*Por João Ker
O trânsito do Rio de Janeiro bem que parece uma Corrida Maluca em versão estática nos horários de pico. Entre suas várias e mutantes peculiaridades, há os táxis amarelo-claro, a cor-padrão para a capital fluminense desde os anos setenta – pálida tentativa de seguir o padrão nova-iorquino dos veículos utilitários em amarelo ovo. E sai a faixa quadriculada em P&B e entra a nossa, em azul escuro. E, apesar do requisito cromático, um veículo anda chamando a atenção de turistas e cariocas que se aventuram pelas madrugadas na Zona Sul da cidade: o Discotaxi Rio, como foi batizado por seu dono, Guilherme Von Doellinger.
Por fora, pode parecer apenas mais um táxi amarelinho. Mas isso porque a magia do Discotaxi fica por dentro, onde, como diz Guilherme, “os passageiros são transportados entre lugares e dimensões”, como se o espectroplasma de Donna Summer houvesse reencarnado em um quatro-portas. O veículo chama a atenção pelas luzes de neon penduradas no teto e pelo globo de luz espelhado que, juntos com a música tocada pelo taxista, conferem o clima de “balada forever” pelo qual o carro ficou famoso. “Costumo dizer que as pessoas são como vaga-lumes: se sentem atraídas pela luz”, comenta Guilherme, que faz o serviço já há 14 anos, praticamente um filósofo da vida mundana.
O resultado, de alguma forma, lembra um pouco o hilário Mambo Táxi que deu expediente em “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” (1988), de Pedro Almodóvar. Mas, agora, sai aquela estética assumidamente cafa, com oncinha e elementos que parecem saídos de um baile de Xavier Cugat (ou Perez Prado), e invadem carroceria adentro todos os componentes da ambiência ressuscitada pela reexibição de “Dancing Days” no canal Viva e a estreia de “Boogie Oogie” na Globo.
Tudo começou em 2000, quando Guilherme abandonou a carreira de DJ – ou “discotecário”, como diz – para assumir o volante no lugar das carrapetas. Logo de cara já sentiu que faltava um certo tipo de customização nos serviços oferecidos. A “luz” só se acendeu quando ele começou a reparar em um denominador comum entre os comentários de seus passageiros: “Eu só trabalho à noite, então pego muita gente que está saindo da balada. Vários clientes entravam no carro e diziam ‘nossa, a música aqui dentro tá melhor do que na festa onde a gente tava agora’. E não é querendo desmereces o pessoal que toca nas festas, mas houve realmente uma mudança tanto no serviço quanto no público. Hoje em dia, com o advento da tecnologia, qualquer um se autointitula como DJ só porque faz umas batidas aqui e ali”, comenta o motorista dublê de DJ, que já trabalha há 24 anos como discotecário e passou por boates cariocas como as extintas Hippopotamus (depois Baronetti, agora comandada pelos filhos de Ricardo Amaral), Gattopardo (atual Club Praia), Provisório etc.
O som rolando solto no interior do Discotaxi
Foi então que, no primeiro ano, o taxista e DJ colocou timidamente um globo de luzes no teto do carro. “Fiquei com medo de haver alguma restrição com a Secretaria de Transportes e isso me causar uma advertência, já que as autoridades por aqui são tão retrógradas”, explica. Após receber o sinal verde para a nova decoração, Guilherme começou a incrementar seu posto de trabalho – no qual passa cerca de oito horas pelas madrugadas a fora, ouvindo Racionais MC’s para se manter alerta – com os tubos de luz e o som potente que hoje fazem parte da marca registrada do Discotaxi.
Hoje, o sucesso do carro mais emperequetado do trânsito carioca é indiscutível. Gabriel conta que os “vaga-lumes humanos” chegam a sair de restaurantes para pegarem seu cartão e que ele já foi até aplaudido quando deixou um passageiro no bar Jobi, ali no Leblon. “A reação de quem entra no meu carro é de deslumbramento, com um olhar infantil e maravilhado”, conta o taxista que diz usar de uma ampla psicologia para evitar qualquer tipo de excesso no interior de seu veículo. “Eu já tenho uma placa ali dentro que diz ‘Comportamentos inadequados podem desviar a atenção do motorista’. Quando vejo uma euforia muito grande, trato logo de abaixar a bola da pessoa”. Ou seja, além de DJ e condutor, ele também atua como leão de chácara, quase um mix de beque de porta de boate com alguém que adora conduzir Misses Daysies mais assanhadas, mas não deixa de por ordem na casa.
Agora, para quem pretende registrar a sua passada pelo táxi mais famosos do Rio de Janeiro, já existe uma opção 0800 para guardar suas memórias. O Discotaxi firmou uma parceria com a Fotocabine e agora disponibiliza Printgrams para seus passageiros. Para quem não lembra do nome, essa é a mesma empresa responsável pela impressão de fotos gratuitas nas melhores baladas do país e agora está inovando com um serviço móvel. Bruno Bezerra, diretor executivo da firma, explica a iniciativa: “A pessoa que entra no táxi já fica encantada pelo ambiente. A luz muda de cor, o globo é espelhado, o teto iluminado… É uma reação espontânea. Nós apenas pegamos um gancho do que as pessoas já fazem e transformamos em algo palpável e gratuito”. Para a turma descrente, o cara ainda afirma que foi feito um teste com o aparelho por uma semana e que tudo funcionou corretamente. O melhor de tudo? Você não precisa depender do sinal 3g da sua operadora, porque o serviço ainda gera uma rede wi-fi tanto para o taxista quanto para o passageiro. É praticamente o sonho de um viciado em selfie se tornando realidade a toda velocidade.
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