Mary Design: confidências ao pé do ouvido com sabor de prosa mineirinha


Nova coleção de bijoux da designer se inspirou em memórias colhidas no circuitão de viagens pelo interior Brasil

Mary Design lança coleção batizada de Confidência Mineira. A ideia veio após viajar por cinco estados brasileiros em apenas um mês, indo, voltando e visitando artesãos e investigando processos para seu trabalho. Segundo Mary Arantes (a cabeça que comanda este pequeno império das bijoux autorais), foi uma correria só, mas nada que impedisse a elaboração da matéria-prima primordial pra suas criações: a reflexão.

Mary já estava com a cabeça em polvorosa quando começou a tal peregrinação. Andava comparando os recentes movimentos populares nas ruas com o período em que saiu da roça e foi para Belo Horizonte, em 1968, “como agora, uma época de proibições e insatisfação popular”, afirma. Ainda incomodavam as dificuldades pelas quais a moda tem passado, o recente falecimento da estilista Clô Orozco, o custo de se ter uma marca hoje em dia. São mesmo tempos de reflexão.

Daí, a viagem. Em Alagoas, visitou a Ilha do Ferro, um paraíso perdido após dez horas de viagem, repleto da mais autêntica arte popular. Em Cuiabá, experimentou novos sabores brasileiros e trouxe na bagagem a bondade e a arte do povo local, assim como a cor do barro. Navegou pelo Rio São Francisco, dormiu em pousadas com banheiros compartilhados, almoçou na casa de desconhecidas em favelas. E, a cada volta, costurava mais um pedacinho de sua coleção, munida das vivências e da oportunidade que teve de aprender em cada um desses locais. Por isso mesmo, afirma que a nova coleção carrega cenas de Penedo, o colorido das casinhas de Piranhas, o amor de Jerônimo pela arte popular, o canto de Vera e Zuleika, a poesia de Ruth Albernaz, a comunhão em roda com a as mulheres em Cuiabá, tudo experiências únicas que lhe ficarão marcadas na memória pelo resto da vida.

Dessa salada de recuerdos recentes, saiu nova fornada de bijoux maravilhosas que Mary, junto com a estilista Juliana Scheid, aproveitou para lançar em seu show room, com a presença das Meninas de Sinhá, grupo musical de senhoras que cantam cantigas de roda, do Alto Vera Cruz, em Belo Horizonte. Elas já haviam participado de um desfile da grife tempos atrás, e Mary achou que tinha tudo a ver chamar as “meninas”, já que a nova coleção usou basicamente esse tipo de lembrança afetiva.

A nova coleção – que a gente mostra aqui na galeria – têm colorido denso que vai desde a melancólica mistura de cinza e marrom, completada por muitos vinhos, bordô, roxos, vermelho intenso. Ou alaranjados. “Gamas da batalha e da brasilidade”, segundo Mary. “Mas, a alegria de ser também fala alto nessa palheta de cores”, filosofa. Com banhos em ouro acobreado, muitas peças com bolas bordadas remetendo aos ateliês de costura, fios finos de linhas, agulhas, miçangas e muitos recursos artesanais, completadas por pingentes em forma de lustres e resinas em acabamentos foscos, lixadas ou com aspecto de seixos e pedras lapidadas, como se estivessem ainda em construção. Como um ser humano, que constantemente se elabora através da reflexão. Mas Mary é assim mesmo.  “Fico aqui tecendo fios para depois desfazer e não ter de acabar, para começar tudo de novo”, brinca Mary, se comparando à famosa Penélope, a esposa do rei Ulisses no clássico grego A Odisséia, de Homero.

Fotos: divulgação