Incensado na moda nacional e internacional, David Lee quanto mais longe chega, mais destaca sua maior inspiração: a cultura nordestina, o artesanato, a vulnerabilidade humana diante da natureza e do social, a arte, e, recentemente, a música. É nisso que se apoia a inspiração do estilista. “Certa vez eu li que: ‘tudo aquilo que nos é visível só o é porque está iluminado. E, então, eu também me iluminei”. A frase de David Lee, que teve como panorama afetivo o horizonte e as velas do Mucuripe, que vão sair para pescar, traduz como conceito da coleção do DFB Festival, multiplaforma de moda, arte e cultura, e realizado em julho, a cultura litorânea em diálogo com a cultura urbana. E ele ressalta a importância do evento, que completou 25 anos, em sua trajetória: “Seria hipocrisia da minha parte falar sobre as minhas coleções, sobre meu local de nascimento, onde eu vivo, a minha cultura e não participar do evento que me projetou, que me ajudou a construir o meu trabalho e que tem essa visibilidade nacional”.
Pluralizando o vestir como forma de expressão, David cria coleções como um território para exercitar possibilidades por meio da moda, que pode acolher discussões necessárias. E ressalta que a perspectiva externa é reflexo do que nos habita. “Dessa forma, é extremamente importante para nós falarmos de autoconhecimento sem perder o otimismo. Independente das dores e delícias de continuar me dedicando ao cenário da moda brasileira, sempre fui muito otimista. Meu trabalho é um projeto de vida e a locomotiva de mudança ao meu redor. Desistir nunca foi uma opção e sei que represento muitos e me comprometo também com isso.
O designer conta que sua motivação [em participar do DFB] é a “possibilidade de nascer outros David, de pessoas que se inspiram em mim. Isso me motiva bastante em deixar um trabalho, um legado no qual as pessoas possam olhar como inspiração. Acho isso muito, muito valioso e grandioso, bem como poder falar do Brasil. Acho que vivemos num país muito desigual. Podemos contar o Brasil de inúmeras formas, então tem esse mix de sensações dessa contribuição e também o meu amor. Eu amo o que eu faço, por mais que as coisas sejam difíceis”.
Em fevereiro de 2019, David desfilou em Londres, durante a International Fashion Showcase (IFS) representando o homem contemporâneo com roupas que vão desde a praia ao agito noturno. Natural de Fortaleza, Ceará, desde 2015 estabeleceu sua marca homônima depois de participações e premiações em concursos reveladores de novos talentos. Autodidata, o designer iniciou suas pesquisas através de temas que moldam a masculinidade contemporânea, estabelecendo uma assinatura inconfundível que se manifesta em coleções bem equilibradas entre a funcionalidade urbana e a inovação técnica e poética. Não à toa, em 2020, foi incluído na seleta lista Under 30, da revista Forbes Brasil, projetando sua label dentro e fora do país. E quanto mais longe chega, mais destaca sua maior inspiração: “O Nordeste é uma locomotiva criativa essencial para promoção do artesanato no Brasil e no mundo, mas não nos reduzimos a ele. Se reconhecer nordestino, valorizar o que é feito aqui e, principalmente fugir dos estereótipos, tem nos levado a um mercado cada vez mais próspero e dinâmico”, pontua.
O HORIZONTE ABERTO
Tão admirável quanto conferir o raiar do sol no horizonte do mar cearense, foi acompanhar look a look o desfile de David, que trouxe uma frase como orientação para este desfile. “Contemplar o que está na frente, esperar, ver o que virá a seguir. A experiência do que veremos na passarela é um instante, diante de tudo o que já foi visto e do que ainda veremos. Tem muito mais perguntas no horizonte do que respostas”.
Como uma conexão singular, as pipas, com suas cores vivas, sobem ao céu, enfeitando a paisagem e anunciando a chegada da época dos ventos. Coloriremos o céu, trazendo ao vasto azul uma imensidão de possibilidades. O desejo pelo ideal esportivo, com seu toque utilitário, continua a ditar nossas prioridades. Em linhas diagonais, a geometria poética ressalta a subjetividade de uma cidade em movimento. Escolha sua direção e siga, mas deixaremos caminhos abertos para a sua jornada. Nos fios náuticos, o crochê emerge como um arremate tecnológico, misturando o artesanal ao inovador, fugindo de clichês. Esta coleção, confiante e determinada, contou com a parceria com O Homem do Sapato, destacando a colaboração entre a marca e David Lee em um sneaker icônico.
Essa collab não só simboliza a convergência de duas trajetórias de sucesso, mas também exalta a história distinta que ambas as marcas vêm construindo no cenário da moda nacional. O ponto culminante dessa colaboração é o lançamento do Sneaker Lee, um modelo de tênis singular concebido como uma homenagem ao fundador e diretor criativo da marca David Lee. O calçado exclusivo harmoniza a elegância atemporal dos designers da Homem do Sapato com a ousadia e inovação que caracterizam a marca de Lee, resultando em um produto que aspira a conquistar o coração dos que amam moda.
“A decisão de lançar a colaboração no DFB Festival não foi meramente circunstancial”, explicou Jhonatan Rêgo, sócio-fundador e diretor criativo da Homem do Sapato. “O evento, que figura entre os mais prestigiados do universo da moda cearense, celebra seus 25 anos de existência e se revela como o cenário perfeito para a apresentação de uma coleção tão especial. Esta colaboração também marca uma década de sucesso para ambas as marcas, fortalecendo a sinergia entre a Homem do Sapato e a David Lee”.
As coleções de David Lee são amplamente aclamadas por sua profunda inspiração na cultura litorânea, com peças que traduzem a vibrante energia do litoral. O Sneaker Lee é uma extensão desse DNA, incorporando cores vivas, estampas geométricas e materiais leves, que o tornam ideal para os dias quentes de verão.
Com uma edição limitada a apenas 30 unidades, o Sneaker Lee transforma-se em um item ainda mais almejado pelos aficionados. Aqueles interessados em adquirir este exclusivo modelo podem encontrá-lo nas duas lojas físicas da Homem do Sapato em Fortaleza, ressaltando a singularidade e a exclusividade que a parceria entre as marcas oferece ao mercado.
Para David Lee, a personalidade de quem veste sua grife é a de “uma pessoa moderna, contemporânea, que vive no ano em que está inserida. E uma pessoa também muito confiante, já que esta é uma roupa que traz muita cor, muita personalidade. E creio que é uma pessoa urbana”. Essa descrição espelha a própria essência de Lee, que se enxerga nos valores que propaga. A moda de David Lee fala com a “preocupação em sempre trazer a sua localidade, a sua referência de local para o contexto nacional.” Ele declara: “Como sou um designer que está no Nordeste, procuro trazer a nossa cultura para o centro, então acredito que esta prerrogativa também é a de quem consome a marca”.
Com uma elegante fusão de cearensidade e contemporaneidade, Lee não apenas cria moda, mas também narra histórias que ecoam em suas raízes. Na passarela, seu último fashion show foi dedicado à Cristina Maia, renomada crocheteria, refletindo a profunda ligação entre suas criações e as pessoas que o inspiram.
Falar do Nordeste é falar de nove estados de uma região rica em artesanias. As pessoas têm olhado mais para a gente a partir dessa visibilidade e é onde a gente tem ascendido. Eu me considero um pioneiro nesse lugar ,porque em 2017, quando eu começo a ascender nacionalmente, eu estava lá representando o Ceará, falando de artesanato, de cultura local, de tudo que é lindo e importante e que às vezes as pessoas não conhecem – David Lee
MERCADO
Num mercado cada vez mais competitivo, para David é justamente a autoralidade que pode servir de diferencial e muito mais. “Uma marca pode se destacar quando ela também entende que, para além da autoralidade, precisa ter outros mecanismos comerciais, produtos que vão ter uma competitividade de preço no lugar do mix de produtos, onde vai atender uma gama de clientes, desde o que tem um poder aquisitivo maior, como o que também consome a gente comprando um boné, uma camiseta, que geralmente são produtos nos quais a gente consegue ter um valor melhor e competitivo. O pensar autoral está mais ligado a um âmbito de pensar o produto para além do lugar de fazer mais do mesmo, de fazer sem preocupação, e está mais ligada à autoria. Então acredito que é pensar esse produto, essa marca, no lugar. Se for necessário para que se possa ter equipe, mix de produtos, apresentações, isso pode estar fazendo parte para que ela possa ser sustentável, primeiro financeiramente para depois a gente falar dos outros âmbitos”.
No vasto mosaico da moda autoral brasileira, a voz de David fala de autenticidade e pela celebração de uma identidade cultural ricamente diversa. Neste cenário, ele reflete a essência dessa busca: “Eu acredito que a característica mais latente na moda autoral hoje é a questão da cultura brasileira. Eu acho que para gente falar de Brasil, a gente precisa estar nele. Acho que a gente pode mixar isso, trazer uma efervescência nossa, mas o próprio país já é multicultural, como se fosse vários países dentro dele, então creio que a arte caminha muito bem nesse sentido e a nova geração, têm consciência disso. Acho que a gente tem parado de olhar mais para o Hemisfério Norte e tem se colocado no centro de referência”.
Esse discurso ressoa com a profundidade de quem entende que a verdadeira moda autoral é uma celebração das raízes e tradições locais. No Brasil, onde cada região é uma tela vibrante de cores, texturas e histórias, a moda se torna um veículo poderoso de expressão cultural. Essa nova geração de designers emerge com uma visão clara e consciente, valorizando o que é autêntico e local. É um movimento que vira os olhos do Norte global e redescobre a riqueza cultural que floresce em cada canto deste país-continente: “Quando a gente coloca essa cultura num lugar de centro, toda uma cadeia ganha, já que se mantém uma mão de obra local além da valorização do artesanato regional”.
Nesta reflexão, transparece a responsabilidade ambiental e social que acompanha a criação de moda no contexto contemporâneo. É um ato de resistência e renovação, onde o resíduo se transforma em recurso, e a tradição artesanal se renova com inovação. O uso de materiais como as pipas de kite recicladas e o crochê sem desperdício exemplifica um compromisso com a sustentabilidade, uma dança harmoniosa entre o antigo e o novo. Neste universo, a moda não é apenas estética; é uma narrativa, um eco das vozes que moldam a cultura local. É um convite para redescobrir o Brasil, não apenas como um ponto no mapa, mas como uma tapeçaria viva de histórias e significados. Os criadores que abraçam essa filosofia não estão apenas confeccionando roupas; estão tecendo a própria identidade nacional, um fio de cada vez, em uma trama de orgulho e inovação.
Assim como o horizonte de Fortaleza, onde o sol mergulha nas águas do Mucuripe, a trajetória de David Lee se funde com a essência do Nordeste. Ele nos convida a um passeio onde as raízes cearenses dançam com a modernidade, unindo a singularidade do artesanato com a ousadia urbana. Na sua coleção, cada peça é uma pipa colorida que corta o azul do céu, transformando ventos em voos de esperança e possibilidades. Sua obra transcende o tempo, tecendo sonhos que vestem o corpo e a alma, em uma celebração de autoconhecimento e identidade. Como um arauto da moda autoral brasileira, Lee se ergue como um farol, guiando-nos para um futuro onde o regional se funde com o global, onde a tradição se reinventa com a inovação, onde cada costura é uma declaração de amor à cultura e às pessoas que o inspiram. E assim, o designer traça seu legado: não apenas uma marca, mas uma ponte entre o que somos e o que ainda podemos ser, uma obra que, como a linha do horizonte, se estende ao infinito, sempre aberta a novas interpretações e destinos.
O DFB Festival 2024 é apresentado pelo Governo do Estado do Ceará, por meio da Secretaria da Cultura. Com apoio cultural da ENEL, realização da Associação Artesanias do Ceará e Empório Lokar. Apoio institucional da Secretaria de Turismo do Estado do Ceará e Secretaria de Cultura do Estado do Ceará (Secult-CE), nos termos da Lei 13.811, de 16 de agosto de 2006.
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