Primeira coleção de moda praia da marca Íyá Íyá Teresa foi inspirada no norte da África: “Quero realmente ser uma referência”


A grife foi criada há um ano, a partir da vontade de Aline Andrade de fortalecer o empreendedorismo afro. Sendo assim, todas as quatro coleções feitas até o momento possuem alguma relação com o universo africano. A jovem é a estilista, pesquisadora e modelo da marca que leva no título o nome de sua avó já falecida

Após a comemoração do um ano de existência da marca Íyá Íyá Teresa, a estilista Aline Andrade criou a primeira coleção de moda praia da grife. Intitulada Sabor, as peças foram inspiradas em uma pesquisa feita pela própria dona sobre a culinária do norte da África, em especial nos países Marrocos e Egito, visando os sabores e aromas. “Eu já tinha falado sobre alguns países, como a Nigéria, mas desta vez quis pegar outra região. Por isso, resolvi usar dois locais que as pessoas pouco associam com a África. Uso a relação entre o Brasil e estes países”, explicou a estilista. O resultado foi a valorização de cores quentes, como laranja e amarelo, em modelos exclusivos de maiôs, biquínis e sungas. E tudo isto sem nunca ter colocado o pé em qualquer parte do continente africano. “A pesquisa foi inteiramente feita a partir daqui. O que facilitou isto foi o fato de eu ser de uma religião de matriz africana onde a culinária, por exemplo, é muito importante. Conheci também refugiados que abriram restaurantes aqui”, informou.

Aline Andrade, além de estilista, fez a pesquisa por trás da coleção, foi atrás de material para a confecção e ainda é a modelo (Foto: DIvulgação)

A grife já havia produzido outras três coleções durante o curto tempo de vida no mercado. Tanto a Urban Afro quanto o Sagrado e As Negras no Partido Alto visavam exaltar a sensibilidade e a originalidade da cultura africana. A marca, portanto, carrega em seu DNA a tentativa de afirmação de brasileiros afrodescendentes, com o objetivo de fortalecer o empreendedorismo. “Os afrodescendentes estão muito preocupados em ter alguma representatividade. Temos um histórico de não conseguir ter uma estabilidade no comércio por conta de tudo o que aconteceu no passado. Além disso, a minha marca nasceu no ápice da crise política e financeira. Com estas duas dificuldades, estou mostrando que o caminho não é fácil, mas é possível”, afirmou.

A ideia é afirmar o papel no negro na sociedade e provar que é possível ser bem sucedido no mercado (Foto: DIvulgação)

Ao criar a Íyá Íyá Teresa, Aline mostrou também que é viável empreender em tempos de crise. Quando iniciou o projeto para a criação da marca, no meio de 2016, o Brasil tinha acabado de passar pelo impeachment da presidente Dilma e sofrer com a instabilidade econômica. “Eu via que as pessoas estavam com muito medo de consumir, por não saber como vai ser o próximo mês ou ano. Para reverter isto, fiz todas as roupas sob medida, não existe um estoque. Isto é bom porque posso fazer peças exclusivas e o material não sobra”, contou. Os tecidos, inclusive, são importados do Senegal e da Angola, afirmando as origens da marca. “A moda praia já é outra história. Pesquisei, fiz as estampas e encontrei um local que faz peças de pouca quantidade”, explicou. Apesar de existir um site, a maior parte das vendas é feita pelas redes sociais já que é mais difícil manter um e-commerce com produtos sob medida. Neste caso, o contato entre a estilista e os clientes é mais favorável.

Cada coleção que produziu, a estilista visava valorizar não apenas o continente, mas a cultura de cada país. As pessoas costumam tratar a África como se fosse um país quando, na verdade, o local é recheado de diferenças. “É um continente muito diverso com vários tipos de histórias e vivências. A base de tudo, para mim, é a pesquisa, só assim consigo trazer as referências que quero. O mais importante é saber respeitar o país que estamos falando”, explicou. Inclusive, a profissional terminou a faculdade em 2015 e, na época, escreveu um TCC sobre como cada local lida com a morte. Ao trazer vários posicionamentos, ela pode afirmar a diversidade.

Aline Andrade colocou o nome de sua avó como título da marca e, ainda, utilizou palavras em uma língua africana (Foto: DIvulgação)

Aline Andrade, de 28 anos, leva a sério o assunto de afirmação do negro na sociedade. Não é à toa que ela faz a pesquisa, busca o material para confecção e, além disso, é a estilista e a modelo da marca. “Quero realmente ser uma referência. Além de ser a modelo e a cara da marca, estou envolvida em todos os processos”, sugeriu.  Tudo isso para provar que é possível uma afrodescendente fazer de tudo um pouco e ser bem sucedida.

Esta necessidade não visa apenas o bem comum, na verdade, existe uma motivação pessoal muito forte. “Conheci um angolano e ele me disse que a diferença entre o negro brasileiro para o africano é que não tem nenhuma referência de si próprio, mas sempre está buscando saber. Isto é muito verdade porque não sabemos de qual região viemos ou qual o nosso verdadeiro sobrenome”, afirmou. Sendo assim, ela pretende também ter mais contato com a sua ancestralidade e buscar um passado que foi apagado. Felizmente, a estilista encontrou meios de estabelecer uma conexão com a origem de sua família através da religião. “Minha avó tinha uma conexão muito forte com o Candomblé e absorvi isto ainda muito nova. E esta religião se torna um estilo de vida, porque tem forma de rezar, de comer e de falar. Dessa forma, a crença acaba sendo uma alusão, para mim, de como seria a vida no continente africano”, contou.

Todas as peças são feitas com lycra e estão nos tamanho P, M e G (Foto: DIvulgação)

Além de apresentar a estilista para as religiões de matriz africana, a avó também foi uma grande fonte de inspiração para Aline seguir em frente com o projeto de ter a sua própria marca. Não é por acaso que o nome da grife Ìyá Ìyá Teresa significa, em yorubá, vó Teresa. A matriarca da família já faleceu há alguns anos, no entanto, a neta batizou a empresa com o nome da mais velha para refletir logo de cara quais os ideais da grife. Segundo a profissional, Teresa era uma mulher forte e determinada, princípios que gostaria que a marca possuísse. “Sabe aquele tipo de pessoa que, mesmo depois de tantos anos de partida, ainda parece que está viva? Ela deixou muitos ensinamentos e referências. Ela é muito presente”, garantiu.