“Passei por uma fase um pouco triste, mas agora estou adaptado à quarentena”, conta Mouhamed Harfouch


Por causa da pandemia de coronavírus, ator está em casa com a família e adiou as temporadas de duas peças de teatro e os shows de lançamento do single “Lente aberta”, que já está nas plataformas digitais. A inspiração para “Lente aberta” veio de um confinamento visto pela TV: a primeira edição do reality “Big Brother Brasil”. Mouhamed lembra que, na época, ficou impressionado com a questão do voyeurismo, da câmera escondida e da imagem que é revelada, captada pela lente

*Por Simone Gondim

Equilibrar a apreensão natural por causa da pandemia de coronavírus, as tarefas domésticas, o trabalho remoto e a energia de duas crianças. Essa é a rotina de Mouhamed Harfouch, que está de quarentena com a mulher, a advogada Clarissa Eyer, e os filhos, Ana Flor, de 7 anos, e Bento, de 3, na residência da família. Há cerca de dez dias sem botar os pés na rua, o ator admite que o isolamento não é fácil. “Passei por uma fase um pouco triste, mas agora estou adaptado. Meu home office é animado. Tenho que fazer de tudo para entreter as crianças, que estão cheias de energia”, confessa. “Usamos serviços de entrega para pedir o que for preciso e dispensamos nossa funcionária, mantendo a remuneração dela, para que pudesse se proteger também”, acrescenta.

O dia é intenso na casa do ator. Além das atividades corriqueiras, como preparar o café da manhã, lavar a louça, fazer ginástica e regar as plantas, Mouhamed precisa de muita imaginação para manter Ana Flor e Bento ocupados. Nessa hora, vale tudo: de levar para pegar sol na varanda a dar uma aula de culinária, ensinando a preparar um bolo para a comemoração do aniversário da avó paterna, feita por chamada de vídeo. “Monto um circuito para as crianças, com aqueles cones pequenos e jogo de amarelinha; boto para pular corda; já amarrei fitas no corredor do apartamento e criei uma passagem como a do filme ‘Missão impossível’, desafiando os dois a atravessar sem encostar em nada”, diz ele. “Mas não é tudo um mar de rosas. Tem horas que o bicho pega, um começa a implicar com o outro. O Bento é muito novinho”, resume.

“Meu home office é animado”, diz Mouhamed (Foto: Ricardo Penna)

O entretenimento planejado para as crianças também tem um lado pedagógico. Mouhamed criou um personagem batizado de Professor João, que dá aulas de artes, leitura e interpretação de texto. “Primeiro, eles vão para o quarto e saem de lá arrumados como se fossem para a escola. Quando os dois entram na sala, tem um quadro-negro. Conto uma história, as crianças falam das impressões delas, dizem se já aconteceu alguma coisa parecida. Vamos desenvolvendo isso, tentando fazer do confinamento algo lúdico”, explica. “Está sendo interessante redescobrir muitas coisas, poder se reconectar de outras formas e perceber o quanto eles são felizes com a possibilidade de conexão com a gente. Por conta dos compromissos do dia a dia, às vezes esse contato fica mais escasso”, completa.

Enquanto a vida doméstica segue bem agitada, a profissional deu uma parada por causa das medidas preventivas contra o coronavírus. Mouhamed interrompeu a reta final dos ensaios da peça “Quando eu for mãe, eu quero amar desse jeito”, na qual divide a cena com Larissa Maciel e Vera Fischer. O espetáculo já estava com cenário montado e estreia marcada para 9 de abril, mas foi adiado. A turnê comemorativa de dez anos de “A história de nós dois”, que tem no palco a parceria com Alexandra Richter, também precisou ser interrompida, com devolução do valor pago por alguns ingressos. “O público teatral, em sua grande maioria, é formado por idosos, que estão no grupo de risco do coronavírus. Imagina quanto tempo vai demorar para voltar a credibilidade e a confiança de o pessoal estar dentro de uma sala de teatro fechada, com ar-condicionado. A gente não sabe dizer quando isso vai acontecer”, pondera.

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O trabalho de Mouhamed como cantor e compositor é outro que está com a agenda em suspenso. Embora o single “Lente aberta” já esteja em plataformas digitais como Spotify, Deezer e iTunes, os ensaios com a banda tiveram que parar, porque os shows de lançamento ficaram para depois. “Torço para que tão logo se restabeleça a normalidade com segurança, porque não me interessa estar na rua ou ter pressa para voltar à vida de sempre sabendo que ainda não é possível combater o vírus de maneira mais eficiente. O momento é de calma, de serenidade, até que a gente tenha um sistema de saúde capacitado e apto a receber a demanda adequada, sem entrar em colapso”, afirma o ator.

A inspiração para “Lente aberta” veio de um confinamento visto pela TV: a primeira edição do reality “Big Brother Brasil”. Mouhamed lembra que, na época, ficou impressionado com a questão do voyeurismo, da câmera escondida e da imagem que é revelada, captada pela lente. “Comecei a brincar com o universo da fotografia. Nessa música, exploro a relação entre o olhar do fotografado e do fotógrafo. Quem quer conquistar quem? E o que a lente é capaz de revelar?”, conta. “Minhas composições surgiram quando eu finalizei o ‘Popstar’. Convidei o Marcelo Süssekind, que foi meu produtor e é um mestre do rock, para cuidar do lançamento. A primeira canção a sair foi ‘Volta’, que entrou em uma cena da novela ‘Órfãos da terra’ e estava na ponta da língua dos meus colegas de elenco”, finaliza.

Apesar do susto e dos transtornos, a quarentena por causa do coronavírus trouxe uma grata surpresa para Mouhamed Harfouch: a reprise de “Malhação – Viva a diferença”, na qual ele interpreta Bóris, o diretor pedagógico do Colégio Grupo. “Meu personagem é um apaixonado pela educação, que pensa muito em formar cidadãos, e não fazer alunos passarem de ano e em provas. Ele é muito preocupado com a ética, em formar pessoas capacitadas para fazerem suas escolhas e participarem da sociedade, para construir uma sociedade justa, humanitária, diversa, com tolerância”, descreve. “Bóris me deu muitas alegrias. Fora que enaltece uma profissão que é tão heroica quanto a de médico, hoje. Sem o professor você não tem nenhuma outra carreira”, reconhece.

Exibida originalmente em 2017 e vencedora do Emmy Internacional Kids na categoria Séries, “Malhação – Viva a diferença” faz ainda mais sentido ao ser reprisada em 2020, segundo Mouhamed. “Gostaria que essa trama voltasse em um momento sem pandemia, claro, mas considero a escolha um acerto total, porque estamos às voltas com censura das artes, fake news, intolerância e intransigência. É uma ‘Malhação’ que conversa com esses temas e levanta a importância de debater esses assuntos”, fala o ator. “Acho muito acertada a posição da Rede Globo de paralisar as gravações, uma vez que mostra não só a preocupação com seus profissionais, mas com toda a sociedade. Estamos passando por um momento histórico. Daqui a 40, 50 anos a gente vai contar essa história e as pessoas não vão acreditar que todo mundo parou e ficou dentro de casa, isolado em quarentena”, garante.