Com mais de 50 anos de carreira, Carlos Vergara ainda tem energia de principiante. Prova disso é a exposição inaugurada ontem (26), na Mais Um Galeria, em Ipanema, apenas com trabalhos inéditos. Durante o evento, amigos, parentes, colecionadores e fãs da obra de Vergara fizeram questão de passar por lá para prestigiar o artista. A mostra com curadoria de Fernando Cocchiarale reúne uma nova série de trabalhos em asfalto e resina sobre MDF, batizada como “Tatuagens”, além de aquarelas e múltiplos em 3D, inspirados nos manguezais da Barra, sobre a qual a gente bateu um papo bem exclusivo com o artista (Para ler, só clicar aqui)
“É muito legal fazer exposição de obras inéditas. Estou sempre trabalhando e a ideia do novo. Não trabalho com o que eu já fiz, mas com o que eu não sei. O que eu sei, eu já fiz, o que não sei, vou fazer. Esse é meu motor de trabalho. Quando aparece assunto novo, vou atrás. Permaneço curioso, porque isso é inerente do trabalho de arte. Há uma diferença do trabalho de arte para o artesanato – que é exercício de melhorar habilidade. A arte não, ela tem artesanato, porque usamos as mãos, mas é mais intelectual”, explicou ele.
A mostra exibe trabalhos feitos com asfalto sobre MDF recortado, realizados a partir de desenhos despretensiosos realizados dos anos 1970 aos dias de hoje. “Quando eu fiz as primeiras criações e pendurei na parede, concluí que pareciam tatuagens. Eram desenhos que estavam em um canto, despretensiosos, que eu resolvi dar um ar pretensioso. Resolvi aumentar para o campo do discurso. Fiquei vendo coisas que eu tinha em cantos de página, pedaços de papel. Todo artista faz essas anotações, e resolvi tornar isso algo mais expressivo. Escolhi um material legal, é asfalto sobre MDF de recorte feito eletronicamente. Fica entre o pastoso e o sólido, algo que está se fazendo ou derretendo”, explicou.
Levar arte de forma gratuita e democrática para quem estiver passando pela calçada é algo que agrada Carlos Vergara. “É na Rua Garcia D’Ávila, passa muita gente e tem um sinal de trânsito bem perto. Então, a obra chegará a muita gente. É uma galeria aberta ao público. A partir da curiosidade, a pessoa pode voltar para ver. Talvez seja, sim, um dos caminhos para que mais gente se interesse pela arte, mas não tem preocupação de ser um marketing público. Tem um aspecto generoso de abrir para fora em uma área de grande circulação. O legal de uma galeria de arte é que pode entrar quem quer comprar e quem quer só apreciar. Não tem nenhum vendedor, como em lojas, com a pergunta: ‘Precisa de alguma ajuda?’, que é uma forma de cercar o comprador”, ressaltou. Até porque a questão principal do trabalho de Carlos Vergara não é essa. “Fazer arte não é emprego, não é para ganhar dinheiro. Arte é vocação, é uma forma de intervir na realidade, uma necessidade existencial, não é uma profissão. A pessoa faz arte porque precisa, porque é uma forma de se expressar no mundo e conversar em outra linguagem com seus semelhantes. Não é uma fabricação de produtos para o mercado”, disse ele, que faz questão de destacar: “Meu trabalho é feito para o olho e para a cabeça. Eu costumo dizer que trabalho em dois movimentos: às vezes para incendiar o cérebro e, às vezes, para acalmar o coração. As duas opções têm seu lado”, disse.
Além das tatuagens, quem passar pela exposição que fica até o dia 30 de abril na galeria Mais Um poderá conferir parte do trabalho de Carlos Vergara realizado nos manguezais da Barra de Tijuca. “Eu estive nos manguezais, fotografei muito e incorporei aos trabalhos como pretexto. Produzi aquarelas, pinturas, 3D, fotografias. São registros de uma área escondida do Rio de Janeiro. Se você for lá, só encontra comigo ou com o (Mário) Moscatelli, que é o grande defensor dos manguezais. É um lugar escondido da cidade, maravilhoso, que as pessoas não têm ideia. A Lagoa de Marapendi eu percorri de barca e são mais de cinco horas. Não é pequeno, é imenso, com jacarés, capivaras, pássaros inacreditáveis, pescadores em situações muito interessantes. Tem uma atmosfera fora do tempo. Lá não é hoje, lá é sempre”, declarou. Poesia, não? “Eu tento exercitar a capacidade que o homem tem de ver as partes sutis de tudo. Todo homem é ou pode ser um poeta. O Carlos Drummond de Andrade dizia uma frase que eu amo: ‘Fazer uma poesia com 13, 14 anos é fácil, com 50 que é difícil’”, ressaltou.
Serviço:
“Carlos Vergara — Inéditos”
Local: Mais Um Galeria de Arte — Rua Garcia D’ Ávila 196, Ipanema (3085-3000).
Data: Seg. a sex, das 10h às 19h; sáb., das 10h às 17h. De 27/4 a 30/6.
Preço: Grátis.
Classificação: Livre.
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