Desde que surgiu no universo da moda, Isabela Capeto vem mostrando uma capacidade incrível de se reinventar, sempre fugindo do caminho mais fácil e apostando em uma produção autoral, que carregue seu DNA e sua filosofia de vida através de peças brasileiríssimas. E é essa expertise – que a fez recomprar sua própria marca e se relançar no mercado – que ela tem passado adiante, através das palestras do Rotas de Inspiração. O projeto, uma parceria da Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal) com o Sebrae, passará por seis cidades mostrando a importância de se valorizar a identidade brasileira na moda e apostar na sustentabilidade. Em conversa exclusiva com HT, a estilista contou como tem sido a experiência de transmitir seu conhecimento, os maiores desafios dessa jornada, o que tem ouvido dos novos players da indústria fashion e muito mais.
Com o tema “Identidade x Criação – Construção de uma marca através da valorização da Cultura Brasileira”, Isabela tem feito palestras em grandes polos da moda brasileira, como Maringá (PR) e Florianópolis (SC), enquanto, agora, se prepara para Birigui (SP), Belo Horizonte (MG) e Juazeiro do Norte (CE), terminando o périplo em São Paulo, onde voltará a pilotar no Inspiramais Verão 2017 – Salão de Design e Inovação de Materiais, em 11 de janeiro (uma parceria entre a Assintecal, a Footwear Components by Brasil e o Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil) o Projeto Ecodesign. Lá, as principais tendências de materiais, texturas, estampas, formas e tecidos serão apresentadas para a indústria de componentes e players da moda. Mas, por enquanto, o foco da estilista está no Rotas de Inspiração, projeto com o objetivo de mostrar a empresários, estudantes de moda, estilistas e agentes da indústria criativa como é possível ter uma marca que preze pela individualidade e fuja da mesmice geral, apoiando-se em conceitos como a sustentabilidade na produção, a brasilidade no design e a própria inovação. As palestras são parte integrante de um contexto mais abrangente, o qual inclui ainda o Fórum de Inspirações, que, além de antecipar as tendências para empresários e designers (veja aqui quais são apostas para o Verão 2017), também os coloca em contato direto com o que há de mais moderno em indicativos para promover o desenvolvimento de produtos inovadores com base na estação (veja as dicas de Tatiana Souza, do Núcleo de Design da Assintecal, sobre o assunto).
“Essa é uma proposta muito interessante. Todas as pessoas que eu encontrei ficam muito felizes de poderem tirar suas dúvidas sobre o mercado e trabalhar com moda no Brasil, principalmente os estudantes e os empresários. Para eles, é muito importante esse bate-papo. Eu falo bastante da experiência com a minha marca, dos percalços, como consegui superá-los e, então, temos essa troca”, explica Isabela. E, de acordo com a estilista, a cumplicidade é bem intensa. “Eles têm muita dúvida a respeito do processo criativo, como criei a Isabela Capeto, como consegui vendê-la e comprá-la de novo…”, conta, empolgada e orgulhosa com o volume de informação que tem trocado.
A entrada de Isabela Capeto no universo da moda sustentável deu-se graças a um empurrãozinho do destino e ao feeling indescritível de quem tem faro para os negócios. Em julho deste ano, a estilista havia comentado com HT (leia a entrevista completa aqui): “Sempre tive mania de reaproveitar tudo. Sobras de tecidos, peças antigas, rendas, enfim, tudo vira um novo material nas minhas mãos”. Agora, ela conta que um momento decisivo nessa nova estratégia ocorreu quando teve de volta o controle de sua marca. “Tive que resolver o meu problema quando a resgatei, mas precisava solucionar aquilo de maneira diferente. Como ainda havia sobrado muita peça, eu dei um jeito de reaproveitar tudo: tingi alguns tecidos, transformei outros, mas consegui reutilizar tudo”, explica.
Agora, para ela, a moda sustentável já se tornou tanto uma necessidade, quanto um prazer e uma chancela dentro de sua grife homônima. “Há mais importância e valor nisso. O mundo todo está prestando mais atenção em soluções sustentáveis. Eu, particularmente, faço através do reaproveitamento, de parcerias com ONGs, das bordadeiras que eu contrato… No meu ateliê, é tudo parte de uma nova responsabilidade social”, explica. Entretanto, ela reconhece que há alguns desafios para criar uma moda sustentável, principalmente em relação ao preço. “Isso é o mais difícil, porque é tudo mais caro. A malha de algodão tingida de forma legal, com tinta de planta etc., acaba custando mais. É um grande problema, porque acho que as pessoas ainda não podem usufruir de tudo isso por não quererem pagar. Mas é também um trabalho que leva tempo”, avalia.
Outro tópico fundamental durante as discussões do Rotas de Inspiração é a valorização de uma identidade brasileira, um ideal que vem sendo trabalhado pela Assintecal por meio do conceito de “Pertencimento” (saiba mais aqui), no qual entende-se o seu lugar na indústria e o seu diferencial, trabalhando-os de uma forma que agreguem valor à marca. E, disso, Isabela entende muito bem. Afinal, não precisamos ir muito longe na memória, apenas até a última edição da São Paulo Fashion Week, para lembrar como a estilista desenvolveu uma coleção brasileiríssima, inspirada no rito de passagem do Ano Novo. “Esse é outro assunto que quem vai às palestras tem muito interesse. Como é criar uma ‘moda brasileira’? Por eu ser uma marca made in Brasil, explico que nunca procurei esse conceito e que ele está no meu DNA, sem querer. É algo que eu gosto, do qual tenho o maior orgulho. Acho que, hoje, as pessoas já estão trabalhando isso de forma mais forte. Copiar o que vem lá de fora não cabe mais, é um mico! Agora temos a velocidade da internet, o Instagram etc., então as pessoas estão sendo obrigadas a procurar esse próprio DNA. Vejo que esse movimento também se replica na arte, na literatura, na gastronomia e em todas as outras expressões de cultura. Os brasileiros estão começando a olhar para dentro de si. A crise também colaborou, porque está difícil para as pessoas viajarem mais e importarem material”.
Em conversa exclusiva com HT, ainda na semana passada, Tatiana Souza, consultora do Núcleo de Design da Assintecal, coordenado por Walter Rodrigues, e uma das palestrantes do Fórum de Inspirações, revelou que parte fundamental do processo de superação da crise se dá com o autoconhecimento acerca da própria marca. Não à toa, o tema desta edição do Fórum foi “Despertar”. “Há três perguntas fundamentais para ter essa noção: ‘Quem eu sou? De onde vim? Para onde vou?’. Quando você tem uma estrutura e uma consciência a respeito do que você sabe produzir com qualidade, até onde você consegue ir e quais são os seus limites, é possível pensar em estratégias mais realistas”, explicou Tatiana.
Para Isabela, esse é exatamente o caminho a se seguir: “As pessoas precisam se reinventar e serem mais criativas, reaproveitando o que têm, enfrentando as dificuldades e, principalmente, trocando informações. Vejo que muitos dos que vão ao Rotas têm dificuldade em mil aspectos, como se organizar, enxergar o mercado, como vender… Mas vejo também que eles estão correndo atrás”, comenta, com um tom esperançoso.
Na próxima semana, ela já começa a pensar na sua apresentação para o Inspiramais, no qual é responsável pelo setor de Ecodesign, reforçando novamente a importância da sustentabilidade. Mas, antes disso, Isabela Capeto ainda pretende desenvolver sua coleção Verão 2017: “Já estou começando a criar. Optei por lançar uma coleção por ano, algo bem trabalhado, assim tenho mais tempo e paciência para todos os detalhes”, explica, ao mesmo tempo em que exemplifica muito bem o que é a noção de “Pertencimento”.
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