No ar em ‘Cara e Coragem’, Maria Eduarda de Carvalho frisa: “A rotina deste ofício não tem nenhum glamour”


Vivendo atriz famosa em trama das 19h da Globo, ela fala do encontro com Paolla Oliveira, que faz sua dublê na ficção, de quem ficou amiga e a quem direcionou um ‘pedido de casamento’: “Ela ainda não respondeu…sigo aguardando!”. A atriz também revela seus projetos autorais no audiovisual e no teatro, e comenta sobre a ilusão das redes sociais: “Essa cultura da superexposição e os ‘tribunais’ que se formam com ela, assustam muito. Os ‘anjos tronchos’ do Vale do Silício me tiram o sono (literalmente!). A internet dita um modo muito superficial de ser e pensar, e tenho medo de sucumbir a ele. O mundo contemporâneo, orquestrado pelas redes sociais, é absolutamente raso, pouquíssimo criativo e inteiramente fulgás. As pessoas não percebem que estão perdendo sua subjetividade. Este processo de ‘zumbificação’ me assusta”

*Por Brunna Condini

A personagem de Maria Eduarda de Carvalho vem causando em ‘Cara e Coragem‘, trama das 19h, da Globo. Na pele da misteriosa Andrea Pratini, famosa atriz de TV com ares de diva, ela vem instigando e divertindo o público. Mas, para além de representar a figura da celebridade que se firmou na indústria cultural alimentando o mercado do entretenimento, Maria Eduarda defende a personagem. “Antes de tudo, ela é uma atriz. Não ficou famosa só por que tem muitos seguidores no Instagram. Acho que existe uma confusão entre ser famoso e ser um ator e uma atriz. Muita gente associa uma coisa à outra e almeja esta profissão vislumbrando a fama. E este é um tremendo equívoco. A proporção de atores que se tornam famosos em consequência do seu trabalho é ínfima. A rotina deste ofício não tem nenhum glamour. Trabalhamos longas horas por dia em um ritmo pra lá de intenso. A instabilidade financeira é uma companhia recorrente e uma desagradável sensação de eterno recomeço também nos assombra permanentemente”, frisa a atriz com 26 anos de trajetória profissional.

Maria Eduarda de Carvalho nos bastidores de 'Cara e Coragem' (Foto: Jeff Alves)

Maria Eduarda de Carvalho nos bastidores de ‘Cara e Coragem’ (Foto: Jeff Alves)

Costumeiramente discreta, a atriz também acabou causando recentemente (e despretensiosamente), ao fazer um post em sua conta no Instagram elogiando a parceira de cena Paolla Oliveira. “E como se não bastasse TUDO, ela ainda come pão francês (e coxinha e farofa!) Curte vinho branco (e caipirinha e caipvodka.) É (muito) divertida. É festeira e carinhosa. Mora no tempo da delicadeza. É humana, sensível e generosa…Comecei a escrever este texto pensando em pedir que os astros que ela crê, nos protejam nessa linda jornada. Mas acho que vou mesmo é pedir licença ao @diogonogueira_oficial para pedir @paollaoliveirareal em casamento! Hahahahahahaha. Muito obrigada, parceira. Sorte grande ter você ao meu lado”, publicou, na estreia do folhetim. E apesar do pedido ter sido uma brincadeira entre amigas, virou manchete nos sites. “Teve essa repercussão? Eu não soube disso … deve ser porque, depois que Caetano Veloso estacionou no Leblon – a ‘notícia’ de que o cantor estacionou seu carro no Leblon já rendeu uma década de memes – esta foi a ‘manchete’ mais contundente do Brasil nos últimos tempos, né? (risos). A propósito: ela ainda não me respondeu … sigo aguardando!”.

Maria Eduarda Carvalho e Paolla Oliveira em cena: "Sua sensibilidade e delicadeza me encantam. E como se não bastasse isso, ela ainda gosta de samba e bebe cachaça! Claro que me apaixonei, né?" (Victor Pollack/ Globo)

Maria Eduarda Carvalho e Paolla Oliveira em cena: “Sua sensibilidade me encanta. E, como se não bastasse, ela ainda gosta de samba e bebe cachaça! Claro que me apaixonei, né?” (Foto: Victor Pollack/ Globo)

Sobre Paolla, a artista conta ainda: “Tenho para mim que pessoas do tipo ‘gente-humana’ são espécie em extinção. Fico profundamente emocionada quando encontro um exemplar. Paolla é ‘gente-humana’ da melhor qualidade. Sua sensibilidade e delicadeza me encantam. E como se não bastasse isso, ela ainda gosta de samba e bebe cachaça! Claro que me apaixonei, né?”.

Maria Eduarda de Carvalho e Paolla Oliveira na estreia da novela das 19h: "Ela ainda não me respondeu ao pedido de casamento (risos) ... Sigo aguardando!" (Reprodução/ Instagram)

Maria Eduarda de Carvalho e Paolla Oliveira na estreia da novela das 19h: “Ela ainda não me respondeu ao pedido de casamento (risos) … Sigo aguardando!” (Reprodução/ Instagram)

Apesar da carreira longeva, o universo da fama não enche os olhos de Maria Eduarda. “Não tenho relação com este mundo das super celebridades. Sou atriz. E descobri que não tinha chance de ser qualquer outra coisa, ainda menina. Sempre fui muito medrosa. Era uma criança cheia de paúras e estranhices. Tinha 3 anos quando meus pais se separaram. Eu e minha irmã, Maria Antônia, víamos meu pai de 15 em 15 dias e, geralmente, quando estávamos com ele, íamos ao teatro. Eu, que tinha um profundo pavor de escuro, nunca tive medo do escuro do teatro. Pelo contrário. Ansiava por aquele momento em que as luzes se apagavam e anunciava a fantasia por vir. O escuro do teatro me aproximava do meu pai, me acolhia e acendia a luz da minha imaginação. Ali comecei a perceber o potencial transformador da arte e suas possibilidades de ressignificação. Quando, aos 13 anos, comecei a fazer teatro no Tablado, já tinha claro dentro de mim que só teria chance de ser uma pessoa realizada como artista”, conta.

"Não tenho relação com este mundo das super celebridades. Sou atriz, porque não posso ser outra coisa" (Foto: Jeff Alves)

“Não tenho relação com este mundo das super celebridades. Sou atriz, porque não posso ser outra coisa” (Foto: Jeff Alves)

Ativa na comunicação nas redes sociais, ela não se deslumbra nem com adulações e nem com alcance da ‘bolha cibernética’. A atriz sabe que quanto mais exposto, mais o artista se torna vulnerável a julgamentos no ‘tribunal da internet’. “Essa cultura da superexposição e os ‘tribunais’ que se formam com ela, assustam muito. Os ‘anjos tronchos’ do Vale do Silício me tiram o sono (literalmente!). A internet dita um modo muito superficial de ser e pensar, e tenho medo de sucumbir a ele. O mundo contemporâneo, orquestrado pelas redes sociais, é absolutamente raso, pouquíssimo criativo e inteiramente fulgás . As pessoas não percebem que estão perdendo sua subjetividade. Este processo de ‘zumbificação’ me assusta”.

Sambando e cantando na cara da sociedade

Mangueirense e frequentadora de rodas de samba há muitos anos, ela comenta sobre sua intimidade com o ritmo. “Apesar deste meu tom translúcido, o samba está presente em minha vida desde antes de nascer. Meu tio e meu primo são excelentes percussionistas e graças a eles o samba de raiz sempre fez parte das trilhas da minha vida. Aliás, todas as quintas-feiras, na Fundição Progresso, aqui no Rio, meu primo comanda uma roda de samba chamada Independente dos Bons Costumes, que frequento e indico. O samba é a nossa nobreza!”, exalta a atriz, que inclusive já deu ‘pinta’ em algumas rodas cantando.

Ela é musical. Tanto na vida, quanto no trabalho, Maria Eduarda está sempre elegendo suas trilhas e colocando canções para embalar os momentos. Vide seus divertidos vídeos nos bastidores da novela publicados no Instagram. Vivendo desde cedo em uma ambiente de estímulo artístico e de expressão, acreditando que “ser artista é viver em (des)equilíbrio constante, sobre uma corda bamba de vastas emoções”, nada a impede de aventurar-se mais pela música, que tanto vem ‘convidado- a para dançar’. “Adoraria fazer um projeto mais profissional cantando. Mas, por hora, ainda não me sinto suficientemente preparada. Quem sabe mais adiante?”, diz. Participaria de algum reality musical? “Se pudesse levar minha professora, Katia Jorgensen, no bolso, quem sabe?”.

A atriz cantando em roda de samba: "Adoraria fazer um projeto mais profissional cantando. Mas, por hora, ainda não me sinto suficientemente preparada. Quem sabe mais adiante?" (Reprodução/ Instagram)

“Adoraria fazer um projeto mais profissional cantando. Quem sabe mais adiante?” (Reprodução/ Instagram)

Checklist feminino

Feliz mãe de Luiza, de 12 anos, do seu casamento com o ex-marido, Snir Wine, ela brinca dizendo que ser ‘mãe de adolescente’ tem sido algo apavorante. “Inclusive quem quiser me enviar dicas, conselhos e mensagens de estímulo no Direct do Instagram, agradeço imensamente (risos)”. Constantemente perguntada sobre ter mais filhos, Maria Eduarda observa. “Passei boa parte da vida acreditando que me casaria e seria feliz para sempre com aquele que se tornaria meu grande parceiro de vida. Com ele teria dois filhos. Não tive e nem fui feliz para sempre com meu ‘príncipe encantado’. Tenho achado interessante refletir sobre este meu ‘checklist’ de desejos não preenchidos. Quais dele, de fato, me representam neste momento da minha vida, e quais são simplesmente fardos culturais que nós mulheres arrastamos, sem perceber que não são genuínos?”, indaga.

 Ao lado da filha Luiza: "Ser mãe de adolescente é apavorante (risos). Inclusive quem quiser me enviar dicas, conselhos e mensagens de estímulo no direct do Instagram, agradeço imensamente" (Reprodução/ Instagram)

Com a filha Luiza: “Ser mãe de adolescente é apavorante (risos). Inclusive quem quiser me enviar dicas, conselhos e mensagens de estímulo, agradeço” (Reprodução/ Instagram)

“A questão da maternidade, por exemplo, é um tema que precisa urgentemente ser desconstruído. Esta ideia de que nascemos com algum tipo de instinto ou essência maternal, e que é nosso dever gerar e criar um filho, é, na verdade, uma construção social difundida a partir do século 18, 19, para que as mulheres aceitassem resignadas o papel de cuidadoras. Apesar disso, muitas mulheres que não desejam ser mães ou que não se tornaram mães por algum motivo, ainda sofrem preconceito e são vistas como mulheres incompletas”.

Sobre as apreensões em relação ao mundo que a filha habita, ela pontua. “Teria que dar três entrevistas, só pra falar delas! Mas, aproveitando a resposta acima, tenho pensado muito sobre esta herança cultural extremamente machista que nós mulheres carregamos e reproduzimos, sem perceber. Nossos desejos vêm sendo forjados ao longo de séculos por uma história escrita por homens. Acho importante que a gente comece a se perguntar, se o que disso tudo que nos disseram que temos que ser, faz interseção com quem de fato desejamos ser”. E divide: “A partir de uma crise pessoal que tive em vias de completar 40 anos, comecei a ler e a estudar a história da mulher na sociedade. Este intercâmbio entre crise e estudo deu origem a um projeto de documentário, chamado: ‘Nós Por Todas, à procura de um feminino singular’. Vou rodá-lo assim que a novela acabar e o dedicarei à Luiza. Espero que ele a ajude a se tornar, não a mulher que ela acha que precisa ser, mas, sim, a mulher que ela deseja ser”.

“A partir de uma crise pessoal que tive em vias de completar 40 anos, comecei a ler e a estudar a história da mulher na sociedade” (Foto: Jeff Alves)

Amanhã vai ser outro dia

Desassossego é o que não falta no coração da atriz quando pensa nas eleições presidenciais deste ano. “Que momento difícil, não? Como se não bastasse tudo o que vivemos, ainda teremos de encarar essa guerra em outubro…mas vamos à luta! Porque o momento não comporta imparcialidade. Não se trata de escolher entre direita ou esquerda. Estamos lutando para que nossos direitos básicos, como cidadãos vivendo em sociedade, sejam mantidos. Não é uma questão partidária. É uma questão de humanidade”, convoca.

Acredita que é fundamental que os artistas se posicionem? “Não sei se todo artista precisa se posicionar, mas sei que eu preciso. Sou filha de uma mulher incrível e com ela aprendi que falar pode curar. Aprendi também que a esquerda está bem longe de ser perfeita, mas está mais próxima dos nossos ideais humanistas. Com minha mãe compreendi que a educação é a base da reforma e que – somente a partir dela – viveremos uma transformação estrutural. Acho que minha necessidade de me posicionar tem mais a ver com essa formação, do que com o fato de ser artista”.

"Não sei se todo artista precisa se posicionar, mas sei que eu preciso me posicionar. Sou filha de uma mulher incrível e com ela aprendi que falar pode curar" (Reprodução/ Instagram)

“Não sei se todo artista precisa se posicionar, mas sei que eu preciso me posicionar. Sou filha de uma mulher incrível e com ela aprendi que falar pode curar” (Reprodução/ Instagram)

E anuncia os planos daqui para frente: “Além do documentário que já mencionei, tem também uma nova peça que escrevi. Há alguns anos montei ‘Atrás Do Mundo’, espetáculo que conta a história de Didia, uma menina que cai “atrás do mundo”, um lugar metafórico, e lá consegue elaborar a perda da irmã. Durante a pandemia me encontrei bastante perdida e decidi que no aniversário de 40 anos Didia cairá “atrás do mundo” outra vez para elaborar as novas dores. Este novo texto se chama ‘Tem mais presença em mim o que me falta’, e meu desejo é estar em cartaz com os dois espetáculos ao mesmo tempo, já que um é infantil e o outro é adulto. Só falta o patrocínio. Alguém se habilita?”.