A equação tecnologia + sustentabilidade é a tônica da Quarta Revolução Industrial que já toma conta de todo o mundo. E voltar um olhar repleto de empatia e solidariedade para o setor têxtil e de confecção é de suma importância para fomentar o crescimento da cadeia produtiva da moda e ver também as empresas tornarem-se cada vez mais incentivadoras de ações em prol do meio ambiente. E os holofotes da 25ª edição do Minas Trend, o maior Salão de Negócios da América Latina, promovida pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG) entre os dias 22 e 25 de outubro, no Expominas, em Belo Horizonte, serão direcionados para o tema “Tecendo futuros”.
O site Heloisa Tolipan foi conversar com o novo diretor-criativo do Minas Trend, o designer Rogério Lima, que imprimiu há muitos anos uma chancela profissional pautada pelo social em sinergia com a sustentabilidade. “Construir o futuro significa atuar no agora. E reconhecermos que, enquanto agentes ativos, não importa se pessoa física ou jurídica, precisamos criar bases capazes de suportar as necessidades das gerações presentes e vindouras”, frisa. E o presidente do Sistema FIEMG, Flávio Roscoe, tem reiterado sempre que a integração cada vez maior da cadeia produtiva da indústria da moda é fundamental. “Somente com todos os setores unidos poderemos gerar negócios e fortalecer a imagem do estado – o que nos fará ganhar mercados dentro e fora do Brasil”, afirma.
Para pensar o futuro, a criação do evento destaca o setor têxtil, fazendo do algodão o fio condutor das histórias a serem contadas sobre perspectivas para a moda. A matéria-prima é base de uma das principais cadeias produtivas do Brasil, respondendo por uma parcela significativa do PIB do país e empregando direta e indiretamente mais de 8 milhões de brasileiros, segundo a Associação Brasileira de Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). Atualmente, o Brasil é o maior fornecedor de algodão sustentável do mundo. Rogério Lima destaca a importância desse protagonismo brasileiro – no momento em que o insumo tem sido um dos principais expoentes na discussão sobre sustentabilidade na moda, assunto que estará em pauta no Minas Trend. A edição de abril, que apresentou as tendências da primavera/verão 2020, recebeu a participação de novos segmentos da indústria no salão de negócios – além de vestuário, bolsas e calçados, joias e bijuterias –, como o setor têxtil, o de cosméticos e o de máquinas e equipamentos. E nesta edição outono-inverno 2020 veremos in loco a adesão de mais e mais empresas.
Considerado um dos melhores designers de bolsas do país, Rogério Lima quer debater questões fundamentais para garantir que o segmento se torne mais competitivo diante das demandas e dos mercados globais. Vale a pena eu ressaltar aqui para você, leitor, alguns pontos sobre a vida de Rogério Lima, o profissional que super entende a importância do acessório para a alma feminina. Criador das bolsas mais desejadas do país, ele exercita sua imensa criatividade com um olhar seríssimo para a sustentabilidade, uma de suas marcas registradas mais fortes. Hoje, a sua label é reconhecida por seus materiais e formas diferenciadas, além dos acabamentos impecáveis.
Desde o começo da carreira, o designer sempre teve como premissa a contribuição para o meio ambiente, com a ideia de reaproveitar sobras, transformando-as em produtos deluxe. E foi graças a seu pensamento sempre atento às questões socioambientais que Rogério criou o maior ícone de sua marca: a bolsa feita com saco de cimento reciclado.
Como muitas ideias geniais, essa também surgiu meio por acaso. Ele estava reformando seu showroom e os (muitos) sacos de cimento que sobravam não iam para o lixo, eram guardados na garagem para um catador de papel que nunca apareceu para buscá-los. Em meio ao caos provisório, foi convidado a participar do Minas Trend e decidiu exibir um produto conceitual que fosse síntese de sustentabilidade. Experimentando, constatou que os sacos de cimento podiam ser costurados. Para garantir mais durabilidade, impermeabilizou o papel.
Trabalhando ao mesmo tempo a matéria-prima e a reciclagem, o designer deu ao material um tratamento reservado aos melhores couros. A coleção, focada em sustentabilidade, tinha a intenção de mostrar um novo conceito em criação. Não se imaginava ainda o apelo comercial que teria. Mas o acessório já nasceu vitorioso. De lá para cá, muita água rolou. Atualmente as bolsas são ícones da marca e estão presentes em todas as coleções nos mais diversos estilos. Já foram produzidos mais de cem modelos para as outras marcas também. E as bolsas ganharam novos shapes e a linha upcycle combina além do saco de cimento, câmara de pneu e lona de caminhão.
Em 2011, Rogério conquistou o Top3 do juri popular do prêmio GreenBest (criado pelo Green Nirvana Comércio de Produtos Ecológicos e Sustentáveis S.A. para incentivar e valorizar empresas, instituições, projetos etc que mais se destacam no desenvolvimento social e econômico do país por critérios rigorosos de proteção ambiental) e recebeu da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG) a comanda Mérito Industrial.
Na condição de diretor-criativo do Minas Trend, Rogério Lima deve tomar como referência algumas diretrizes da Agenda 2030, plano de ação da ONU que visa ao desenvolvimento sustentável. Serão trazidas à pauta da indústria questões fundamentais para garantir que o segmento se torne mais competitivo diante das demandas e dos mercados globais. Vem com a gente saber mais sobre o que nos aguarda em Belo Horizonte!
Heloisa Tolipan – A 25ª edição do Minas Trend e do maior Salão de Negócios da América Latina tem como tema “Tecendo futuros” e você assume a direção criativa. Como avalia o caminho trilhado até agora e a perspectiva que nos é apresentada para a indústria da moda no Brasil?
Rogério Lima – Dentro do Minas Trend, o caminho trilhado foi brilhante e podemos ver isto refletido no aumento de expositores e no crescimento de muitas marcas que começaram dentro do Minas Trend e hoje estão desfilando também de Norte a Sul do país. Ainda é cedo para traçar um cenário sobre o futuro da indústria. A temática deste ano é inclusive, um convite, para refletir sobre o que queremos e como vamos construir este futuro.
HT – A sua relação com o Minas Trend é permeada por uma longa trajetória. Pode nos contar suas histórias mais marcantes e relembrar momentos que ficaram para sempre como profissional da moda?
RL – Os desfiles que fizemos da Rogério Lima foram muito marcantes, porque não existem fashion shows no Brasil dedicados ao acessório – a roupa quase sempre é a protagonista. Uma das coleções que fizemos foi batizada “Habitantes Invisíveis” e resultou em uma exposição incrível fotografada pelo Sérgio Rezende e curadoria de Pedro Lázaro. (Rogério Lima desenvolveu uma grande pesquisa e seu processo criativo de desenvolvimento de acessórios teve como inspiração os habitantes invisíveis dos centros urbanos. Homens e mulheres que moram nas ruas e tentam enfrentar com dignidade a indiferença de muitos que cruzam seus caminhos. As histórias, cores e texturas observadas naquele universo foram o fio condutor para a criação de bolsas e mochilas. O designer lançou mão de cobertores, latinhas, sacos de embalagem, carrinhos com papelão para criar bolsas com um handmade incrível para a mulher usar em qualquer ocasião). Outro momento importante pra nós foi o lançamento das bolsas confeccionadas em saco de cimento há quase dez anos, uma coleção até hoje muito relembrada pelos clientes fiéis da marca. (A preocupação com o meio ambiente sempre foi a tônica de Rogério e ele imprimiu uma grande visibilidade ao produto, não só pela reciclagem em si, mas pela forma como ela foi confeccionada conferindo status premium).
HT – “Construir o futuro significa atuar no agora. E reconhecermos que, enquanto agentes ativos, não importa se pessoa física ou jurídica, precisamos criar bases capazes de suportar as necessidades das gerações presentes e vindouras”. A partir desta frase assinada por você, eu pergunto: como fazer a sinergia entre o hoje e o amanhã?
RL – Quando falo em criar bases me refiro ao desenvolvimento de ações, sejam no campo social, ambiental ou econômico que colaborem para a sustentabilidade do nosso negócio e do nosso planeta. Neste aspecto, a própria Fiemg tem muito a colaborar, mas ressaltamos que é papel de todos atuar com consciência e responsabilidade.
HT – O algodão, fio condutor das histórias do setor têxtil, é base de uma das principais cadeias produtivas do Brasil, respondendo por uma parcela significativa do PIB do país e empregando direta e indiretamente mais de 8 milhões de brasileiros, segundo a ABIT. Como você vê o legado que o nosso setor têxtil deixará como chancela para o futuro da indústria da moda?
RL – Um legado bastante promissor, pois vemos desenvolver uma consciência com relação ao plantio e produção do algodão. O setor têxtil já está bastante avançado em tecnologia, já tendo por base a indústria 4.0.
HT – A cadeia produtiva da indústria da moda é a segunda que mais emprega em Minas Gerais, principalmente na contratação de mulheres. Há em Minas Gerais 9.750 empresas proporcionando trabalho para 125 mil pessoas. Em tempo: O número de empresas mineiras representa 13,5% do total no país. O que tem a comentar sobre esses dados e como vê a projeção de Minas Gerais para todo o país no fazer moda?
RL – Eu acredito que os dados são ainda maiores, considerando todos os empregos informais que não são contabilizados. Os sindicatos do setor têm feito um trabalho cada vez maior na captação destas pessoas, pois entende-se que há uma grande demanda para qualificação e prestação de serviços na área. Temos também uma grande tradição de produtos autorais, o que inspira novos estudantes e nos diferencia em originalidade do que vem sendo feito no resto do país.
HT – Estamos em plena Quarta Revolução Industrial. O setor têxtil começa a operar em 4.0. Como avalia esta transição e como estamos em relação ao mundo?
RL – Embora a indústria 4.0 traga uma nova lógica automatizando grande parte da produção, ela proporciona inteligência à manufatura, possibilitando uma maior customização de produtos e inovação. Um belo exemplo são as impressoras 3D – já é possível produzir muito sob demanda. É importante nos preparamos para esta “nova revolução industrial”, através de especializações para os novos tipos de emprego que irão surgir. Ainda estamos engatinhando, se comparados a outros países, principalmente em função da nossa deficitária legislação que dificulta o investimento e implementação de toda a tecnologia necessária a este sistema.
HT – O Minas Trend 25ª edição lançará luz sobre as diretrizes da Agenda 2030 – Plano de Ação da ONU que visa o desenvolvimento sustentável. Que questões serão levadas em pauta para garantir que o segmento se fortaleça, de forma competitiva, frente às demandas e mercados globais?
RL – A FIEMG já vem fazendo um trabalho de conscientização com a indústria que buscamos trazer visibilidade com o Minas Trend. Pretendemos também incrementar o acesso a este conteúdo através da nossa programação com talk shows.
HT – O que o inspira para esta edição Outono-Inverno 2020?
RL – A busca por leveza como contraponto a todas as dificuldades que estamos vivenciando. Por isto elegemos uma cartela de cores fresca e as ilustrações lúdicas do artista Luís Matuto.
HT – O que vemos nas edições do Minas Trend é a valorização da moda mineira e do Brasil tanto na passarela como no maior Salão de Negócios da América Latina. Quais são as novidades que veremos como ênfase na 25ª edição?
RL – Faremos uma parceria significativa com a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção e o pré-lançamento para uma nova feira no setor têxtil.
HT – Como foi a repercussão do Projeto Comprador Internacional, que movimentou na edição passada negócios estimados em U$265.108,29, e tinha expectativa de novos contratos para os próximos 12 meses por meio de encontros de negócios com 40 empresas brasileiras expositoras no evento?
RL – A repercussão e o crescimento do Projeto Comprador se deram como resultado de um trabalho persistente nas edições anteriores, construindo um relacionamento de confiança entre os compradores internacionais e as marcas participantes. A cada edição eles se sentem mais seguros para investir nas marcas nacionais. Mérito do setor de exportação da FIEMG que vem fazendo um belo trabalho não só no setor têxtil mas em outros segmentos da indústria.
HT – O Minas Trend apoia os novos criadores autorais. E como está o cenário do novo empreendedor da indústria criativa da moda no Brasil?
RL – O novo empreendedor chega com uma mentalidade diferente, valorizando o comércio justo, as colaborações, tiragens em pequenas escalas. Muitos nem têm interesse de manter uma fábrica, trabalhando com terceirizações e focando seus esforços em marketing e comunicação. Ao mesmo tempo, conseguem trazer um ar fresco e novas discussões para a moda.
HT – Além da moda, o evento une cultura, gastronomia, exposições, shows… o que pode nos antecipar? Observamos que o setor gastronômico uniu o pequeno produtor e o cliente final para que este experimente o melhor das Minas Gerais. O que veremos na 25ª edição?
RL – Posso antecipar que teremos o relançamento da Estrada Real no espaço gastronômico mas ainda estamos fechando os detalhes.
HT – A integração da sociedade como um todo com o evento tem sido a tônica. O público pôde conferir desfiles abertos, espetáculos, shows, e estar presente no Expominas. Como serão ampliadas estas ações?
RL – A abertura ao público final é uma proposta para ampliar o envolvimento da sociedade no evento, movimentando ainda mais nossa cidade. É uma demanda que sempre existiu e que agora buscamos conciliar criando um espaço de entretenimento destinado a este público, paralelo ao salão de negócios. Espere por palestras, gastronomia, shows e até desfiles no foyer do evento.
HT – Defina Rogério Lima em três palavras.
RL – Traquitaneiro, criativo e trabalhador!
HT – Qual o seu maior sonho?
RL – Ver uma sociedade sem tantas diferenças sociais.
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