Reforçando a simbiose entre arte e design, a noite desta terça-feira foi de badalo artsy e conceitual com o start do Design Weekend 2015, o maior festival urbano de arte e design de toda a América Latina, que promete agitar a capital paulistana até o dia 16. E que melhor maneira de celebrar um evento como este do que com um desfile promovido pela Dell Anno em parceria com a Casa de Criadores – que foi representada pelos estilistas Isaac Silva, Rober Dognani e Jadson Raniere – + Coletivo Sipá, o grupo Divinadança e a banda Stop Play Moon inspirado na rainha do cangaço Maria Bonita (1911-1938) – companheira de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião (1898-1938) -, que também tinha alma de estilista ao confeccionar suas próprias roupas no sertão nordestino. O cenário escolhido para a montagem de uma passarela foi o Jockey Club de São Paulo, onde música, performance, moda e uma síntese das artes foram brindadas pelos convidados. O caráter autoral e artístico das peças é tão grande, que elas já estão à mostra na Dell Anno Atelier, na Avenida República do Líbano, através da exposição “Casas de Maria”, com cenografia que remete ao sertão nordestino, assinada pelo Coletivo Sipá.
Como comentamos aqui, o texto de apresentação do projeto afirma: “Maria Bonita, musa dos cordéis, do cangaço e heroína nacional, representou a ruptura da condição submissa da mulher da época, e, cercada de histórias e lendas, continua a inspirar homenagens e se confundir com a figura da mulher moderna. Movida por seu amor por Lampião, Maria vivia o presente, lutando de um lugar a outro, sem tempo de construir uma casa ou seus pertences. Sua residência era sua paixão por Lampião e sua vontade por um mundo mais justo no sertão”. O diretor de marketing, pesquisa e desenvolvimento da Dell Anno, Edson Busin, que esteve ontem no evento, sempre frisou que a marca de móveis planejados imprimiu uma chancela de arquitetura de interiores, moda e lifestyle. “Nossa estratégia se baseia na união dos universos e traduz o estilo de vestir para o luxo de viver”, comenta.
Momentos antes de a apresentação começar, o backstage do Jockey Clube fervia de modelos e dançarinos, como você pode conferir pelos cliques abaixo:
O espetáculo teve início com a performance do grupo Divinadança, no qual todos os integrantes chegaram devidamente caracterizados como cangaceiros, com direito a cinturões de couro e botas de cano alto. Os passos de dança elaborados retratavam as danças típicas no sertão nordestino em uma mistura com a arte de interpretar os gestos dos cangaceiros em ação no sertão nordestino. Logo em seguida, os dançarinos interagiram com as próprias modelos na passarela. Na trilha sonora, a banda Stop Play Moon, com Geanine Marques, a musa de Alexandre Herchcovitch à frente dos vocais.
Pelas mãos dos estilistas Jadson Raniere, Rober Dognani e Isaac Silva, que integram Casa de Criadores, poderosa incubadora de novos talentos na moda pilotada por André Hidalgo, uma interpretação da Maria Bonita pós-moderna, As peças traziam um ar contemporâneo e romântico, flertando com várias referências da cultura nordestina. O cinturão de cangaceiro, por exemplo, aparecia com flores nos lugares onde as balas são carregadas, enquanto as bolsas vinham com franjas ou detalhes de costura nas bordas. Saias midi douradas e blusas com as barras amarradas, deixando parte do abdômen de fora, se alternavam com shorts e vestidos românticos de estampas florais. A síntese da Maria Bonita pós-moderna.
Maria Bonita, a cangaceira pioneira no sertão, primeira mulher a entrar para o grupo dos justiceiros, era nômade, acompanhava Lampião pelos mais diversos lugares, e autodidata. Ela costurava as próprias roupas. E em pleno 2015, seu estilo de vestir e viver ganhou uma releitura quase literal, mas urbana e extremamente contemporânea em um look completamente púrpura, composto por bermuda estilizada com legging por baixo, cinto, blusa transparente de gola alta, e as bolsas de franjas combinando com o chapéu e o cinturão em volta do peito.
Os tons terrosos ganharam a passarela através de calças de alfaiataria, saias fluidas e casacos com texturas. Houve espaço também para a desconstrução fashion, evidenciada melhor por bermudas rasgadas e um look repleto de bolsos e zíperes pelos braços e torso, que mais tarde apareceram na forma de pochetes em volta da cintura, combinadas com sandálias rasteiras de couro. Os adornos de flores na cabeça, posteriormente, deram lugar a chifres, que tomaram um ar mais literal no look final, com a caveira de uma cabeça de boi fixada na frente de um vestido de couro.
Os três estilistas foram perfeitos na síntese do artesanato de luxo, nosso cartão de visita na moda internacional, na valorização do handmade.
Com exclusividade ao site HT, Jadson Raniere comentou um pouco sobre o conceito de suas peças e como foi se inspirar em Maria Bonita, uma figura tão central para a história e cultura nacionais: “Pensei um pouco e tive que ser bem rápido, porque não tivemos muito tempo para confeccionar as peças. Conseguimos visualizar a mulher, companheira de Lampião, sempre pronta para as batalhas, mas quis lembrar que, antes de qualquer coisa, Maria Bonita não era só guerrilheira, era uma mulher forte, sonhadora e muito apaixonada, tanto que deu a única filha com Lampião para a sua mãe criar, assim poderia seguir em batalha com seu grande amor. Dentro deste contexto, queria fazer os looks pensando nessa mulher, que era sonhadora e uma “apaixonada roxa” pelo Lampião. Sendo assim, escolhi cores como o roxo que, para mim, é a cor da paixão. , além de ser sexy e combinar com qualquer outra cor. Adicionei o cinza e o preto para deixar a figura de Maria mais altiva e contemporânea, assim como a cintura marcada. Ela também usava muitas saias, o que a deixava com um ar mais feminino e sexy. Essas saias apareciam por cima ou por baixo da blusa de mangas princesa em shantung, com um toque de seda e brim com fios de lurex. Usei um pouco de transparências em tecidos de tule e muitas aplicações de metal para dar o acabamento nos looks, sempre carregados de muitos acessórios”.
Já Rober Dognani também nos contou com exclusividade: “Quis representar a força e a beleza da mulher nordestina, festejar seu modo de ser, sua cultura e seu jeito todo especial, representados pela figura emblemática de Maria Bonita! Oss materiais que usei foram couro – recortado, desconstruído e às vezes misturado com patchwork de pochetes – em vestidos, maxi-coletes, e saias usadas com t-shirts, que vinham estampadas com a frase “heads will roll” (“cabeças irão rolar”, em tradução livre). A cor predominante foi o caramelo, lembrando a caatinga, o calor e as vestes do cangaço”, explicou.
Em bate-papo com Isaac Silva, ele comentou sobreos detalhes da coleção criada para o desfile: “Fiz oito looks baseados em uma Maria Bonita que usa couro ecológico, paetês, linho, guiper de algodão e camiseta estampada com arte da homenageada. Prezei por uma cartela de cores focada em tons terrosos, que lembram o chão do sertão, e o dourado predominante faz alusão à luz solar constante do nordeste. Pensei em uma roupa comercial, usável e jovem, que já chega pronta para sair das passarelas e alcançar as mulheres dos dias de hoje, que usam sua força feminina para o dia a dia. Nisso, Maria Bonita, a Rainha do Sertão, é um exemplo. Enxergo nela a primeira-dama a inspirar muitas mulheres pelo Brasil e pelo mundo”.
A empolgação de ver tamanha homenagem à figura de Maria Bonita, feita por um time tão competente e singular como o citado acima, foi tanta, que reuniu a nata das artes paulistana no Jockey Clube, a qual aplaudiu de pé o desfile apoiado pela Dell Anno. Veja abaixo quem passou por lá:
As peças desfiladas já estão à mostra na Dell Anno Atelier, na Avenida República do Líbano, através da exposição “Casas de Maria”. Além dos looks criados por Jadson Raniere, Isaac Silva e Rober Dognani, o espaço também conta com cenografia assinada pelo coletivo Sipá, que reproduziu as casas do sertão nordestino em um trabalho exímio de ambientação e diálogo com as roupas, com direito a cactos e tudo, expandindo o universo de Maria Bonita. Veja, em primeira mão, foto da exposição:
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