produção, temos todos os ISO; temos o selo EcoLabel, da União Europeia, um dos mais difíceis de se conseguir, porque eles analisam todo o ciclo de vida da fibra, da origem ao descarte final; temos o Ecovadis, que olha toda a segurança de processo; fazemos análise de ciclo de vida em nossos produtos; os índices – enfim, vários processos, certificações e selos que garantem que o processo é correto, de baixo impacto ambiental e feito com responsabilidade social”, relata Campanatti.

Filamentos de Liocel da marca Tencel Luxe (Lenzing AG Fotógrafo: Michael M. Vogl)

Além das empresas classificadoras de produtos e processos, a Lenzing também busca o a certificação de organizações internacionais como a ZDHC, a Fundação Ellen MacArthur, a Textile Exchange e outros órgãos mundiais que avaliam e classificam empresas como sustentáveis, não-sustentáveis, que cuidam do ambiente, que não cuidam, que cuidam ou não das florestas, que cuidam ou não das pessoas. “Quando falamos de um produto ou a respeito do nosso processo, não é simplesmente ‘La garantía soy yo’. Para obter esses selos, a transparência é fundamental. Tem que abrir seus processos, seus números, toda informação para ser verificada e poder receber essas comprovações autorizadas”.

Roupas feitas de fibras da marca Tencel (Lenzing AG Fotógrafo: Richard Ramos)

O terceiro pé da sustentabilidade, a rastreabilidade, é trabalhado em três níveis. O primeiro é a certificação de tecido Lenzing, que garante que o produto foi feito com uma fibra da tradicional fábrica austríaca. A rastreabilidade física (no caso, um rastreador dentro da fibra), vem em segundo lugar. O terceiro nível é o trabalho com o blockchain, tecnologia que permite rastrear o uso de fibras sustentáveis, desde a matéria prima até chegar à loja e o descarte. A Lenzing vem trabalhando diretamente com a Textile Genesis, empresa indiana de blockchain que visa garantir a autenticidade da fibra contra os genéricos. “Você pode ter um QR code para onde apontar o celular e conhecer toda a história daquele produto: de onde veio a fibra, qual é a origem do fio, a malha, quem fez o pedido, quem finalizou, quem costurou. Enfim, você tem toda a trajetória do produto que está comprando”, diz Gilberto Campanatti.

Filamentos de Liocel, fibra sustentável de baixo impacto ambiental, da marca Tencel Luxe (Lenzing AG Fotógrafo: Michael M. Vogl)

A rastreabilidade Lenzing é a certificação de tecidos feita a partir da plataforma E-Branding Service: “O cliente se cadastra e faz o pedido de certificação do tecido que criou e produziu. Ele passa as informações sobre o tecido. Além da certificação, fornecemos todas as licenças legais de marketing, de produto e as etiquetas. É uma plataforma de branding que inclui a parte de certificação do tecido. A empresa entra nessa plataforma, preenche os dados da requisição de certificação, envia um tecido para ser testado. Essa amostra é testada na fábrica da Lenzing, que comprova ou não sua autenticidade. Fazemos uma breve análise de qualidade e, se houver correção a fazer, fazemos junto com o cliente”.

Uma vez certificado e aprovado, o tecido recebe um número de certificação, como se fosse um RG, e o cliente recebe uma carta com este número. A primeira forma de rastreio é essa certificação do tecido.

Roupas produzidas com fibras Lenzing Ecovero (Lenzing AG Fotógrafo: Richard Ramos)

Campanatti conta que de três anos para cá, começaram a implantar a rastreabilidade física, depois de mais de uma década de estudos. Dá para resumir assim: as fibras celulósicas podem ser identificadas através de testes químicos e físicos. “Nós desenvolvemos uma forma de colocar um rastreador, como se fosse um DNA, dentro da fibra. Da madeira nós fazemos a polpa e, conforme usamos a polpa e produzimos a fibra, injetamos dentro dela o rastreador, como se fosse um DNA”, revela o engenheiro têxtil. “Com esse rastreador conseguimos identificar a fibra mesmo depois de qualquer tipo de processo, mesmo numa roupa com 20 anos de uso. Como ele está dentro da fibra, e vai continuar lá para o resto da vida, a rastreabilidade é permanente”.

A empresa tem grandes ações para reduzir suas emissões de gases que colaboram com o aquecimento global. Ela se comprometeu a zerar essas emissões em 2050. A Lenzing tem três soluções sustentáveis ​​sob a marca premium Tencel: Tencel Liocel, Tencel Modal e Tencel Liocell Filament. E, entre novidades, a expansão das fibras da marca Tencel carbono-zero para a tecnologia Refibra para atender à crescente demanda da indústria em torno da economia circular e do carbono neutralidade de produção da empresa. Recentemente, lançou as fibras de celulose Tencel Denim de origem botânicas. Os jeans com liocel Tencel e fibras modais são fabricados com uma tecnologia inovadora que utiliza pequenas quantidades de água. E tem ainda uma edição limitada da marca Tencel para mostrar todas as possibilidades que a empresa tem de produzir uma fibra celulósica. Hoje, ela vem da madeira, mas esta edição limitada mostra uma fonte completamente nova: casca de laranja. A parceria foi feita com a startup italiana Orange Fiber para integrar celulose da laranja na produção de fibra com a marca Tencel.

Denim (Lenzing AG Fotógrafo: Richard Ramos)

A preocupação com os 50 milhões de toneladas de roupas e calçados descartados todos os anos no meio ambiente motivou a Lenzing a buscar uma solução para o problema. E foi assim que surgiu a tecnologia Refibra, com produção totalmente circular. “Esse trabalho foi desenvolvido junto ao grupo da Zara em que pegamos toda sobra do corte de tecido de algodão e transformamos em polpa de celulose. Eram sobras que iriam poluir o meio ambiente e transformamos em matéria-prima. Foi assim que iniciamos o processo”, conta o gerente-técnico da Lenzing América do Sul, o engenheiro têxtil Gilberto Campanatti. “Juntamos os restos de corte, fizemos uma polpa de celulose, misturamos com a polpa de madeira e criamos uma fibra de Liocel. Em seguida, passamos a usar pós-consumo; quer dizer, roupas jogadas no lixo para fazer a polpa e produzir uma fibra de Liocel de primeira qualidade. E, no terceiro momento, vamos começar a utilizar qualquer roupa de celulose para também fazermos polpa e, com isso, produzir uma fibra, um fio, um tecido, confecção, roupa e reiniciar o ciclo”.

Filamentos de Liocel da marca Tencel Luxe (Lenzing AG Fotógrafo: Michael M. Vogl)

O Refibra usa uma parte de madeira sustentável e outra de resíduos de algodão. Quando começaram a desenvolver a fibra, a equipe dividiu numa proporção de 10% de uso de polpa e 90% de madeira. Hoje são 70% de madeira e 30% de resíduos de tecido pré e pós-consumo.

Outro produto interessante desenvolvido pela Lenzinig, em parceria com a DyStar (empresa especializada em corantes criada em 1995, em Singapura), para o Tencel Modal Índigo foi a Indigo Color technology, pigmento índigo normal injetado dentro da fibra. “Em vez de um pigmento ou corante, ela usa o pigmento índigo. Ele funciona para alguns efeitos de desbote como laser, ozônio, permanganato. Alguns trabalhos feitos com o índigo tradicional funcionam nessa fibra”, observa Gilberto Campanatti. “Comparando com o processo tradicional, a redução do uso de água é maior que 99%, 80% a menos de químicos, quase 100% de economia de eletricidade, quase 100% de economia de efluentes colocados e, seguramente, 100% de energia de aquecimento, porque não precisa nenhuma energia para colocar o pigmento dentro da fibra”.

A gigante austríaca das fibras celulósicas sustentáveis segue firme na expansão global. Atualmente a empresa investe na construção de uma fábrica de Liocel moderníssima na Tailândia, que vai acrescentar 100 mil toneladas às 200 mil toneladas produzidas por ano quando entrar em operação, no começo de 2022.

Lenzing AG

Mais? “Estamos construindo uma unidade produtora de polpa solúvel de madeira no Brasil, a LD Celulose, em Minas Gerais”. A LD Celulose S.A. é uma joint venture entre a austríaca Lenzing e a brasileira Duratex, formada para implantar uma das maiores fábricas de celulose solúvel do mundo. Com investimento de R$ 5,2 bilhões, a planta está sendo erguida no Triângulo Mineiro, entre os municípios de Indianópolis e Araguari, quando começar a operar, em 2022, vai produzir 500 mil toneladas de celulose solúvel por ano. A previsão é que no pico das obras sejam gerados cerca de 8 mil empregos diretos, impulsionando o desenvolvimento social e econômico de toda a região. As fibras especiais de celulose produzidas na LD serão utilizadas na indústria têxtil, gerando tecidos com inovação, sustentabilidade e alta tecnologia.