No Brasil e em todo o planeta a palavra da vez é sustentabilidade. E tem sido tratada com a seriedade e a importância que sempre mereceu. O 2º Fórum da Indústria da Moda, realizado pelo SENAI CETIQT, reuniu empresários e profissionais do setor têxtil e de confecção para palestras e debates sobre o tema “Perspectivas para uma indústria mais sustentável”. Além da questão ambiental, foram abordados aspectos da Quarta Revolução industrial, que está em curso, e aponta para uma enorme transformação pela qual o mundo vem passando. “Hoje é extremamente importante estarmos atentos ao meio ambiente, que influencia, inclusive, as exportações das produções do setor têxtil e toda a cadeia produtiva. É necessário estar a par das novidades tecnológicas e sustentáveis, pois só assim é possível fomentar o crescimento contínuo e maturação das empresas para torná-las mais responsivas. Como fica o setor diante dessa nova realidade? O Fórum da Indústria da Moda é essencial para essa avaliação”, disse o diretor-executivo do SENAI CETIQT, Sergio Motta, ao dar boas-vindas aos participantes.
E vem muito mais inovação por aí. “O futuro da moda estará ligado necessariamente à questão das tecnologias habilitadoras para a indústria 4.0. (Robôs autônomos, impressão 3D, simulação digital e integração horizontal e vertical de sistemas). Também não dá mais para falar de moda, confecção, setor têxtil se não se pensar em sustentabilidade ambiental. O mundo todo gira em torno desse assunto, de upcycling e de slow fashion”, aposta o gerente do Instituto SENAI de Tecnologia em Têxtil e Confecção do SENAI CETIQT, Fabian Diniz, acrescentando que os robôs não representam, necessariamente, uma ameaça aos profissionais da área: “Fala-se muito que a tecnologia toma os postos de trabalho. Não, não toma. Ela modifica. Vamos ter outros tipos de emprego graças à tecnologia e à preocupação com a sustentabilidade. Não se trata de perda, mas de geração de ocupações diferentes. E nós estamos aqui, no SENAI CETIQT, para capacitar e formar esses novos trabalhadores”.
Fabian Diniz acredita no poder da informação para acelerar o processo de modernização do setor no Brasil. “Nossa ideia é fazer um trabalho de grande sinergia com o mercado de trabalho. A gente tem que trazer conhecimento e compartilhar sempre. A transformação de que estamos falando vai se dar a partir da capacitação, de mais eventos como o Fórum da Indústria da Moda, por exemplo. É fundamental a simbiose de conhecimentos e informar o que está acontecendo no mundo. E esse é o papel do SENAI CETIQT”, afirma. “O grande recado que queremos passar é que estamos em sintonia com o mundo e somos capazes de ter uma chancela de transformação digital aliada à sustentabilidade ambiental. Precisamos falar disso também, nesse evento, no Rio de Janeiro, no Brasil, na moda carioca, na moda brasileira. Precisamos abordar sempre esses dois temas e apresentar o resultado do que estamos desenvolvendo sempre em prol da indústria sustentável”.
Vale ressaltar que a conectividade entre as áreas de Educação, Tecnologia e Inovação é o diferencial do Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil – SENAI CETIQT, que oferece serviços transversais que o consagram como um dos maiores centros latino-americanos de produção de conhecimento aplicado à cadeia produtiva dos setores Químico, Têxtil e de Confecção.
Uma das consequências mais surpreendentes – e que proporciona prazer, por que não? – de vivenciar essa Quarta Revolução Industrial é descobrir que será possível ligar a TV, aumentar o som, atender o celular com um simples toque dos dedos em sua jaqueta. Entre outros exemplos, é claro. Melhor ainda é descobrir que isso já é realidade, ao menos em um tecido que foi desenvolvido pela Levi’s em parceria com a Google. O nome técnico de roupas assim é wearable, ou tecidos com funcionalidade. Com um pequeno aparelho instalado na parte de dentro, toda a área se torna uma superfície sensível ao toque que pode ativar chamadas, ler mensagens, dar play e pause. Gostou? Tem mais, muito mais.
O grafeno e sua mágica
Em palestra sobre “Tech – Têxtil – visão de futuro para indústria têxtil”, uma abordagem sustentável sobre as tendências tecnológicas e de inovação do setor, tendo como referências insights das mudanças globais, o engenheiro e doutor em Ciência de Polímeros Ricardo Cecci, pesquisador da plataforma de inovação em fibras do SENAI CETIQT, falou sobre as maravilhas da aplicação de grafeno em tecidos. Grafeno? “Ele vem da grafite, que são folhas empilhadas, entre cem e 200 camadas. Até 2004, não existia um método para isolar as camadas e ficar com apenas uma, o grafeno”, conta. “Pesquisadores da Universidade de Manchester isolaram o grafeno pela primeira vez e desenvolveram métodos de esfoliação e conseguiram separar essa camada, que possui propriedades que a grafite não tem. Isolar uma camada entre 200 encarece muito o processo e faz com que o grafeno custe muito caro. Mas, por ser um material formado apenas por átomos de carbono, tem uma das ligações mais fortes da natureza. Isso confere ao grafeno características muito interessantes para vários setores técnicos”.
O hexágono de carbono que é o grafeno permite que os elétrons passem rapidamente, conferindo uma condutividade térmica extremamente alta ao material. “Quando aplico grafeno em fibras ou tecidos, obtenho uma troca de calor rápida. Isso é bom para tecidos esportivos. Quando você faz exercício, forma gradientes de temperaturas no seu corpo. Uma parte fica mais quente, outra mais fria. Se um esquiador, por exemplo, usa um uniforme com grafeno, distribui equilibradamente o calor e gerencia melhor o conforto térmico. Além disso, como a troca de calor é rápida, o suor evapora mais rapidamente”, explica Cecci.
Mas o grafeno não combate apenas o desconforto causado pelo suor. Também auxilia para que estejamos sempre limpinhos e perfumados. Devemos agradecer à capacidade de decompor matéria orgânica. Tecidos com grafeno podem ser auto-limpantes: “Dependendo da estrutura de empilhamento das camadas de grafeno, ele pode ter um comportamento mais semicondutor ou mais condutor. Se estiver no modo semicondutor, é capaz de decompor matéria orgânica. Então, se uma gota de vinho manchar a sua camisa, ele limpa para você”.
A mistura com tecidos ou fibras é útil na área de higiene, também. “Ele tem efeito antibacteriano. As bordas do grafeno são pontiagudas e têm a capacidade de penetrar na membrana plasmática da bactéria. Ele perturba o mecanismo biológico dela e a leva à morte”, revela o pesquisador. “Como é composto só de carbono, o grafeno é totalmente apolar. Não tem nenhuma qualquer afinidade com a água, dando a característica de hidrofobicidade ao tecido. Isso protege a pele contra raios UV, porque absorve na região UV, mais ou menos 260 nanômetros, e dá essa propriedade para o tecido”.
A parte divertida do uso de grafeno na moda é exemplificada pelas ideias da estilista Francesca Rossella, que vem realizando experiências com looks “interativos” desde 2004, quando fundou a marca Cutecircuit, nos Estados Unidos, primeira grife dedicada aos wearables do mundo (no já distante 2006, ela lançou roupas energizadas por células fotovoltaicas). Recentemente, Francesca criou um vestido com grafeno no DNA do tecido. A peça muda de cor ao ritmo da respiração de quem estiver usando. “São LEDs que se acendem a partir de um sensor feito de grafeno”, comenta Ricardo Cecci.
Simbiose entre sustentabilidade e indústria
Alguns desses resultados podem ser obtidos por outros caminhos. A proteção solar, por exemplo. A Rhodia apresentou um desenvolvimento revolucionário com o Emana, um fio têxtil inteligente de poliamida 66 que emite raio infravermelho longo. Em contato com a pele, melhora a microcirculação sanguínea. Testes clínicos mostraram que o Emana pode aumentar a elasticidade da pele e reduzir os sinais de celulite. De acordo com o pesquisador Fábio Lacerda, da Rhodia, o Emana tem, também, cristais bioativos em sua composição. “Ele não só melhora a microcirculação sanguínea, como reduz a fadiga muscular. Essa calça jeans que estou usando, por exemplo, é Emana e, no final do dia, eu me sinto mais tranquilo”.
O trabalho do Grupo Rhodia-Solvay dá o exemplo perfeito da simbiose entre a sustentabilidade e a etapa atual da revolução industrial. A empresa se valeu de altíssima tecnologia para desenvolver fios têxteis de poliamidas inteligentes que se degradassem em apensas três anos. “Uma poliamida normal leva 50, 60 anos para ser integrada ao meio ambiente”, compara Lacerda. “Só para dar uma ideia, a Rhodia tem 100 anos, mas produz poliamida no Brasil há uns 60. A poliamida produzida agora… em três anos estará degradada”.
E o grande lançamento do grupo é o Amni Dynamic, que foi apresentado em primeira mão durante o Fórum. Trata-se de uma poliamida 6.6 modificada que, além das características do toque gelado da poliamida, da sensação gostosa, traz o benefício de promover a sustentabilidade da cadeia têxtil. Como? “Você usa menos corante para tingir a fibra, reduz o consumo de energia, porque ela tinge em baixa temperatura e absorve o corante mais rapidamente. Isso é positivo para o bem-estar do meio ambiente. Para o atleta também, uma vez que a absorção de suor é mais rápida, extremamente dinâmica permite uma aceleração no processo de secagem da peça, ampliando a sensação de conforto e frescor durante e após a atividade física”, exemplifica.
O profissional da indústria de confecção do futuro
Consultor técnico do SENAI CETIQT, Luiz Cláudio de Almeida Leão, aborda a questão da adaptação do profissional em meio à transição da era industrial com ênfase no universo digital. Ressalta a importância do trabalho em equipe e o pensamento crítico. São os que nos diferenciam dos robôs e das máquinas. Segundo ele, “é imprescindível o desenvolvimento do capital intelectual, pois é esse o fator mais importante que possibilitará a adequação a uma nova realidade nas empresas”.
No SENAI CETIQT, a educação e capacitação dos profissionais para o futuro
O ritmo alucinante das mudanças pelas quais a Terra e a humanidade vêm passando levou o SENAI CETIQT a repensar a grade curricular. A Coordenadora de Design de Moda do SENAI CETIQT, Ana Claudia Lopes, conta essa história: “A gente consultou os empresários e perguntou: ‘Qual o perfil profissional que a sua empresa quer contratar?’ A partir das respostas, começamos a reestruturar completamente a grade curricular dos cursos. Foi uma reestruturação muito grande. As empresas que participaram do comitê técnico setorial de vestuário ajudaram a formar o curso de Design de Moda. E as empresas do setor de química também contribuíram com essa pesquisa que embasou a criação das novas grades”.
Os cursos de Moda, por exemplo, são repletos de inovações. De acordo com Ana Claudia, “as empresas indicaram que os formandos têm que ter conhecimento de gestão da produção e precisam saber comunicar o produto. Essa foi a primeira remodelação que a gente fez na grade curricular”, observa Ana. “O primeiro ano é importantíssimo pela ênfase nos fundamentos do design e da cor, o início da modelagem. O segundo ano inteiro é criação. Em seguida, focamos na gestão, na comunicação e, por fim, no TCC”.
Os alunos ganharam e empresas têm à disponibilidade o Fashion Lab e a Fábrica Modelo. “A gente já tem impressora 3D e colocou no curso de moda o ensino do software de modelagem em 3D, para capacitar os alunos a usarem a impressora. Além de Photoshop, Illustrator e Corel, que eles já aprendiam, vão ter conhecimento do software em 3D a partir do segundo período”.
A síntese é a seguinte: o SENAI CETIQT implementa medidas que direcionem os alunos a reconhecer a instituição como uma aliada, um instrumento singular para o impulsionamento de suas potencialidades. Os programas são exclusivos, os laboratórios de última geração e o reconhecimento é de uma instituição indutora da moda no Brasil. E eu pergunto a você: já conhece o Fashion Lab instalado na Unidade Riachuelo do SENAI CETIQT? O espaço é destinado à experimentação de produtos e serviços no segmento têxtil e confecção, baseado nos conceitos de laboratório aberto e de maker spaces. A ideia é disseminar a tecnologia inovadora e sustentável nos processos relacionados ao desenvolvimento de produto, modelagem, fabricação aditiva e experiência de consumo. Um espaço aberto e colaborativo para a realização de experimentos que utilizem tecnologias inovadoras destinadas à indústria da moda.
Outro curso que passou por uma reformulação completa foi a Engenharia de Produção. Segundo Ana Claudia, o grande diferencial hoje é que o curso já é orientado para a Indústria 4.0. “Fizemos uma pesquisa e constatamos que é o único curso do Rio orientado para a indústria 4.0. O que acontece? O profissional já sai capacitado para trabalhar com as ferramentas tecnológicas”.
O Futuro da Indústria
Na prática, como os jovens empresários estão lidando com a realidade? Como encaram a concorrência de grandes empresas nem sempre atentas à sustentabilidade e às inovações trazidas pela Quarta Revolução Industrial? O painel #vista mudança: qual é o seu tamanho?, mediado pela consultora Técnica em Design Estratégico do SENAI CETIQT, Christina Guerreiro Gurgel, e pela pesquisadora do SENAI CETIQT, atualmente responsável pela Plataforma 4.0, Angélica Coelho, recebeu dois empresários jovens, Julia Glioche, sócia na The Non Brand, e Fabricio Tardin, diretor de operações da Dellas Lingerie, para comentar suas experiências com sustentabilidade para gerar impactos positivos na indústria da moda.
Para Christina, nunca houve momento melhor para se comprometer com a sustentabilidade e com os princípios da circularidade. “O assunto chegou a um nível de seriedade tal que foi debatido no Fórum Econômico de Davos. Trataram de moda circular. E foi discutido agora, na reunião do G7, quando 32 grandes empresas globais se comprometeram a trabalhar em prol de mudanças nos seus processos”, ressalta Christina. “É hora de botar o pé no freio e entender que, independentemente do modelo de negócios e do tamanho da empresa, é possível mudar a rota em direção a uma indústria mais consciente, mais responsável e mais amigável ao meio ambiente”.
Julia conta que o primeiro pilar de sua marca, The Non Brand, é a sustentabilidade. “Esse ano, fomos escolhidos pela Shell Iniciativa Jovem como uma das poucas marcas que busca sustentabilidade na indústria da moda”, conta. “Nós adotamos o conceito de slow fashion, e temos o nosso PQS: Preço Qualidade e Sustentabilidade. Também valorizamos a atemporalidade, em reaproveitar peças de roupa, não jogar fora. Estamos sempre pensando em maneiras de você estar bem na roupa. Não é porque acabou a coleção que vai jogar fora. Tentamos mostrar às pessoas que é possível ter menos e construir com menos”.
A empatia também está presente no DNA da empresa: “A gente tomou a decisão política de abolir o PP e optamos pelo GG. Temos três categorias atualmente, Elas, Eles e Tanto Faz”, diz. Mas, por conta de o masculino querer usar o feminino e o feminino querer usar o masculino, precisamos aumentar a grade para a próxima coleção. E aí vamos trabalhar com, pelo menos, cinco tamanhos, que são P, M, G, GG e um que ainda não escolhemos como chamar”. Gentileza gera gentileza.
Já a Dellas tem uma história totalmente diferente. Começou como empresa caseira depois que a família de Fabricio Tardin se mudou de Nova Friburgo para Bicas, em Minas. “A cidade era bem menor e minha mãe, que trabalhava em fábrica em Friburgo, precisava ganhar dinheiro. Então, resolveu empreender e abriu uma empresa literalmente de fundo de quinta”, conta.
Ao longo dos anos, o negócio cresceu e apareceu. Hoje, a Dellas tem unidades em Nova Friburgo e em Bicas e entrega mais de 200 mil peças por mês, sendo que boa parte dessa produção vai para o exterior. Mas o crescimento veio acompanhado pela consciência ambiental, algo que ajudou a modernizar e a dinamizar a empresa. “Seguimos um projeto sustentável do Sebrae. Fazemos bolsas e tapetes com as aparas”, disse Fabrício.
Todos os participantes conheceram o Fashion Lab e a Fábrica Modelo e a Planta de Confecção 4.0 com a orientação do consultor Bernardo Barbosa, responsável por projetos e estrutura física do Fashion Lab.
Na arena do Fashion Lab, Patrícia Dinis, que integra a equipe do SENAI CETIQT atuando em projetos como Oficinas de Design, consultoria tecnológica e capacitações em modelagem conversou sobre a Gestão de Insumos na Engenharia de Produtos. Ela abordou a questão da responsabilidade social, econômica e ambiental nos bastidores do processo produtivo e mostrou com a engenharia de Produtos da empresa deve gerir seus insumos. Por fim, o painel “ITMA Talk – Panorama sobre a ITMA Inovando para um Futuro Sustentável” contou com convidados como Adriano Passos, responsável pela área de Inovação de Fibras do ISI em Biossintéticos e Fibras (SENAI CETIQT), Fernando Moebus, especialista em manufatura avançada e coordenador de serviços de consultoria do SENAI CETIQT; Gilson Leite, consultor técnico do SENAI CETIQT com 30 anos de experiência na área têxtil e de confecção; Robson Wanka, gerente de Educação Profissional no SENAI CETIQT, e Patrícia Dinis. Eles abordaram os eventos internacionais e as tendências do setor têxtil e de confecção.
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