*Por João Ker
Okay, o mundo entrou em êxtase essa semana, quando a Chanel finalmente lançou o vídeo para a campanha do seu perfume mais tradicional, Nº 5, com Gisele Bündchen emprestando seu rostinho milionário para o filme. Antes de chegar lá, vale uma breve história sobre a fragrância para reavivar a memória daqueles que não ingerem peixe em todas as refeições: a icônica garrafa lançada em 1921 – que já virou bolsa-fetiche nas mãos de Karl Lagerfeld – tornou-se um item de desejo mundial quando Marilyn Monroe, durante seu auge em 1960, foi questionada sobre o que usava para dormir e declarou (inocente ou maldosamente, isso nunca ficou claro) que bastavam duas gotas do aroma. Agora, a emblemática resposta da estrela mais deliciosamente devassa de Hollywood foi convertida em um comercial. Desde então, a maison francesa escolhe a dedo todos os porta-vozes para o perfume, com produções milionárias para suas propagandas. E é aí que entra Gisele Bundchen e o diretor australiano Baz Luhrmann.
Baz, que é conhecido pela extravagância de filmes como “Moulin Rouge” (idem, 2001) e “O Grande Gatsby” (“The Great Gatsby”, 2013), já havia filmado a campanha de 2004 do Chanel Nº5, estrelada por Nicole Kidman e Rodrigo Santoro em algo que parecia um spin-off moderno e encurtado do próprio Moulin Rouge, com um orçamento de alegados U$42 milhões. O breve romance entrou para a história das propagandas de cosméticos e, posteriormente, foi incorporado ao DNA da fragrância, que já convidou Brad Pitt (o primeiro homem a realizar tal feito) e Audrey Tautou (que em 2009 interpretou a própria Coco Chanel no cinema) para serem o rosto do perfume.
Campanha do Chanel Nº 5 de 2004, dirigida por Baz Luhrmann e estrelada por Nicole Kidman e Rodrigo Santoro
Gisele Bundchen é a primeira modelo a encarnar a mulher Nº 5 que, pelo histórico, têm sido sempre estrelas do cinema. Mas, óbvio, a trajetória profissional e midiática da moça equivale ao de uma grande diva nas telas, não é mesmo? Nos bastidores do “filme”, Baz Luhrmann explica que o conceito por trás da produção era pensar em como esse arquétipo específico teria evoluído desde a campanha com Nicole Kidman até os dias de hoje. “Ela é realmente alguém que vai à praia, que é extremamente atlética. Ela tem filhos, tem um relacionamento muito significativo. E ainda tem uma carreira que lhe permite criar uma imagem inspiradora, sensual e repleta de glamour. E, de alguma forma, o mais importante para ela é o amor. É isso o que tentamos passar nesse filme”, diz o diretor, romantizando realidades e divagando sobre a top brasileira, como se estivesse mais enebriado que a própria Marilyn em um set de gravação.
Ao lado de Michiel Huisman (famoso pelas séries “Orphan Black” e “Game Of Thrones”), Gisele aparece em uma história de amor repleta de efeitos visuais e até um pouco desconexa, mas sempre poderosa, enquanto o até então desconhecido Lo-Fang apresenta uma releitura romântica do clássico “The One That I Want”, uma das músicas mais famosas de “Grease” (idem, de Randal Kleiser, 1978) e que acaba por emprestar seu nome ao comercial.
Tudo a ver. Luhrmann, que antes de ser engolido por Hollywood, dirigia clipes de música para as gravadoras (assim como tantos outros diretores), nunca conseguiu se desvencilhar dessa origem e seus longa-metragens são, antes de qualquer coisa, um frenesi visual. O cineasta sempre acaba dando uma esnobada na importância de um bom roteiro, transformando suas produções em vídeos de mais de duas horas de duração com ótimas imagens, direção de arte feérica e embalados por uma seleção de músicas tiradas do imaginário pop mundial e repaginadas com nova roupagem. No novo comercial do Chanel nº 5, portanto, a coisa não poderia ser diferente.
E, claro, se ele evoca a tal mulher poderosa e glamorosa do tradicional perfume, mas adiciona pitadas de naturalidade usando a imagem da própria Gisele aditivada por cenas praianas, pranchas de surfe e o cotidiano de mãe de família, por outro lado ele não consegue abrir mão de sua verve burlèsque. Afeito a festas bafônicas, ambiência de cabarés, cortinas drapeadas, salões de dança e toda a sorte de excessos que fazem a alegria dos gays, o diretor dá um jeitinho de intercalar as imagens das ondas com as de Lo-Fang cantando a tal canção em um ambiente que, digamos, mais Baz Luhrmann, impossível! Como se, em parte do filmete, Gisele desse um tempo naquele mundinho perfeitamente clean que a trouxe para perto de Kelly Slater e, assim como na vida real, caísse na farra, dando “bye bye, natureba”. Só falta pegar um carro com capô retrátil envenenado e sair com as amigas pelas ruas de Los Angeles com uma garrafa de bourbon na mão, zoando com quem estivesse na calçada e gritando; “uhuuuuuuu”!
É, o bafão não poderia jamais ficar de fora em uma produção do diretor e, sem dúvida, as belas imagens do set de fotografia, com a übbermodel posando ao lado de um imenso blockletter com o logo do perfume, cheio de luzinhas, é extremamente “Moulin Rouge”, cheio daquela aura de cabaré retrô. Quase Cher, não é mesmo?
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Chanel Nº 5, “The One That I Want” – Dirigido por Baz Luhrmann
Apesar do hype incrível, monstruoso e merecido para o filme, essa não é nem de longe a primeira – e nem será a última! – vez em que Hollywood e a indústria de cosméticos de luxo se encontram cara a cara. Afinal, moda, cinema, música e comportamento fazem parte do mesmo balaio e, claro, os executivos do mercado de beleza – um dos mais poderosos do mundo – deitam e rolam com as associações possíveis entre todos esses mundinhos na hora de revestir seus produtos com a aura proveniente de todos eles. Tudo junto e misturado, of course! Abaixo, HT faz um Top 5 com comerciais dirigidos por grandes diretores de cinema. Solta o play!
Pelas lentes de Martin Scorcese, a Dolce & Gabbana também produziu em 2013 um romance repleto de luxo, estrelado por outra loura digna do pódio, a sulafricana Scarlett Johansson e a bola da vez, Matthew McConaughey. “Esta é a celebração da paixão, da beleza e da individualidade”, declarou a marca. Apesar de o casal não convencer muito bem, os diálogos e a representação em preto e branco de Manhattan provam que para se contar uma boa história não é necessária uma megaprodução como a de Baz Luhrmann..O problema é que, tratando-se de bizz, o “menos” dificilmente será “mais”.
Dolce & Gabbana, “The One” – Dirigido por Martin Scorcese
Uma das vantagens de ser amigo de Sofia Coppola é poder contar com o talento da diretora para seus projetos. E foi exatamente o que Marc Jacobs fez para as campanhas das fragrâncias “Daisy” e “Daisy Dream”. Nos curtíssimos vídeos, Sofia aplica sua estética de forma natural, como se o perfume e o conceito por trás dele houvessem sido pensados exatamente para a garota. Com o casting correto, as imagens poderiam muito bem se passar por cenas excluídas de “As Virgens Suicidas” (“The Virgin Suicides”, 1999) ou “Maria Antonieta” (“Marie Antoinette”, 2006).
Marc Jacobs, “Daisy” e “Daisy Dream” – Dirigido por Sofia Coppola
Continuando o périplo da família, Roman Coppola e o incensado Wes Anderson fizeram uma série de três capítulos para “Candy”, fragrância lançada em 2013 pela Prada e que se envolve completamente no conceito das coleções lançadas nesse ano pela grife de Miuccia. Aqui, a estrela principal é Lea Seydoux, que se já era atriz cult e transformou em it-girl no ano passado depois de cair nas graças do público e da crítica com sua performance em “Azul É A Cor Mais Quente” (“La vie d’Adèle”, de Abdellatif Kechiche). Todas as características da marca aparecem ali: a modernidade da mulher francesa, a liberdade sexual, o jeito simples de levar a vida e até um certo feminismo implícito. E, como os relacionamentos são vias de mão dupla, quem é uma das atrizes a amealhar um dos poucos papeis femininos na última produção de Anderson, “Grande Hotel Budapeste”, repleta de astros como Ralph Fiennes e Jude Law? Elazinha, meu bem: Lea!
Prada, “Candy” – Dirigido por Wes Anderson
Em 2010, Guy Ritchie, diretor que tem pecha de macho pela sua filmografia e por ter transformado a rainha do pop Madonna em uma maezinha de família ladylike (somente por um tempo, bem verdade), foi o escolhido para comandar o filme da Dior Homme, criando um buzz absurdo em volta da propaganda estrelada por Jude Law, com mais de 5 min. de duração. As marcas do diretor estão lá: perseguição, sensualidade, carros velozes e mulheres fatais, tudo costurado por um diálogo que vai desabrochando ao final. Okay, bem a cara do diretor. Mas, convenhamos, quem disse que o homem que se vê nas telas combina com os rapazes de traços delicados e pouco viris, deliciosamente twinks, que a grife escolhe na hora de compor seu casting nas passarelas? Tudo bem, a amplitude de vendas de uma fragrância da grife é infinitamente maior do que a capacidade de consumo da sua linha masculina de roupas e precisa atingir um público mais amplo (e quem sabe, mais masculino), que está diante da televisão vendo o comercial. Mesmo assim, a diferença é um disparate!
Dior Homme, “Un Rendez Vous” – Dirigido por Guy Ritchie
A Axe não pode ser considerada como uma marca de cosméticos de luxo – au contraire! – , mas este ano ela investiu tanto quanto pode nos comerciais, e por isso HT vai incluí-la nesta lista como curiosidade de quermesse. Afinal, é louvável que ela também tenha optado por um nome do cinemão para sua campanha, Rupert Sanders, conhecido como o amante de Kristen Stewart ou o diretor de “Branca de Neve e o Caçador” (“Snow White and the Huntsman”, 2012), estrelado pela própria e com Charlize Theron, outra figurinha fácil em comerciais de perfume (J’Adore, da Dior), como vilã. A propaganda, exibida durante o Super Bowl, traz uma mensagem clara e positiva em uma daquelas raras vezes que a publicidade lembra que tem uma alma: “Faça amor e não guerra”.
Axe, “Make Love Not War” – Dirigido por Rupert Sanders
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