*Por Marcia Disitzer
A notícia teve o efeito de uma ducha de água gelada. A segunda edição do Rio Moda Rio, que aconteceria em novembro e lançaria coleções de alto verão, foi adiada para o primeiro semestre do ano que vem. O evento, que estreou com proposta inovadora de apresentação da moda brasileira e reuniu 22 mil pessoas, em junho, no Píer Mauá, foi um sucesso de público e de crítica. E a alma do Rio Moda Rio tem nome e sobrenome: Carlos Tufvesson. “Trabalhar o alto verão é a vocação do Rio. Este estilo é a cara da moda brasileira e nosso nicho no mercado internacional”, afirma o estilista e presidente do Conselho Municipal da Moda do Rio de Janeiro.
Comenta-se no mercado que um dos motivos do adiamento teria sido o descontentamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), patrocinadora master do evento, com a data do Rio Moda Rio. O desejo da Federação seria fazer um evento direcionado para os pedidos dos lojistas. Enquanto que o conceito do Rio Moda Rio é priorizar o público final. Procurada pelo site, a Firjan disse que não vai se pronunciar sobre o adiamento.
Idealizador e curador do Rio Moda Rio, Carlos defende a preservação da filosofia do evento e acha que não se deve repetir a fórmula dos anos 90. “Sou favorável à democratização da moda, que é tudo que a gente veste e não, como muitos confundem, o vestido longo da passarela. A gente só vai aumentar o poder de compra quando a moda voltar a encantar e isso não acontece em semanas fechadas, só para iniciados ou profissionais do mercado”, acredita. “O desfile coletivo de encerramento da primeira edição do evento, em junho, reuniu 1.800 pessoas na Praça Mauá, sem muita divulgação. E elas me perguntaram por que a apresentação durou apenas 10 minutos. Foi emocionante. É a educação pela moda que vai direcionar as compras deste público”, afirma ele, que se certificou estar no rumo certo quando palavras, como plataforma e performance, adotadas pelo Rio Moda Rio, passaram a ser incorporadas a outros eventos do setor. “O Rio Moda Rio marca uma nova visão de empresários sobre o nosso setor. Coisa que não acontecia no segmento há 20 anos”, emenda o estilista, referindo-se a Duda Magalhães, da Dream Factory, e a Luiz Calainho, da L21.
Carlos lembra que o Rio Moda Rio também teve o mérito de reverenciar a memória da moda brasileira. “Abri o evento com um desfile que homenageou nomes, como Simão Azulay, Mauro Taubman e Maria Cândida Sarmento, que ergueram a moda no Brasil e que não são conhecidos nem nas faculdades. O Luiz de Freitas, que revolucionou o mercado na década de 80 com a Mr. Wonderful, seria o próximo da lista”, revela, elogiando a cobertura da mídia nacional: “Foi bombástica”.
Falante e articulado, Tufvesson não entende a apatia que domina o setor. “Nesta campanha para a prefeitura, candidato algum abordou o segmento de confecção. E o estilista também não se faz ouvir. Quando acabou o Fashion Rio, ninguém falou nada. Parecia que tinha terminado a Semana de Moda da Rua Teresa, em Petrópolis”, dispara ele, que é a favor da criação de uma Secretaria Municipal de Economia Criativa, na qual a moda estaria incluída. “Não tem como continuar com esta tributação altíssima. Na época em que tinha a minha marca, adoraria que uma blusa, que custava mil reais, fosse vendida por 200 reais. Mas com esta carga de impostos é impossível. Também não temos uma estamparia digital no Rio de Janeiro. Contamos com estilistas, mas não qualificamos a formação de modelistas, costureiras e acabadeiras”, critica. Para ele, o poder de transformação da costura deveria ser valorizado. “É um empoderamento, capaz de mudar a vida das mulheres, principalmente em ambientes machistas”. Mas, segundo Tufvesson, o setor público continua olhando para a moda como coisa de burguês. “É enlouquecedor, mas não vou desistir. A moda é a minha vida”.
Além de ter que lidar com a frustração provocada pelo adiamento do Rio Moda Rio, Tufvesson se despede da presidência da Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual da cidade do Rio (CEDS-Rio). E ele sai com a sensação de missão cumprida. “Gostaria de fazer pela moda o que fiz com a política LGBT. Tirei a homofobia do gueto. Hoje à noite, o 15° Prêmio do Cinema Brasileiro contará com 22 recepcionistas trans, do Projeto Damas. Nossa intenção é provar que a capacidade profissional não passa pelo órgão sexual”, explica. Carlos também assina o figurino dos apresentadores do evento, os atores Fabrício Boliveira e Cris Vianna: “Ela vai usar um modelo meu, de acervo, que é um escândalo, tenho orgulho da atemporalidade do meu design”, diz ele, que fechou a sua empresa há cinco anos. “Sinto muita falta. Mas não tenho saudade de pagar 600 mil reais de impostos por mês”.
Nesta ciranda de emoções, ele observa com preocupação o segundo turno da eleição para prefeito da cidade que tanto ama: “Sou contra extremismos e trabalho em prol dos direitos humanos. Esta foi uma campanha de muito ódio. A gente sabe como tem sofrido com a questão partidária e com a influência religiosa na política. As candidaturas de Freixo e Crivella precisam provar que falarão para toda a sociedade e não apenas para seus respectivos guetos”.
Artigos relacionados