“O SENAI Brasil Fashion investe no melhor que está acontecendo no mundo da moda e nós temos observado como este projeto faz a diferença na vida dos alunos”, comenta Marcelo Ramos, curador do projeto SENAI Brasil Fashion, promovido pelo SENAI CETIQT, principal centro formador de recursos humanos para a cadeia têxtil nacional. O objetivo é fortalecer e divulgar a educação profissional no Brasil por meio de uma plataforma de moda que capacita os alunos através de uma experiência hands on – e que gera visibilidade para o segmento. Foram selecionadas 12 duplas de jovens estilistas e modelistas, alunos dos cursos de longa duração na área de moda oferecidos pelo sistema SENAI de todo o Brasil. E os alunos estão se preparando para apresentar minicoleções compostas por três looks em um desfile no Centro Cultural Ação Cidadania, em novembro. Em sua quinta edição, o projeto tem como coaches os estilistas Lenny Niemeyer, Lino Villaventura, Ronaldo Fraga e Alexandre Herchcovitch. Desde ontem, a sede do SENAI CETIQT, no Riachuelo, reúne os coaches e os alunos para encontros com palestras sobre os elementos que vão compor o desfile e momentos de trabalho, nos quais os jovens apresentam os primeiros protótipos e executam a modelagem para a construção do que vão comunicar com suas coleções.
A edição 2018 tem como tema “Todo Mundo Tá na Moda”, uma abordagem para retratar a diversidade e representatividade que envolve as demandas no mundo da moda. Os alunos de vários estados do país tiveram seus trabalhos autorais selecionados a partir de um edital. Eles possuem histórias e estilos repletos de chancela. Com a orientação dos coaches, os jovens partem para a execução do processo de criação. Na manhã de ontem, o diretor criativo do SENAI Brasil Fashion, Jackson Araujo, mediou um bate-papo entre os coaches e consultores de cada área que envolverá o desfile. Eles contaram aos alunos sobre suas experiências. Entre os participantes, o stylist Daniel Ueda, o responsável pela trilha sonora, Max Blum, o diretor de casting, Ed Benini, o diretor de desenvolvimento e modelagem, Wilson Ranieri. A iniciativa é mais uma etapa para o processo de profissionalização dos alunos, no qual se constrói a educação sobre a área de forma prática. “Nós procuramos em nossos ambientes e em nossos currículos trabalhar de forma mais aderente ao mercado de trabalho. Então, nada melhor do que uma plataforma como o SENAI Brasil Fashion, unindo estudantes com profissionais de renome do campo da moda. O objetivo é trabalhar a produção, a criação e a comunicação de moda”, afirmou Marcelo Ramos.
A palestra na manhã de ontem foi decisiva para o processo de aprofundar o conhecimento que os alunos precisarão para o desfile, no dia 22 de novembro. Entre os assuntos abordados, os estilistas puderam pontuar cada elemento componente de um fashion show com base nas suas experiências e com o auxílio de profissionais que integram esse processo. “Vocês devem pensar no desfile como uma narrativa, comparando a um filme. Cada elemento conta a história que vocês vão criar”, explicou Jackson Araujo aos alunos. Com o auxílio dos coaches, os alunos pensarão em casting, trilhas sonoras, cenografia e styling, o que trás o olhar profissional à educação dos participantes.
CASTING
O momento da escolha do é essencial para cada novo desfile, sendo essencial saber o objetivo da seleção de modelos. Cada estilista e cada equipe possui sua maneira de planejar e escolher, porém são tempos de transformação e mais inclusão na passarela. Até nos concursos para miss está havendo transformação. “Chiara Bordi foi a primeira aspirante a Miss Itália 2018 com uma perna biônica. É uma possibilidade de entendimento da quebra de padrão”, contou Jackson Araujo aos alunos.
Outros exemplos também foram apresentados, como o Laboratório Fantasma de Emicida, com uma linha de produtos de vestuário que foca na população negra e possui modelos negros sempre como destaque nos desfiles da LAB , e que, segundo Jackson, mostra uma potencialidade do discurso do rapper como ativista e porta-voz dessa causa. Outro exemplo nítido é a seleção feita por Alexandre Herchcovitch e Fábio Souza para os desfiles da grife À La Garçonne, que buscaram diferentes tipos de beleza vasculhando o Instagram, o que acabou resultando em uma seleção bem diversa. “Foram 83 pessoas selecionadas no casting que o Fábio cuidou pessoalmente. E trouxemos dezenas de pessoas do Brasil inteiro. Muitas que não eram modelos e nem com a pretensão de ser”, comentou Herchcovitch.
Os coaches conversaram com Ed Benini, consultor de imagem e produtor de eventos, para debater o papel do diretor de casting. “Nós recebemos o que é a proposta da coleção, o estilista nos fala o perfil de modelos para a passarela, o que ele imagina e pensa, e a partir disso desenvolvemos as escolhas. É um trabalho mais minucioso, principalmente porque antigamente era mais fácil fazer um casting de ‘mulher bonita,’ porque o perfil daquela época era padrão. Hoje, com a mudança de posicionamento, nós estamos buscando as pessoas mais reais. As pessoas querem se sentir representadas na passarela, na televisão, em todos os ambientes. Antes, nós recebíamos o briefing e era aquele perfil clássico de modelos”, comentou Ed. E acrescentou: “O casting para o desfile dos alunos dessa edição do projeto mostrará a diversidade. Será muito elaborado”. Ainda foi comentado sobre como o casting pode expressar a narrativa do desfile tal qual um filme. Então, a atitude do modelo tem de transmitir a emoção da roupa, verdadeira arte.
A estilista Lenny Niemeyer, comentou que tem suas especificidades na seleção de modelos, principalmente pela marca ser beachwear. “Geralmente chamo mais mulheres e gosto de igualar a altura. São mulheres com muita personalidade e, inclusive, já fizemos desfiles com diversos tipos de mulheres do Brasil, porque nós temos que mostrar a realidade nas passarelas”, contou Lenny. Ronaldo Fraga seguiu essa linha e comentou sobre a necessidade de representação: “O consumidor final quer ver algo real no que antes era inalcançável”. Os estilistas e coaches do SENAI Brasil Fashion acreditam na diversidade representativa.
Lino Villaventura também falou sobre seu processo de seleção. “Depende muito do trabalho, mas o corpo é a pontuação da roupa. Eu trabalho com corpos que consigam interpretar o que estou querendo mostrar. Eu gosto de modelos com atitude e com ritmo”, contou.
CENOGRAFIA
Pensando em narrativa, a cenografia é como a direção de arte de um filme e que faz toda a diferença quando bem planejada. No SENAI Brasil Fashion é trabalhada a videocenografia com as referências dos alunos. O responsável por discutir sobre cenografia com as duplas é o Rodrigo Romano, da produtora Chá das Cinco. O representante no segundo encontro foi o Philip Moss e comentou sobre a importância de pensar ambientação e as linguagens possíveis. “Tem que ser alinhado com o que vocês estão fazendo. Além disso, a cenografia é um suporte, não pode se sobrepor ao que está sendo apresentado na passarela”, contou Felipe.
Lino Villaventura comentou sobre seu processo. “Eu já deixei de produzir cenografia em alguns desfiles por conta do conteúdo principal, mas acho importante. E a inserção de vídeo é uma alternativa boa nesse sentido”, afirmou. A cenografia pode contar desde com uma parede branca até com balões de ar. As possibilidades são infinitas, principalmente para o vídeo, que é dinâmico.
Um exemplo interessante levado para debate foi o desfile de À La Garçonne, grife com a parceria de Fábio Souza e Alexandre Herchcovitch, realizado na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo. “Eu estou produzindo desfiles em locais públicos há bastante tempo. Já fiz no Theatro Municipal, no saguão da Prefeitura de São Paulo e no MASP. A biblioteca funcionava 24 horas e as pessoas estavam lá fazendo seus estudos. Optamos por um desfile silencioso”, lembrou Herchcovitch.
Jackson Araujo também trouxe o exemplo do desfile de Lenny Niemeyer, apresentado na São Paulo Fashion Week com a coleção Verão 2018. Como cenografia apresentava pêndulos dividindo a passarela ao meio, inspirado no místico. “Esse trabalho foi difícil, mas foi o mais interessante. Começou ao querermos falar sobre misticismo e eu não estava encontrando a pegada mais forte. Eu fui, então, inspirada nas artes de Hilma af Klint e Emma Kunz para pensar em linhas e formas geométricas, mas transformar isso em moda-praia foi um belo exercício. O resultado foi extremamente positivo e combinou com a coleção”, contou Lenny.
“Esse lugar da ‘roupa que fala’ precisa ser potencializado e o cenário faz isso, transporta as pessoas para onde você quer. Luz também é cenário, cor é cenário”, comentou Ronaldo Fraga. Sobre sua experiência, um dos exemplos citados foi o desfile sobre a tragédia na cidade de Mariana. “O que tem que ser dito.. tem que ser dito. Para sempre essa lama vai acompanhar as pessoas, a história do país e eu não tive receio em ser contundente quanto a isso. Eu acho que essa lama atravessou as pessoas. As paredes e o chão da sala de desfile foram revestidos com plástico e, depois, receberam uma tinta também plástica. Foram necessários vários testes. Na cena final do desfile em que os modelos formam a fila, eles deitaam no chão e na lama. E as pessoas se assustaram e se emocionaram com tanto realismo”, contou.
TRILHA
A trilha foi o terceiro assunto abordado na conversa dos coaches com os consultores. O convidado da vez foi o produtor musical Max Blum, que assina trilhas dos mais importantes desfiles do país e cuidará do projeto do SENAI Brasil Fashion. “O papel da música incidental é falar também. É como um filme: o leva para um ambiente mágico”, disse o produtor, que produz as próprias trilhas de acordo com o perfil do desfile e o briefing do estilista.
A roupa, segundo os estilistas, é a estrela, mas a trilha é pura simbiose no processo de apresentar uma coleção na passarela. Lino Villaventura conta sua experiência. “No desfile da São Paulo Fashion Week, a trilha de uma dasminhas apresentações eram composta por sussurros e batidas de coração. As pessoas levaram muito para o lado do orgasmo, mas tinha a conotação de abordar os sentimentos humanos”, disse o estilista.
Sobre desfiles silenciosos, Alexandre Herchcovitch tem experiência, como o realizado na Biblioteca Mário de Andrade e a experiência de trabalhar no silêncio. “Foi curioso, porque as pessoas assistindo não podiam fazer barulho, então isso fez com que elas não falassem e se concentrassem mais no que estava acontecendo do que no celular, por exemplo. Prendeu a atenção do público”, afirmou Alexandre. Jackson Araujo também comentou sobre como o silêncio também pode ser um experimento para ouvir o som que a roupa produz, como um vestido com muito tecido e o farfalhar dele acaba tornando-se a trilha na passarela.
Além de atenção e coerência, os alunos também foram orientados sobre a questão dos direitos autorais, já que músicas de outros artistas podem ser usadas em desfiles, mas não podem ser veiculadas em plataformas como YouTube e Instagram, o que acaba prejudicando a divulgação. No SENAI Brasil Fashion, as trilhas serão autorais, com a produção de Max Blum.
STYLING
Para falar sobre styling, área importantíssima em um desfile, o consultor convidado é Daniel Ueda, stylist que tem um trabalho impecável com as maiores grifes do país. Montar looks completos com acessórios, roupas, maquiagem, cabelo e sapato é o papel do stylist, criando uma unidade coerente das criações. “O trabalho de styling é a união de processos e começa na pré-produção. Então, todos os detalhes têm que estar alinhados para passar a imagem e o sentimento necessário”, contou Daniel.
Depois da palestra, as 12 duplas encontraram-se com seus coaches e realizaram em salas do SENAI CETIQT a primeira prova dos protótipos da coleção com a ajuda de modelos. Os coaches puderam analisar, sugerir modificações e acompanhar o processo de conceituar os looks. Cada dupla saiu com orientações e dicas que vão aprimorar o desenvolvimento do trabalho de execução até o grande desfile.
O projeto SENAI Brasil Fashion, como agente de transformação e inserção dos alunos no funcionamento do mercado, é pioneiro no país e reúne um cast impressionante e único. A edição 2018 recebeu cerca de 300 inscrições de alunos de 15 estados. O curador Marcelo Ramos conta a receita para o sucesso. “É um projeto consistente, com planejamento e que começa quando o SENAI CETIQT pensa na estratégia e olha para o mundo. Observa o que está acontecendo de melhor e traz para si: na montagem de suas equipes, na infraestrutura, nas aulas, sempre com inovação, competitividade e com desenvolvimento para a educação no Brasil”, frisou.
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