*Com Marcos Eduardo Altoé
Foi dada a largada! O primeiro dia de SPFWN43 começou cedo, com dois desfiles externos na cidade de São Paulo. Pela manhã, Animale apresentou sua coleção assinada por Vitorino Campos na loja da Oscar Freire, enquanto Raquel Davidowicz preparou uma apresentação artsy na Pinacoteca. Já na Bienal, foi a vez de João Pimenta desfilar sua alfaiataria masculina, seguido pelo prêt-à-porter ultrafeminino de Lilly Sarti. A Osklen fechou com chave de ouro a segunda-feira ao levar Selton Mello e Seu Jorge para a Fila A de seu desfile. Continue lendo para saber tintim por tintim o que rolou!
ANIMALE
Sob as mãos do baiano Vitorino Campos, novo grande nome da moda brasileira, a Animale abre a 43º edição do São Paulo Fashion Week com um desfile “see now, buy now” no segunda andar de sua flagship na Oscar Freire. E, como não poderia deixar de ser, os 34 looks desfilados carregaram toda a identidade forte da marca carioca traduzida para o inverno 2017 por meio da assinatura forte do estilista. Um show para aplaudir de pé, seja pelo conceito forte e bem amarrado, seja pela visão nada óbvia do tema escolhido, a Itália.
Vitorino, assim, propôs uma viagem pela arquitetura e pelo design italianos, ignorando os clichês que comumente reservamos ao país em forma de bota – gastronomia colorida e turismo pelas ruínas. Não. Ele buscou inspiração no trabalho de dois arquitetos nativos, Carlo Scarpa e Ettore Sotssas, para amarrar a construção das peças cosmopolitas da coleção. “Busquei enxergar por traz dos clichês italianos para vestir uma nova mulher, empoderada e segura de si”, comenta.
No roteiro, cinco destinos famosos, os quais ilustram características da coleção. Roma, para a escolha primorosa de tecidos, com matérias-primas como seda, tweed, couro e renda; Milão, para a estampa de cobra, um dos símbolos da cidade, eleita para acessórios e peças irreverentes; Florença, para a alfaiataria precisa de recortes clássicos; Costa Amalfitana, para a cartela de cores que traz tons de rosa, chumbo, vinho, amarelo, preto e branco; e Veneza, para a riqueza em detalhes, traço da cultura italiana.
Um perfume punk se fez presente, em peças-desejo de modelagem perfecto, como vestidos, coletes e uma jaqueta, que de alguma forma uniram atitude à feminilidade. As botas foram uma aposta certeira da Animale, apresentando couro com textura de cobra em cores irreverentes, como azul, amarelo e rosa. A lingerie à mostra provou que a sensualidade pode sim ser contestatória, ainda mais neste momento de luta pelos direitos das mulheres.
Beleza
A leveza e uma apresentação mais fresh ditaram a beleza do desfile da Animale. Assinada por Henrique Martins, a maquiagem tinha como principal objetivo corrigir apenas pequenas imperfeições. O profissional, em entrevista, destaca que a missão era tratar, e não corrigir, a pele das modelos. Sendo assim, a Animale combinou a sua coleção três tipos de produções: total nude, sem qualquer ponto de cor ou luz, com a pálpebra preta, feita com sombra em bastão cremosa, e dourada, com brilhos nos olhos.
A leveza e simplicidade também ditaram os cabelos das modelos. Para esta estação, a Animale seguiu a proposta de realçar o natural e apostou em fios leves e produção que valorizasse a textura das madeixas.
UMA POR RAQUEL DAVIDOWICZ
Pela primeira vez uma marca de moda ocupou a Pinacoteca de São Paulo para apresentar sua coleção. Nesse sentido, ninguém melhor do que Raquel Davidowicz e sua UMA para ocuparem o posto. Em um flerte irresistível, a estilista trouxe sua assinatura forte minimalista para um inverno preto, branco e vermelho intenso. A construção primorosa das peças elevou o jogo já na manhã desta segunda-feira, primeiro dia de SPFWN43. “Eu adoro arte. Sempre adorei. Acho que é a maior fonte de inspiração que nós podemos ter”, declara. “Eu quis trazer a coleção para um lugar que tem respiro, onde as pessoas possam ter aquele momento de tranquilidade, de entrar em contato com essa energia boa que a Pinacoteca tem”.
Além do corte, uma boa alfaiataria é feita de tecidos, como os eleitos pela estilista. Tafetá, tricô de lã virgem, crepes de seda e acetato, tricoline de algodão e tule bordado, para citar alguns. Eles foram responsáveis por traduzirem os desejos de Raquel em silhuetas alongadas, de perfume esportivo sofisticado. Peças de grande volumetria casaram perfeitamente com a fluidez dos tecidos mais leves.
O destaque, sem dúvida, vai para as peças. Jaquetas acolchoadas e casacos em pele artificial evidenciaram a proposta sporty-chic, enquanto saias bem longas em tafetá ou malha criaram um clima feminino. As calças trouxeram o gancho mais longo, enquanto os vestidos receberam drapeados. Para o frio, coletes e pelerines.
Nos acessórios, botas em couro com solado reforçado por borracha, de inspiração militar, o tem-que-ter da coleção. Ankle boots desfilaram ao lado de meias bordadas. Enfim, uma coleção completa para mulheres contemporâneas, criada por uma mulher que elevou moda ao status de arte.
JOÃO PIMENTA
João Pimenta não decepciona e celebra a rica herança deixada pela arquitetura gótica em sua coleção “see now, buy now” de inverno 2017, com peças práticas e viáveis, que em nada deixam a desejar. “Buscava um recorte que alongasse a silhueta. Nos estudos de modelagem chegamos na arquitetura gótica, que vem remover os arredondados das construções para transformá-las em estruturas elevadas, mais altas”, explica. E são os arcos “quebrados” deste movimento arquitetônico os responsáveis pelo efeito tão desejado pelo estilista, presentes em grande parte da coleção, que foi acompanhada na primeira fila pelo prefeito de São Paulo, João Dória.
Ainda sob influencia daquela estética, o trabalho de João Pimenta prestou tamanha atenção aos detalhes que elevou o interior das peças ao protagonismo. Os bolsos das calças de silhueta largada e dos paletós ajustados foram costurados em sua parte externa, em uma aposta avant garde que trouxe novo fôlego à alfaiataria.
Como de costume, o casting com meninos andrógenos de atitude punk carregou perfeitamente a coleção, entre casacos, saias e calças cropped de inspiração militar, emprestando sua juventude a uma das melhores passarelas masculinas do SPFWN43. No backstage, o beauty stylist Luiz Mufato, do Retrô Hiar, que assinou a beleza do desfile e acompanha o trabalho de João Pimenta há algumas coleções, destacou essa característica do estilista. O João sempre tem uma pegada diferente. Ele nunca gosta de trazer um casting muito padrão. Por isso, nos desfiles, ele aposta em uma mescla, que vai de meninos bem exóticos aos andrógenos”, disse Luiz.
Nos pés, a turma usou sapatos classic brogue pretos, fruto de uma parceria da label com a Melissa. As peças da coleção estarão disponíveis na loja do estilista a partir de abril.
Beleza
Para potencializar a vibe exótica e um tanto andrógena do casting de João Pimenta, como Luiz Mufato apontou, o hair stylist, que assina a beleza do desfile, aposta nos traços naturais dos modelos. Para isso, a maquiagem traz somente a intenção de corrigir pequenas imperfeições. “Para o João, é preferível aparecer alguns detalhes da pele a muita quantidade de produto”, acrescentou Luiz Mufato.
Já quando o assunto são as madeixas, a equipe do Retrô Hair dividiu os modelos em três grupos: cabelos curtos, cacheados e longos. Para cada um deles, Luiz Mufato criou um visual para dialogar com o conceito arquitetônico do estilista. “Em relação ao cabelo, nós aproveitamos a textura de cada um. Os que tinham os fios mais enrolado, nós valorizamos os cachos. Quem tinha cabelo curto, puxamos a lateral com risca para destacar o rosto. Já as madeixas longas foram as mais elaboradas, que possuem tranças e penteados que remetem aos homens vikings”, explica.
LILLY SARTI
Para este SPFWN43, Renata e Lilly Sarti buscaram mais do que uma coleção “see now, buy now”. As irmãs mergulharam fundo no momento atual em que vivemos e saíram em defesa das mudanças. Uma reflexão traduzida em moda fácil, “que as mulheres podem usar de verdade” como ressalta Lilly. “O momento é de mudança, seja pela qual o Brasil está passando, seja pela própria qual passa o formato da semana de moda. Seja pela nossa mudança, como nós seres humanos encaramos as nossas mudanças. Comecei a reparar em como as pessoas eram resistentes às mudanças; elas são boas para todos”, completa. A estilista vai mais além, e se mostra animada. “Mudanças envolvem a sabedoria do momento presente, para encararmos o novo de forma positiva. É como ver o copo meio cheio”.
Pois bem. O mix repleto de peças-desejo apontou, então, para shapes orgânicos, propondo uma releitura dramática do inverno em peças ultrafemininas. O mood, que (quase) nos remeteu à genialidade de um Christian Lacroix na década de 1980, era todo sobre a silhueta. Mangas bufantes e babados estratégicos equilibraram recortes e decotes, enquanto a cintura marcada e as golas expressivas denunciaram um flerte com a estética gótica vitoriana. Claro, tudo bem fácil, como pede a cartilha do desfila-vende.
Entre os materiais eleitos, o couro imprimiu um tom sofisticado a grande parte da coleção. Crepes e brocados completam as escolhas da grife. Na cartela de cores, os terrosos convivem em plena harmonia com os vinhos e os rosados, para remeter aos tons da natureza. Em contrapartida, o preto foi visto e revisto em bons momentos.
Ponto forte da apresentação, os acessórios foram inspirados na arte cinética do artista plástico norte-americano Alexander Calder. Seus móbiles serviram de base para as criações da marca. “Nos inspiramos na história dele para confeccionar os acessórios, já que nossa inspiração também envolve o movimento”.
Beleza
Quem também privilegiou em destacar a beleza natural das modelos neste primeiro dia de SPFWN43 foi a grife Lilly Sarty. No backstage da apresentação, Fabiana Gomes, conta que a vermelhidão dos lábios das meninas eram apenas um ponto de informação que trazia vivacidade à produção. “A coleção tem uma atmosfera oriental e eu quis trazer isso para a maquiagem. Então, na beleza, eu pensei em uma gueixa pós-moderna com um pouco de informação no centro dos lábios, que se expandindo para as laterais. A proposta é que seja tudo muito natural e que nenhuma das manobras de maquiagem ficassem explicitas”, detalha Fabiana.
Para completar o visual, Celso Kamura foi quem assinou a produção dos cabelos do casting. Para atingir o efeito mais volumoso, sem deixar a naturalidade dos fios de lado, o hair stylist apostou em um segredo de beleza orgânico e natural. Literalmente. “Nós aplicamos spray de água do mar por dentro dos cabelos para que a gente conseguisse um efeito volumoso que não tivesse o brilho da cera, por exemplo”, disse Kamura que explicou a técnica adotada. “A água do mar consegue dar volume no cabelo de forma mais natural, sem precisar desfiar ou fazer qualquer tipo de exercício. Assim, a gente consegue ter um resultado por mais tempo e mais simples”, conta Celso Kamura que garantiu que a técnica não agride os fios.
OSKLEN
A moda do fim do mundo. É assim como podemos resumir a coleção de inverno 2017 apresentada pela Osklen. Em um riquíssimo streetwear utilitário, digno de uma aventura extrema, Oskar Metsavaht provou mais uma vez o porquê de sua marca ser tão desejada mundo afora. E para esta temporada o desafio foi mais além, já que tudo começou durante as filmagens do longa Soundtrack, projeto que, de tão intenso, inspirou Oskar a criar sua nova coleção “see now, buy now”. Pois o clima inóspito do filme estrelado por Selton Mello e Seu Jorge foi traduzido pelas mão habilidosas da equipe de estilo em cores, formas e texturas, elevando o jogo deste primeiro dia de SPFWn43. “Enquanto o Selton interpreta como ator o personagem, eu o faço artisticamente. Esse protagonista tem uma crise existencial e se encontra em um lugar inóspito, como se fosse uma grande tela branca. Então, foi uma combinação e uma experiência excelentes”, comenta Oskar.
O contraste imperou na cartela de cores eleita. O estilista revela que elas variam entre tons pastel, azul e rosa claros, muito presentes no filme, e vêm do amanhecer da Islândia. “Essa parte da paleta se decompõe no restante da coleção em tons mais neutros, sendo destacadas em pontos fortes, os quais azul royal, laranja e vermelho, uma referência aos equipamentos que as pessoas levam para o alto da montanha”, explica.
Hit da marca, o vestido paraquedas foi visto em uma profusão deliciosa de cores e propostas – o layering deu conta de sobreposições ousadas e muito necessárias, quebrando a delicadeza da silhueta de algumas peças. Outra it-peça vista a todo momento é a parka, construída a partir de golas dramáticas e fendas traseiras, conhecidas como “fishtail”, ou rabo de peixe. Uma alfaiataria engenhosa trouxe um forte perfume japonês em um flerte velado com novos materiais, algo que a Osklen faz muito bem. Metsavaht comentou ainda sobre o novo shape cosmopolita proposto para os casacos da marca. ”O que é muito interessante nesta coleção é a desconstrução dos casacos de neve. Para a estação, nós trazemos essa ideia combinada a alguns itens da moda urbana”.
Esses, inclusive, levantados como bandeira oficial da marca pela os chamados e-fabrics, desenvolvidos especialmente para a coleção, os quais o Tricô de alpaca, sinônimo de conforto e alta qualidade; o moletom pet, totalmente reciclado; o tyvek, “tecido do futuro” empapelado composto de polietileno; e o “bio-lether” do pirarucu, pele do peixe que seria descartada, gerando poluição. Este couro, inclusive, presente há 3 coleções, deu vida a acessórios incríveis, como bolsas e mochilas, que arrancaram suspiros da platéia no desfile. “É um novo couro, ainda sustentável. Então acredito que por muito tempo ainda teremos esse material nas nossas coleções”.
Sem dúvida, o futuro para Oskar Metsavaht está logo ali. Seja por seu design de vanguarda, altamente desejável, seja pela sua escolha de processos ecológicos de sustentáveis. Temos aqui uma moda que, sim, vale a pena!
Beleza
O frio da Islândia também esteve presente e ditou a beleza do desfile da Osklen. Na passarela, a produção assinada por Amanda Schün traz bochechas rosadas como se tivessem sido congeladas pela baixa temperatura. O ar de vermelhidão, com aspecto de frio, também esteva presente na raiz dos cílios. Sem rímel, os olhos ainda tinham blush avermelhado que completava a proposta das bochechas. No entanto, esse era o único detalhe mais forte da produção. Para este desfile, assim como acontece frequentemente na história da Osklen, a naturalidade dos modelos é a principal informação de beleza.
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