Tânia Alves, atriz da primeira versão de Pantanal: ‘Nunca aceitei abuso de poder e nem pedi trabalho. Medo de assédio’


São 50 anos de uma vitoriosa carreira e está no ar na reprise de ‘O clone’. Atriz, cantora e empresária revela a postura com a qual conduziu sua trajetória. Aos 72 anos, pleníssima e no quinto casamento, retorna à TV em seu primeiro trabalho na Netflix, a série ‘Olhar Indiscreto’; integra o elenco do longa-metragem Senhoritas, de Mikaela Plotkin, e está daptando o livro Criogenia de D. ou Manifesto pelos Prazeres Perdidos, de Leonardo Valente. Tânia lembra o preconceito que venceu na vida: “Uma vez fui tirada de um programa humorístico. Ouvi dizer da direção que eu estava aquém do padrão de beleza da TV Globo. Dois anos depois, eu era a Maria Bonita, ganhamos vários prêmios internacionais e foi uma mudança na minha vida. Veja como a vida dá voltas”

Aos 50 anos de careira, Tânia Alves está com projetos na TV, no cinema e na música (Foto: Felipe Panfili)

Aos 50 anos de careira, Tânia Alves está com projetos na TV, no cinema e na música (Foto: Felipe Panfili)

* Por Carlos Lima Costa

Tânia Alves, que está no ar, na reprise da novela O Clone, na Globo, vive fase de celebração profissional. São 50 anos de uma vitoriosa carreira iniciada no teatro, e com destaques na TV, como o especial Morte e Vida Severina, a minissérie Lampião e Maria Bonita, onde protagonizou junto com Nelson Xavier (1941-2017), e novelas como Pantanal (que ganha remake agora, na Globo), Pedra Sobre Pedra e Tocaia Grande. “Sempre estive em projetos pelos quais eu me apaixonava, acho que só tive duas experiências desagradáveis. Talvez tenha feito escolhas equivocadas, mas não me arrependi. No momento é o que me parecia ser mais correto. Nunca fiz nada que me envergonhasse”, analisa ela, que desde o início dessa trajetória, a conduziu de maneira firme para evitar o assédio. “Eu nunca lidei bem com autoridades, com abuso de poder e sempre tive muito medo de assédio quando comecei. Esse foi um dos motivos pelos quais eu nunca pedi trabalho, porque morria de medo que me assediassem. Então, quando me relacionava com os poderosos, usava o meu lado mais masculino para poder evitar esse tipo de situação que eu não saberia como lidar. Graças a Deus, os trabalhos foram acontecendo, tive muita sorte”, enfatiza.

E a atriz está repleta de novidades para os fãs. Ela acabou de passar dois meses, em Pernambuco, no set do longa-metragem Senhoritas, de Mikaela Plotkin, protagonizado por Analu Prestes. “É um filme delicado, poético e, ao mesmo tempo poderoso, sobre qualidade de vida de mulheres idosas, setentonas. Ela é uma mulher que tem marido, filha, genro, netinha. Aí recebe a visita da melhor amiga de infância, Luci, minha personagem, diplomata aposentada, uma explosão de vitalidade, liberdade, alegria, que começa a dar injeção de vida à amiga que já está com um casamento morno. Ela a leva para boate, a um sex shop, aula de zumba. Quer dizer, chega como um furação dando balançada na rotina, incrementando a qualidade de vida, a energia vital, desperta o gosto pelo prazer de viver e de uma relação a dois”, conta.

Questionada que ao descrever a personagem, ela parece falar de si própria, Tânia reconhece ser verdade. “Essa sacudida na vida de uma pessoa, dela resgatar o prazer de viver, a vitalidade, a saúde física, mental e emocional, auto estima, é o que faço no Spa Maria Bonita. Quando a gente cuida da saúde e da alimentação, automaticamente a aparência também muda. Me sinto muito Luci em tudo que ela fala, e também cheia de vida, bom humor, alto astral, prazer de viver e de desenvolver projetos”, compara.

"Mesmo com a Lei Maria da Penha, tem homens que continuam batendo, matando e estuprando as mulheres. Isso não tem a ver com machismo. Pra mim, esses homens que batem são doentes mentais”, aponta Tânia (Felipe Panfili)

“Mesmo com a Lei Maria da Penha, tem homens que continuam batendo, matando e estuprando as mulheres. Isso não tem a ver com machismo. Pra mim, esses homens que batem são doentes mentais”, aponta Tânia (Foto: Felipe Panfili)

A FORÇA DAS MULHERES

Tânia também considera que a palavra ‘empoderada’ vem sendo mal usada. “Parece que alguém te deu essa licença e você não precisa que ninguém te dê. Mulher poderosa é outra coisa. Por exemplo, Tizuka Yamasaki, em certo sentido, era vista como exemplo do que é uma mulher poderosa. Estava filmando Parahyba Mulher Macho, uma cena externa com 300 figurantes, homens fardados, o povo na rua, fumaça, eu ali no meio, e a Tizuka com um megafone dirigia isso ao mesmo tempo que amamentava o bebê dela. Isso pra mim é uma mulher poderosa”, aponta.

Assim, Tânia ressalta que é preciso ter cuidado com exageros. “Parece que se você disser ‘eu te amo’, você pode ir para a cadeia. Por exemplo, adoro ouvir que estou linda. Tenho várias amigas que ficaram casadas, foram casamentos de amor, e que começaram em situação que hoje em dia talvez chamem de assédio. Paquera sempre existiu. O que seria do mundo sem paquera, pelo amor de Deus! Então, é muito perigoso, tem que ter limite e bom senso para diferenciar as situações. Agora, claro que sou a favor de que as pessoas reivindiquem e conquistem as leis”, relata.

E acrescenta um pensamento que a permeia. “Desde que não prejudiquem o semelhante, as pessoas têm que ser livres, fazerem e pensarem o que querem. Essa é a minha única bandeira: ‘amai-vos uns aos outros’. Eu não sei em que letra eu me coloco nesse alfabeto de variáveis sexuais, porque acho que um alfabeto só não da conta (risos), são muitas e em todas ninguém tem que aceitar ou não. Não estou nem aí para a opinião de ninguém. E, graças a Deus, não tenho o que me queixar em relação a assédio, que eu nunca cheguei perto”, assegura.

Mas destaca preconceito que vivenciou em sua trajetória: “Posso me queixar de racismo, mas isso sou eu e tanta gente, sabe, porque a primeira atriz mestiça protagonista foi Sonia Braga e eu vim em seguida nessa alavanca. A partir do momento que não tinha nenhuma protagonista mestiça na televisão brasileira isso já era racismo. Uma vez fui tirada de um programa humorístico. Ouvi dizer da direção que eu estava aquém do padrão de beleza da TV Globo. Dois anos depois, eu era a Maria Bonita, ganhamos vários prêmios internacionais e foi uma mudança na minha vida. Veja como a vida dá voltas”, revela e completa: “Eu sou mestiça, minha bisavó por parte de mãe veio para o Brasil em um navio negreiro, era escrava. Mesmo assim, meu avô se tornou um brilhante advogado.”

"A preferência nacional do brasileiro é a mulher curvilínea, tipo violão e eu não gosto disso. Prefiro ficar mais atlética, com corpo de bailarina, magra, musculosa”, ressalta a atriz (Foto: Felipe Panfili)

“A preferência nacional do brasileiro é a mulher curvilínea, tipo violão e eu não gosto disso. Prefiro ficar mais atlética, com corpo de bailarina, magra, musculosa”, ressalta a atriz (Foto: Felipe Panfili)

Pleníssima, aos 72 anos, ela garante que jamais esteve nesse lugar de abatimento, sem energia vital. “A idade vai passando, mas nunca me senti tão livre, tão sem medo e amorosa. Continuo cheia de projetos. Ambiciosos em termos de saúde. Confio na força do meu corpo, do meu preparo físico. Tenho também muita gente me assessorando nisso, médicos de ponta, terapeutas. Minha própria rotina e hábitos. Tédio e acomodação? Nunca. Não é a toa que me casei cinco vezes. Mas não sou leviana. É que eu nunca condenei a minha vida a relação de acomodação, de resignação”, explica ela, casada há 15 anos com Daniel Rodrigues, o quinto marido.

“Meu sistema imunológico é nota um milhão. Tem mais de 50 anos que eu não pego nem resfriado”, garante Tânia (Foto: Felipe Panfili)

“Meu sistema imunológico é nota um milhão. Tem mais de 50 anos que eu não pego nem resfriado”, garante Tânia (Foto: Felipe Panfili)

A VIDA PROFISSIONAL E A ENTRADA PARA O STREAMING

Profissionalmente, a atriz está ainda adaptando o livro Criogenia de D. ou Manifesto pelos Prazeres Perdidos, de Leonardo Valente. E cai na gargalhada ao citar a coincidência entre sua vida e a da personagem que vai interpretar no monólogo. “Ela também está no quinto marido”, diverte-se Tânia, que este ano, retorna à TV em seu primeiro trabalho na Netflix, a série Olhar Indiscreto. Escrita pela argentina Marcela Clitterio, e protagonizada por Débora Nascimento, a produção tem ainda no elenco nomes como Emanuelle Araújo e Débora Duarte. Sem falar na reprise da novela O Clone, onde interpretou a dançarina de gafieira Norma. “Fiz uma participação especial, mas foi muito boa. E ainda ganhei de presente da Gloria Perez um videoclipe com uma das cenas que eu canto uma das músicas do disco que eu estava lançando na época, foi bem gostoso”, conta ela, que está com projeto de um novo show, mais para o lado pop. Até já gravou um single.

Quer dizer, vive um momento diferente de quando a pandemia começou. Na época, Tânia estava em cartaz com a peça Allan Kardec – Um Olhar para a Eternidade, que havia marcado o retorno dela ao teatro depois de seis anos. “Eu estava me maquiando, alguém entrou no camarim falando que o espetáculo tinha sido suspenso, porque os teatros ficariam fechados por 15 dias. Foi frustrante, porque estava o maior sucesso. Esperei 15 dias, um mês, e como nada aconteceu fui com minha família para o nosso hotel fazenda, o Spa Maria Bonita, em Friburgo, onde temos nossas casas dentro da propriedade”, explica ela, mãe de Gabriela Alves e Leonardo, e avó de Bernardo, 2, filho de seu herdeiro.

Gabriela Alves e a mãe, Tânia Alves (Foto: Reprodução Instagram)

Gabriela Alves e a mãe, Tânia Alves (Foto: Reprodução Instagram)

Na fase de isolamento, começou a desenvolver fortemente algo que sempre quis experimentar: dedicar-se às mídias sociais. “Sou muito criativa, meu cérebro tem vida própria, não parei de criar. Levei para Friburgo a filha de uma amiga. Adolescente sabe tudo sobre redes sociais. Eu cuidava do roteiro, direção, enquadramento, luz, cenários, e fizemos filmes incríveis, lives com os terapeutas do Spa, que são geniais. Ouso dizer que são os melhores do mundo, porque viajo o mundo inteiro, sou muito cobaia, experimento de tudo, e vejo como eles são fantásticos nas suas especialidades, então, teve de terapias quânticas a medicina ayuvérdica. Já minha filha deu aula de yoga”, comenta e acrescenta que em momento algum testou positivo para Covid. Além de seguir os protocolos, ressalta seu estilo de vida de prevenção. “Meu sistema imunológico é nota um milhão. Tem mais de 50 anos que eu não pego nem resfriado”, afirma.

O CASE DE SUCESSO COMO EMPRESÁRIA

Quando o Spa Maria Bonita inaugurou, há 35 anos, Tânia definiu o primeiro cardápio. Atualmente, não cuida mais dessa área e ressalta que o espaço, por exemplo, oferece programação só para quem quer relaxar e não deseja emagrecer, e também de desintoxicação e emagrecimento, contando com a unidade urbana, em Ipanema. “Os cardápios foram se aprimorando. Estamos sempre ligados nas descobertas da ciência sobre alimentação. Hoje em dia, cuido do controle de qualidade e da parte ideológica, filosófica. Realizo palestras sobre qualidade de vida. Eu gosto de cuidar das pessoas para vê-las felizes”,  destaca.

Com seu estilo de vida, Tânia sempre teve boa forma física. Ganhou alguns quilos a mais apenas quando foi necessário para o trabalho. “Lembro que Paulo Ubiratan (1947-1998) mandou eu engordar para fazer a novela Pedra Sobre Pedra, que minha personagem era a gostosona do pedaço. Ele disse que eu tinha que aumentar um pouco o peso (risos). A preferência nacional do brasileiro é a mulher curvilínea, tipo violão e eu não gosto disso. Gosto de ficar mais atlética, com corpo de bailarina, magra, musculosa”, recorda ela, que precisou ganhar alguns quilos também para interpretar a Maria Bonita, e para atuar no filme Parahyba Mulher Macho. “Meu corpo é um instrumento de trabalho. Faz muito sentido o physique du rôle. Não que tudo seja o estereótipo. Mas trabalho meu corpo em relação a isso, além de detalhes como corte do cabelo, o porte. O corpo todo da gente tem a ver com a nossa atuação”, finaliza.